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Hábitos auditivos e comportamento de adolescentes diante das atividades de lazer ruidosas

Listening habits and behavior of teenagers versus noisy leisure activities

Resumos

OBJETIVO: identificar atitudes e hábitos auditivos de adolescentes frente ao ruído (ambiental e lazer). MÉTODOS: amostra: 125 adolescentes, ambos os gêneros, média de idade de 16,7 anos, estudantes do ensino fundamental e médio de escolas de diversos municípios paranaenses. Utilizou-se a versão brasileira do questionário Youth Attitude to Noise Scale (YANS) para explorar atitudes dos adolescentes diante do ruído e questões relacionadas aos hábitos auditivos e dados demográficos dos adolescentes. Análise por estatística descritiva, testes de Fisher e Qui-quadrado. RESULTADOS: atitudes: 40,2% dos adolescentes concordam que barulhos e sons altos são aspectos naturais da nossa sociedade, 32% sentem-se preparados para tornar o ambiente escolar mais silencioso e 41,6% consideram importante tornar o som ambiental mais confortável; 38,4% dos adolescentes apresentam zumbido e consideram-se sensíveis ao ruído. A maioria (85,6%) dos entrevistados relatou não se preocupar antes de ir a shows e discotecas, mesmo com experiências precedentes de zumbido; 75,2%, não fazem uso de protetor auditivo. Hábitos auditivos: 46,4% referiram que ouvem música com fones de ouvido diariamente e 34,4% ouvem música com equipamento de som em casa. Diferenças significantes entre os gêneros, foram observadas na prática de atividades esportivas e náuticas e grupo musical. CONCLUSÕES: os integrantes desse estudo apresentam atitudes positivas para o ruído e os hábitos mais comuns foram ouvir música com fone de ouvido ou equipamento de som (casa ou carro).

Perda Auditiva Provocada por Ruído; Adolescentes; Hábitos; Atividades de Lazer


PURPOSE: to identify the attitudes and the hearing habits of adolescents in relation with environmental noise and in leisure activities. METHODS: 125 teenagers of both genders (68% male and 30.4% female) were included in the study, with an average age of 16.7 years. The adolescents were invited to answer the Brazilian version of the Youth Attitude to Noise Scale (YANS) questionnaire in order to study their attitude towards noise, teenagers' habits and demographic data. Descriptive statistics was used to characterize demographic data and Fisher and Square Chi tests to analyze gender differences. RESULTS: to attitudes: 40.2% agree that noise and high sounds are natural aspects of our society, 32% are prepared to make the school atmosphere less noisy. 85.6% of the teens said that they do not worry before going to shows or even discos and that they had had precedent experiences of buzzing after resonant events, and 75.2% said they never use any hearing protective equipment. To habits: 46.4% of the sample said that they hear music daily using ear phones; 34.4% hear music with house sound equipment in high volumes. Significant results (p < 0.05%) between genders were found in sporting and nautical activities as well as in shooting practices and musical groups. CONCLUSIONS: the members of this study have positive attitudes towards noise and the most common habits were listening to music with headphones or stereo (home or car).

Hearing Loss; Noise-Induced; Adolescents; Habits; Leisure Activities


Hábitos auditivos e comportamento de adolescentes diante das atividades de lazer ruidosas

Listening habits and behavior of teenagers versus noisy leisure activities

Adriana Bender Moreira de LacerdaI; Cláudia Giglio de Oliveira GonçalvesII; Angela Maria Fontana ZocoliIII; Carolina DiazIV; Karla de PaulaV

IFonoaudióloga; Professora adjunta da Universidade Tuiuti do Paraná – UTP, Curitiba, Paraná, Brasil; Doutora em Ciências Biomédicas – Audiologia pela Universidade de Montreal, Canadá

IIFonoaudióloga; Professora do programa de Mestrado da Universidade Tuiuti do Paraná – UTP, Curitiba, Paraná, Brasil; Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual de Campinas

IIIFonoaudióloga; Mestre em Distúrbios da Comunicação pela Universidade Tuiuti do Paraná – UTP, Curitiba, Paraná, Brasil

