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A relevância do storytelling para a percepção da autenticidade

The relevance of storytelling for authenticity perception

La relevancia del storytelling para la percepción de la autenticidade

Resumo

O objetivo deste artigo é compreender como o storytelling, ou a contação de histórias, é relevante para a autenticidade. Para tanto, foi desenvolvida revisão de literatura sobre autenticidade em experiências turísticas e sobre storytelling, o que deu base para as discussões teóricas deste estudo. Para que se pudesse alcançar o objetivo proposto, optou-se por uma abordagem interpretativista e qualitativa com trabalho de campo aplicado ao contexto do turismo cacaueiro e chocolateiro na Ilha do Combu, Pará. A coleta de dados se deu por meio de observação e de entrevistas semiestruturadas, e os dados - depois de organizados e transcritos - foram analisados por meio de análise de conteúdo. A partir do acesso aos dados, observou-se que o storytelling proporcionou conexão entre os objetos, o local, as pessoas (incluindo comunidade e prestadores de serviço) e a experiência turística. Nesse sentido, o estudo foi capaz de demonstrar a relação existente entre os elementos da abordagem relacional da autenticidade (Rickly-Boyd, 2012) com o storytelling. Ainda, o estudo permite perceber que as histórias conectam os envolvidos na experiência e seus repertórios, legitimam processos de produção, ilustram aspectos físicos e dão significados a ações.

Palavras-chave
Storytelling; Autenticidade; Turismo de Cacau; Turismo de Chocolate; Experiências Turísticas; Ilha do Combu

Abstract

The purpose of this paper is to understand how storytelling is relevant to authenticity. For the matter, a literature review was carried out on authenticity in tourism experiences and on storytelling, which provided the basis for the theoretical discussions of this study. An interpretative and qualitative approach was chosen with fieldwork applied to the context of cocoa and chocolate tourism at Combu Island (Ilha do Combu), Pará. Data collection took place through observation and semi-structured interviews, and the data - after being organized and transcribed - were analyzed using content analysis. It was found through the data that storytelling provided a connection between the objects, the place, the people (including the community and service providers) and the tourism experience. In this sense, the study was able to demonstrate the relationship between the elements of the relational approach to authenticity (Rickly-Boyd, 2012) with storytelling. Furthermore, the study reveals that the stories connect those involved in the experience and their repertoires, legitimize production processes, illustrate physical aspects and give meaning to actions.

Keywords
Narrative; Authenticity; Cocoa Tourism; Chocolate Tourism; Tourist Experiences; Combu Island

Resumen

El propósito de este artículo es comprender cómo el storytelling, o la narración de historias, es relevante para la autenticidad. Para ello, se realizó una revisión bibliográfica sobre la autenticidad en las experiencias turísticas y sobre el storytelling, que sirvieron de base para las discusiones teóricas de este estudio. Para alcanzar el objetivo propuesto, se eligió un enfoque interpretativo y cualitativo con trabajo de campo aplicado al contexto del turismo de cacao y chocolate en Ilha do Combu, Pará. La recolección de datos ocurrió a través de observación y entrevistas semiestructuradas, y los datos, después de ser organizados y transcritos, fueron analizados mediante análisis de contenido. Al acceder a los datos, se observó que la narración proporcionaba una conexión entre los objetos, el lugar, las personas (incluida la comunidad y los proveedores de servicios) y la experiencia turística. En este sentido, el estudio pudo demostrar la relación entre los elementos del enfoque relacional de la autenticidad (Rickly-Boyd, 2012) con el storytelling. Además, el estudio revela que las historias conectan a los involucrados en la experiencia y sus repertorios, legitiman procesos de producción, ilustran aspectos físicos y dan sentido a las acciones.

Palabras clave
Narración; Autenticidad; Turismo Cacaotero; Turismo Chocolatero; Experiencias Turísticas; Isla del Combu

1 INTRODUÇÃO

O ato de contar histórias, ou o storytelling, é inerente ao ser humano. Ele aprofunda a compreensão da vida a partir do compartilhamento de histórias e suas implicações nas relações humanas (Bruner, 1990Bruner, J. (1990). Acts of Meaning. Harvard Business School Press.; Woodside et al., 2008Woodside, A. G., Sood, S., & Miller, K. E. (2008). When Consumers and Brands Talk: Storytelling Theory and Research in Psychology and Marketing. Psychology & Marketing, 25(2), p. 97–145. https://doi.org/10.1002/mar.20203
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). À medida em que as narrativas são incorporadas às experiências turísticas, os visitantes estabelecem conexões simbólicas com o espaço visitado, que somado às experiências subjetivas individuais anteriores, atribuem novos significados aos lugares (Rickly-Boyd, 2010Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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). Para Andrade-Matos, Richards e Barbosa (2022)Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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o storytelling atua na conexão dos atores, lugares e elementos da experiência turística. O sucesso das narrativas nos destinos turísticos depende da participação ativa dos ouvintes, portanto, estudar a construção das relações entre a comunidade local e os turistas é fundamental para ampliar a compreensão teórica de fenômenos turísticos que estão sendo sub investigados (Chronis, 2005Chronis, A. (2005). Coconstructing heritage at the Gettysburg storyscape. Annals of Tourism Research, 32(2), p. 386–406. https://doi.org/10.1016/j.annals.2004.07.009
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).

Além disto, os turistas da atualidade desejam viver experiências autênticas, através do contato mais efetivo com a cultura, história e os modos de vida da comunidade local (Belhassen & Caton, 2006Belhassen, Y., & Caton, K. (2006). Authenticity Matters. Annals of Tourism Research, 33(3), p. 853–856. https://doi.org/10.1016/j.annals.2006.03.009
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; Cooper, 2001Cooper, C. (2001). Turismo, princípios e práticas. Bookman.; Matos & Barbosa, 2018Matos, M. B. A., & Barbosa, M. de L. de A. (2018). Autenticidade em Experiências de Turismo: proposição de um novo olhar baseado na Teoria da Complexidade de Edgar Morin. Revista Brasileira de Pesquisa Em Turismo, 12(3), p. 154–171. https://doi.org/10.7784/rbtur.v12i3.1457
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; Mkono, 2012Mkono, M. (2012). Authenticity does matter. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 480–483. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.06.004
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). Em relação à autenticidade dessas experiências, este é um assunto com pouco consenso. MacCannell (1999)MacCannell, D. (1999). The tourist: a new theory of the leisure class. University of California Press. afirma que a autenticidade das experiências turísticas é encontrada no objeto. Enquanto Reisinger e Steiner (2006)Reisinger, Y., & Steiner, C. J. (2006). Reconceptualizing object authenticity. Annals of Tourism Research, 33(1), p. 65–86. https://doi.org/10.1016/j.annals.2005.04.003
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negam a existência da autenticidade do objeto e propõem uma abordagem existencial. Cohen (1988)Cohen, E. (1988). Authenticity and commoditization in tourism. Annals of Tourism Research, 15(3), p. 371–386. https://doi.org/10.1016/0160-7383(88)90028-X
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acredita na construção coletiva da autenticidade e Wang (1999)Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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conclui que a autenticidade é encontrada nas reflexões individuais durante as experiências turísticas. Para Rickly-Boyd (2012)Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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, as autenticidades do objeto, local e experiência turística estão relacionadas. A autora também indica a necessidade de compreender as dinâmicas espaciais e temporais envolvidas no processo de autorreflexão da construção de histórias e lugares por meio da experiência turística (Rickly-Boyd, 2010Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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).

