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Pandemias e infância: um olhar para a pequena infância nas crises sanitárias (1918-2020) na perspectiva da cultura material

Pandemics and childhood: a look at young childhood in health crises (1918-2020) from the perspective of material culture

Pandemias e infancia: una mirada a la primera infancia en crisis de salud (1918-2020) desde la perspectiva de la cultura material

Resumo

O presente artigo aborda como as relações e concepções higienistas de saúde e assistência - fundantes da creche enquanto instituição de atendimento à infância - retornam no cenário da pandemia da Covid-19 e se instituem em documentos e na cultura material que permeia a educação infantil. Para tanto, analisam-se as medidas e os protocolos de enfrentamento à Gripe Espanhola, no interior de uma instituição para crianças pequenas na cidade de São Paulo (1918), e o atendimento em Centros de Educação Infantil no município de Campinas-SP durante a pandemia da Covid-19, no ano de 2021. Ao examinar as orientações sanitárias e práticas estabelecidas, compreende-se que a cultura escolar se modifica, compondo uma nova materialidade que preconiza a saúde e o higienismo, em detrimento das ações e dos princípios pedagógicos da educação infantil.

Palavras-chave:
história da educação; cultura escolar material; educação infantil; pandemia

Abstract

This article discusses how hygienist relationships and conceptions of health and assistance - foundations of day care as an institution for childcare - return in the scenario of the Covid-19 pandemic and are instituted in documents and in the material culture that permeates early childhood education. To this end, measures and protocols for coping with the Spanish flu are analyzed, within an institution for young children in the city of São Paulo (1918), and the care provided at Child Education Centers in the city of Campinas-SP during the pandemic of Covid-19, in the year 2021. When examining the established health guidelines and practices, it is understood that the school culture changes, composing a new materiality that advocates health and hygiene, to the detriment of actions and pedagogical principles of early childhood education.

Keywords:
history of education; material school culture; child education; pandemic

Resumen

Este artículo discute cómo las relaciones higienistas y las concepciones de salud y asistencia - fundadoras de la guardería como institución de cuidado infantil - retornan en el escenario de la pandemia de la Covid-19 y se instituyen en los documentos y en la cultura material que permea desde temprano educación infantil. Para ello, se analizan medidas y protocolos de enfrentamiento a la gripe española, en una institución para niños pequeños de la ciudad de São Paulo (1918), y la atención prestada en los Centros de Educación Infantil de la ciudad de Campinas-SP durante la pandemia de la Covid-19, en el año 2021. Al examinar las pautas y prácticas sanitarias establecidas, se entiende que la cultura escolar cambia, componiendo una nueva materialidad que aboga por la salud y la higiene, en detrimento de las acciones y principios pedagógicos de la educación infantil.

Palabras clave:
historia de la educación; cultura material escolar; educación infantil; pandemia

Introdução

No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou que a disseminação do coronavírus (Covid-19), doença infecciosa causada pelo vírus sars cov 2, atingiu o nível de pandemia1 1 De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), pandemia é a disseminação global de uma nova doença, e o termo é empregado quando uma epidemia, surto que afeta uma região, se espalha por diferentes continentes e com transmissão sustentada de pessoa para pessoa. . Dentre as ações realizadas pelos países na tentativa de conter a propagação da Covid-19, estava o fechamento de instituições educativas, visando evitar aglomerações, medida de contenção adotada por diversos governos.

No Brasil, tal iniciativa foi marcada por uma série de divergências e dissonâncias político-sanitárias que impactaram o enfrentamento à doença, elevaram sobremaneira o número de infectados e mortos no país e comprometeram o acesso da população aos direitos fundamentais como saúde e educação. No que concerne ao sistema educacional, vimos a interrupção das atividades presenciais desde a educação infantil à pós-graduação, com a retomada gradativa do atendimento a partir de 2021. O retorno presencial às escolas ocorreu após o início tardio da vacinação da população brasileira pelo Sistema Único de Saúde (SUS), associado à criação de uma série de protocolos sanitários que tentaram conter a circulação do vírus.