IVFonoaudióloga; Especialista em Audiologia pela Universidade Tuiuti do Paraná – UTP, Curitiba, Paraná, Brasil

VFonoaudióloga; e Especialista em Audiologia pela Universidade Tuiuti do Paraná – UTP Curitiba, Paraná, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Adriana Bender Moreira de Lacerda Rua Sydnei Antonio Rangel Santos, 238– Santo Inácio Curitiba, Paraná, Brasil CEP: 82010-330 E-mail: adriana.lacerda@utp.br

RESUMO

OBJETIVO: identificar atitudes e hábitos auditivos de adolescentes frente ao ruído (ambiental e lazer).

MÉTODOS: amostra: 125 adolescentes, ambos os gêneros, média de idade de 16,7 anos, estudantes do ensino fundamental e médio de escolas de diversos municípios paranaenses. Utilizou-se a versão brasileira do questionário Youth Attitude to Noise Scale (YANS) para explorar atitudes dos adolescentes diante do ruído e questões relacionadas aos hábitos auditivos e dados demográficos dos adolescentes. Análise por estatística descritiva, testes de Fisher e Qui-quadrado.

RESULTADOS: atitudes: 40,2% dos adolescentes concordam que barulhos e sons altos são aspectos naturais da nossa sociedade, 32% sentem-se preparados para tornar o ambiente escolar mais silencioso e 41,6% consideram importante tornar o som ambiental mais confortável; 38,4% dos adolescentes apresentam zumbido e consideram-se sensíveis ao ruído. A maioria (85,6%) dos entrevistados relatou não se preocupar antes de ir a shows e discotecas, mesmo com experiências precedentes de zumbido; 75,2%, não fazem uso de protetor auditivo. Hábitos auditivos: 46,4% referiram que ouvem música com fones de ouvido diariamente e 34,4% ouvem música com equipamento de som em casa. Diferenças significantes entre os gêneros, foram observadas na prática de atividades esportivas e náuticas e grupo musical.

CONCLUSÕES: os integrantes desse estudo apresentam atitudes positivas para o ruído e os hábitos mais comuns foram ouvir música com fone de ouvido ou equipamento de som (casa ou carro).

Descritores: Perda Auditiva Provocada por Ruído; Adolescentes; Hábitos; Atividades de Lazer

ABSTRACT

PURPOSE: to identify the attitudes and the hearing habits of adolescents in relation with environmental noise and in leisure activities.

METHODS: 125 teenagers of both genders (68% male and 30.4% female) were included in the study, with an average age of 16.7 years. The adolescents were invited to answer the Brazilian version of the Youth Attitude to Noise Scale (YANS) questionnaire in order to study their attitude towards noise, teenagers' habits and demographic data. Descriptive statistics was used to characterize demographic data and Fisher and Square Chi tests to analyze gender differences.

RESULTS: to attitudes: 40.2% agree that noise and high sounds are natural aspects of our society, 32% are prepared to make the school atmosphere less noisy. 85.6% of the teens said that they do not worry before going to shows or even discos and that they had had precedent experiences of buzzing after resonant events, and 75.2% said they never use any hearing protective equipment. To habits: 46.4% of the sample said that they hear music daily using ear phones; 34.4% hear music with house sound equipment in high volumes. Significant results (p < 0.05%) between genders were found in sporting and nautical activities as well as in shooting practices and musical groups.

CONCLUSIONS: the members of this study have positive attitudes towards noise and the most common habits were listening to music with headphones or stereo (home or car).

Keywords: Hearing Loss, Noise-Induced; Adolescents; Habits; Leisure Activities.

INTRODUÇÃO

A preocupação dos profissionais de saúde com a perda auditiva induzida pelo ruído (PAIR) no ambiente de trabalho começou a se estender para as atividades de lazer, principalmente com a prática de esportes em ginásios e/ou academias, a frequência em boates e o uso de equipamentos portáteis com fones de ouvido 1-8.

