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Cluster turístico: conceitos, características e modelos de análise

Tourism cluster: concepts, characteristics and models of analysis

Clúster turístico: conceptos, características y modelos de análisis

Resumo

Este estudo tem como objetivo estabelecer uma base conceitual ao mesmo tempo em que fornece exemplos práticos de clusterização dentro do domínio do turismo. A pesquisa aprofunda-se em perspectivas analíticas, focando em redes regionais que, por meio de uma governança estratégica, promovem iniciativas colaborativas e o desenvolvimento local. Clusters são concentrações geográficas de empresas e instituições locais que operam em um mesmo setor e que cooperam e competem entre si obtendo vantagens competitivas por meio da eficiência coletiva. Por estar vinculado a sua base local e a ação conjunta, o conceito de cluster alinha-se com o setor de turismo. A constituição de clusters no turismo é uma tendência que promove o desenvolvimento regional.

Palavras-chave
Cluster turístico; Cooperação; Desenvolvimento regional

Abstract

This study aims to establish a conceptual foundation while providing practical examples of clustering within the tourism domain. It delves into analytical perspectives, focusing on regional networks that, through strategic governance, foster collaborative initiatives and local development. Clusters represent geographic concentrations of enterprises and other stakeholders operating within the same sector. These entities collaborate and compete, harnessing collective efficiencies to gain competitive advantages. Due to its association with local roots and collaborative efforts, the cluster concept aligns with the tourism sector. The emergence of tourism clusters signifies a progressive trend that drives regional growth.

Keywords
Tourism cluster; Cooperation; Regional development

Resumen

Esta investigación tiene como objetivo establecer una base conceptual al mismo tiempo que proporciona ejemplos prácticos de agrupamiento dentro del ámbito del turismo. Profundiza en perspectivas analíticas, centrando su enfoque en redes regionales que, a través de una gobernanza estratégica, fomentan iniciativas colaborativas y avances locales. Los clusters son concentraciones geográficas de empresas y otros actores que operan en un mismo sector. Estos entes colaboran y compiten entre sí, aprovechando eficiencias colectivas para obtener ventajas competitivas. Debido a su asociación con raíces locales y esfuerzos colaborativos, el concepto de clúster se alinea con el sector turístico. La formación de clusters en el turismo es una tendencia que promueve el desarrollo regional.

Palabras clave
Clúster turístico; Cooperación; Desarrollo regional

1 INTRODUÇÃO

Esta revisão didática tem como objetivo apresentar uma base conceitual para estudos sobre a clusterização no turismo, suscitando um olhar para recortes de análise que considerem a perspectiva de redes regionais que, mediante uma governança, promovem a ação conjunta e o desenvolvimento local.

De forma geral clusters empresariais são concentrações geográficas de empresas e outras instituições associadas a uma cadeia produtiva que conseguem vantagens competitivas por meio da eficiência coletiva (Porter, 1990Porter, M.E. (1990). The Competitive Advantage of Nations. The Free Press.; Cunha, 2007Cunha, I. J. (2007). Governança, internacionalização e competitividade de aglomerados produtivos de móveis no Sul do Brasil, Portugal e Espanha. Arcus Ind. Gráfica.). As abordagens teóricas sobre a formação de clusters têm em comum a ideia de que a competitividade entre das empresas é potencializada pela ação conjunta (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.).

Os clusters turísticos são o resultado da co-localização de empresas complementares que, sob uma governança, desenvolvem ações conjuntas e gerando de ganhos coletivos (Novelli, Schmitz & Spencer, 2006Novelli, M., Schmitz, B., & Spencer, T. (2006). Networks, clusters and innovation in tourism: A UK experience. Tourism management, 27(6), 1141-1152. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.011
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). O desenvolvimento de políticas públicas para criação de clusters turísticos impacta positivamente o crescimento econômico e do desenvolvimento do turismo de territórios.

Tendo em vista os benefícios dos clusters turísticos considera-se que é preciso ampliar o conhecimento teórico e empírico sobre este tema. Estudos sobre clusters como recorte analítico no turismo contribuem para o desenvolvimento do setor (Sohn et al., 2017Sohn, A. P., Silvestrini, C., Fiuza, T. F., & Limberger, P. F. (2017). The elements that characterize the tourism cluster in Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(1), 154-174. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i1.1201
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, Della Corte & Aria, 2016Della Corte, V., & Aria, M. (2016). Coopetition and sustainable competitive advantage. The case of tourist destinations. Tourism Management, 54, 524-540. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2015.12.009
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2015.1...
; Kim et al., 2021Kim, Y. R., Williams, A. M., Park, S., & Chen, J. L. (2021). Spatial spillovers of agglomeration economies and productivity in the tourism industry: The case of the UK. Tourism Management, 82, 104201. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2020.104201
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2020.1...
).

Este artigo está dividido em sete seções. A introdução apresenta o contexto, objetivo e as motivações para o estudo sobre clusters turísticos. Na segunda seção são expostos os fundamentos conceituais e as principais características de clusters turísticos. A terceira seção trata da regionalização e da clusterização de destinos turísticos. A quarta seção, apresenta diretrizes para o desenvolvimento de clusters turísticos. Na quinta seção, o ciclo de vida e o grau de maturidade de clusters são apontados como modelos de análise. Na sexta seção, é apresentado o conceito de Destination Management Organization (DMO) e sua relação dentro do contexto dos clusters turísticos. A última seção apresenta as considerações finais do artigo.