Nesse sentido, o presente artigo apresenta uma análise sobre os protocolos sanitários instituídos em duas escolas de educação infantil do município de Campinas-SP (2021), cotejando-os com as medidas de combate à pandemia da Gripe Pneumônica, conhecida como ‘Gripe Espanhola’, em uma instituição de atendimento à pequena infância na cidade de São Paulo-SP em 19182 2 Considerada uma das epidemias mais letais da história, a Gripe Pneumónica foi causada pela virulência incomum de uma estirpe do vírus Influenza A, do subtipo H1N1, e alastrou-se pelo mundo no contexto da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A denominação ‘gripe espanhola’ foi cunhada devido ao fato de muitas das informações a respeito da doença terem sido transmitidas pela imprensa da Espanha. . A mirada histórica busca refletir acerca das práticas higienistas adotadas pelas unidades escolares em ambos os contextos de enfrentamento às pandemias, delineando mudanças e permanências no atendimento à infância em cada um dos cenários retratados.

Para tanto, utiliza-se como fonte material do tempo presente os documentos produzidos pelas duas instituições educacionais, bem como as normativas técnico-sanitárias-governamentais que regularam o cotidiano de retomada ao atendimento presencial para bebês e crianças pequenas. Dentre as fontes documentais investigadas do passado, estão as atas de reuniões e fotografias de materiais datados do início do século XX, pertencentes ao acervo da centenária instituição de atendimento à infância paulistana, cuja análise foi aliada aos relatórios sanitários e demais informações sobre a Gripe Pneumónica veiculadas pela imprensa da época.

O diálogo com a cultura material segue o percurso metodológico apresentado por Escolano Benito (2017Escolano Benito, A. (2017). A escola como cultura. Experiência, memória e arqueologia. Campinas, SP: Alínea.), na construção de uma etno-história das instituições educativas. Esta perspectiva estabelece relações entre passado e presente sob uma perspectiva não linear de rupturas e permanências históricas presentes no cotidiano das instituições. Desse modo, as questões teórico-metodológicas propostas pelo autor nutrem o trabalho investigativo realizado a partir da materialidade presente nos espaços educativos, num caminho semelhante ao do arqueólogo que vai, pouco a pouco, desvelando as camadas de seu objeto.

Nessa perspectiva, as contribuições do que se denomina História Cultural trouxeram novas formas de pensar o sujeito histórico, ao passo que as pesquisas e os estudos deste campo passaram a questionar antigas concepções epistemológicas acerca do conhecimento. Segundo Pesavento (2005Pesavento, S. J. (2005). História e história cultural. Belo Horizonte, MG: Autêntica.), a História Cultural promoveu uma mudança epistemológica ao deslocar o olhar do historiador, por intermédio dos conceitos de representação, narrativa, sensibilidades, imaginário e ficção. No prisma da História Cultural,

[...] as representações construídas sobre o mundo não só se colocam no lugar deste mundo, como fazem com que os homens percebam a realidade e pautem a sua existência. São matrizes geradoras de condutas e práticas sociais, dotadas de força integradora e coerciva, bem como explicativa do real. Indivíduos e grupos dão sentido ao mundo por meio das representações que constroem sobre a realidade (Pesavento, 2005Pesavento, S. J. (2005). História e história cultural. Belo Horizonte, MG: Autêntica., p. 39).

Assim, as fontes de pesquisa também passam a ser problematizadas, já que os grandes manuais e documentos prescritivos pareciam não possibilitar a aproximação com esse novo sujeito que constrói a partir de representações sobre o mundo e sua realidade. Dessa forma, fotografias, materiais e documentos produzidos em contextos específicos compõem um novo arcabouço de pesquisa, rico em informações sobre as práticas sociais, emergindo daí um novo fazer histórico e um novo historiador. Cabe ressaltar o que Jacques Le Goff (1990Le Goff, J. (1990). História e memória. Campinas, SP: Editora da Unicamp.) nos chama a atenção sobre a neutralidade no processo de investigação: tanto o documento quanto o historiador não são neutros e ambos trazem consigo marcas da sociedade de seu tempo. Todo documento produzido atende a uma finalidade específica associada aos entendimentos e práticas estabelecidas pelos sujeitos de seu contexto, dado que destaca a necessidade de análise sobre as condições de produção de tais fontes de pesquisa.