Nos ambientes onde os jovens costumam se encontrar como bares, danceterias, shows, etc., geralmente a intensidade do som é superior a 100 dBA e nos equipamentos portáteis individuais com fones de ouvido podem até ultrapassar esta intensidade 9,10.

A exposição a elevados níveis de intensidade pode desencadear diversos sintomas, tais como: intolerância a sons intensos, tontura, otalgia e principalmente, o zumbido e perda auditiva 11. Já o prejuízo na audição pode acarretar conseqüências severas à qualidade de vida do indivíduo, afetando sua saúde e conturbando intensamente suas relações sociais 12.

Muitos estudos são realizados acerca do ruído ocupacional, porém não há tantos estudos com jovens expostos a níveis sonoros elevados nas mesmas proporções, entretanto, a integridade auditiva deles pode estar relacionada com seu estilo de vida e suas preferências nas atividades de lazer 13.

Este estudo teve como objetivo identificar o comportamento de adolescentes frente ao ruído ambiental e em atividades de lazer, relacionado às atitudes e hábitos auditivos, para direcionar o planejamento de Programas Preventivos de Perdas Auditivas.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo analítico transversal (ou seccional) que investigou, por meio de questionário, as atitudes e hábitos de adolescentes frente ao ruído.

Este estudo foi desenvolvido com 125 adolescentes, de ambos os sexos (68,6 % masculino e 31,4 % feminino); com idade média de 16,7 anos (sendo do sexo feminino, média da idade de 16,3 anos – desvio padrão de 1,4 anos e do sexo masculino, média de 16,9 anos – desvio padrão de 1,6 anos); estudantes do ensino fundamental II e médio, de várias cidades paranaenses, participantes do evento "Olimpíada do Conhecimento 2008 – Fase Nacional Etapa Paraná", promovido pelo SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) – Departamento Nacional, no período de 13 a 16 de agosto de 2008. No total foram aplicados 316 questionários, porém apenas 125 foram selecionados para análise, devido ao fato dos demais estarem rasurados ou com as respostas incompletas.

A escolha desse evento para realização do presente estudo ocorreu em virtude do fato que dentre os inúmeros objetivos do evento, um dos destaques foi a conscientização dos adolescentes para práticas preventivas relacionadas à saúde. Sendo assim o SESI (Serviço social da Indústria) criou a "Praça da cidadania", onde os jovens participantes recebiam informações sobre diferentes áreas da saúde, dentre elas a Fonoaudiologia. Durante o evento os alunos dos programas de graduação em Fonoaudiologia, Mestrado e Doutorado em Distúrbios da Comunicação de uma Universidade privada da cidade de Curitiba-PR, elaboraram uma palestra preventiva/educativa sobre os efeitos do ruído na adolescência e esclareceram dúvidas relacionadas ao tema.

Os adolescentes foram convidados a responder um questionário, com perguntas fechadas, antes de assistir a palestra. O questionário foi dividido três partes: Parte 1 – versão brasileira do questionário Youth Attitude to Noise Scale – YANS 14; adaptado para português brasileiro 6; com finalidade de explorar atitudes dos jovens para o ruído, numa escala que trata dos tipos diferentes de sons comuns em ambientes freqüentados por eles. É formado por 19 questões afirmativas, divididas em quatro fatores envolvendo questões correlacionadas, assim classificadas: atitudes para o ruído associado com aspectos da cultura da juventude; atitudes para habilidade de se concentrar em ambientes ruidosos; atitudes para os ruídos diários e atitudes para influenciar o ambiente sonoro. As respostas são registradas por meio da escala de Likert com cinco graus, onde: 1 – discordo totalmente, 2 – discordo parcialmente, 3 – concordo, 4 – concordo parcialmente e 5 – concordo totalmente. Parte 2: questões sobre queixas de sintomas auditivos e extra-auditivos pela exposição a intensidades sonoras elevadas e antecedentes otológicos; Parte 3: hábitos dos adolescentes e sua freqüência em relação às atividades de lazer em intensidades sonoras elevadas, com 14 questões e quatro possibilidades de respostas temporais (nunca, eventualmente, várias vezes na semana, diariamente).