2 CLUSTER TURÍSTICO: FUNDAMENTOS CONCEITUAIS

Cluster no contexto empresarial é uma concentração de empresas e outras instituições ligadas a uma indústria que coabitam uma mesma região geográfica, colaboram entre si e, assim, tornam-se mais eficientes (Porter, 1990Porter, M.E. (1990). The Competitive Advantage of Nations. The Free Press.). A presença de um cluster implica na concentração geográfica de diversos agentes, como empresas, instituições de ensino, entidades de apoio e órgãos governamentais, que colaboram de maneira conjunta para impulsionar um setor econômico específico, como é o caso do turismo. (Cunha & Cunha, 2005Cunha, S. K. D., & Cunha, J. C. D. (2005). Tourism cluster competitiveness and sustainability: proposal for a systemic model to measure the impact of tourism on local development. BAR-Brazilian Administration Review, 2, 47-62. https://doi.org/10.1590/S1807-76922005000200005
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; Novelli, Schmitz & Spencer, 2006Novelli, M., Schmitz, B., & Spencer, T. (2006). Networks, clusters and innovation in tourism: A UK experience. Tourism management, 27(6), 1141-1152. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.011
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; Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.; Sohn et al., 2017Sohn, A. P., Silvestrini, C., Fiuza, T. F., & Limberger, P. F. (2017). The elements that characterize the tourism cluster in Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(1), 154-174. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i1.1201
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).

O cluster turístico pode ser conceituado como a aglomeração em um mesmo território geográfico de empresas e outras organizações ligadas ao turismo que competem e cooperam entre si (Ferreira & Estevão, 2009Ferreira, J., & Estevão, C. (2009). Regional competitiveness of a tourism cluster: A conceptual model proposal. Encontros científicos–Tourism & management studies, (5), 37-51. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=4789050
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; Ivaniš, 2011Ivaniš, M. (2011). Tourism cluster as a model of small entrepreneurship development and increasing competitiveness of Labin-Rabac tourist destination. In: The 5th International Scientific Conference "Entrepreneurship and Macroeconomic Management: Reflections on the World in Turmoil" http://eknjiznica.unipu.hr/id/eprint/1974
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; Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.; Kunz, et al. 2012Kunz, J. G., Schommer, L., Schneider, M., & Salete Mecca, M. (2012). A Clusterização do Turismo em Gramado-RS: Breves Notas. Rosa dos Ventos, 4(4), 609-624. https://www.redalyc.org/pdf/4735/473547091012.pdf
https://www.redalyc.org/pdf/4735/4735470...
; Sohn et al., 2017Sohn, A. P., Silvestrini, C., Fiuza, T. F., & Limberger, P. F. (2017). The elements that characterize the tourism cluster in Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(1), 154-174. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i1.1201
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; Mirčetić, Vukotić & Cvijanović, 2019Mirčetić, V., Vukotić, S., & Cvijanović, D. (2019). The concept of business clusters and its impact on tourism business improvement. Економика пољопривреде, 66(3), 851-868. https://doi.org/10.5937/ekopolj1903851m
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). Em uma definição mais intuitiva, um cluster de turismo pode ser considerado um grupo de produtos ou atividades semelhantes que desenvolvem ações em conjunto sob uma determinada governança. O conceito, portanto, tem uma forte conotação de junção, união, agregação e interação.

O conceito de cluster é bastante aderente às características do setor do turismo, pois valoriza a localização geográfica e a ação conjunta (Novelli, Schmitz & Spencer, 2006Novelli, M., Schmitz, B., & Spencer, T. (2006). Networks, clusters and innovation in tourism: A UK experience. Tourism management, 27(6), 1141-1152. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.011
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; Kunz et al., 2012Kunz, J. G., Schommer, L., Schneider, M., & Salete Mecca, M. (2012). A Clusterização do Turismo em Gramado-RS: Breves Notas. Rosa dos Ventos, 4(4), 609-624. https://www.redalyc.org/pdf/4735/473547091012.pdf
https://www.redalyc.org/pdf/4735/4735470...
; Mirčetić, Vukotić & Cvijanović, 2019Mirčetić, V., Vukotić, S., & Cvijanović, D. (2019). The concept of business clusters and its impact on tourism business improvement. Економика пољопривреде, 66(3), 851-868. https://doi.org/10.5937/ekopolj1903851m
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). Para compreender o fenômeno da ação conjunta em uma rede como o cluster de turismo é preciso conhecer o conceito de externalidades (Britto, 2000Britto, J. (2000). Características estruturais dos clusters industriais na economia brasileira. Nota técnica, 42(00).; Cunha, 2007Cunha, I. J. (2007). Governança, internacionalização e competitividade de aglomerados produtivos de móveis no Sul do Brasil, Portugal e Espanha. Arcus Ind. Gráfica.). A noção de externalidades em um cluster refere-se à presença de efeitos diretos e indiretos da interdependência entre os agentes que dele fazem parte (Cunha, 2007Cunha, I. J. (2007). Governança, internacionalização e competitividade de aglomerados produtivos de móveis no Sul do Brasil, Portugal e Espanha. Arcus Ind. Gráfica.). Usualmente a literatura distingue quatro tipos de externalidades a saber: técnicas, pecuniárias, tecnológicas e de demanda (Britto, 2000Britto, J. (2000). Características estruturais dos clusters industriais na economia brasileira. Nota técnica, 42(00).; Cunha, 2007Cunha, I. J. (2007). Governança, internacionalização e competitividade de aglomerados produtivos de móveis no Sul do Brasil, Portugal e Espanha. Arcus Ind. Gráfica.). No Quadro 1 apresenta-se a caracterização destas externalidades no contexto dos clusters turísticos.