Na educação, tanto os objetos quanto os documentos que possibilitam certa aproximação com o passado das instituições educativas passam a ser investigados de um modo que seus sentidos são produzidos à medida que o pesquisador passa a relacionar as instituições com seus contextos sociais de atuação. Outra vez, o referencial teórico apresentado por Escolano Benito (2017Escolano Benito, A. (2017). A escola como cultura. Experiência, memória e arqueologia. Campinas, SP: Alínea.), com o termo ‘etno-história’ das instituições educativas, instiga uma aproximação entre o fazer-histórico com o movimento do arqueólogo que, ao entrar em contato com um objeto, investiga suas diversas camadas, formas de uso, produção e possíveis representações. Para o citado autor, neste entendimento “[...] o novo sujeito, que nasce da conjunção entre memória e arqueologia, é sob esse ponto de vista o elemento estruturante de toda a cultura da escola, que adquire, assim, uma dimensão antropológica” (Escolano Benito, 2017, p. 224). Nesse sentido, denomina objetos-vestígios (objetos-huella) os materiais que, ao serem relacionados com seu contexto de produção e uso, trazem representações e significados importantes para a compreensão de práticas do passado. Neste processo o historiador-arqueólogo escava a história desse objeto para

[...] decifrar nas próprias coisas - e também em suas representações textuais ou icônicas - os códigos secretos que as regulamentam e, ao mesmo tempo, regulam suas continuidades e transformações. Fazer falar essas materialidades leva a abrir a memória que nelas está inserida e a intuir ou explicitar os discursos que as constituíram (Escolano Benito, 2017Escolano Benito, A. (2017). A escola como cultura. Experiência, memória e arqueologia. Campinas, SP: Alínea., p. 225).

Assim, a análise produzida neste artigo utiliza fontes do acervo de uma instituição de educação infantil denominada ‘Creche Baroneza de Limeira’ (CBL), localizada na cidade de São Paulo, um local de atendimento à infância que surgiu no início do século XX e que se coloca como representante de um modelo social de cuidados para com as crianças pobres da época. O acervo material da instituição, junto com as atas de reuniões e o conhecimento acerca do contexto social da época, possibilitam refletir sobre o modo pelo qual, em 1918, as práticas de atendimento à infância relacionadas à Gripe Pneumónica foram implementadas através de ações higienistas e de assistência. Nesse sentido, identificam-se permanências e similaridades de tais práticas no trabalho realizado na educação infantil quando do enfrentamento da pandemia de Covid-19. A contextualização das duas creches, a análise das práticas higiênico-sanitárias adotadas e o exame das normativas e protocolos instituídos no retorno do atendimento presencial em meio à pandemia da Covid-19 nos auxiliam na compreensão do atendimento da educação infantil em tempos de pandemia.

Por fim, as relações estabelecidas entre a atuação dessas instituições em distintos períodos pandêmicos refletem as permanências relacionadas às práticas higienistas, os diferentes entendimentos acerca do cuidado com crianças pequenas e os impactos da instituição de ‘Protocolos de Infância’ nos contextos de crises sanitárias. À luz do campo teórico metodológico da cultura material e da etno-história das instituições educativas, a discussão se inclina às questões relacionadas às práticas pedagógicas da educação infantil ao longo da história e problematiza as interferências do campo médico-higienista como elemento constituinte do fazer educacional, expresso pela marcada preocupação com o controle, a limpeza e a higienização dos corpos infantis.

A Creche Baroneza de Limeira como representante de um modelo social

As pesquisas históricas indicam o ano de 1899 como marco temporal de fundação da primeira creche no Brasil. Tal criação se deu por intermédio de uma iniciativa privada, no interior de uma fábrica de tecidos, na cidade do Rio de Janeiro-RJ, com o objetivo de atender bebês em fase de amamentação, filhos das mulheres trabalhadoras (Kuhlmann Jr., 1998Kuhlmann Jr., M. (1998). Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre, RS: Mediação.). Contudo, antes disso, a ideia de uma instituição de atendimento à primeira infância, cujo caráter se diferenciava dos asilos e orfanatos existentes à época, já circulava na sociedade brasileira, uma vez que, na Europa, as creches já eram uma realidade. Em seus estudos sobre a temática, Caroli (2017Caroli, D. (2017). Day nurseries & childcare in Europe, 1800-1939. Macerata, IT: Palgrave Mcmillan.) destaca que:

Com o crescente emprego de mão-de-obra feminina em cidades e fábricas em meados do século XIX, a necessidade de cuidados infantis tornou-se aparente em vários países europeus. Até então, as crianças pequenas tinham sido, em geral, entregues a amas de leite e babás, ou até mesmo abandonados em hospitais que recebiam os enjeitados por mães, tanto solteiras quanto casadas. Aceitando apenas bebês legítimos, a primeira creche foi estabelecida na França. Ancestral da escola maternal, no primeiro século de sua existência essa instituição não seria, como hoje, um estabelecimento educacional para crianças muito pequenas, mas sim um local que oferecia assistência e cuidados aos recém-nascidos na tentativa de prevenir o abandono e a mortalidade infantil (Caroli, 2017Caroli, D. (2017). Day nurseries & childcare in Europe, 1800-1939. Macerata, IT: Palgrave Mcmillan., p. XIII).

