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Laceração de canalículo lacrimal em centro de referência do centro-oeste paulista

Lacrimal canaliculus laceration in a reference center in the Center-West of the state of São Paulo

RESUMO

Objetivo:

Descrever as características clínico-epidemiológicas, técnicas cirúrgicas e resultado do tratamento das lacerações canaliculares operadas em nosso serviço.

Métodos:

Estudo retrospectivo, realizado de janeiro de 2012 a junho de 2020, considerando-se as lesões de canalículo lacrimal operadas em um serviço de referência. Dados demográficos, características das lesões, detalhes das cirurgias e resultado do tratamento foram obtidos de prontuários eletrônicos e analisados estatisticamente.

Resultados:

Foram incluídos 26 portadores de lesões canaliculares, com idade entre 2 e 71 anos, sendo 73,1% homens. A lesão acometia o canalículo superior em 53,9%; 80,8% pacientes procuraram pelo serviço nas primeiras 24 horas, e 46,2% tiveram a cirurgia realizada entre 24 e 72 horas após o traumatismo. Todos os pacientes tiveram intubação mono ou bicanalicular, e o tempo transcorrido entre a cirurgia e a retirada do silicone, variou de zero a 183 dias. Após a cirurgia, 21 pacientes (80,8%; p<0,05) não apresentaram complicações, 2 (7,7%) evoluíram com obstrução canalicular, 2 (7,7%) com granuloma e 1 (3,8%) com ectrópio de ponto lacrimal.

Conclusão:

As lesões de canalículo encontradas em nossa prática são mais comuns em crianças ou homens jovens, acometem mais o canalículo superior e as nossas condutas levam a sucesso no tratamento na maior parte dos casos. As grandes controvérsias no assunto persistem, como o tipo e o tempo de permanência do tubo de silicone na via lacrimal. Somente estudos com grandes amostras podem consolidar esses conceitos.

Descritores:
Pálpebras; Lacerações; Aparelho lacrimal; Obstrução dos ductos lacrimais; Intubação

ABSTRACT

Objective:

To describe the clinical and epidemiological characteristics, surgical techniques, and results of the canalicular laceration treatment at our service.

Methods:

A retrospective study was carried out from January 2012 to June 2020, considering canalicular injuries operated at a reference center. Demographic data, lesion characteristics, surgical details, and treatment outcomes were obtained from electronic medical records and were statistically analyzed.

Results:

Twenty-six cases of people with canalicular lesions aged between 2 to 71 years old were included, of whom 73.1% were men. The superior canaliculus was affected in 53.9%; 80.8% of patients searched for care within the first 24 hours, and 46.2% had the surgery performed between 24-72 hours after trauma. All patients had mono or bicanalicular intubation and the time elapsed between surgery and silicone removal ranged from 0 to 183 days. After surgery, 21 patients (80.8%, p<0.05) did not present any complications, two (7.7%) evolved with canalicular obstruction, two (7.7%) with granuloma, and one (3.8 %) with lacrimal puncta ectropion.

Conclusion:

In our practice, canalicular injuries are more common in children or young men, affecting mainly the superior canaliculus, and treatment success using our approach can be achieved in most of the cases. However, great controversies remain on the subject, such as type of intubation and when to remove the silicone tube from the lacrimal pathway. Larger series are required to consolidate controversial concepts.

Keywords:
Eyelids; Lacerations; Lacrimal apparatus; Lacrimal duct obstruction; Intubation

INTRODUÇÃO

A laceração canalicular pode ocorrer por traumatismo direto ou indireto da região palpebral ou periocular, constituindo uma emergência oftalmológica.(11 Guo T, Qin X, Wang H, Lu Y, Xu L, Ji J, et al. Etiology and prognosis of canalicular laceration repair using canalicular anastomosis combined with bicanalicular stent intubation. BMC Ophthalmol. 2020;20(1):246.) Pode resultar de traumatismo penetrante ou contuso no canto medial da pálpebra, sendo mais comum em crianças e adultos jovens e afetando principalmente o canalículo inferior.(22 Tavakoli M, Karimi S, Behdad B, Dizani S, Salour H. Traumatic canalicular laceration repair with a new monocanalicular silicone tube. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2017;33(1):27-30.)