Diante do exposto, o objetivo deste artigo é compreender como o storytelling é relevante para a percepção da autenticidade. Essa pesquisa é baseada na abordagem relacional de Rickly (2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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; 2022)Rickly, J. M. (2022). A review of authenticity research in tourism: Launching the Annals of Tourism Research Curated Collection on authenticity. Annals of Tourism Research, 92, 103349. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103349
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para os estudos de autenticidade, pois considera que a ação conjunta das diferentes abordagens da autenticidade (Andrade-Matos et al, 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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) pode contribuir simultaneamente para o estudo e a compreensão do objeto, do local e da experiência, o que pode ser promissor para os estudos de storytelling. Para que se pudesse alcançar o objetivo proposto, optou-se por uma abordagem qualitativa com base no interpretativismo.

Para a aplicação empírica do estudo, optou-se por estudar o turismo cacaueiro e chocolateiro na Ilha do Combu, considerado um dos principais atrativos turísticos da região norte paraense, que demonstra ser uma oportunidade para envolver o público em novas experiências autênticas. Lisete Costa, popularmente conhecida como Dona Nena, aproveitou os recursos naturais de sua terra e aprimorou as técnicas de refinamento do cacau realizadas por seus ancestrais, tornando único o sabor do chocolate do combu. Dessa forma, o turista que visita esta localidade além de se envolver numa atmosfera amazônida, representada pelas comunidades ribeirinhas, casas de palafita e passeios de barco, podem emergir em uma experiência transformadora ao conhecer as particularidades da produção de cacau, explorar a fauna e flora da comunidade e se inspirar na história de Dona Nena. O passeio está longe dos moldes industrializados dos grandes centros urbanos e apresenta uma alternativa para se conectar com o saber fazer de pequenas comunidades tradicionais, a partir do compartilhamento de experiências.

2 REVISÃO DE LITERATURA

Esta seção é dedicada aos aspectos teóricos que darão base ao desenvolvimento desta pesquisa, quais sejam: (1) Autenticidade em Experiências Turísticas e (2) Storytelling.

2.1 Autenticidade em Experiências Turísticas

O estudo da autenticidade iniciou após as provocações de Boorstin (1992)Boorstin, D. (1992). The image: a guide to pseudo-events in America. Vintage Books. sobre o turismo ser um pseudoevento que sacia a superficialidade das massas. MacCannell (1999)MacCannell, D. (1999). The tourist: a new theory of the leisure class. University of California Press. pontua que ao explorar os destinos, os turistas se deparam com a “autenticidade encenada”, onde as localidades são “decoradas” para serem percebidas como reais (Matos & Barbosa, 2018Matos, M. B. A., & Barbosa, M. de L. de A. (2018). Autenticidade em Experiências de Turismo: proposição de um novo olhar baseado na Teoria da Complexidade de Edgar Morin. Revista Brasileira de Pesquisa Em Turismo, 12(3), p. 154–171. https://doi.org/10.7784/rbtur.v12i3.1457
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). Essas críticas moldaram os preceitos da corrente objetiva, que recebeu diversas críticas por ignorar a amplitude da experiência turística (Cole, 2007Cole, S. (2007). Beyond authenticity and commodification. Annals of Tourism Research, 34(4), p. 943–960. https://doi.org/10.1016/j.annals.2007.05.004
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). Diante disso, diferentes teóricos desenvolveram seus próprios conceitos de autenticidade. Wang (1999)Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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categorizou esses estudos da autenticidade em três correntes - objetiva, construtivista e pós-modernista – e introduziu a autenticidade existencialista.

A corrente objetiva se relaciona com a autenticidade dos objetos e é originária da museologia. Seus defensores (Boorstin, 1992Boorstin, D. (1992). The image: a guide to pseudo-events in America. Vintage Books.; Lau, 2010Lau, R. W. K. (2010). Revisiting authenticity: A social realist approach. Annals of Tourism Research, 37(2), p. 478–498. https://doi.org/10.1016/j.annals.2009.11.002
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; MacCannell, 1999MacCannell, D. (1999). The tourist: a new theory of the leisure class. University of California Press.) acreditam que a autenticidade está vinculada à manutenção das tradições histórico-culturais e temem que as interferências externas possam descaracterizá-las. Enquanto a originalidade é um ponto central na discussão da corrente objetiva, para a construtivista não é uma questão. Os adeptos da corrente construtivista (Cohen, 1988Cohen, E. (1988). Authenticity and commoditization in tourism. Annals of Tourism Research, 15(3), p. 371–386. https://doi.org/10.1016/0160-7383(88)90028-X
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) apostam na reinvenção das culturas a partir da construção de significados, que tem sua autenticidade validada pela coletividade. Para Wang (1999)Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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, o que define a autenticidade construtivista é a confirmação das imagens idealizadas pelos turistas.

A corrente pós-modernista (Reisinger & Steiner, 2006Reisinger, Y., & Steiner, C. J. (2006). Reconceptualizing object authenticity. Annals of Tourism Research, 33(1), p. 65–86. https://doi.org/10.1016/j.annals.2005.04.003
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) envolve os conceitos de “hiper-realidade” e “simulacros”, que supõem a inexistência de coisas reais, onde tudo é percebido como simulações da realidade (Rickly-Boyd, 2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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). Por isso, afirma que os espaços turísticos são inautênticos, onde os turistas buscam a “autenticidade encenada” para vivenciar momentos de “prazer” (Cohen, 1988Cohen, E. (1988). Authenticity and commoditization in tourism. Annals of Tourism Research, 15(3), p. 371–386. https://doi.org/10.1016/0160-7383(88)90028-X
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; Wang, 1999Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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). A autenticidade existencialista (Wang, 1999Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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) é fundamentada nas ideias de Heidegger, ou seja, é voltada para reflexões individuais desvinculadas dos objetos visitados. É resultado da relação entre o “eu” e suas sensações, sentimentos e emoções (Rickly-Boyd, 2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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). Dessa forma, a noção de autenticidade partirá das reflexões que o próprio indivíduo realiza acerca do mundo (Steiner & Reisinger, 2006Steiner, C. J., & Reisinger, Y. (2006). Understanding existential authenticity. Annals of Tourism Research, 33(2), p. 299–318. https://doi.org/10.1016/j.annals.2005.08.002
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) e a inautenticidade surge quando o equilíbrio entre as partes do ser são quebrados (Wang, 1999Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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).

Após os estudos de Wang (1999)Wang, N. (1999). Rethinking authenticity in tourism experience. Annals of Tourism Research, 26(2), p. 349–370. https://doi.org/10.4324/9781315237749-27
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, pesquisadores direcionaram seus esforços para compatibilizar as abordagens objetiva, construtivista, pós-moderna e existencial (Rickly, 2022Rickly, J. M. (2022). A review of authenticity research in tourism: Launching the Annals of Tourism Research Curated Collection on authenticity. Annals of Tourism Research, 92, 103349. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103349
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). Essas pesquisas originaram perspectivas relacionais e aprofundaram as investigações acerca da autenticidade. Rickly-Boyd (2010)Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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reconhece o aprofundamento da complexidade da subjetividade turística nesses estudos, mas reforça a necessidade de compreender as dinâmicas espaciais e temporais envolvidas nos processos auto reflexivos da construção de histórias e lugares através da experiência turística. De forma semelhante, este artigo reconhece a complexidade da autenticidade e considera a racionalidade das abordagens que agem simultaneamente sob o objeto, local e experiência (Andrade-Matos et al., 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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; Rickly-Boyd, 2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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). Por esta razão, neste estudo será adotada a abordagem relacional proposta inicialmente por Rickly-Boyd (2010)Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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.