O projeto do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Tuiuti do Paraná por meio do processo nº 062/2006.

Utilizaram-se procedimentos estatísticos para a análise dos dados, sendo a estatística descritiva utilizada para caracterizar os dados demográficos, e os Testes de Fisher e o Qui-quadrado para as análises de diferenças entre os gêneros.

RESULTADOS

Para avaliar as atitudes dos jovens diante de situações ou eventos com níveis sonoros elevados, foi utilizada a escala de Lickert, em que os valores mais elevados sugerem atitude mais positiva para com o ruído (ruído considerado como algo bom) e os valores mais baixos na escala refletem atitude mais negativa (ruído considerado como algo ruim). A análise das atitudes e comportamentos dos jovens frente ao ruído ficou assim distribuída: na escola (questões 1, 2, 3, 4, 5 e 6), observou-se que mais da metade dos adolescentes concordam que o som da escola é confortável, porém, a maioria concordou que a sala de aula deveria ser silenciosa e calma. Muitos deles concordam que estão preparados para tornar o ambiente escolar mais silencioso. O comportamento dos jovens em discotecas, bailes, shows de rock e/ou eventos esportivos foi descrito nas questões 7, 8, 9 e 10. Quando questionados se consideram o volume do som em eventos alto demais, as respostas dividiram-se em adolescentes que concordavam com a pergunta e indecisos, porém, para a maioria, o volume do som não parece ser problema. As atitudes dos jovens frente ao ruído ambiental são descritas por meio das questões 11, 12, 13, 14, 15,16, 17, 18 e 19. Observa-se que a maioria dos adolescentes considera importante tornar o som do ambiente mais confortável, porém, não gostam quando está quieto ao redor e acham que barulhos e sons altos são aspectos naturais da nossa sociedade. Todavia, a maior parte considera que deveria haver mais regras ou regulamentos para o volume de sons na sociedade. Os resultados podem ser observados na tabela 1.

Foram questionados queixas e sintomas que poderiam estar relacionados com a exposição a níveis de intensidade sonora elevados (Tabela 2). Observa-se que 38,4% dos adolescentes apresentaram zumbido e consideram-se sensíveis ao ruído. Cabe ressaltar que 85,6% dos jovens referiram não se preocupar antes de ir a shows e discotecas mesmo relatando experiências precedentes de zumbido ao sair destes locais. Ao nível de significância de 0,05 (5%) não ocorreram resultados significativos entre os gêneros.

Analisaram-se os hábitos auditivos e comportamento dos jovens em relação às atividades que poderiam expô-los a intensidades sonoras elevadas (tabela 3). A maioria deles (64%) referiu que eventualmente frequentam discotecas, danceterias e/ou bailes; pouco mais da metade da amostra (53,6%) responderam que frequentam eventualmente shows de música popular ou rock. Um número significativo de jovens (46,4%) referiu que utiliza equipamentos portáteis com fones de ouvido para ouvir música diariamente ou equipamento de som casa em volume alto (diariamente 34,4% e várias vezes ao dia 29,6%). Diferenças significantes entre os gêneros foram observadas na prática de eventos esportivos; na prática de mergulho, caça submarina ou vôo livre; na realização de atividade de caça ou tiro com armas de fogo e para tocar instrumento musical (banda ou orquestra).

DISCUSSÃO

Nas últimas décadas, os níveis de pressão sonora intensos foram considerados os mais presentes agentes nocivos à saúde nos ambientes urbanos e sociais, sendo encontrados frequentemente em locais de atividades de lazer, na forma de música em intensidade elevada, transformam-se num problema ambiental crescente na atualidade 12,14.

Os resultados deste estudo, relacionados às atitudes dos adolescentes frente ao ruído presente em diferentes locais, sugere que a cultura atual da juventude não parece preocupar-se com os efeitos nocivos dos sons intensos. Esse fato fica claro ao serem consideradas suas atitudes nas mais diversas situações de exposição (tabela 1).