Quadro 1
Externalidades em clusters turísticos

Considerando o conceito e os tipos de externalidades pode-se entender que a localização de organizações em um cluster promove vantagens competitivas ligadas a maior eficiência técnico produtiva, redução de custos financeiros, promoção de inovações, e aumento da demanda.

Além destas externalidades clusters turísticos podem contribuir para o desenvolvimento sustentável (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.), a preservação de valores e estilos de vida, geração de emprego, a adoção de estratégias conjuntas de marketing, desenvolvimento de novos negócios, flexibilidade e aprendizagem inteorganizacional (Novelli, Schmitz & Spencer, 2006Novelli, M., Schmitz, B., & Spencer, T. (2006). Networks, clusters and innovation in tourism: A UK experience. Tourism management, 27(6), 1141-1152. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.011
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).

A coopetição é uma externalidade da clusterização, que se refere à interação simultânea de cooperação e competição entre organizações. Esta abordagem envolve a colaboração entre concorrentes em determinados aspectos, visando benefícios mútuos, enquanto também mantêm uma competição em outras áreas. As empresas podem se unir para resolver desafios comuns, como promoção, infraestrutura ou marketing, ao mesmo tempo em que competem por visitantes e participação de mercado.

De forma geral, uma região turística clusterizada apresenta as seguintes características:

  1. conjunto de empresas e instituições relacionadas ao setor de turismo localizadas em uma mesma região geográfica que competem e cooperam entre si;

  2. geração de externalidades resultantes da ação conjunta;

  3. intercâmbio de conhecimento e aprendizagem inteorganizacional;

  4. presença de empresas e instituições líderes;

  5. estrutura de governança em rede.

Para Novelli, Schmitz e Spencer (2006)Novelli, M., Schmitz, B., & Spencer, T. (2006). Networks, clusters and innovation in tourism: A UK experience. Tourism management, 27(6), 1141-1152. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.011
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, o desenvolvimento de clusters não deve ser visto como um processo simples e espontâneo, mas sim como um processo muito complexo ligado à colaboração e à competição. Em um cluster de turismo os atores desenvolvem esforços cooperativos para alcançar objetivos individuais e coletivos. O comportamento colaborativo no interior de aglomerados turísticos depende das atitudes pessoais dos atores, das suas experiências anteriores e do seu nível de consciência dos ganhos decorrentes da ação conjunta (Della Corte & Aria, 2016Della Corte, V., & Aria, M. (2016). Coopetition and sustainable competitive advantage. The case of tourist destinations. Tourism Management, 54, 524-540. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2015.12.009
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). Neste sentido é necessária a existência uma governança do cluster capaz de organizar as relações entre os atores, assegurando que esses tenham seus interesses coletivos garantidos.

A governança no turismo é uma construção coletiva com foco em parceiras que podem influenciar as políticas de regionalização do setor (Conceição, 2020Conceição, C. C. (2020). Modelo analítico de governança regional de turismo-MAGRET. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 14, 123-139. https://doi.org/10.7784/rbtur.v14i2.1822
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). Destaca-se que a governança em redes, como é o caso dos clusters, é um tema que tem ganhado relevância nos estudos que abordam o planejamento, a gestão e o desenvolvimento de territórios (Ribeiro & Chamusca, 2020Ribeiro, J., & Chamusca, P. (2020). Governança territorial, Atores e Desenvolvimento: um estudo sobre a organização territorial do cluster do calçado português. GOT: Revista de Geografia e Ordenamento do Território, (19), 186. http://dx.doi.org/10.17127/got/2020.19.008
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). A noção de governança relaciona-se a um modo de cooperação e de coordenação em rede abrangendo a atuação de diferentes atores. Elementos como a variedade de atores, a participação, a cooperação e a coordenação, podem ser essenciais na governança de um cluster turístico.

A localização de micro, pequenas e médias empresas (MPME) turísticas em um cluster gera mais colaboração e melhorias na capacidade competitiva, facilita o compartilhamento de infraestruturas, estimula a inovação e amplia o acesso a novos conhecimentos e mercados. Um dos propósitos de clusters no turismo é conseguir que estas empresas, que normalmente trabalhariam isoladamente, cooperem e construam um produto turístico mais competitivo, ampliando suas capacidades, seus serviços e produtos por meio da ação conjunta (Novelli, Schmitz & Spencer, 2006Novelli, M., Schmitz, B., & Spencer, T. (2006). Networks, clusters and innovation in tourism: A UK experience. Tourism management, 27(6), 1141-1152. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2005.11.011
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).

3 REGIONALIZAÇÃO E CLUSTERS TURÍSTICOS

Segundo Beni (2012)Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole., para que as experiências de clusters turísticos possam ser bem estruturadas e comunicadas, fazem-se necessárias a implementação das diretrizes de regionalização. Beni (2020)Beni, M. C. (2020). Saturação e rejeição ao turismo nas destinações turísticas. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 14, 1-8. https://doi.org/10.7784/rbtur.v14i2.1847
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afirma que o processo de regionalização no turismo tem como objetivo a integração de diferentes áreas que possam trabalhar em conjunto para a criação de experiências turísticas únicas. Esse processo tem como desafio a superação das barreiras territoriais, políticas e econômicas. A regionalização no turismo pode permitir a cooperação entre regiões para a construção de uma oferta turística mais atraente e adequada às necessidades específicas dos viajantes (Beni, 2020Beni, M. C. (2020). Saturação e rejeição ao turismo nas destinações turísticas. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 14, 1-8. https://doi.org/10.7784/rbtur.v14i2.1847
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).