2.2 Storytelling

O ato de contar histórias, ou storytelling, nasceu antes mesmo do desenvolvimento dos escritos literários, quando o homem já tinha o hábito de relatar suas experiências aos outros (Godsil & Goodale, 2013Godsil, R., & Goodale, B. (2013). Telling our own story: the role of narrative in racial healing. Recuperado de: http://perception.org/wp-content/uploads/2014/11/Telling-Our-Own-Story.pdf%0A
http://perception.org/wp-content/uploads...
). Para Cronon (1992)Cronon, W. (1992). A Place for Stories: Nature, History, and Narrative. The Journal of American History, 78(4), p. 1347. https://doi.org/10.2307/2079346
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as narrativas não podem ser consideradas fenômenos naturais, mas sim produtos da concepção humana, decorrentes da necessidade de atribuir significado às coisas (Baumeister & Newman, 1994Baumeister, R. F., & Newman, L. S. (1994). How Stories Make Sense of Personal Experiences: Motives that Shape Autobiographical Narratives. Personality and Social Psychology Bulletin, 20(6), p. 676–690. https://doi.org/10.1177/0146167294206006
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). Essa construção simbólica, além de registrar o mundo, permite a conexão com o outro através da transmissão de experiências (Chronis, 2012Chronis, A. (2012). Tourists as Story-Builders: Narrative Construction at a Heritage Museum. Journal of Travel and Tourism Marketing, 29(5), p. 444–459. https://doi.org/10.1080/10548408.2012.691395
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; Polkinghorne, 1988Polkinghorne, D. E. (1988). Narrative knowing and the human sciences. State University of New York Press.). As narrativas também podem contribuir para comunicar identidades, valores e habilidades (Cross et al., 2011Cross, T. L., Friesen, B. J., Jivanjee, P., Gowen, L. K., Bandurraga, A., Matthew, C., & Maher, N. (2011). Defining Youth Success Using Culturally Appropriate Community-based Participatory Research Methods. Best Practices in Mental Health: An International Journal, 7(1), p. 94–114. Recuperado de: http://www.pathwaysrtc.pdx.edu/pdf/pbBestPractices5.pdf
http://www.pathwaysrtc.pdx.edu/pdf/pbBes...
) e assegurar a manutenção das culturas e religiões (Godsil & Goodale, 2013Godsil, R., & Goodale, B. (2013). Telling our own story: the role of narrative in racial healing. Recuperado de: http://perception.org/wp-content/uploads/2014/11/Telling-Our-Own-Story.pdf%0A
http://perception.org/wp-content/uploads...
), a partir do repasse oral das tradições entre gerações. Estas revelam os princípios e valores de uma determinada sociedade num período temporal (Twitchell, 2004Twitchell, J. (2004). An english teacher looks at branding. Journal of Consumer Research, 31(2), p. 484. http://proquest.umi.com/pqdweb?did=950436731&Fmt=7&clientId=12010&RQT=309&VName=PQD
http://proquest.umi.com/pqdweb?did=95043...
).

Em um sentido mais amplo, as narrativas ultrapassam a mera interpretação das palavras escritas, pois conseguem estimular o cérebro a evocar sensações (Paul, 2012Paul, A. M. (2012). Your Brain on Fiction. New York Times. Recuperado de: https://www.nytimes.com/2012/03/18/opinion/sunday/the-neuroscience-of-your-brain-on-fiction.html
https://www.nytimes.com/2012/03/18/opini...
). Tuan (1975)Tuan, Y.-F. (1975). Place: An Experiential Perspective. Geographical Review, 65(2), p. 151. https://doi.org/10.2307/213970
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explica que a experiência de construir histórias é baseada na junção das sensações ativas e passivas. As primeiras, exemplificadas pela visão e audição, influem na construção dos “padrões de realidade”. Enquanto as segundas, como o tato, olfato e paladar, são dimensionados no “eu privado”. Para Tulving (1985)Tulving, E. (1985). How many memory systems are there? American Psychologist, 40(4), p. 385–398. a memória episódica de experiências subjetivas fornece uma maior capacidade de retenção do conhecimento, permitindo que o indivíduo reflita sobre sua existência passada, presente e futura. Dessa forma, as histórias envolvem uma complexidade que compreende o equilíbrio inicial, antes do indivíduo entrar em contato com a narrativa, e o desequilíbrio do inconsciente, após refletir sobre os aspectos vivenciados (Woodside et al., 2008Woodside, A. G., Sood, S., & Miller, K. E. (2008). When Consumers and Brands Talk: Storytelling Theory and Research in Psychology and Marketing. Psychology & Marketing, 25(2), p. 97–145. https://doi.org/10.1002/mar.20203
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). Esses efeitos revelam uma experiência transformadora ao ser humano, capaz de mudar a forma de agir em sua vida (Paul, 2012Paul, A. M. (2012). Your Brain on Fiction. New York Times. Recuperado de: https://www.nytimes.com/2012/03/18/opinion/sunday/the-neuroscience-of-your-brain-on-fiction.html
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).

No turismo, o storytelling é utilizado para tornar os lugares mais atraentes (Chronis, 2012Chronis, A. (2012). Tourists as Story-Builders: Narrative Construction at a Heritage Museum. Journal of Travel and Tourism Marketing, 29(5), p. 444–459. https://doi.org/10.1080/10548408.2012.691395
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), principalmente os ambientes patrimoniais, devido à densidade das características singulares ou abrangência nacional dos significados (Rickly-Boyd, 2010Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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). Nesse contexto, os guias atuam como codificadores dos significados e os turistas como decodificadores (Herbert, 2001Herbert, D. (2001). Literary places, tourism and the heritage experience. Annals of Tourism Research, 28(2), p. 312–333. https://doi.org/10.1016/S0160-7383(00)00048-7
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). Além de se envolver com os aspectos da narrativa, o turista resgata memórias pessoais em seu subconsciente. Esse processo semiótico traduz experiências pessoais e singulares que complementam a autenticação da narrativa (Rickly-Boyd, 2010Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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). Para Turner (2003)Turner, M. (2003). Double-scope Stories. In Herman, D. (Ed.). Narrative Theory and the Cognitive Sciences (pp. 117–142). CSLI Publications. Recuperado de: http://markturner.org/DoubleScopeStoriesTurner.pdf
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mesclar histórias e transformá-la em uma nova, ou “co-construção” como intitula Chronis (2005)Chronis, A. (2005). Coconstructing heritage at the Gettysburg storyscape. Annals of Tourism Research, 32(2), p. 386–406. https://doi.org/10.1016/j.annals.2004.07.009
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, é uma capacidade estritamente humana. Nesse sentido, o turista cria identificação com os narradores a partir da coerência das histórias (Cronon, 1992Cronon, W. (1992). A Place for Stories: Nature, History, and Narrative. The Journal of American History, 78(4), p. 1347. https://doi.org/10.2307/2079346
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; Jacobs, 2002Jacobs, R. (2002). The Narrative Integration of Personal and Collective Identity in Social Movements. In Green, M. C. , Strange, J. J., & Brock, T. C. (Eds.). Narrative Impact: Social and Cognitive Foundations (pp. 211–219). Psychology Press.), pelo interesse nos personagens envolvidos (Boyd, 2009Boyd, B. (2009). On the Origin of Stories. Harvard University Press. https://doi.org/10.2307/j.ctvjf9xvk
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) e pela familiaridade com sua realidade (Johnston, 1990Johnston, B. (1990). Stories, community, and place: Narratives from Middle America. Indiana University Press.). Quando a história não é validada pelos turistas, seu envolvimento poderá ser comprometido durante a experiência (Chronis, 2005Chronis, A. (2005). Coconstructing heritage at the Gettysburg storyscape. Annals of Tourism Research, 32(2), p. 386–406. https://doi.org/10.1016/j.annals.2004.07.009
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).