O acometimento das vias lacrimais ocorre em cerca de 16% de todos os traumatismos da pálpebra.(33 Naik MN, Kelapure A, Rath S, Honavar SG. Management of canalicular lacerations: epidemiological aspects and experience with Mini-Monoka monocanalicular stent. Am J Ophthalmol. 2008;145(2):375-380.) O envolvimento canalicular representa 70% dos traumatismos das vias lacrimais,(44 Bai F, Tao H, Zhang Y, Wang P, Han C, Huang YF, et al. Old canalicular laceration repair: a retrospective study of the curative effects and prognostic factors. Int J Ophthalmol. 2017;10(6):902-907.) provavelmente devido à maior vulnerabilidade da porção lacrimal da pálpebra, a qual não possui tarso.(22 Tavakoli M, Karimi S, Behdad B, Dizani S, Salour H. Traumatic canalicular laceration repair with a new monocanalicular silicone tube. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2017;33(1):27-30.)

Um exame minucioso e a suspeição para lesão canalicular são de suma importância nos casos de traumatismo da região do canto interno das pálpebras.(55 Maheshwari RD, Maheshwari M. Annular intubation with pigtail probe for canalicular lacerations. Indian J Ophthalmol. 2020;68(10):2166-9.) A sutura com intubação canalicular é uma máxima, sendo a única forma de manter a via pérvia e evitar epífora nesses pacientes.(66 Linberg JV, Moore CA. Symptoms of canalicular obstruction. Ophthalmology. 1988;95(8):1077-9.) A não reconstrução da via lacrimal ou seu manejo inadequado podem levar à estenose e à obstrução dela.(11 Guo T, Qin X, Wang H, Lu Y, Xu L, Ji J, et al. Etiology and prognosis of canalicular laceration repair using canalicular anastomosis combined with bicanalicular stent intubation. BMC Ophthalmol. 2020;20(1):246.,22 Tavakoli M, Karimi S, Behdad B, Dizani S, Salour H. Traumatic canalicular laceration repair with a new monocanalicular silicone tube. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2017;33(1):27-30.)

Devido a raridade das lesões canaliculares, a maioria do conhecimento sobre o assunto se baseia em relatos de poucos casos, a partir do que se constrói o conhecimento sobre as melhores condutas a seguir.(77 Chu YC, Wu SY, Tsai YJ, Liao YL, Chu HY. Early versus late canalicular laceration repair outcomes. Am J Ophthalmol. 2017;182:155-9.

8 Chatterjee S, Rath S, Roy A, Shrestha E. 20G silicone rod as monocanalicular stent in repair of canalicular lacerations: Experience from a tertiary eye care centre. Indian J Ophthalmol. 2013;61(10):585-6.
-99 Leibovitch I, Kakizaki H, Prabhakaran V, Selva D. Canalicular lacerations: repair with the Mini-Monoka® monocanalicular intubation stent. Ophthalmic Surg Lasers Imaging. 2010;41(4):472-7.) Assim, o objetivo do presente estudo foi descrever as características clínico-epidemiológicas, técnicas cirúrgicas e resultado do tratamento dos casos de laceração canalicular atendidos no nosso serviço.

MÉTODOS

Trata-se de estudo retrospectivo, realizado com dados obtidos a partir de prontuários eletrônicos de portadores de laceração de canalículo lacrimal atendidos no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, entre janeiro de 2012 e junho de 2020. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição e o Termo de Consentimento foi dispensado, tendo em vista o caráter retrospectivo da pesquisa.

Foram incluídos todos os pacientes consecutivos portadores de lesão de vias lacrimais altas e que foram submetidos à reconstrução cirúrgica dos canalículos. Foram excluídos os indivíduos que não foram tratados cirurgicamente.