A regionalização de destinos turísticos deve ser acompanhada por uma estratégia de clusterização que busca fortalecer a cooperação e colaboração entre os diversos atores do setor turístico. Isso visa criar sinergias e oportunidades para o desenvolvimento de experiências turísticas inovadoras, aumentando a visibilidade do destino e ampliando seu alcance de mercado ao atrair visitantes de outras regiões geográficas (Beni, 2020Beni, M. C. (2020). Saturação e rejeição ao turismo nas destinações turísticas. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 14, 1-8. https://doi.org/10.7784/rbtur.v14i2.1847
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).

Em clusters são observadas três dimensões de integração: horizontal, vertical e expandida (Quadro 2) (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.). A clusterização horizontal no turismo ocorre por meio do fomento de redes de relacionamento entre empresas que realizam serviços similares (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.). Estas redes podem englobar tanto empresas do mesmo ramo, como a hotelaria e o Airbnb, quanto de ramos complementares, como a operação de receptivo. Um exemplo de clusterização horizontal é o voucher único utilizado no destino turístico de Bonito (MS), que integra os serviços ofertados na região. Funciona como um cartão de benefícios que permite que o turista monte seu próprio roteiro.

A clusterização vertical é consequência da interação competitiva e cooperativa entre diferentes empresas da cadeia produtiva do turismo (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.). A clusterização vertical se concentra em empresas e serviços que estão interconectados em uma sequência linear da cadeia de valor. Isso significa que as empresas envolvidas operam em diferentes estágios do processo produtivo ou prestam serviços relacionados que se complementam de maneira sequencial. Na região da Baja California, no México, um exemplo de clusterização vertical no turismo pode ser observado na Rota do Vinho do Valle de Guadalupe. Nessa área, diversas vinícolas, restaurantes, hotéis e outras empresas ligadas ao enoturismo formaram um cluster vertical. Esta clusterização vertical cria uma sinergia que fortalece toda a cadeia produtiva. A colaboração entre vinícolas, restaurantes e meios de hospedagens resulta em uma experiência integrada e enriquecedora para os turistas (Bernal Escoto, Montero Delgado & Rivera Aguirre, 2021Bernal Escoto, B. E., Montero Delgado, N. I., & Rivera Aguirre, F. A. (2021). Strategic analysis of sustainable tourism in Baja California against COVID-19. Sustainability, 13(7), 3948. https://doi.org/10.3390/su13073948
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).

A clusterização expandida abrange múltiplos estágios da cadeia de valor do turismo e uma variedade de empresas e serviços relacionados (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.). Assim, requer a criação e o fortalecimento de redes de relacionamento. É uma dimensão dependente da clusterização horizontal e vertical (Beni, 2012Beni, M. C. (2012). Turismo: planejamento estratégico e capacidade de gestão: desenvolvimento regional, rede de produção e clusters. Manole.). Um exemplo de clusterização expandida com foco em redes de relacionamento externas ao cluster é a região de Chianti, na Toscana, Itália. Região reconhecida mundialmente por sua produção de vinhos e azeites de alta qualidade. Além das vinícolas e produtores locais, estão localizados na região restaurantes, comércios de produtos locais, acomodações turísticas e atividades culturais relacionadas à tradição gastronômica. Através de parcerias e colaborações, Chianti estabeleceu conexões com distribuidores, importadores e amantes da culinária italiana em todo o mundo. Essas redes externas ao cluster desempenham um papel importante na divulgação da cultura e produtos locais, bem como na promoção do turismo gastronômico na região. O que demonstra que a clusterização expandida pode criar um ecossistema interconectado que não apenas beneficia os atores internos, mas também amplia a visibilidade e o alcance da região no mercado global.

Quadro 2
Dimensões da clusterização no turismo

É importante distinguir o entendimento de cluster e de cadeia produtiva. Enquanto um cluster é uma concentração geográfica de empresas e instituições em um setor específico que promove a interação e a cooperação, a cadeia produtiva refere-se à sequência de atividades envolvidas na criação e distribuição de um produto ou serviço, abrangendo diferentes estágios e empresas ao longo desse processo. Nas cadeias produtivas, o conceito de elo a jusante se refere à parte da cadeia que está situada após um determinado ponto ou estágio no processo de produção. São as etapas realizadas à medida que os produtos ou serviços se aproximam do consumidor final. Por exemplo, no caso de um cluster, como o de móveis em São Bento do Sul, Santa Catarina, ou de produtos como queijo e presunto em Parma, Itália, a atenção está voltada para feiras e comércio a jusante na cadeia produtiva, enquanto o turismo também desempenha um papel evidente. No segundo caso, destacam-se dois exemplos notáveis de clusters turísticos. Na Sardenha, Itália, o queijo de cabra é parte da experiência turística (Biancu, 2003). E, em Gramado, Rio Grande do Sul, atividades como fabricação de malhas, móveis e chocolate, estão interligadas com o setor turístico (Casarotto Filho & Pires, 2020Casarotto Filho, N. e Pires, L. H. (2020). Redes de pequenas e medias empresas e desenvolvimento local (3a ed.). Atlas.).