Para Andrade-Matos, Richards e Barbosa (2022)Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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as relações mediadas através do storytelling conseguem envolver diversos atores, objetos e ambiente: os turistas, os prestadores de serviços turísticos, a comunidade local, o governo e os aspectos físicos, naturais e culturais. Além disso, ao considerar que essas narrativas podem comunicar identidades, valores e habilidades (Cross et al., 2011Cross, T. L., Friesen, B. J., Jivanjee, P., Gowen, L. K., Bandurraga, A., Matthew, C., & Maher, N. (2011). Defining Youth Success Using Culturally Appropriate Community-based Participatory Research Methods. Best Practices in Mental Health: An International Journal, 7(1), p. 94–114. Recuperado de: http://www.pathwaysrtc.pdx.edu/pdf/pbBestPractices5.pdf
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), as histórias são fundamentais para proporcionar a compreensão da cultura e aumentar o engajamento dos turistas nas atividades (Andrade-Matos et al., 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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). Essa interação pode influenciar a legitimação e construção da autenticidade dos objetos físicos e do ambiente social (Andrade-Matos et al., 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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) e, por isso, é fundamental a participação ativa dos turistas durante o storytelling (Chronis, 2012Chronis, A. (2012). Tourists as Story-Builders: Narrative Construction at a Heritage Museum. Journal of Travel and Tourism Marketing, 29(5), p. 444–459. https://doi.org/10.1080/10548408.2012.691395
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).

Apresentadas as bases teóricas utilizadas para o desenvolvimento deste estudo, na próxima seção serão discutidos os procedimentos metodológicos da pesquisa.

3 METODOLOGIA

A fim de responder o problema de pesquisa proposto, que é “compreender como o storytelling é relevante para a percepção da autenticidade”, foram tomadas decisões metodológicas que serão descritas nesta seção.

A abordagem interpretativista foi compreendida como a mais adequada para a aproximação com o campo e acesso aos dados, já que visa a compreensão e a interpretação da ação humana (Schwandt, 2006Schwandt, T. A. (2006). Três posturas epistemológicas para a investigação qualitativa: interpretativismo, hermenêutica e construcionismo social. In. Denzin, N. K., & Lincoln (Ed.), O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens (2nd ed.). Artmed.). Ainda, de acordo com Melucci (2005)Melluci, A. (2005). Busca da Qualidade, Ação Social e Cultura: por uma sociologia reflexiva. In Melucci, A. (Ed.) Por uma Sociologia Reflexiva: pesquisa qualitativa e cultura. Vozes., há uma redefinição da relação entre o pesquisador e o campo no interpretativismo, já que este é inserido no contexto de pesquisa sem pretensão de neutralidade e assumindo que este se relaciona com o campo social estudado, influenciando e sendo influenciado. Entende-se, portanto, que as pesquisadoras fazem parte do campo estudado.

A metodologia que se compreende como a mais adequada, portanto, é a qualitativa. Essa decisão está pautada no objetivo que o estudo possui de compreender e explicar com maior profundidade o fenômeno social estudado (Merriam, 1998Merriam, S. B. (1998). Qualitative Research and Case Study Application in Education. Jossey-Bass.). A pesquisa qualitativa é caracterizada como uma tentativa de compreensão detalhada da realidade estudada (Richardson, 1999Richardson, A. (1999). Subjective experience: Its conceptual status, method of investigation, and psychological significance. Journal of Psychology: Interdisciplinary and Applied, 133(5), p. 469–485. https://doi.org/10.1080/00223989909599756
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).

A partir dessas decisões basilares, foi realizada coleta de dados no locus da pesquisa - a Ilha do Combu, especificamente a empresa “Filha do Combu”. A coleta ocorreu em novembro de 2021, especificamente entre os dias 26, 27 e 28. Uma das pesquisadoras ficou hospedada na empresa (mesmo local onde a proprietária e sua família moram) durante todo o período, observando a rotina e acompanhando os serviços ofertados no local.

Foram utilizadas duas técnicas de coleta de dados: observação e entrevistas semiestruturadas. Observou-se os passeios de grupos que aconteceram no local nos dias citados - buscando compreender as interações espontâneas, as histórias contadas e as relações que são desenvolvidas ao longo do passeio. Ao longo dos passeios, breves interações foram feitas com os guias e os turistas, sempre buscando não interferir demasiadamente em suas ações, mas reconhecendo que estar ali já era uma maneira de interferir. O tour é composto por uma palestra de introdução, um passeio na roça e visita à fábrica com demonstração de elaboração do chocolate feito com cacau nativo. Detalhes do passeio são descritos na seção de apresentação e discussão dos resultados. Ao todo, foram observados três passeios completos de grupos ao longo dos dias.

As entrevistas foram realizadas com os/as turistas após a conclusão de suas vivências no local, quando estavam aguardando a chegada do barco para retornarem a Belém. Este momento foi selecionado por eles estarem tranquilos e ociosos aguardando o retorno, o que foi propício para a concessão da entrevista. Para a realização das entrevistas obteve-se autorização da prestadora de serviços e dos turistas. Sempre, no início das vivências, os guias dos grupos apresentavam a pesquisadora, informavam que ela acompanharia o passeio e ao fim conversaria com quem desejasse. Ao todo foram entrevistados 20 turistas, tendo algumas entrevistas acontecido em duplas, conforme quadro abaixo (Quadro 1).

Quadro 1
Lista de entrevistados

Os entrevistados e as entrevistadas foram questionados acerca da motivação em visitar Belém e a Ilha do Combu, se tinham algum interesse específico na gastronomia cacaueira e chocolateira, como foi a experiência no Combu e se reconheciam a experiência vivenciada como autêntica. Todas as entrevistas foram gravadas com autorização dos sujeitos pesquisados.

Após a coleta, os dados de áudio foram transcritos e organizados. A análise dos dados se deu por meio da Análise de Conteúdo (Bardin, 1977Bardin, L. (1977). Análise de Conteúdo. Edições 70.), que possui as seguintes etapas: pré-análise, momento em que o material é organizado para operacionalizar a sistematização; exploração, transformação dos dados brutos em unidades agregadas (codificação, destaca-se que as categorias foram definidas à posteriori); tratamento dos resultados e interpretação, etapa dedicada ao processo analítico de maneira crítica.

Após apresentação dos procedimentos metodológicos adotados neste estudo, a seguir apresenta-se a seção de resultados e discussão.

4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1 Descrição do locus e da empresa pesquisada

A Ilha do Combu está localizada em uma área de proteção ambiental em Belém, Pará. Segundo os guias locais, residem entre 1.400 e 1.500 pessoas na ilha, o que corresponde a aproximadamente 450 famílias. Os trajetos para chegar à ilha e a locomoção dentro dela são realizados apenas de barco e as casas são construídas com palafitas para evitar enchentes e inundações durante o período chuvoso. Quanto à infraestrutura urbana, o local não possui água encanada e o abastecimento de água mineral, gás e diversos suprimentos são fornecidos pela Prefeitura de Belém, todos vindos da capital de barco. Em 2011, após a introdução da energia elétrica na comunidade, muitos restaurantes se estabeleceram no local, aumentando o fluxo turístico. Os guias de turismo da região estimam que atualmente existem entre 45 e 50 restaurantes e a região é conhecida pela produção de açaí e de cacau.

Viver na Ilha do Combu, conforme os dados apresentados no parágrafo anterior, pode ser bastante desafiador. É fato que há desafios de abastecimento, gestão de resíduos, sanitários e de custos. O turista que se aproxima da Ilha percebe a simplicidade do lugar, mas também a riqueza cultural e de fauna e flora. Percebe-se que há, na ilha, a presença de visitantes interessados nas experiências com a aproximação da Amazônia, e outros interessandos em festas que acontecem em alguns bares. É comum que esses bares promovam eventos com música alta e que incomodam os vizinhos ribeirinhos. Aos finais de semana, ainda, há a presença de lachas particulares que também movimentam a ilha, o rio e os igarapés com som alto e festas privadas. À noite e nos dias de semana é menos comum a presença externa agitada e percebe-se um clima mais tranquilo e silencioso dos moradores locais. O rio é agitado apenas pelo barulho dos motores dos “tototós”, barcos pequenos utilizados pelos ribeirinhos para locomoverem-se entre os pontos da Ilha ou para irem e voltarem de seus trabalhos no continente belenense.