No Brasil, o início do século XX foi marcado pelo aumento populacional nos grandes centros urbanos, dado que ocasionou uma série de problemas sociais, dentre eles o desemprego, a pobreza, as altas taxas de mortalidade e o abandono infantil. Neste contexto, a elite da sociedade brasileira, passa a atuar nos problemas sociais emergentes e criam instituições sociais que, em certa medida, higienizam as cidades e promovem o ordenamento e controle da população pobre. Temos nesse período uma profusão de ações associadas à preocupação de ordem demográfica e sanitária, dentre elas se destacam as que atuaram para garantir a sobrevivência das crianças, a qualificação da alimentação da população e a criação de instituições de assistência social. Segundo Sidney Chalhoub (1996Chalhoub, S. (1996). Trabalho, lar e botequim. O cotidiano dos trabalhadores no Rio de Janeiro da Belle Époque. São Paulo, SP: Brasiliense.), o raciocínio oitocentista demonstrado na preocupação das classes privilegiadas com o controle das ‘classes perigosas’ tem raízes profundas na cultura e política brasileira. Há no Brasil uma forte tendência de correlação da pobreza aos vícios e, como consequência, ao perigo social, figurando o pobre como sujeito perigoso.

Nesse movimento, a criação de creches ganhou força, e uma série de instituições de caráter assistencial e caritativo subsidiaram o atendimento de bebês e crianças pobres, através de ações de fundação e financiamento por parte de representantes da igreja, médicos higienistas e membros da oligarquia cafeeira. Dentre essas iniciativas, destaca-se a Creche Baroneza de Limeira, fundada em 1911 por Paulina de Souza Queiroz, filha do Barão de Limeira, que dedicou sua vida à obra3 3 A tese de Oliveira (2020) aborda, pela perspectiva da história cultural da educação, o surgimento das creches no Brasil a partir do acervo documental, dos artefatos e do espaço edificado da Creche Baroneza de Limeira, em São Paulo. A pesquisa investiga como as práticas de atendimento à infância são representadas, tomando a cultura material como um dos seus elementos fundamentais e percebendo como os artefatos contribuem para configurar formas de educar as crianças em um ambiente institucionalizado. . A instituição tinha por objetivo inicial abrigar bebês e crianças pequenas com até seis anos de idade, durante o período de trabalho de suas mães e pais.

Ainda que a iniciativa de atender filhos de mulheres trabalhadoras durante o dia representasse o principal propósito da instituição, as demandas da cidade que perpassavam questões relacionadas à mortalidade infantil, à taxa elevada de desnutrição e ao abandono de bebês e crianças, fizeram com que o atendimento da creche fosse alterado e ampliado. Assim, logo nos primeiros anos de funcionamento, ela passa a atuar como um internato, visto que muitas das crianças eram abandonadas pelas famílias, ou eram deixadas durante a semana nas creches, retirando-as aos sábados com retorno subsequente aos domingos. Apesar disso, a nomenclatura creche foi mantida pela instituição.

Cabe pontuar que a Creche Baroneza de Limeira permanece em atividade nos dias de hoje e, durante sua história centenária, o seu modelo de atendimento foi alterado, à medida que que a educação infantil se modificou em razão de questões de âmbito social e político educacional. Assim, o modelo de internato, por exemplo, funcionou durante praticamente todo o século XX, até o momento em que a educação infantil passou a integrar a educação básica, sendo regulada por um arcabouço legal que a desvinculou da assistência social enquanto atividade fim.

A pandemia da Gripe Espanhola em São Paulo em 1918 e a Creche Baroneza de Limeira

O arquivo da Creche Baroneza de Limeira (CBL) dispõe de documentos que tratam tanto da história da instituição quanto da relação dela com a cidade de São Paulo, bem como das demandas sociais com as quais ela dialogou ao longo de seu funcionamento. Nesta análise, o recorte temporal estabelecido focaliza as atas de reuniões do ano de 1918, momento em que a Gripe Espanhola foi identificada no Brasil e São Paulo se notabilizou como uma das cidades com maior número de infectados.