4 DESENVOLVIMENTO DE CLUSTERS TURÍSTICOS

Políticas para a criação de clusters têm como objetivos o desenvolvimento regional, a cooperação interorganizacional, a inovação e o incentivo ao empreendedorismo. De forma geral, as políticas públicas desempenham um papel importante na promoção do crescimento ordenado, na sustentabilidade e na competitividade dos clusters turísticos. Elas podem criar um ambiente favorável para a colaboração, a inovação e o desenvolvimento de destinos turísticos que beneficiem tanto os atores envolvidos quanto as comunidades locais e os turistas.

A União Européia (UE) é destaque na implementação de políticas para criação de clusters de turismo. A partir de 2020 vigoraram leis na UE que permitem o acesso a incentivos financeiros para clusters de turismo. Países e regiões da UE ganham mais controle operacional sobre o desenvolvimento de produtos turísticos. Por exemplo, na Islândia, o programa Icelandic Tourism Cluster incentiva a inovação em pequenas e médias empresas (OECD, 2020OECD (2020). OECD Tourism Trends and Policies 2020, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/6b47b985-en
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). O cluster de turismo Arctic 365, na Noruega, foi criado a partir de uma política pública que resultou no desenvolvimento de novos produtos turísticos, programas de capacitação e de vários projetos de pesquisa e desenvolvimento (Teräs et al., 2018Teräs, J., Salenius, V., Fagerlund, L., & Stanionyte, L. (2018). Smart specialisation in sparsely populated European Arctic regions. Publications Office of the European Union. https://publications.jrc.ec.europa.eu/repository/handle/JRC114273#:~:text=Smart%20specialisation%20has%20found%20very,investment%20solutions%20applying%20S3%20approach.
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).

Segundo Mirčetić, Vukotić e Cvijanović, 2019 (2019)Mirčetić, V., Vukotić, S., & Cvijanović, D. (2019). The concept of business clusters and its impact on tourism business improvement. Економика пољопривреде, 66(3), 851-868. https://doi.org/10.5937/ekopolj1903851m
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, em um cluster de turismo o escopo geográfico pode variar de uma única cidade ou estado para todo um país ou mesmo uma rede de países vizinhos, podendo ser de escala micro, regional, pan-regional, nacional e internacional (Quadro 3).

Quadro 3
Escopo geográfico dos clusters turísticos

Aglomerados de turismo no nível micro incluem membros do cluster em um ambiente relativamente pequeno e homogêneo. Por exemplo, a localidade da Costa da Lagoa em Florianópolis, no sul do Brasil, pode ser considerada um micro cluster de turismo gastronômico. O Núcleo Setorial de Gastronomia da Costa da Lagoa foi estabelecido pela Associação Comercial e Industrial de Florianópolis com o propósito de aprimorar as conexões entre os estabelecimentos gastronômicos. Esta iniciativa visa aprimorar não apenas o desenvolvimento das pessoas envolvidas, mas também a infraestrutura dos restaurantes, com o intuito de aperfeiçoar os serviços oferecidos aos visitantes.

Os clusters regionais são formados no território de um município, cidade ou região. Um exemplo de cluster regional é o da região de Aragón na Espanha. O Cluster de Turismo Sustentável de Aragón é formado por uma associação de empresas do setor e entidades a ele vinculadas que têm como objetivo a promoção do desenvolvimento do turismo sustentável. Neste cluster a governança é compartilhada pela administração pública, centros de tecnologia e pesquisa, universidades, escolas de negócios, empresas, associações profissionais, Câmara de Comércio, entre outros.

Os clusters pan-regionais são formados por duas ou mais regiões que compartilham algumas características mútuas. O InnoCoast na Dinamarca pode ser considerado um cluster turístico pan-regional, que é formado pela integração de sete zonas costeiras do país.

Os clusters nacionais de têm sua origem no âmbito de um país. O Cluster do Turismo de Portugal é um exemplo. Sendo configurado como um plano transversal de promoção do turismo em todo país, desenhado conjuntamente com as diferentes regiões e com múltiplos interlocutores (governo, empresas, centros de pesquisa, associações, dentre outros). Tem como missão reforçar a competitividade e a sustentabilidade do turismo em Portugal, promovendo a colaboração intersetorial.

Os clusters internacionais ou pan-nacionais são aqueles nos quais os membros são dois ou mais países (Mirčetić, Vukotić & Cvijanović, 2019Mirčetić, V., Vukotić, S., & Cvijanović, D. (2019). The concept of business clusters and its impact on tourism business improvement. Економика пољопривреде, 66(3), 851-868. https://doi.org/10.5937/ekopolj1903851m
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). Como exemplo, podemos citar o cluster de turismo das regiões Norte de Portugal e Galícia, Espanha. É um projeto inovador que busca a cooperação internacional e a promoção conjunta dessas regiões como um destino único, visando principalmente atrair turistas dos mercados do Brasil, Venezuela, Argentina e Miami (EUA). A iniciativa de criação do cluster pan-nacional partiu de dirigentes de entidades governamentais ligadas ao turismo, demonstrando uma colaboração bilateral para fortalecer sua atratividade turística conjunta.

5 CLUSTER TURÍSTICO: MODELOS DE ANÁLISE

Dois modelos de análise de cluster se destacam nos estudos sobre o tema: o do ciclo de vida e o do grau de maturidade. A análise do ciclo de vida considera desde o pré-cluster até a formalização de um cluster estruturado. O desenvolvimento de um cluster turístico está relacionado à vocação regional e pode se expandir verticalmente, por meio da oferta de serviços, ou horizontalmente, por meio da oferta de suprimentos (Sohn et al., 2017Sohn, A. P., Silvestrini, C., Fiuza, T. F., & Limberger, P. F. (2017). The elements that characterize the tourism cluster in Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(1), 154-174. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i1.1201
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). O processo envolve quatro etapas ao longo do seu ciclo de vida, conforme descrito no Quadro 4.