A laceração do canalículo foi constatada pelo exame ectoscópico ou biomicroscópico, avaliando-se a presença de soft stop, a visibilização da sonda de Bowman que foi introduzida pelo ponto lacrimal próximo da área de lesão e o teste de Zappia-Milder (instilação de uma gota de colírio de fluoresceína sódica 2%, observando-se o escoamento do corante em 3 a 5 minutos, interpretando-se como teste positivo quando houver a retenção do corante e o aumento do menisco lacrimal por mais de 5 minutos).

O tratamento cirúrgico visou à sutura do canalículo lesado, com intubação canalicular com fio de silicone de diâmetro menor que 0,18mm, unicanalicular quando a lesão se localizava há menos que 3 mm do ponto lacrimal ou bicanalicular, quando a laceração foi de ambos os canalículos ou distava do ponto lacrimal superior ou inferior em mais do que 3mm. Os procedimentos foram realizados por médicos oftalmologistas em treinamento, sempre sob supervisão de um oftalmologista sênior que decidia sobre o uso do pig tail ou da sonda de Crawford para a passagem do silicone.

Dados demográficos, das características das lesões e do tratamento realizado foram transferidos para tabela Excel e submetidos à análise estatística descritiva. Considerando-se como sucesso do tratamento o resultado do teste de Zappia-Milder negativo ou 1+, foram analisadas possíveis relações entre as variáveis tipo de lesão (mono ou bicanalicular), tempo transcorrido entre o diagnóstico e cirurgia e o tempo de permanência do tubo silicone, utilizando-se o teste do qui-quadrado, teste de associação de Goodman e teste t de Student. Adotou-se p<0,05 como nível de significância.

RESULTADOS

No período do estudo, foram operados 26 pacientes com o diagnóstico de laceração canalicular (Tabela 1), dos quais 19 (73,1%, p < 0,05) eram do sexo masculino, com média de idade de 28,8 ± 20,8 anos. Quanto ao mecanismo da lesão, os traumatismos por objetos cortantes foram os mais frequentes (17; 65,4%; p<0,05), enquanto três pacientes sofreram traumatismos contusos (11,5%; p<0,05) e seis (23,1%; p<0,05) foram vítimas de outros tipos de traumatismos. A lesão isolada do canalículo superior (14; 53,9%) ou inferior (9; 34,6%) foi mais frequente, sendo que a lesão de ambos os canalículos ocorreu em menor proporção (3; 11,5%), com p<0,05.

Tabela 1
Características clínico-epidemiológicas dos pacientes com laceração canalicular

Dos 26 pacientes, 2 (7,7%) apresentaram lesão ocular associada.

Analisando o tempo entre a ocorrência do traumatismo e o momento do diagnóstico da laceração canalicular, 80,8% (p<0,05) dos pacientes apresentaram-se ao nosso serviço nas primeiras 24 horas. O tempo entre o diagnóstico e a correção cirúrgica esteve entre 24 e 72 horas para 12 pacientes (46,2%).

O reparo cirúrgico foi feito sob anestesia geral em todos os nossos pacientes, envolvendo sutura direta e intubação monocanalicular em 9 pacientes (34,6%) e, em 16 (61,6%), a intubação foi bicanalicular com auxílio do pig tail (16; 61,6%; p<0,05) ou com intubação bicanalicular com sonda de Crawford (1; 3,8%; p<0,05). O tempo cirúrgico em 61,6% dos pacientes (p<0,05) esteve entre 1e 2 horas.

O período transcorrido entre a cirurgia e a retirada da intubação pelo silicone variou de zero a 183 dias (média de 49,8 ± 39,5 dias).

O seguimento de 42,4% dos pacientes foi feito por 6 meses, período no qual 21 pacientes (80,8%, p<0,05) não apresentaram complicações, 2 (7,7%) evoluíram com obstrução canalicular, 2 (7,7%) com granuloma e 1 (3,8%) com ectrópio de ponto lacrimal. O sucesso do tratamento considerando o teste de Zappia-Milder negativo ou 1+ ocorreu em 21 (80,8%; p<0,05) pacientes (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição dos resultados do teste de Zappia-Milder no pré-operatório e no pós-operatório

A avaliação de sucesso cirúrgico com relação ao tipo de lesão (mono ou bicanalicular), tempo transcorrido entre o diagnóstico e a cirurgia e o tempo de permanência do tubo de silicone mostrou que, para as três variáveis estudadas, não houve relevância estatística (p>0,05) (Tabela 3).