A dinâmica de funcionamento da creche previa reuniões mensais, nas quais os diretores da instituição discutiam temas como: a entrada de novas crianças; a situação sanitária da cidade e da creche; o número e tipos de doenças pelas quais as crianças internas eram acometidas; as doações angariadas; as compras realizadas, dentre outros. As atas registradas de forma manuscrita em cadernos brochuras possuem informações que retratam o cotidiano desta instituição centenária com alto teor de detalhamento. No que se refere à Gripe Espanhola, o fragmento a seguir apresenta a ata do mês de outubro de 1918 e descreve parte da dinâmica de ajuste do cotidiano da creche em virtude da pandemia:

Foram vendidos os bilhetes da rifa de um casal de aves de raça que ficou da kermesse, não tendo sido efetivada a extracção, adiada para o próximo mês, devido à epidemia da grippe. Por esse mesmo motivo foram suspensas as reuniões semanais da Diretoria. Atendendo às prescrições do Serviço Sanitário, a ninguém mais foi permitido a entrada ou saída da creche a não ser aos dois entregadores de leite esterilizado a domicilio, e assim deseja o Dr. Brandão, interessado em evitar todo e qualquer contato exterior na esperança de salvaguardar do contágio as crianças abrigadas no estabelecimento (CBL, 1918a)4 4 A grafia da época foi preservada nas transcrições das atas. .

Podemos analisar o registro da reunião de outubro de 1918 por uma série de perspectivas. Desde a venda dos bilhetes de uma rifa para pessoas da elite paulista, ação que demarca práticas caritativas comuns à época, até a questão da prioridade à entrega do leite para as crianças cadastradas no serviço do ‘Gotta de Leite’, atividade que compôs parte das ações filantrópicas da creche5 5 Sobre a Gotta de Leite: assim como a creche, era um modelo institucional de atendimento à infância importado da Europa. A primeira Gotta de Leite da cidade de São Paulo foi fundada em 1905 e fornecia leite esterilizado às famílias pobres. Quando a CBL foi criada, em 1911, vinculou-se à Gotta de Leite, sendo ambas localizadas no mesmo prédio. . Contudo, o contexto da pandemia da Gripe Pneumônica se apresenta como fator decisivo na alteração das práticas no interior da creche. A preocupação com o contágio era tamanha, que o serviço médico-sanitário da Creche Baroneza de Limeira proibiu que as crianças e os funcionários deixassem o estabelecimento, na tentativa de evitar qualquer contato com pessoas e ambientes alheios ao controle da instituição, para assim reduzir as chances de contaminação.

A medida de confinamento parece ter sido crucial. A creche funcionava como um internato onde as crianças residiam, e o fato de haver muitas delas em um mesmo local (as atas registram em média o atendimento de 60 crianças por mês), somado ao potencial fluxo de concentração de pessoas, poderia torná-lo um ambiente de disseminação do vírus.

Além da proibição do contato externo à creche, à ocasião da epidemia, vale ressaltar que o viés higienista já demarcava algumas práticas dentro da instituição. A exemplo disso, destacamos a existência de uma sala específica denominada ‘sala de isolamento’. A partir de um modelo hospitalar, o espaço tinha como objetivo tanto isolar alguma criança que já frequentava a creche e por ventura manifestasse algum sintoma que pudesse indicar qualquer doença infectocontagiosa quanto colocar em uma espécie de quarentena as crianças recém-chegadas que, antes de ter contato com as demais, deveriam ter atestada a sua condição de saúde, de modo a não representar risco sanitário ao ambiente da instituição. Tempos depois, vemos que o conceito de isolamento retorna em um outro formato, durante a pandemia da Covid-19, como será ressaltado posteriormente neste texto.

Ao retomar o contexto da Gripe Espanhola, o último trimestre do ano de 1918 representou o período mais crítico da pandemia na cidade de São Paulo. A análise de Queiroz (2004Queiroz, R. S. (2004). As epidemias como fenômenos sociais totais: o surto de gripe espanhola em São Paulo (1918). Revista USP, (63), 64-73. Recuperado de: https://doi.org/10.11606/issn.2316-9036.v0i63p64-73
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9036....
) sobre a emergência da Gripe Espanhola na capital destacou que, entre os meses de outubro a dezembro de 1918, cerca de 5.200 pessoas vieram a óbito em decorrência da doença na cidade que, à época, tinha por volta de 523 mil habitantes. Esse cenário foi referenciado nos documentos do acervo da Creche Baroneza de Limeira, quando a escalada do número de casos em São Paulo impactou o atendimento da creche e alterou sua dinâmica de funcionamento, tal qual ocorrera com a realização da reunião mensal da instituição:

A reunião mensal da diretoria não pode ser realizada no mês de novembro de 1918 em virtude da epidemia que assola ainda a nossa capital. O mal reinante não permitiu que deixasse o estabelecimento a ama Maria Sposito que devia sair no último dia de outubro (CBL, 1918b).