Ao serem questionados quanto ao ruído escolar (tabela 1, questões de 1 a 6), a maioria dos adolescentes relatou que o volume de ruído na escola é confortável. Um número considerável de jovens ouve música durante as tarefas escolares e declaram que se concentram melhor quando ela esta presente, tal fato também já havia sido descrito em pesquisas anteriores 15. Em 2001 pesquisadores encontraram um resultado semelhante ao entrevistarem funcionários de uma discoteca, na qual a maioria preferia realizar suas tarefas em ambientes barulhentos, pois relatavam o som alto os mantinham alertas e acabava ajudando no trabalho 3.

Apesar da maioria dos participantes deste estudo referir estar preparada para tornar o ambiente escolar mais silencioso e concordar com a afirmação de que a sala de aula deveria ser silenciosa e calma, os jovens não estão dispostos a desistirem de atividades ruidosas. Estes resultados refletem a falta de conscientização dos jovens sobre a problemática do ruído escolar e seus efeitos.

A PAIR é um problema invisível que freqüentemente é ignorado nas escolas, visto que, as escolas públicas são ambientes ruidosos, nos quais funcionários e alunos trabalham e estudam diariamente. Neste contexto, a pesquisa sugere que deveria ser prioridade para a atenção pública e desenvolver um programa de prevenção auditiva e educacional para as escolas. A PAIR nas escolas é um problema que pode ser erradicado com apoio e educação 16.

Nos Estados Unidos estudo mostra que a porcentagem de alterações auditivas entre jovens no ensino médio aumentou 2,8 vezes nas últimas décadas 17. Esse fato vem de encontro a outros estudos que revelam que pessoas jovens deveriam ser informadas em bases amplas sobre o risco para a audição que o indivíduo se submete ao fazer uso de fones de ouvido em intensidade alta e por um longo período de tempo. Campanhas informativas deveriam, por outro lado, iniciar com as crianças que são expostas à música dos estéreis portáteis, jogos eletrônicos, etc. 18.

As atitudes dos adolescentes frente ao ruído nas atividades de lazer (tabela 1, questões de 7 a 10) revelam que este grupo não considerara o ruído elevado como um fator prejudicial à saúde, não manifestara desejo de se proteger e o volume do som nestes locais não foi considerado um problema. Estes achados diferem do estudo realizado em 2001 onde muitos adolescentes referem que a música alta em danceterias, shows e até mesmo na cantina da escola é freqüentemente tão alto que eles acham difícil se divertir. Entretanto eles se sentem incapazes de mudar a situação, porque percebem que a maioria de seus amigos gosta do ruído 19.

O fato de alguns jovens gostarem do ruído pode estar relacionado com a descarga de adrenalina causada pela exposição a intensidades sonoras elevadas e que são vistas como estimulantes pelos jovens 20.

A maioria dos jovens dessa amostra não considera importante o uso de protetores auriculares em situações de intensidade sonora elevada (tabela 1, questão 9). A falta de conhecimento e interesse dos adolescentes acerca das medidas de prevenção auditiva pode ser atribuída ao fato da perda auditiva não se manifestar durante os primeiros anos de exposição ao ruído. A maioria das pessoas com perdas auditivas leves em altas freqüências não esta ciente do problema, não usa proteção adequada e também não imagina o impacto que a perda auditiva pode causar em sua qualidade de vida no futuro 6,15.

A questão sobre o uso do protetor auditivo em atividades como em discotecas e shows, causou espanto nos jovens que participaram de uma pesquisa em Santa Catarina, maioria deles questionou se a pergunta fazia parte de alguma brincadeira. Consideraram a pergunta engraçada e comentaram que assistir a um show com "os ouvidos tapados não teria graça" 6.

O uso do protetor auditivo por jovens pode ser uma boa opção para evitar os riscos à audição, devendo ser usado em todas as situações. Possivelmente a combinação entre os sintomas auditivos e a preocupação em relação à exposição a sons altos pode conduzir a uma maior freqüência no uso do protetor auditivo e ações educativas de boa qualidade deveriam efetivamente conscientizar os jovens 6,21.

