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Nascimento da Raia-viola, Zapteryx brevirostris (Müller & Henle) (Chondrichthyes, Rhinobatidae), em cativeiro

Birth of guitarfish, Zapteryx brevirostris (Müller & Henle) (Chondrichthyes, Rhinobatidae) in captivity

Resumos

Um exemplar fêmea de Zapteryx brevirostris foi capturada na Ilha Queimada Grande, Itanhaém, São Paulo em 19/II/2002, e transportada para o cativeiro do Núcleo de Pesquisa e Estudo em Chondrichthyes (NUPEC). Em 21/II/2002, a fêmea pariu seis filhotes (três machos e três fêmeas). Este é o primeiro registro de nascimento de Z. brevirostris em cativeiro.

Cativeiro; reprodução


A female of Zapteryx brevirostris were caught at Queimada Grande Island, Itanhaém, São Paulo on 19/II/2002, and transported to Núcleo de Pesquisa e Estudo em Chondrichthyes (NUPEC) captivities. At 21/II/2002, the female gave birth to six pups (three males and three females). This is a first birth record of Z. brevirostris in captivity.

Captive; reproduction


Nascimento da Raia-viola, Zapteryx brevirostris (Müller & Henle) (Chondrichthyes, Rhinobatidae), em cativeiro

Birth of guitarfish, Zapteryx brevirostris (Müller & Henle) (Chondrichthyes, Rhinobatidae) in captivity

Manoel M. B. Gonzalez

Núcleo de Pesquisa e Estudo em Chondrichthyes (NUPEC). Rua Ana Pimentel 12, 11030-050 Santos, São Paulo, Brasil. E-mail: gonzalez@nupec.com.br

RESUMO

Um exemplar fêmea de Zapteryx brevirostris foi capturada na Ilha Queimada Grande, Itanhaém, São Paulo em 19/II/2002, e transportada para o cativeiro do Núcleo de Pesquisa e Estudo em Chondrichthyes (NUPEC). Em 21/II/2002, a fêmea pariu seis filhotes (três machos e três fêmeas). Este é o primeiro registro de nascimento de Z. brevirostris em cativeiro.

Palavras-chave: Cativeiro, reprodução.

ABSTRACT

A female of Zapteryx brevirostris were caught at Queimada Grande Island, Itanhaém, São Paulo on 19/II/2002, and transported to Núcleo de Pesquisa e Estudo em Chondrichthyes (NUPEC) captivities. At 21/II/2002, the female gave birth to six pups (three males and three females). This is a first birth record of Z. brevirostris in captivity.

Key words: Captive, reproduction.

O número de elasmobrânquios capturados e mantidos em cativeiro vem aumentando durante os últimos oito anos (GONZALEZ 1996-2002). Um dos motivos prováveis para este aumento estaria na popularidade do grupo e seus caracteres específicos relacionados ao comportamento, fisiologia, anatomia e reprodução (DEMSKI 1990). Conseqüentemente um número maior de espécies se reproduzem com sucesso em cativeiro como exemplares das famílias Carcharhinidae e Myliobatidae (UCHIDA et al. 1990).

De acordo com o INTERNATIONAL ZOO YEARBOOK (1963-2003), 47 espécies de 13 famílias de tubarões e 31 espécies de nove famílias de raias nasceram em cativeiro. As espécies assim obtidas eram provenientes de aquários, parques marinhos e demais instituições que trabalham com elasmobrânquios cativos, possuindo apenas três registros para indivíduos da família Rhinobatidae: Rhinobatos lentiginosus (Garman, 1880), Rhinobatos productus (Girard, 1854) e Rhinobatos hynnicephalus (Richardson 1846).

A raia-viola (Fig. 1) ocorre do Nordeste do Brasil ao Norte da Argentina (FIGUEIREDO 1977, MENNI & STEHMANN, 2000), alcançando comprimento máximo de 100 cm, possuindo viviparidade aplacentária como modo reprodutivo (BATISTA 1987, HAMLETT & KOOB 1999). Pode ser capturada em águas costeiras, com até 120 m de profundidade (FIGUEIREDO 1977). Objetivou-se neste trabalho demonstrar pela primeira vez, o nascimento e a manutenção dos exemplares de Z. brevirostris em cativeiro.


MATERIAL E MÉTODOS

O Núcleo de Pesquisa e Estudo em Chondrichthyes (NUPEC) recebe regularmente animais vivos proveniente da pesca comercial e artesanal do litoral de Santos, Estado de São Paulo, que opera no Sul e Sudeste do Brasil. No dia 19/II/2002, recebemos uma fêmea de raia-viola com aproximadamente 50 cm de comprimento total (TL). O exemplar foi capturado por barco camaroneiro entre 50-70 m de profundidade próximo à Ilha Queimada Grande (24º29'S, 46º30'W), distante 35 km da costa continental do Município de Itanhaém, São Paulo. Após diagnóstico, observamos o abdômen distendido e as nadadeiras pélvicas e região da cloaca edemaciada.