Mesmo com as medidas de contenção elaboradas e os protocolos sanitários estabelecidos, a instituição menciona em seus registros casos de contaminação dos médicos que trabalhavam na instituição:

O primeiro médico a ser atingido pela gripe foi o Dr. Brandão. O caráter benigno da moléstia permitiu porém que ele durante os dias de afastamento do serviço médico respondesse sempre a consultas da irmã superiora pelo telefone quando aparecia alguma criança com pequenos incômodos. Logo após o Dr. Brandão foi atacado pelo mal reinante o Dr. Octávio, que depois de um mês conseguiu reestabelecer-se apesar da gravidade da moléstia (novembro 1918) (CBL, 1918b).

Relatos como esse, à luz da metodologia proposta por Escolano Benito (2017Escolano Benito, A. (2017). A escola como cultura. Experiência, memória e arqueologia. Campinas, SP: Alínea.), possibilitam a reflexão sobre a importância desse acervo documental como representante de um período histórico. Por intermédio dele, podemos nos aproximar das práticas realizadas no interior de uma instituição cujo contexto foi fortemente marcado pela epidemia da Gripe Espanhola. As mudanças na dinâmica de funcionamento da creche são tão significativas, que a instituição que assumia dentre seus objetivos prestar abrigo e assistência à infância pobre, diante do surto de Gripe, proíbe todo e qualquer contato das crianças com o mundo externo (inclusive com seus pais, que as visitavam semanalmente), na tentativa de evitar o contágio, como destacado na ata do mês de dezembro de 1918:

Desde o princípio do corrente mes, começaram as Irmãs e o pessoal da Creche a sair, tendo sido suspensa a reclusão observada até então, reclamada pela epidemia que devastou a nossa Capital e cujo declínio permitiu neste mes as visitas dos pais aos filhos internados na Creche, no primeiro domingo de cada mes (CBL, 1918c).

Ainda que outros excertos de documentos do acervo da instituição assinalem a preocupação com outras doenças infectocontagiosas (catapora, por exemplo), o aparecimento de um vírus da Gripe Espanhola, capaz de aumentar as taxas de mortalidade na cidade, representou à época o enfrentamento a um ‘inimigo’ até então desconhecido. O relatório anual de atividades da creche compila alguns dos números relacionados à mortalidade no contexto da Gripe:

Este anno passado particularmente a mortalidade, nesta cidade, excedeu as dos demais anos, registrando-se numa semana do mês de dezembro 146 óbitos de menores de dois anos! Entretanto, a mortalidade da creche, nesse ano conquanto maior que a dos anos anteriores (em 1918 foram 6 no ano todo), acusou somente 10 falecimentos em todo o ano; pois tivemos no começo do ano de 1919 a visita da famosa ‘hespanhola’ (CBL 1919, p. 12, grifo do autor).

As práticas de isolamento e restrições no contato social, realizadas na CBL, relacionam-se não apenas com o contexto da epidemia, como também com o cenário de criação desse modelo de atendimento à infância pobre. Como mencionado anteriormente, o aumento populacional nos grandes centros urbanos, acrescido à alta taxa de abandono e mortalidade infantil, acabaram por moldar um trabalho que, embora tivesse um modelo educativo a ser inculcado, baseado na moral cristã, primou pela assistência à infância nos aspectos de saúde e higiene no atendimento prestado. A relação do atendimento à pequena infância com o campo médico-higienista tem um teor tão acentuado, que um ano antes da emergência da pandemia da Gripe, a instituição preconizou a criação de um laboratório médico em suas dependências,

Dr. Raphael Sampaio está organizando um laboratório para pequenas cirurgias, afim de evitar o incoveniente de serem as crianças sempre submetidas para o Hospital da Santa Casa. O primeiro tratamento será feito no pé do pequeno Moisés e no dedo de um outro menino. Doutor propõem-se a angariar donativos para esse laboratório, facilitando em tudo que puder para que a sua ação e custeio não pesem aos cofres da Sociedade, a cujo cargo só ficarão as despesas de instalação de água e luz (CBL, 1917).