As atitudes dos jovens frente ao ruído ambiental (tabela 1, questões de 11 a 19) revelam respostas incoerentes, onde apesar da maioria dos entrevistados referirem que é importante tornar o ambiente mais confortável, observa-se que os participantes estão habituados com ruído ambiental e não gostam de um ambiente silencioso. Referem também, que mesmo o barulho do trânsito sendo perturbador, é fácil ignorá-lo. O nível do ruído ambiental e a exposição a ruído durante o lazer e atividades de recreação está aumentando e para muitas pessoas, principalmente a geração mais jovem, esses sons são normais no dia-a-dia 21.

Em relação ao volume dos sons, os participantes de pesquisa realizada em 2008 expressaram vários motivos para ouvir música em volume alto como: reduzir o ruído de fundo (trânsito e outras pessoas falando), ou quando querem ouvir melhor principalmente quando é uma música favorita, ou quando querem cantar sem ter que ouvir suas vozes. Muitos referiram que sabem que é possível perder a audição se expostos à música alta, porém, afirmaram que isto só pode acontecer quando a exposição é muito frequente, em um volume muito alto, o que não era o caso deles. Alguns disseram que seria uma boa idéia estabelecer limite de volume para os MP3, porém, a maioria disse que preferiria decidir como deveriam usá-lo 15. Neste estudo, os adolescentes também concordam que deveria haver mais regras ou regulamentos sobre o ruído ambiental.

Os achados apresentados na tabela 1, mais uma vez refletem o desconhecimento dos jovens sobre a nocividade do ruído e subestimam sua vulnerabilidade para uma possível perda auditiva, enfatizando-se assim a necessidade de campanhas educativas. Em campanha realizada com adolescentes sobre sons altos, mais da metade dos jovens entrevistados inicialmente referiram que som alto era bom. Após a campanha, grande parte queria que o som fosse reduzido 22.

Quanto às queixas e sintomas auditivos (tabela 2) 38,4% dos participantes referiram zumbido temporário e sensibilidade ao ruído. Porém, apenas 8,8% preocupam-se antes de ir a shows, discotecas ou outros locais ruidosos devido às experiências precedentes de zumbido. Pesquisa revela que participantes que já tiveram experiências com zumbido não consideram que seja um sintoma de que seus ouvidos estão suscetíveis aos danos causados pela música alta, pois este zumbido desaparece sem deixar qualquer dano no momento, e que a única preocupação é quando o zumbido aparece pela primeira vez 15.

No quesito hábitos auditivos (tabela 3), os resultados sugerem que a maioria dos adolescentes possui hábitos auditivos ruidosos em suas atividades de lazer, com diferenciações apenas na periodicidade de freqüência dos episódios como ocorreu nos trabalhos em outros estados brasileiros 9,10.

O hábito de escutar música (utilizando fones de ouvido, com equipamento de som ou no carro) são os mais comuns entre os jovens, o que vem sendo encontrado na literatura como um comportamento cada vez mais comum entre os adolescentes, e podem ser um risco para a audição 6-8. Encontrou-se, ainda, grande porcentagem de jovens que tocam instrumentos musicais com freqüência, o que pode aumentar o risco de problemas auditivos, uma vez que existem inúmeros trabalhos descrevendo os riscos auditivos nos músicos 11. A maioria dos participantes refere que a casa onde residem é um ambiente ruidoso concordando com o estudo de Lacerda et. al (2005) 23.

O número de jovens que realiza atividades de caça ou tiro com arma de fogo foi muito elevado (88%), indo de encontro com os achados de Wuest e Guetty (1992) 19, o qual estudantes afirmaram estarem expostos a ferramentas ou máquinas, armas ou aviões, no entanto, estes estudantes têm consciência que a exposição a esses ruídos pode causar perda de audição.