Quadro 4
Ciclo de vida de um cluster

Na etapa de pré-cluster, cita-se como exemplo o município de Urubici, localizado na região da Serra Catarinense, no sul do Brasil. Urubici apresenta algumas pousadas e pequenas empresas voltadas para o turismo de inverno que oferecem serviços semelhantes, como hospedagem e passeios locais. Ainda não há no município uma concentração significativa de empresas interconectadas.

Em relação ao estágio de nascimento, pode-se citar a cidade de San Pedro do Atacama, no Chile. Com a descoberta do potencial de atrações naturais na região, como o Deserto do Atacama e os gêisers, houve uma concentração de empresas voltadas para o turismo e o estabelecimento de relações de parceria e cooperação entre elas, impulsionando o desenvolvimento do cluster turístico.

O estágio de desenvolvimento do cluster pode ser exemplificado pela região de Queenstown, na Nova Zelândia, que experimentou crescimento na concentração empresarial acompanhado pela verticalização da produção e a formação de consórcios. Já, o cluster turístico de Barcelona, na Espanha, demonstra o estágio de estruturação, com um aglomerado de atores atuando em conjunto para gerar ganhos coletivos e promover o desenvolvimento regional.

Sobre o grau de maturidade, um cluster vai da informalidade até um nível considerado máximo de maturidade (Cunha, 2007Cunha, I. J. (2007). Governança, internacionalização e competitividade de aglomerados produtivos de móveis no Sul do Brasil, Portugal e Espanha. Arcus Ind. Gráfica.; Zucchella, 2006Zucchella, A. (2006). Local cluster dynamics: trajectories of mature industrial districts between decline and multiple embeddedness. Journal of Institutional Economics, 2(1), 21-44. https://doi.org/10.1017/S174413740500024X
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; Sohn et al., 2017Sohn, A. P., Silvestrini, C., Fiuza, T. F., & Limberger, P. F. (2017). The elements that characterize the tourism cluster in Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(1), 154-174. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i1.1201
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). De forma geral, são observados quatro graus de maturidade em clusters: informal, intermediário, organizado e maduro (Quadro 5). Nos clusters informais percebe-se a hegemonia de empresas de micro e pequeno porte cujos atores críticos apresentam baixa qualificação e pouca representatividade no mercado externo. O desempenho econômico do setor é fraco e pouca propensão há cooperação entre os atores. Exemplos de clusters turísticos informais podem incluir pequenas comunidades rurais ou vilarejos que não têm uma estrutura organizacional formal, mas que naturalmente atraem empresas e serviços relacionados ao turismo devido a recursos naturais, culturais ou históricos específicos. Podem surgir de forma espontânea, com empresas locais, como pousadas, restaurantes e lojas de artesanato, se estabelecendo de maneira independente para atender à demanda dos visitantes. Clusters turísticos informais podem ser observados em vilarejos ou comunidades rurais que não possuem uma estrutura formal de organização, mas naturalmente atraem turistas devido a características naturais, culturais ou históricas únicas. Um exemplo é o vilarejo de Ubud em Bali, Indonésia, conhecido por sua atmosfera tranquila, paisagens de arrozais em terraços e cultura artística. As empresas locais, como pousadas, restaurantes e lojas de artesanato, se estabelecem de forma independente para atender aos visitantes que são atraídos pela experiência cultural e natureza exuberante da região.

Nos clusters com grau de maturidade intermediário, há a presença de MPME e o surgimento de empresas líderes com maior qualificação. Notam-se algumas ações de cooperação entre os atores. Um cluster turístico com grau de maturidade intermediário possui uma coordenação estruturada entre os atores envolvidos no setor turístico, mas ainda está em processo de aprimoramento da colaboração e cooperação. Um exemplo é a região de Yarra Valley na Austrália, conhecida por seus vinhedos e enoturismo. Na região, há a presença de vinícolas de diferentes tamanhos, bem como empresas relacionadas à hospedagem, gastronomia e entretenimento. A colaboração entre as vinícolas para promover a região como um destino turístico é um exemplo de ação coordenada em um cluster intermediário.

Nos clusters com grau de maturidade classificado como organizado há presença de atores líderes (gatekeepers), com alta qualificação que transbordam conhecimento (spillover) para os demais atores (Giuliani, 2011Giuliani, E. (2011). Role of technological gatekeepers in the growth of industrial clusters: Evidence from Chile. Regional Studies, 45(10), 1329-1348. https://doi.org/10.1080/00343404.2011.619973
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). São identificadas práticas de cooperação entre os atores do cluster que resultam em externalidades ligadas aos benefícios da ação conjunta. A região de Napa Valley na Califórnia é um exemplo de cluster organizado no turismo. Sendo renomada por suas vinícolas e produção de vinhos de alta qualidade. As vinícolas, hotéis, restaurantes e outras empresas relacionadas à indústria do vinho colaboram de forma ativa para oferecer experiências agradáveis aos visitantes. A Napa Valley Vintners, uma associação de vinicultores locais, coordena esforços de promoção, marketing e educação, fortalecendo a colaboração entre os atores do cluster e aprimorando a oferta turística. A interconexão entre os setores de viticultura, hospitalidade e gastronomia contribui para a criação de uma experiência turística única e bem-sucedida na região de Napa Valley.