O conjunto de fontes pertencentes ao acervo é composto por uma coleção de fotografias que, embora sem datas, quando cotejadas com atas e relatórios de atividades, possibilitam inferir seus possíveis períodos de produção. Dentre elas, a imagem de um médico em uma instalação que apresenta toda uma materialidade de um laboratório (aparelho microscópio, vidrarias que se assemelham a utensílios usados para medicamentos ou até mesmo para pesquisa de misturas, paredes azulejadas, dentre outros) indica que havia a intenção, por parte da creche, de divulgar um tipo específico de atendimento que ocorria no local. Provavelmente, estas seriam as instalações citadas na ata de 1917. A imagem a seguir (Figura 1) traz elementos que nos ajudam a compreender a presença do campo médico-higienista em meio às práticas cotidianas da instituição.

Figura 1
Médico em atuação no laboratório da creche.

A análise iconográfica vai ao encontro de uma nova história promovida pela guinada da História Cultural, tal como mencionada no início do texto, e dos trabalhos de Dussel (2019Dussel, I. (2019). Fotos encontradas en el archivo. Aproximaciones al trabajo con imágenes a propósito de un álbum amateur sobre juegos infantiles (Argentina, fines del siglo XI). Historia y Memoria de la Educación, 10, 51-89.), os quais colaboram para a discussão sobre tal fonte de pesquisa. Para a autora,

Nessas novas perspectivas historiográficas, a fotografia como documento histórico não é mais considerada como a porta de entrada para um encontro direto e imediato entre presente e passado. A investigação de documentos fotográficos significa mergulhar em uma combinação de tecnologias, impulsos arquivísticos, signos e corpos que carregam olhares e temporalidades heterogêneas (Dussel, 2019Dussel, I. (2019). Fotos encontradas en el archivo. Aproximaciones al trabajo con imágenes a propósito de un álbum amateur sobre juegos infantiles (Argentina, fines del siglo XI). Historia y Memoria de la Educación, 10, 51-89., p. 58, tradução nossa)6 6 “En estas nuevas perspectivas historiográficas, la fotografía como documento histórico ya no es considerada como la vía de entrada a un encuentro directo e inmediato entre presente y pasado. La investigación de los documentos fotográficos supone adentrarse en una combinación de tecnologías, impulsos archivísticos, signos y cuerpos que portan miradas y temporalidades heterogéneas”. .

Assim, há o entendimento de que a fotografia não retrata o passado ou a história tal como ocorrera em determinado período, há uma intencionalidade no registro iconográfico e, inclusive, uma razão pela qual algumas fotos permanecem preservadas ao longo do tempo e outras não. Na discussão em questão, a imagem compõe um acervo juntamente com outros documentos e artefatos, o que permite uma análise sob várias perspectivas. Dentre elas, uma concepção emergente nas materialidades do acervo sobre as questões médico-higienistas pautadas como essenciais no atendimento à infância do período.

No diálogo com Dussel (2019Dussel, I. (2019). Fotos encontradas en el archivo. Aproximaciones al trabajo con imágenes a propósito de un álbum amateur sobre juegos infantiles (Argentina, fines del siglo XI). Historia y Memoria de la Educación, 10, 51-89.), é possível problematizar o conceito encontrado em Le Goff, citado por Mauad (1996Mauad, A. M. (1996). Através da imagem: fotografia e história - interfaces. Tempo, 1(2).) sobre a fotografia como imagem/documento e documento/monumento:

Há que se considerar a fotografia, simultaneamente como imagem/documento e como imagem/monumento. No primeiro caso, considera-se a fotografia como índice, como marca de uma materialidade passada, na qual objetos, pessoas, lugares nos informam sobre determinados aspectos desse passado - condições de vida, moda, infraestrutura urbana ou rural, condições de trabalho, etc. No segundo caso, a fotografia é um símbolo, aquilo que, no passado, a sociedade estabeleceu como a única imagem a ser perenizada para o futuro. Sem esquecer jamais que todo documento é monumento, se a fotografia informa, ela também conforma uma determinada visão de mundo (Mauad, 1996Mauad, A. M. (1996). Através da imagem: fotografia e história - interfaces. Tempo, 1(2)., p. 8).