Foram observadas diferenças significantes entre os gêneros somente nas questões relacionadas aos hábitos auditivos dos adolescentes, especificamente na prática de eventos esportivos (motociclismo), mergulho, caça submarina, vôo livre e instrumento musical (banda ou orquestra), sendo que o gênero masculino predominou (tabela 3) corroborando com os achados do estudo realizado na Argentina em 2005. Nos trabalhos de Zocoli, Erlandsson et. al., Wuest e Getty o gênero feminino apresentou mais sensibilidade ao ruído do que o masculino 5,6,10,19,21.

Com base nos resultados obtidos destaca-se a importância de ações educativas baseadas no comportamento relacionado às atitudes e os hábitos auditivos dos jovens. Deste modo, pode-se atuar mais objetiva e diretamente na orientação, conscientização e prevenção dos prejuízos decorrentes da exposição ao ruído ambiental e atividades de lazer. Os achados do estudo reforçam os trabalhos desta natureza em todas as regiões do País.

Para conscientizar esses grupos de crianças e jovens algumas iniciativas já vêm sendo desenvolvidas em programas educativos para a preservação auditiva. Em alguns países, como nos Estados Unidos, há o programa Dangerous Decibels do Oregon Hearing Research Center e o Wise Ears! do National Institute on Deaness and other Communication Disorders, além da inclusão nos currículos escolares deste país de temas relacionados com os efeitos do som intenso na audição 24. No Brasil, campanhas como o Dia Internacional de Conscientização dos Efeitos do Ruído e o Passe Adiante Esta Idéia, são exemplos de projetos cujo objetivo é a promoção da saúde auditiva 25,26.

Mesmo com essas diretrizes, são poucos os Programas Preventivos de Perdas Auditivas – PPPA consistentemente implementados em escolas ou com foco nos familiares, entretanto, muitas atividades escolares, incluindo bandas e artes, podem produzir níveis sonoros que excedem os limites recomendados pela ASHA. Os PPPA em escolas deveriam ser diferenciados e com ênfase na prevenção primária e secundária das perdas auditivas. Estudantes, pais e o quadro de funcionários da escola devem ser encorajados a programar estas estratégias para reduzir os riscos de exposição ao som 8.

Os currículos escolares deveriam abortar com mais ênfase a questão dos efeitos da exposição às intensidades sonoras elevadas desde as séries escolares iniciais e buscar, com a participação das crianças e jovens, as alternativas possíveis para se evitar esses efeitos criando-se hábitos auditivos mais saudáveis. Outra sugestão é que normas e uma fiscalização mais rigorosa em relação à música em ambientes de lazer e nos equipamentos individuais de som deveriam ocorrer, evitando-se exposições excessivas e modificando-se os hábitos em relação à exposição à música desde criança. Sugere-se também o acompanhamento auditivo de jovens para estimar-se o risco para a audição atribuído aos hábitos e comportamentos frente a intensidades sonoras elevadas.

Recomendam-se campanhas sobre preservação auditiva voltada a essa população, e mesmo em idades mais tenras, para uma maior conscientização e mudanças de hábitos. Estudos que possam realizar o acompanhamento auditivo de jovens visando observar possíveis mudanças nos limiares auditivos devem ser intensificadas.

CONCLUSÃO

O comportamento de jovens do ensino fundamental II e ensino médio relacionado às atitudes e os hábitos auditivos pode ser nocivo à saúde.

Escutar música utilizando fone de ouvido, com equipamento de som em casa ou no carro, foi o hábito mais freqüente relatado pelos jovens. Pode-se observar que grande parte dos jovens apresenta zumbido, porém isso não os preocupa e nem os faz evitar exposições a elevadas intensidades sonoras. Os jovens gostam da música alta e não se preocupam com o volume excessivo do som, porém em relação à sala de aula, consideram que deveria ser silenciosa e calma.

Recebido em: 07/04/2010

Aceito em: 21/08/2010

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:
    Adriana Bender Moreira de Lacerda
    Rua Sydnei Antonio Rangel Santos, 238– Santo Inácio
    Curitiba, Paraná, Brasil
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    • Publicação nesta coleção
      03 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2011

    Histórico

    • Recebido
      07 Abr 2010
    • Aceito
      21 Ago 2010
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