Tabela 3
Associação de variáveis de interesse e sucesso no tratamento das lesões canaliculares segundo teste Zappia-Milder realizado no pós-operatório

DISCUSSÃO

Os portadores de laceração canalicular atendidos em nosso serviço possuem perfil semelhante ao que a literatura estabelece, sendo maior o acometimento de indivíduos do sexo masculino e adultos jovens.(22 Tavakoli M, Karimi S, Behdad B, Dizani S, Salour H. Traumatic canalicular laceration repair with a new monocanalicular silicone tube. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2017;33(1):27-30.,33 Naik MN, Kelapure A, Rath S, Honavar SG. Management of canalicular lacerations: epidemiological aspects and experience with Mini-Monoka monocanalicular stent. Am J Ophthalmol. 2008;145(2):375-380.,1010 Lee H, Chi M, Park M, Baek S. Effectiveness of canalicular laceration repair using monocanalicular intubation with Monoka tubes. Acta Ophthalmol. 2009;87(7):793-6.)

Encontramos mais traumatismos canaliculares decorrentes de ferimentos cortantes (65,4%). Apesar dos traumatismos cortantes serem mais encontrados em crianças,(33 Naik MN, Kelapure A, Rath S, Honavar SG. Management of canalicular lacerations: epidemiological aspects and experience with Mini-Monoka monocanalicular stent. Am J Ophthalmol. 2008;145(2):375-380.,1111 Alhammad F, Ferreiro AG, Alhammad F, Galindo-Ferreiro A, Khandekar R, Al-Sheikh O, et al. Management outcomes of canalicular laceration in children. Saudi J Ophthalmol. 2020;34(2):101-6.,1212 Murchison AP, Bilyk JR. Canalicular laceration repair: An analysis of variables affecting success. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2014;30(5):410-14.) em nossos pacientes eles predominaram em adultos jovens (65,4%). Os traumatismos contusos estão associados às lesões canaliculares em cerca de 35,8%(44 Bai F, Tao H, Zhang Y, Wang P, Han C, Huang YF, et al. Old canalicular laceration repair: a retrospective study of the curative effects and prognostic factors. Int J Ophthalmol. 2017;10(6):902-907.) ou 66,7%,(1111 Alhammad F, Ferreiro AG, Alhammad F, Galindo-Ferreiro A, Khandekar R, Al-Sheikh O, et al. Management outcomes of canalicular laceration in children. Saudi J Ophthalmol. 2020;34(2):101-6.) sendo mais comuns em adultos.(1313 Amit R, Sahil T, Sudesh AK, Prem K, Upasna S. Canalicular lacerations in tertiary eye hospital: our experience with monocanalicular stents. Rom J Ophthalmol. 2020;64(2):146-52.,1414 Chowdhury HR, Rose GE, Ezra DG. Long-term outcomes of monocanalicular repair of canalicular lacerations. Ophthalmology. 2014;121(8):1665-6.)

O canalículo superior foi o mais acometido na nossa amostra, embora outros reportem o acometimento do canalículo inferior como mais frequente.(11 Guo T, Qin X, Wang H, Lu Y, Xu L, Ji J, et al. Etiology and prognosis of canalicular laceration repair using canalicular anastomosis combined with bicanalicular stent intubation. BMC Ophthalmol. 2020;20(1):246.,33 Naik MN, Kelapure A, Rath S, Honavar SG. Management of canalicular lacerations: epidemiological aspects and experience with Mini-Monoka monocanalicular stent. Am J Ophthalmol. 2008;145(2):375-380.) Essa divergência pode ser justificada pelo mecanismo do traumatismo envolvido na região do estudo.