Os clusters maduros são compostos por uma diversidade de organizações com destaque para presença de empresas e instituições líderes (gatekeepers) que se relacionam com o mercado global, estabelecendo parcerias com outras empresas do cluster e de fora do aglomerado, representando tanto uma rede local quanto um nó de uma rede global que gera spillovers de conhecimento (Zucchella, 2006Zucchella, A. (2006). Local cluster dynamics: trajectories of mature industrial districts between decline and multiple embeddedness. Journal of Institutional Economics, 2(1), 21-44. https://doi.org/10.1017/S174413740500024X
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). Um exemplo de cluster turístico maduro pode ser observado na região de Orlando, na Flórida, Estados Unidos. O cluster é marcado por uma diversidade de atores. Desde as renomadas empresas de parques temáticos, como a Disney e a Universal Studios, até os diversos hotéis, restaurantes e fornecedores de serviços, a região abriga uma ampla gama de participantes. Universidades e instituições de ensino também contribuem para o setor do turismo, enquanto organizações de promoção e turismo trabalham para atrair e receber visitantes. A variedade de atores proporciona uma experiência turística diversificada que abrange desde acomodações até entretenimento, atendendo às necessidades e preferências de uma audiência global.

Os clusters turísticos organizados e maduros representam estágios mais avançados no desenvolvimento de aglomerados que atuam como motores impulsionadores do turismo em uma determinada região. Enquanto a região Napa Valley apresenta uma colaboração estruturada e focada na experiência dos visitantes, a região de Orlando exemplifica a influência global e a diversidade dos atores.

Quadro 5
Clusters turísticos graus de maturidade

Em clusters organizados e maduros, destacam-se os ganhos provenientes da articulação entre os atores que resultam na obtenção de spillovers, a propagação de conhecimento. Segundo Boschma (2005)Boschma, R. (2005). Role of proximity in interaction and performance: Conceptual and empirical challenges, Regional Studies, 39:1, 41-45, https://doi.org/10.1080/0034340052000320878
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e Balland, Boschma & Frenken (2022)Balland, P. A., Boschma, R., & Frenken, K. (2022). Proximity, innovation and networks: A concise review and some next steps. Handbook of Proximity Relations, 70-80., o efeito spillover em clusters é estimulado pela proximidade geográfica. A mobilidade de mão de obra, os contatos pessoais, as relações do tipo cadeia de suprimentos, e os mecanismos culturais facilitam o transbordamento de conhecimento e estimulam o spillover, a aprendizagem interorganizacional e a inovação (Sohn et al., 2017Sohn, A. P., Silvestrini, C., Fiuza, T. F., & Limberger, P. F. (2017). The elements that characterize the tourism cluster in Balneário Camboriú, Santa Catarina, Brazil. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 11(1), 154-174. https://doi.org/10.7784/rbtur.v11i1.1201
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; Kim et al., 2021Kim, Y. R., Williams, A. M., Park, S., & Chen, J. L. (2021). Spatial spillovers of agglomeration economies and productivity in the tourism industry: The case of the UK. Tourism Management, 82, 104201. https://doi.org/10.1016/j.tourman.2020.104201
https://doi.org/10.1016/j.tourman.2020.1...
).

Clusters formados por atores que possuem contato com fontes externas de conhecimento são mais inovadores, estes atores são identificados pela literatura especializada como gatekeepers, guardiões de conhecimento (Morrison & Rabellotti 2009Morrison, A., & Rabellotti, R. (2009). Knowledge and information networks in an Italian wine cluster. European Planning Studies, 17(7), 983-1006. https://doi.org/10.1080/09654310902949265
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). Tais atores levam para o interior do cluster os conhecimentos que adquirem fora (extra-cluster), ou seja, trazem informações externas para seu cluster. Normalmente, tendem a estabelecer contatos diretos com os mercados globais, e são os mais propensos a reagirem ou anteciparem mudanças. Segundo Zucchella (2006)Zucchella, A. (2006). Local cluster dynamics: trajectories of mature industrial districts between decline and multiple embeddedness. Journal of Institutional Economics, 2(1), 21-44. https://doi.org/10.1017/S174413740500024X
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, a presença de gatekeepers pode determinar mudanças estratégicas na trajetória dos clusters, fato que revela a importância destes atores. O compartamento dos gatekeepers frente a ameaças e oportunidades externas pode determinar a sobrevivência de um cluster. Universidades, centros de formação, redes de hotéis e outros empreendimentos podem atuar como gatekeepers de conhecimento.

Em clusters turísticos a inovação promovida pela transmissão de conhecimento tem sido cada vez mais valorizada. Incubadoras, aceleradoras e laboratórios que incentivam parcerias entre organizações da tecnologia e do turismo podem melhorar a abertura à inovação e à troca de conhecimento. Países como Grécia, Áustria, Israel, Islândia, Espanha, Dinamarca e França, introduziram hubs, incubadoras e aceleradoras visando dar suporte às necessidades de transformação digital das empresas turísticas. O France Tourisme Lab é uma rede nacional de incubadoras e aceleradoras que visa impulsionar a inovação e aumentar a visibilidade de empresas inovadoras do setor de turismo. O Laboratório atende às necessidades específicas de startups e promove o desenvolvimento da oferta turística no país.