Lisete Costa, popularmente conhecida como Dona Nena, foi precursora da tradição chocolateira da Ilha do Combu. Natural de Belém, mudou-se para a propriedade de seu sogro na Ilha do Combu após casar-se. Lá teve contato com a produção do chocolate artesanal, inicialmente restrita aos bombons paraenses. Anos mais tarde, descobriu sua vocação para o ramo chocolateiro após perceber a valorização dos produtos orgânicos em uma feira que participou em Belém. Imediatamente, passou a comercializar suas barrinhas rústicas de cacau feitas com pilão. Após o sucesso, buscou se profissionalizar. Uma de suas principais metas era modernizar o processo de refinamento do cacau, sem perder a essência de seus ancestrais. Utilizou a criatividade e transformou um antigo moedor de grãos, onde fazia a comida de suas galinhas, em uma máquina para moer o cacau. Nos anos seguintes, fez um curso profissionalizante na Escola Castelli, no Rio Grande do Sul, para transformar seu chocolate rústico em um produto cada vez mais refinado.

Esse movimento de Dona Nena em busca de formação em Gramado se deu por vontade própria de refinar o chocolate produzido por ela, mas, também, em alguma medida, porque recebeu críticas de um jornalista ao seu chocolate rústico. A textura e o sabor de chocolate que os consumidores brasileiros estão acostumados são influenciados pelos padrões europeus e, nesse sentido, há pouca sensibilidade e conhecimento sobre a relevância, características e riqueza (de cultura e sabor) do chocolate rústico brasileiro e latino-americano. O refinamento do chocolate, de qualquer modo, foi relevante para uma maior aceitação do chocolate pelo público em geral.

Hoje, Dona Nena, com 57 anos, é a principal representante do cacau na Ilha do Combu. O negócio que iniciou como uma renda extra, hoje se tornou uma empresa que emprega oito funcionários. Sua cartela de produtos inclui os chocolates 55%, 70%, 85% e 100% cacau. No início das atividades de turismo, as visitas eram em sua residência, mas com a expansão do negócio, construiu um prédio onde está localizada sua cozinha, loja, café e área para palestras (Figura 1). O passeio da vivência cacaueira realizado por Dona Nena é intermediado por empresas de turismo, realizado por guias locais e dura aproximadamente seis horas. Existem outras modalidades de passeios mais curtos, mas não incluem a experiência de produção do chocolate.

Figura 1
Píer de embarque/desembarque e espaço para palestras de Dona Nena

4.2 Relatos da Observação: passeio, temas e participações espontâneas

O passeio realizado com os turistas começa no quintal de Dona Nena, quando os guias locais introduzem as primeiras informações sobre a empresa, a história da matriarca e os fundamentos básicos da produção cacaueira. São explicadas minuciosamente as etapas de coleta, fermentação, secagem e armazenamento, assim como as dificuldades e os cuidados necessários para que a produção obtenha sucesso. À medida que adentram a mata, os guias explicam a origem do cacau, quais as espécies de cacau nativas na região, como foram trazidas, quais os períodos de floração, maturação e colheita e suas semelhanças e diferenças com o cupuaçu - já que ambos pertencem à família theobroma. Durante a trilha, também são explorados aspectos culturais e ambientais da Amazônia, da floresta e dos ribeirinhos, o que envolve os participantes em uma experiência amazonense mais ampla. Na etapa final do passeio, os visitantes chegam à sede da empresa Filha do Combu, onde recebem mais informações sobre a produção do chocolate, visitam a fábrica, fazem uma degustação e visitam a lojinha.

Chama a atenção ao longo dos passeios que além dos aspectos relacionados ao cacau, informações sobre a floresta e o modo de vida na Ilha são compartilhados. O Açaí é um desses elementos, além de outras plantas e frutos relevantes para a comunidade local (andiroba, buriti, taperebá, dentre outros). Quanto às espécies de animais que vivem na região, são citados os tucanos, os macacos, as preguiças e os japús pretos. São mostrados ninhos de japús em cima da sumaúma, fato que os turistas admiram a preciosidade e perfeição. Também se destaca o fato de a guia pedir licença para entrar na floresta - ela fecha os olhos e fica alguns segundos concentrada pedindo uma “bênção” - esta ação faz com que os turistas se concentrem, façam silêncio e respeitem o momento. Segundo a guia, a atitude é o que garante a segurança do grupo.

Ao longo do passeio os turistas surgem com assuntos não necessariamente inseridos no script dos guias, como perguntas sobre os banhos de rio, que levam a uma conversa sobre estratégias que a comunidade local utiliza para filtrar a água e torná-la potável. Nesse sentido, percebe-se que a floresta e a maneira de viver do ribeirinho são objeto de curiosidade do visitante e grande atrativo da vivência - para além do cacau e de seu beneficiamento. Os turistas interessam-se pelo contexto, histórias, frutos e animais que vão além do cacau.

Figura 2
Turistas vendo tucanos que sobrevoavam a mata

Os aspectos históricos do consumo do cacau e do chocolate no mundo são incluídos no roteiro, através da exemplificação da produção da bebida com cacau tradicionalmente feita pelos astecas. Nesses momentos, foi possível observar que os turistas ficam impressionados com a importância histórica do cacau. Os guias também exploram a ancestralidade mística de outros frutos amazônicos, como é o caso da andiroba, planta que as matriarcas da comunidade paraense utilizam para extrair seu óleo e utilizar para fins de regeneração, como queimaduras e dores de garganta. Além disso, revelam mitos e histórias relacionadas ao apuí e a sumaúma, que remontam às tradições indígenas da região. Esses fatos contados reforçam a importância do storytelling para a manutenção da cultura local (Godsil & Goodale, 2013Godsil, R., & Goodale, B. (2013). Telling our own story: the role of narrative in racial healing. Recuperado de: http://perception.org/wp-content/uploads/2014/11/Telling-Our-Own-Story.pdf%0A
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). A Sumaúma é uma espécie de árvore encontrada na Ilha de Combu. A espécie é utilizada pelos indígenas para comunicação e para fazer rituais. Os turistas ficam encantados com a beleza da árvore e fazem comparações com outras espécies que conhecem, ou seja, resgatam memórias pessoais em seus subconscientes (Rickly-Boyd, 2010Rickly-Boyd, J. M. (2010). The Tourist Narrative. Tourist Studies, 9(3), p. 259–280. https://doi.org/10.1177/1468797610382701
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). Os guias também a relacionam às histórias atuais, em que a comunidade local utiliza a árvore para obter um bom sinal de internet. De imediato, os turistas se identificam com essa realidade contemporânea e riem da situação (Johnston, 1990Johnston, B. (1990). Stories, community, and place: Narratives from Middle America. Indiana University Press.).

A importância da preservação do meio ambiente e da Amazônia é reforçada pelos guias ao explicarem a boa fertilidade das áreas de plantação, que são adubadas naturalmente. Também trazem à luz reflexões sobre a comunicação e cooperação de nutrientes entre as espécies nativas. Neste momento, um dos turistas espontaneamente relata que também faz um processo de adubação em sua residência, confirmando a familiaridade apontada por Johnston (Johnston, 1990Johnston, B. (1990). Stories, community, and place: Narratives from Middle America. Indiana University Press.), uma forma de identificação com as histórias contadas. Enquanto isso, outros turistas notam a presença de abelhas e formigas, questionando se sua existência é positiva. Os guias respondem que algumas espécies de formigas e abelhas auxiliam na polinização do cacau e destacam a importância de não interferir no ecossistema.