Importante destacar que o globo ocular apresentava ferimento concomitante em 7,7% dos nossos pacientes, fato já destacado por outros,(44 Bai F, Tao H, Zhang Y, Wang P, Han C, Huang YF, et al. Old canalicular laceration repair: a retrospective study of the curative effects and prognostic factors. Int J Ophthalmol. 2017;10(6):902-907.,1212 Murchison AP, Bilyk JR. Canalicular laceration repair: An analysis of variables affecting success. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2014;30(5):410-14.) realçando a necessidade de um exame oftalmológico minucioso em todos os portadores de traumatismo canalicular.

O reparo da lesão deve ser feito preferencialmente sob anestesia geral, como realizado em todos os nossos pacientes, uma vez que a infiltração de anestésicos locais pode alterar a anatomia e dificultar o reconhecimento das delicadas estruturas do sistema de drenagem lacrimal.(1515 Lorena SH, Silva JAF. Laceração canalicular: a utilização do bastão de Veirs modificado. Rev Bras Oftalmol. 2013;72(6):411-4.)

A tensão de força horizontal do músculo orbicular sobre o canalículo lacerado, associada ao efeito gravitacional, faz com que seja mais difícil manter um bom fechamento das lesões.(1111 Alhammad F, Ferreiro AG, Alhammad F, Galindo-Ferreiro A, Khandekar R, Al-Sheikh O, et al. Management outcomes of canalicular laceration in children. Saudi J Ophthalmol. 2020;34(2):101-6.,1616 Wu S-Y, Ma L, Chen RJ, Tsai YJ, Chu YC. Analysis of bicanalicular nasal intubation in the repair of canalicular lacerations. Jpn J Ophthalmol. 2010;54(1):24-31.) Dessa forma, durante o reparo cirúrgico, deve-se dar especial atenção ao alinhamento palpebral.

Todos os nossos pacientes tiveram sutura e intubação temporária dos canalículos com fio de silicone, a fim de manter a funcionalidade do sistema lacrimal, prevenindo a ocorrência de obstrução do lúmen canalicular durante o processo de cicatrização.(55 Maheshwari RD, Maheshwari M. Annular intubation with pigtail probe for canalicular lacerations. Indian J Ophthalmol. 2020;68(10):2166-9.) A intubação pode ser mono ou bicanalicular, a depender da extensão e da localização da lesão. A grande discussão fica centrada na forma como essa abordagem deve ser realizada.(11 Guo T, Qin X, Wang H, Lu Y, Xu L, Ji J, et al. Etiology and prognosis of canalicular laceration repair using canalicular anastomosis combined with bicanalicular stent intubation. BMC Ophthalmol. 2020;20(1):246.,44 Bai F, Tao H, Zhang Y, Wang P, Han C, Huang YF, et al. Old canalicular laceration repair: a retrospective study of the curative effects and prognostic factors. Int J Ophthalmol. 2017;10(6):902-907.) Se a lesão for monocanalicular, intubar os dois canalículos poderá causar dano ao canalículo não envolvido, propiciar a formação de granuloma e, se realizada com a sonda de Crawford, levar a irritação nasal crônica,(44 Bai F, Tao H, Zhang Y, Wang P, Han C, Huang YF, et al. Old canalicular laceration repair: a retrospective study of the curative effects and prognostic factors. Int J Ophthalmol. 2017;10(6):902-907.) além de haver indivíduos que não possuem o canalículo comum (cerca de 10% da população).(55 Maheshwari RD, Maheshwari M. Annular intubation with pigtail probe for canalicular lacerations. Indian J Ophthalmol. 2020;68(10):2166-9.) Já na intubação monocanalicular, a desvantagem seria o maior risco de extubação prematura.(1010 Lee H, Chi M, Park M, Baek S. Effectiveness of canalicular laceration repair using monocanalicular intubation with Monoka tubes. Acta Ophthalmol. 2009;87(7):793-6.)

No presente estudo, predominaram as reconstruções com intubação bicanalicular usando o pig tail, outra conduta discutível, havendo os que entendem que o pig tail se associa com maior extensão de lesão já existente. Entretanto, apesar da intubação com a sonda de Crawford ser considerada menos traumática, esta deve ser recuperada na fossa nasal, manobra que, dependendo de alterações nasais existentes, pode ser difícil.