Em 2018, a Comissão Europeia apoiou a criação da primeira rede europeia de incubadoras de turismo, a Creative Accelerators for Sustainable Tourism (CAST). A CAST fornece apoio a incubação e aceleração para startups ligadas ao turismo sustentável. Dentre as atividades desenvolvidas pela CAST estão o apoio a criação de novos produtos e a ajuda no acesso a fontes de financiamento.

6 DESTINATION MANAGEMENT ORGANIZATION E O DESENVOLVIMENTO DE CLUSTERS TURÍSTIVOS

A Destination Management Organization (DMO), ou Organização de Gestão de Destino em português, é uma entidade ou organização central na administração e promoção de um destino turístico específico. Conforme definido pela Organização Mundial do Turismo (OMT/UNWTO), uma DMO tem a função de coordenar e facilitar o desenvolvimento e a promoção de destinos, atraindo visitantes, melhorando a infraestrutura, promovendo atividades turísticas e colaborando com diversas partes interessadas, incluindo empresas locais, autoridades governamentais e comunidades.

A principal razão para a importância de uma DMO na gestão de destinos turísticos deriva da natureza fragmentada do turismo, que abrange múltiplas partes interessadas com objetivos por vezes diversos e, em alguns casos, conflitantes. Nesse contexto, a DMO desempenha um papel importante na promoção da colaboração, atuando como entidade que congrega agências governamentais, partes interessadas e profissionais do setor, buscando facilitar parcerias e promover a ação conjunta (Sotiriadis & Shen, 2017Sotiriadis, M., & Shen, S. (2017). The contribution of partnership and branding to destination management in a globalized context: The case of the UNWTO Silk Road Programme. Journal of Tourism, Heritage & Services Marketing, 3(2), 8-16. https://nbn-resolving.org/urn:nbn:de:0168-ssoar-67089-8
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).

Nos clusters turísticos, a importância DMO é destacada por Beni (2020)Beni, M. C. (2020). Saturação e rejeição ao turismo nas destinações turísticas. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, 14, 1-8. https://doi.org/10.7784/rbtur.v14i2.1847
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. Devido ao papel que desempenham no gerenciamento de destinos considera-se que estas organizações podem ser responsáveis pela coordenação geral e implementação da estratégia de um cluster.

Um exemplo prático de como uma DMO se relaciona com um cluster turístico é o caso da região do Algarve, em Portugal. O Algarve é uma região conhecida por suas praias, campos de golfe e infraestrutura turística desenvolvida. A Associação Turismo do Algarve (ATA) atua como a DMO responsável pela gestão e promoção do destino, e pela coordenação entre entidades regionais públicas e privadas para definir políticas, metas e estratégias de promoção turística do Algarve no exterior.

No cluster turístico do Algarve a ATA trabalha em estreita colaboração com as empresas de hospedagem, restaurantes, agências de turismo e outras empresas relacionadas ao turismo na região. Assim, criam campanhas de marketing conjuntas, pacotes turísticos integrados e eventos especiais que destacam as diversas atrações da região, como praias, cultura local e atividades esportivas. Isso ajuda a atrair um público diversificado e incentiva a exploração de várias atividades. Esse exemplo ilustra como uma DMO como a ATA pode desempenhar um papel importante na promoção e desenvolvimento de um cluster turístico, coordenando esforços entre várias partes interessadas para criar uma experiência turística mais completa e atraente.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo apresenta a relevância da clusterização no contexto do turismo como uma abordagem holística e interconectada. Estabelecendo uma base sólida para compreender os clusters turísticos, apresentando um olhar para temas que podem direcionar políticas públicas e futuras pesquisas.

O estudo dos clusters turísticos revela seu papel no impulsionamento do desenvolvimento regional, na promoção da colaboração entre organizações, na facilitação da inovação e no estímulo ao empreendedorismo.

É importante reconhecer a diversidade na formação de clusters turísticos, uma vez que cada aglomerado se configura de acordo com suas próprias características. A flexibilidade em relação ao escopo geográfico, que pode variar de microambientes até níveis nacionais e internacionais.

A análise por meio de modelos como o ciclo de vida e o grau de maturidade dos clusters turísticos oferece uma perspectiva completa de sua evolução. O ciclo de vida, abrange desde a fase pré-cluster até o estágio de estruturação, e a avaliação do grau de maturidade, compreende desde os clusters informais até os maduros com a presença de gatekeepers e promoção da inovação.

É importante reconhecer que, apesar do progresso alcançado, o campo de estudo sobre clusters turísticos continua a demandar novas pesquisas. Estudos de casos que analisem clusters turísticos bem-sucedidos podem fornecer lições valiosas para a criação e gestão destes agrupamentos. A identificação dos fatores críticos de sucesso e a avaliação de seu impacto econômico e social também representam caminhos de pesquisa promissores. Análises comparativas entre clusters turísticos podem oferecer insights sobre as práticas mais eficazes em diferentes contextos. Por fim, também são importantes e necessárias pesquisas sobre como as políticas públicas para o fomento de clusters turísticos podem ser moldadas visando a promoção da sustentabilidade e do desenvolvimento regional.

  • Como Citar: Sohn, A. P., & Beni, M. C. (2023). Cluster turístico: conceitos, características e modelos de análise. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, São Paulo, 17, e-2798, 2023. https://doi.org/10.7784/rbtur.v17.2798

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Editado por

Editor:
Carlos Eduardo Silveira;
Mirian Rejowski;
Rafaela Camara Malerba

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2023
  • Aceito
    15 Out 2023
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