Os impactos decorrentes do aumento do fluxo turístico, diante do crescente número de restaurantes, também são citados pelos guias. Eles recomendam a adoção de práticas responsáveis pelos moradores e visitantes e controle de embarcações, que em excesso de velocidade causam erosão nos igarapés. Os turistas, demonstrando interesse, questionam a existência de fiscalização, e devido à resposta negativa dos guias, demonstram-se preocupados com o comprometimento do ecossistema local.

Em determinados momentos do roteiro quando os guias demonstram que a produção pode ser perdida após um árduo trabalho, alguns turistas demonstraram emoções ao se identificarem com a narrativa. Também é possível observar que as etapas iniciais foram cruciais para torná-los mais engajados nas etapas posteriores. Quando se direcionam para o momento prático e de degustação (Figura 3), onde todos podem experimentar os itens servidos, como chocolate quente, amêndoas de cacau, nibs e chocolates locais. Os turistas demonstram empolgação com o que visualizam e fazem perguntas sobre o processo de refinamento da cozinha industrial, buscando a transmissão de experiências (Chronis, 2005Chronis, A. (2005). Coconstructing heritage at the Gettysburg storyscape. Annals of Tourism Research, 32(2), p. 386–406. https://doi.org/10.1016/j.annals.2004.07.009
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; Polkinghorne, 1988Polkinghorne, D. E. (1988). Narrative knowing and the human sciences. State University of New York Press.). Neste momento de interação e participação ativa dos visitantes moendo cacau, percebe-se que todos levantam-se e um clima amistoso de brincadeira é estabelecido.

Figura 3
Guia repassando informações sobre a produção do chocolate

Em momento de descanso, quando os turistas estão envolvidos na lojinha, foi questionado a uma das guias o que ela pensa sobre as histórias contadas ao longo do passeio, ela prontamente respondeu: “eu conto histórias porque elas unem todo mundo”. Esta fala da guia demonstra sua percepção sobre a relevância e o papel das histórias nos passeios turísticos do local.

Por meio das observações, foi possível perceber que há interesse e envolvimento com as histórias contadas pelos guias relacionadas não apenas ao cacau e ao chocolate mas também à floresta; ao longo do passeios é possível observar que turistas lembram e compartilham histórias próprias a partir do que é compartilhado pelos guias, o que demonstra que esses estão atentos e relacionando a vivência com experiências anteriores; e, por fim, há interesse e demonstração de empolgação - por meio de risos, interações e brincadeiras - que nascem a partir da experiência ativa de moagem do cacau e transformação deste em chocolate.

4.3 Resultados das Entrevistas realizadas com os turistas

4.3.1 Motivações da viagem à Belém

Foram citados pelos turistas diferentes aspectos que teriam os levado a viajar para Belém. Os entrevistados 1, 13 e 14 relataram que a viagem surgiu do desejo de explorar novos lugares. A entrevistada 1 foi influenciada por um amigo de trabalho, que indicou Belém acreditando ser um destino que lhe agradaria. Contudo, se demonstrou decepcionado com a urbanização, o que lhe incentivou a buscar nas proximidades opções mais integradas com a natureza. Baseada na vontade de explorar todas as capitais brasileiras e na indicação de um colega de trabalho, foi como a entrevistada 13 acabou chegando à Belém. Já a entrevistada 14 busca conhecer novos lugares, principalmente pela gastronomia. O que lhe atraiu em Belém foram as comidas que não conhece, como também as comidas que já conhece, mas pretende conhecer de uma forma mais profunda, a exemplo do açaí.

Outro fluxo observado foi que alguns turistas aproveitam a estadia em cidades vizinhas para conhecer Belém. Os entrevistados 12 e 15 estavam em Alter do Chão e decidiram passar o final de semana em Belém. A visita de parentes também é responsável por influenciar o fluxo de visitantes. Os entrevistados 8 e 10 foram visitar, respectivamente, a irmã e o filho, que moram em Belém. Enquanto isso, as entrevistadas 2 e 4, já conheciam Belém e estavam visitando novamente. A entrevistada 4 revelou que todo ano visita à cidade, pois acredita ter vínculos ancestrais com a localidade e admira o quanto a comunidade vive sua cultura, não se restringindo a meras representações. Todas as vezes que visita, opta por fazer roteiros diferentes. Apenas a entrevistada 6 contou que esteve em Belém por motivos de trabalho e aproveitou o tempo livre para conhecer os lugares turísticos.

4.3.2 Motivações da viagem à Ilha do Combu

Quanto à decisão de visita ao Combu, os entrevistados 1 e 15 ficaram sabendo de sua existência durante a estadia em Belém; os entrevistados 4, 5, 6, 11 e 12 souberam através de amigos e conhecidos; e os entrevistados 2, 3, 7, 8, 9, 13 e 14 descobriram através da internet. Os entrevistados 12 e 14 relatam ter visto reportagens sobre a Ilha do Combu na televisão. Os principais comentários sobre a localidade se referiam às comunidades tradicionais que produzem cacau e açaí, as casas de palafitas situadas à beira do lago e aos restaurantes.

Em conversa com os guias dos passeios, eles especificaram que o meio de conhecer o Combu é pelas agências de turismo e informam que acreditam que somente 10% a 15% dos turistas que vão à Belém buscam especificamente o cacau. Esses guias acreditam que o açaí chama mais atenção econômica e turística para o Pará. Nesse sentido, observa-se que a Ilha não é tão acessível aos turistas e que estes precisam, muitas vezes, sair de suas zonas de conforto para realizar a visita. Não são todas as empresas que fazem o passeio e é preciso conversar com algum local para entender como pegar o barco para a Ilha. Os turistas relataram dificuldade para conseguir tais informações.

As redes sociais foram bastante citadas como meio de obter informações e influenciar o passeio ao Combu. Os entrevistados 3 e 15 relatam que buscaram informações com pessoas conhecidas, mas foi através da internet que obtiveram detalhes completos do passeio e fizeram a reserva. As entrevistadas 13 e 14 informaram que descobriram o passeio através de perfis no instagram e blogs de viagem que mostram o passeio e contam as histórias. O que reforça os novos hábitos de consumo motivados pelos meios digitais (Barbosa et al., 2020Barbosa, L. S. da S., Andrade-Matos, M. B., & Perinotto, A. R. C. (2020). Marketing digital: a influência das mídias sociais digitais no processo de decisão de compra dos consumidores de meios de hospedagem. PODIUM Sport, Leisure and Tourism Review, 9(1), p. 154–170. https://doi.org/10.5585/podium.v9i1.14822
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). A partir deste exemplo, é possível perceber o quanto o storytelling de um indivíduo é capaz de influenciar o outro a viver a mesma experiência.

“curiosidade de ver as coisas que eu vi no instagram e eu sigo uma moça que ela tem um blogzinho que ele chama ‘tem que ir’ e ela fez esse passeio (...)ela veio pro Pará acho quem em julho, se eu não me engano, e ela fez vários, vários stories. (...) Ali, ela mostra aquele painel, ai ela mostra essa parte da mata que a gente andou”

(Entrevistada 13).

Apesar da entrevistada 14 revelar que não foi visitar a região especificamente pelo cacau, outros visitantes afirmam o oposto. O desejo do entrevistado 12 em conhecer a Ilha do Combu surgiu após assistir um programa de televisão que falava sobre a região. É bastante nítido neste estudo, apesar de não ser o objetivo, que as redes sociais e os programas televisivos influenciam a decisão de viajar para esta localidade e viver esta experiência.

A experiência de vivenciar locais habitados por pequenos produtores locais e degustar seus produtos atraiu as entrevistadas 2, que afirmaram gostar de gastronomia.

“eu gosto muito dessa cena de pequenos produtores, de projetos enganchados ao território, essa coisa, acho que mais na Itália a gente pesquisa muito isso... Os produtos naturais, queijos de pequenos produtores (...) eu gosto muito”

(Entrevistada 2A).