O indivíduo foi acondicionado em quarentena de formato circular com 2500 l, montada sob Sistema Jauber, filtros biológicos (bactérias nitrificantes) e mecânicos (lã de vidro), termômetro digital, iluminação de vapor metálico e sala equipada com aparelho de ar condicionado para manter a temperatura da sala e dos aquários estáveis. Como substrato utilizou-se halimeda, com aproximadamente 10 cm de espessura. Os parâmetros físico-químicos dos sistemas de cativeiros e da quarentena foram monitorados diariamente (Tab. I).

RESULTADOS

No dia 21/II/2002, houve o nascimento de seis exemplares, sendo três machos (respectivamente, 13,0; 12,5 e 11,5 mm TL) e três fêmeas (respectivamente, 13,0; 13,0 e 12,5 mm TL). O nascimento ocorreu durante o período noturno, não sendo possível o registro. Os filhotes foram transferidos para outro tanque (Sistema 2) de 500 l, onde permaneceram isolados. A fêmea foi mantida na quarentena para observação e cuidados (GRUBER & KEYES 1981, MURRU 1990, SMITH 1992).

Durante o período de iluminação do cativeiro (10 horas/dia), as raias encontravam-se sob o substrato, estando visíveis apenas os espiráculos. O período de ausência de iluminação era caracterizado por picos de grande movimentação, alternados por natação sobre o substrato e meia-água. Os filhotes iniciaram a alimentação 14 dias após seu nascimento, sendo ministrados pequenas porções de invertebrados moídos (camarão e lula).

Após a retirada dos filhotes foi realizado o procedimento profilático ministrando à fêmea antibiótico (terramicina — 25 mg/l) por imersão. Após dois dias a raia iniciou sua alimentação com porções de peixes e invertebrados marinhos (camarão e lula). Como observado nos filhotes, o período de maior atividade foi o noturno. No dia 25/III/2002 o exemplar foi transferido para o tanque principal com capacidade total de 34000 l.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

Nascimento e reprodução em cativeiro são eventos distintos que devem ser descritos de forma clara e concisa; na reprodução são observados a cópula, o desenvolvimento (de ovíparo a vivíparo aplacentário) e o nascimento. O nascimento das raias em cativeiro, possivelmente, foi estimulado pelo stress durante a captura e transporte da fêmea (GILBERT 1981). Nos trabalhos de reprodução com elasmobrânquios em cativeiro devem ser observados os vários modos de desenvolvimento reprodutivo encontrados em tubarões e raias. As grandes diferenças encontradas, desde a oviparidade até a viviparidade aplacentária, dificultam a adoção de técnicas gerais (DEMSKI 1990). Por esta razão deve-se realizar procedimentos padrões para cada tipo de modo reprodutivo.

De acordo com UCHIDA et al. (1990), são poucas as informações sobre reprodução de elasmobrânquios em cativeiro, principalmente quando relacionados à sobrevivência e desenvolvimento de filhotes. Os primeiros trabalhos bem sucedidos com reprodução de raias; UCHIDA et al. (1990) com Aetobatus narinari (Euphrasen, 1790), THROSON et al. (1983) com Potamotrygon motoro (Müller & Henle, 1841) e LUER & GILBERT (1985) com Raja eglanteria Bosc, 1800; demonstraram grande otimismo com a possibilidade do desenvolvimento de novas técnicas. No Brasil existem dois registros sobre reprodução e nascimento de elasmobrânquios em cativeiro (GONZALEZ 1996-2002).

Para garantir o sucesso na reprodução, no nascimento e no desenvolvimento de elasmobrânquios em cativeiro, o esforço de captura, transporte e quarentena devem ser o menos estressante possível e a alimentação e a qualidade do cativeiro estejam similares à do meio em que o animal vive (UCHIDA et al. 1990, SMITH 1992, GONZALEZ 1999). O período de quarentena é um dos mais importantes em todo o procedimento, possibilitando o tratamento de infecções e possíveis danos causados aos animais durante a captura e transporte (SMITH 1992).

Infelizmente o aumento na demanda por elasmobrânquios para manutenção em cativeiro vem gerando inúmeros problemas para as populações costeiras do nosso litoral, sendo justamente a preservação destes peixes o objetivo de maior importância dos estudos com reprodução em cativeiro (DEMSKI 1990).

AGRADECIMENTOS

Ao biólogo Carlo Magenta da Cunha pela leitura e sugestões; ao Dr. Wagner Intelizano e aos biólogos Renan Ruas Reis, Carlo Magenta da Cunha e Luiz Gustavo Aleagi pelo auxílio empregado nos cativeiros durante este trabalho.

Recebido em 02.III.2004; aceito em 28.IX.2004.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Abr 2006
  • Data do Fascículo
    Dez 2004

Histórico

  • Aceito
    28 Set 2004
  • Recebido
    02 Mar 2004
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