Adotamos como definição de sucesso o resultado do teste de Zappia-Milder. Outras definições que poderiam ser adotadas seriam o sucesso anatômico, considerando a patência das vias lacrimais pela irrigação das vias lacrimais com soro fisiológico ou o sucesso funcional, observando-se a ausência de epífora.(1717 Singh S, Ganguly A, Hardas A, Tripathy D, Rath S. Canalicular lacerations: Factors predicting outcome at a tertiary eye care Centre. Orbit. 2017;36(1):13-8.)

O sucesso cirúrgico com relação ao tempo transcorrido entre o diagnóstico da laceração canalicular e seu reparo não foi estatisticamente significativo, apesar de que a maioria de nossas cirurgias foi realizada no prazo considerado ideal, com intervalo entre 24 até 72 horas para a realização da reconstrução cirúrgica, tempo que permite melhor visibilização anatômica pela redução do edema presente nas primeiras 24 horas após o traumatismo.(1212 Murchison AP, Bilyk JR. Canalicular laceration repair: An analysis of variables affecting success. Ophthalmic Plast Reconstr Surg. 2014;30(5):410-14.) Cirurgias realizadas após 72 horas podem ter resultados menos favoráveis, devido à formação de tecido cicatricial, dificultando a identificação do canalículo.(77 Chu YC, Wu SY, Tsai YJ, Liao YL, Chu HY. Early versus late canalicular laceration repair outcomes. Am J Ophthalmol. 2017;182:155-9.,1818 Tint NL, Alexander P, Cook AE, Leatherbarrow B. Eyelid avulsion repair with bi-canalicular silicone stenting without medial canthal tendon reconstruction. Br J Ophthalmol. 2011;95(10):1389-92.)

O sucesso cirúrgico também não esteve relacionado ao tempo de permanência do tubo de silicone. O período que o mesmo deve ser mantido na via lacrimal diverge muito entre os estudos, podendo variar de 6 semanas até 1 ano.(33 Naik MN, Kelapure A, Rath S, Honavar SG. Management of canalicular lacerations: epidemiological aspects and experience with Mini-Monoka monocanalicular stent. Am J Ophthalmol. 2008;145(2):375-380.) Nossa conduta é a manutenção do silicone por 2 meses, havendo indicação de período mínimo 3 meses por outros.(1818 Tint NL, Alexander P, Cook AE, Leatherbarrow B. Eyelid avulsion repair with bi-canalicular silicone stenting without medial canthal tendon reconstruction. Br J Ophthalmol. 2011;95(10):1389-92.,1919 Alam MS, Mehta NS, Mukherjee B. Anatomical and functional outcomes of canalicular laceration repair with self-retaining mini-MONOKA stent. Saudi J Ophthalmol. 2017;31(3):135-9.)

Apesar das nossas cirurgias terem sido realizadas por cirurgiões em treinamento sob supervisão, um número considerável de pacientes (80,8%) obteve sucesso com o tratamento empregado. O sucesso do tratamento do traumatismo canalicular depende especialmente da localização da lesão, do material empregado na reconstrução, da técnica utilizada e do tempo transcorrido entre o traumatismo e a cirurgia.(33 Naik MN, Kelapure A, Rath S, Honavar SG. Management of canalicular lacerations: epidemiological aspects and experience with Mini-Monoka monocanalicular stent. Am J Ophthalmol. 2008;145(2):375-380.)

CONCLUSÃO

As lesões de canalículo encontradas em nossa prática são mais comuns em crianças ou homens jovens, acometem mais o canalículo superior e as nossas condutas levam a sucesso no tratamento da maior parte dos casos. As grandes controvérsias no assunto permanecem, sendo necessários mais estudos com grandes amostras para consolidação dos conceitos.

  • Instituição de realização do trabalho: Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Botucatu, SP, Brasil.
  • Fonte de auxílio à pesquisa: não financiado.

AGRADECIMENTOS

À Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" e a todo seu corpo docente, pelo suporte na realização deste estudo, e aos pacientes que participaram desta pesquisa, pela confiança em nosso trabalho.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    05 Jan 2023
  • Aceito
    12 Dez 2023
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