A entrevistada 8 revela amar chocolate e a entrevistada 6 aproveitou o dia de folga da viagem à trabalho para explorar o chocolate de Dona Nena. Demonstrou desejo em conhecer o local, pois sua família tem o costume de experimentar sabores de chocolate diferentes. Já a entrevistada 1 assume ser a primeira vez que experimenta um cacau tipicamente paraense.

4.3.3 Experiência cacaueira e chocolateira

Todos os entrevistados revelaram gostar da experiência. A entrevistada 14 criou expectativas em relação ao passeio, mas relatou que ao entrar em contato com a cultura, natureza e história da comunidade, superou sua imaginação. Complementa que esperava que a experiência fosse restrita a degustação de chocolate, mas que a introdução dos guias em revelar características da região enriqueceu o passeio. Releva que o passeio é emocionante, ao compreender a dificuldade em conseguir obter o produto final, e que diversas vezes se sentiu acolhida pela vida simples da comunidade.

“amei (...) a gente vem imaginando que vai conhecer uma ´overview´ da cultura, história dela, mas foi muito mais completo do que eu imaginava (...) já esperava que comer essas coisas seria deliciosas, mas não sabia que teria tantas opções assim, achei que seria algo mais básico, mas eu gostei muito da introdução da Cris (guia)... dela contar tanto da região quanto da história da Dona Nena”

(Entrevistada 14).

Nesta passagem é possível perceber que as expectativas da turista são superadas e que muito disso se dá por conta de aspectos relacionados à contação de histórias (as dificuldades do trabalho ali), o que afirma ser emocionante. Assim, inferimos que a autenticidade vivenciada pela turista, que a emociona, foi conferida por aspectos do storytelling locais, que autentificaram e legitimaram sua vivência, corroborando com Andrade-Matos et al. (2022)Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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.

Os entrevistados 8 e 15 ressaltam a receptividade e informações detalhadas que os guias revelam durante a visita. Essas observações demonstram o quanto a transmissão das experiências da comunidade local podem ser valiosas ferramentas de conexão (Chronis, 2005Chronis, A. (2005). Coconstructing heritage at the Gettysburg storyscape. Annals of Tourism Research, 32(2), p. 386–406. https://doi.org/10.1016/j.annals.2004.07.009
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; Polkinghorne, 1988Polkinghorne, D. E. (1988). Narrative knowing and the human sciences. State University of New York Press.). O mesmo pode ser refletido sobre o momento em que o entrevistado 11 afirma que a equipe engajada e que é parte da comunidade é fundamental para a experiência. Durante o passeio, as impressões do entrevistado foram que os guias locais sabiam das particularidades da região, e que se fossem pessoas de fora não seria uma experiência autêntica. Tal constatação corrobora com Zhou et al. (2015) que tratam da relevância do prestador de serviço para a construção da autenticidade em turismo.

Os entrevistados 3 e 15 conheciam o cacau, mas desconheciam o processo de fabricação do chocolate. A entrevistada 3 demonstrou surpresa ao perceber o quanto tinham aperfeiçoado as técnicas de produção. Os entrevistados 5 também não imaginavam que o processo fosse tão artesanal e os entrevistados 15 gostaram de poder observar os processos na cozinha. O que mais chamou a atenção da entrevistada 7A foi a qualidade do chocolate ao saber que a natureza pode influenciar em seus processos nutricionais, sendo capaz de mudar o sabor.

Para a entrevistada 6, a parte mais interessante em provar o chocolate, é associar a toda história que lhe foi apresentada durante o passeio. Acredita que sem as experiências vividas, não aproveitaria o chocolate da mesma forma. A partir da visão desta turista, é possível compreender que as histórias são capazes de fornecer-lhe um produto superior, uma experiência mais legítima e autêntica. Apesar da tangibilidade do chocolate e de seus aspectos sensoriais, a turista defende que as histórias alteram a vivência com o produto, o que corrobora com Chronis (2012)Chronis, A. (2012). Tourists as Story-Builders: Narrative Construction at a Heritage Museum. Journal of Travel and Tourism Marketing, 29(5), p. 444–459. https://doi.org/10.1080/10548408.2012.691395
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que afirma que o storytelling é uma forma de tornar a experiência mais atraente.

A experiência vinculada aos produtos locais foi o ponto principal para os entrevistados 9 e 10, e o entrevistado 11 afirmou que se surpreendeu com o quanto a alimentação influencia o estilo de vida das comunidades ribeirinhas. Para ele, essas comunidades vivem tranquilamente, aproveitando os pequenos momentos do dia a dia, o que é muito diferente de seu cotidiano. Em outras palavras, é o storytelling o possibilitou refletir sobre os aspectos vivenciados e compará-los com sua realidade (Tulving, 1985Tulving, E. (1985). How many memory systems are there? American Psychologist, 40(4), p. 385–398.; Woodside et al., 2008Woodside, A. G., Sood, S., & Miller, K. E. (2008). When Consumers and Brands Talk: Storytelling Theory and Research in Psychology and Marketing. Psychology & Marketing, 25(2), p. 97–145. https://doi.org/10.1002/mar.20203
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). No entanto, é relevante destacar que sua percepção da realidade dos ribeirinhos é distanciada da realidade, não contemplando as dificuldades que esses vivem, o que demonstra que sua vivência na localidade não foi atravessada por reflexões acerca da comunidade local e sua falta de água, energia, dificuldade de mobilidade, dentre outros.

Os meios de locomoção também foram comentados. Os entrevistados 8, 13, 1 e 15 comentaram a experiência, sendo 8 e 13 experiências positivas e 1 e 15 experiências negativas (dificuldades para embarcar).

4.3.4 Percepção da autenticidade

Quando questionados se os entrevistados consideravam que suas experiências foram autênticas, todos afirmaram que sim. Uma das entrevistadas respondeu:

“Achei que foi (autêntico), trás a gente pro contexto, antes de só ser comida, comida... e foi muito emocionante (...) entender a dificuldade que é pra você chegar no produto final, isso trás um valor muito maior sabe? (...) então é uma comida deliciosa, a gente come algo que é muito diferente do que a gente conhece como chocolate, mas a gente entende o processo todo da Dona Nena até chegar onde tá e a gente vê, que a gente tá aqui na casa dela e ela leva uma vida super simples ainda. Então você se sente abraçado (...) não é uma coisa muito plastificada, sabe?”

(Entrevistada 14).

O relato desta visitante é embebido da relação construída entre autenticidade e storytelling. Ela afirma que percebe a experiência como autêntica a partir de informações que lhe foram contadas por meio de histórias (as dificuldades, o processo, a vida simples) e tangibilizadas por meio do ambiente físico e das pessoas. Esta passagem corrobora com a relevância os aspectos relacionais (objetos, lugar e experiências) da autenticidade (Andrade-Matos et al., 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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; Rickly-Boyd, 2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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) os envolve com o storytelling.

A explicação sobre o processo de produção foi apontada pelos entrevistados 1, 5, 8 e 15 como um fator diferencial. Para a entrevistada 1, é um diferencial do chocolate local o fato dele estar em contato com o produtor e suas raízes, pois acredita criar uma nova consciência sobre o assunto. De acordo com Paul (2012)Paul, A. M. (2012). Your Brain on Fiction. New York Times. Recuperado de: https://www.nytimes.com/2012/03/18/opinion/sunday/the-neuroscience-of-your-brain-on-fiction.html
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esta aprendizagem está relacionada ao potencial das histórias contadas. A entrevistada 5A, apesar de ser paraense, apontou no discurso dos guias aspectos que desconhecia de sua própria terra, o que foi interessante para descobrir mais sobre suas origens. O entrevistado 15B, relatou ter vivido uma experiência semelhante na Amazônia, mas ressaltou que a profundidade das explicações foi o fator que a diferenciou da experiência anterior. Esta afirmação revela o potencial diferenciador de lugares a partir do storytelling.

As memórias afetivas também são apontadas. A entrevistada 3, natural do Pará, menciona recordações de sua mãe, que produzia chocolate artesanal de forma semelhante aos primeiros chocolates de Dona Nena. Também revela que desconhecia formas modernizadas de trabalhar com o cacau. Tal fato corrobora com o afirmado por Tulving (1985)Tulving, E. (1985). How many memory systems are there? American Psychologist, 40(4), p. 385–398., em que os turistas revivem experiências individuais do passado, para complementar a autenticidade das experiências vividas.

Os entrevistados 5, 8 e 13 citaram a autenticidade da trajetória de Dona Nena: a entrevistada 13 gostou de ouvir a história da empreendedora e ver seu sonho realizado; a entrevistada 8 menciona a naturalidade das etapas vividas pela empresária; e os entrevistados 5 complementam que a produção de cacau era algo que existia e apenas precisou ser viabilizado. Essas entrevistas revelam que os turistas enxergam a autenticidade a partir da coerência (Cronon, 1992Cronon, W. (1992). A Place for Stories: Nature, History, and Narrative. The Journal of American History, 78(4), p. 1347. https://doi.org/10.2307/2079346
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; Jacobs, 2002Jacobs, R. (2002). The Narrative Integration of Personal and Collective Identity in Social Movements. In Green, M. C. , Strange, J. J., & Brock, T. C. (Eds.). Narrative Impact: Social and Cognitive Foundations (pp. 211–219). Psychology Press.) e do interesse na personagem principal (Boyd, 2009Boyd, B. (2009). On the Origin of Stories. Harvard University Press. https://doi.org/10.2307/j.ctvjf9xvk
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).

A importância do lugar é enfatizada como diferencial do passeio pelas entrevistadas 8 e 13. A entrevistada 13 relata que já visitou fábricas de chocolate em sua cidade, mas a vivência no Combu foi uma experiência totalmente diferente por ser artesanal. A entrevistada 8 exemplifica que se fosse realizado em sua terra natal, Minas Gerais, seria interessante, mas não seria a mesma coisa. Para ela, andar de barco, receber instruções, conhecer a plantação de cacau e ver o processo de produção do chocolate são elementos que tornaram a experiência autêntica. O que demonstra a legitimação da autenticidade a partir de diversos elementos que compõem a experiência, não apenas os diretamente relacionados ao momento em si do consumo (Andrade-Matos et al., 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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). A entrevistada 9B revela orgulho em viver uma experiência tipicamente paraense, ao trazer recursos naturais e elementos de sua cultura. Já a entrevistada 8 relata ter aberto seus olhos para viver uma experiência vinculada à história e cultura brasileira.

A entrevistada 1 elogiou a diversidade da Amazônia. Para ela, estar nesse ambiente é interessante, pois é diferente de tudo que existe, esta afirmativa demonstra a importância que a turista dá aos aspectos físicos que caracterizam o contexto da vivência turística e legitimam aquela como uma vivência amazônica (Lau, 2010Lau, R. W. K. (2010). Revisiting authenticity: A social realist approach. Annals of Tourism Research, 37(2), p. 478–498. https://doi.org/10.1016/j.annals.2009.11.002
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). Outros entrevistados também levantam os aspectos naturais como autênticos, por exemplo, os entrevistados 9, 10 e 11 revelaram se sentir atraídos pelo modo de vida das comunidades ribeirinhas.

5 CONCLUSÃO

A partir da realização do presente estudo, que buscou “compreender como o storytelling é relevante para a percepção da autenticidade”, foi possível compreender a relevância do storytelling para a construção e percepção da autenticidade.

O storytelling proporcionou a interconexão simbólica entre os objetos, o local, as pessoas (incluindo comunidade e prestadores de serviço) e a experiência turística. Nesse sentido, o estudo foi capaz de demonstrar a relação existente entre a abordagem relacional da autenticidade (Rickly-Boyd, 2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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) com o storytelling. Ainda, o estudo permite perceber que as histórias conectam os envolvidos na experiência, como relatado pela guia, legitimam processos de produção, ilustram aspectos físicos e dão significados a ações.

Essa relação atribuiu um valor subjetivo aos turistas, que de forma unânime reconheceram a autenticidade de suas vivências. Através do processo de co-criação da experiência, eles se identificaram com os modos de vida tradicionais da comunidade, compreenderam a importância do cacau, defenderam a preservação do ecossistema nativo e destacaram a relevância da trajetória da protagonista. Também é perceptível o quanto o storytelling transcende sua atuação para além da experiência turística. Quando demonstra que é fundamental para a manutenção das tradições da comunidade, a exemplo da preparação do óleo de andiroba pelas matriarcas, ou ainda, das formas de purificar a água.

As principais observações deste artigo se referem ao engajamento dos turistas em relação à cronologia da narrativa. Ficou evidente que, assim como as histórias escritas, o storytelling segue uma ordem cronológica, que proporciona uma experiência imersiva aos envolvidos. Podemos observar que à medida que as histórias eram reveladas, os turistas desenvolviam relações emocionais com a comunidade local, e se tornavam mais receptivos em viver a experiência. Outros fatores que merecem ser destacados são a importância do storytelling na superação das imagens idealizadas, a partir da atribuição de valor aos objetos, ao lugar e à experiência, após os turistas se aproximarem da narrativa; e a diferenciação entre os lugares, em que um turista relatou viver uma experiência semelhante, mas que ao conectar-se com as histórias relatadas pela comunidade, se tornou diferente.

Para pesquisas futuras, sugerimos estudos que incluam a visão da comunidade local no processo de construção da autenticidade a partir do storytelling. Como também, uma maior compreensão acerca da importância da cronologia do storytelling para a percepção da autenticidade das experiências turísticas. Devido ao grande número de turistas que descobriram o passeio através de relatos de blogs, estudos de storytelling baseados na análise de relatos em redes sociais digitais das vivências pode ser interessante, a fim de comparar o que é retratado na internet do que foi estudado presencialmente.

Por fim, acredita-se que o objetivo do estudo foi atingido, tendo este artigo contribuído para a compreensão da relevância do storytelling para a autenticidade e reafirmando o caráter complexo (Andrade-Matos et al., 2022Andrade-Matos, M. B. de, Richards, G., & Barbosa, M. de L. de A. (2022). Rethinking authenticity through complexity paradigm. Annals of Tourism Research, 92, 103348. https://doi.org/10.1016/j.annals.2021.103348
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; Matos & Barbosa, 2018Matos, M. B. A., & Barbosa, M. de L. de A. (2018). Autenticidade em Experiências de Turismo: proposição de um novo olhar baseado na Teoria da Complexidade de Edgar Morin. Revista Brasileira de Pesquisa Em Turismo, 12(3), p. 154–171. https://doi.org/10.7784/rbtur.v12i3.1457
https://doi.org/10.7784/rbtur.v12i3.1457...
) e relacional (Rickly-Boyd, 2012Rickly-Boyd, J. M. (2012). Authenticity & aura. Annals of Tourism Research, 39(1), p. 269–289. https://doi.org/10.1016/j.annals.2011.05.003
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) da autenticidade.

AGRADECIMENTOS

Este estudo contou com apoio financeiro da Universidade de São Paulo (USP). Agradecemos à comunidade e aos turistas pesquisados.

  • Como citar: Andrade-Matos, M. B., & Cavalcante, M. M. (2023). A relevância do storytelling para a percepção da autenticidade. Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, São Paulo, 17, e-2719, 2023. https://doi.org/10.7784/rbtur.v17.2719

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Editado por

Editor: Leandro B. Brusadin.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    27 Out 2022
  • Aceito
    06 Mar 2023
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