Dessa forma, perenizar, por meio da fotografia, as práticas médicas no interior da creche parece ter sido importante para aqueles que ali vivenciaram o cotidiano da instituição, e essa constatação pode ser reforçada na fotografia a seguir (Figura 2), a qual traz o registro dos materiais que, assim como a foto, continuam preservados no acervo. Produzida no ano de 2018, a fotografia apresentada destaca materiais que foram preservados pela instituição. Nela temos um armário em madeira que guarda uma série de objetos.

Figura 2
Armário com objetos históricos da CBL.

A Figura 2 destaca, além dos objetos de vidro encontrados na fotografia, outras materialidades importantes para a história da creche. Os materiais em vidro, tubos de ensaio, seringas, balão de fundo chato, dessecador, frascos de medicamentos evidenciam objetos de laboratório que foram produzidos em material de alta durabilidade e fácil esterilização, o que traz a concepção de assepsia e higiene, necessária, por exemplo, na realização de possíveis análises clínicas e exames. A sequência de imagens apresentadas detalha a composição das materialidades e auxilia a compreender a organização dos espaços que, notadamente, além de assistir à pequena infância, tinha como ponto basilar a preservação da vida infantil dos perigos e riscos da sociedade da época.

Adere-se à discussão a reflexão sobre o tempo presente que une esforços em preservar um determinado tipo de materialidade, expressa na seleção de exibição dessas materialidades que representam uma parte do todo preservado pela instituição. Parece fundamental, na creche pesquisada, que a história de atendimento à saúde que salvaguardou crianças pobres do abandono e da morte seja reconhecida hoje por aqueles que entram em contato com a história da instituição.

Nesse sentido, o acervo nos ajuda a compreender as práticas de atendimento à infância na relação com seu contexto histórico ao mesmo tempo que nos auxilia na compreensão dos motivos pelos quais - pouco mais de 100 anos depois - verifica-se o retorno da organização dos espaços da educação infantil pautado em normativas médico-higienistas, bem como do uso de materiais passíveis de limpeza e higienização constante. A pandemia da Covid-19 trouxe à tona questões vivenciadas em um passado não muito distante, cujo mote central das ações e organizações no interior das instituições de educação infantil, novamente, se vê diante da necessidade de educar e preservar a vida de bebês e crianças pequenas em meio a uma crise sanitária.

A Pandemia Covid-19

Em 2020, a partir do momento em que a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou oficialmente a situação de pandemia causada pela Covid-19, os países passaram a buscar uma série de iniciativas na tentativa de diminuir a circulação do vírus. No Brasil, a condução política e epidemiológica da doença levou o país ao patamar de epicentro mundial da pandemia em março de 2021.

De acordo com o Boletim Observatório Covid-19 (2021), divulgado em junho de 2021 - momento em que Brasil atingia a marca de 500 mil mortes pela Covid-19 -, destaca-se a postura da comunidade científica ao analisar o cenário em questão e declarar que muitas vidas poderiam ter sido salvas se o país tivesse adotado medidas de saúde pública baseadas em evidências científicas por meio de uma coordenação central para enfrentamento da pandemia que promovesse o fortalecimento do Sistema Único de Saúde. O declínio da coordenação de enfrentamento à pandemia por parte do Governo Federal se reflete na falta de dados e análises produzidos pelo Ministério da Saúde, fato que, somado ao problema da subnotificação dos casos, evidencia quão calamitosa fora a gestão desta crise sanitária no país7 7 Por mais que haja um grande esforço da comunidade científica na produção de levantamentos e análises sobre a pandemia da Covid-19 e suas implicações, há ainda escassez de dados sistematizados que dialoguem a nível regional e nacional, bem como de transparência na divulgação de tais informações. Segundo Castro, Siqueira e Périssé (2022), quando tais dados existem, faz-se necessário questionar a precisão e confiabilidade das informações apresentadas, as quais, somadas aos cortes e desatualização do Censo, prejudicam a elaboração e o planejamento de políticas públicas. .

Nesta conjuntura, temos que reconhecer que os dados relativos ao acometimento e morte de crianças de por Covid-19 são subestimados. Em dezembro de 2021, a nota pública da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19 (Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19 [CTAI-COVID], 2021), divulgou que entre os anos de 2020 (início da pandemia) e 2021, o Brasil teve 1.449 óbitos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Srag) por Covid-19 em crianças de zero a 11 anos, para além do número de vítimas vivas, mas com sequelas duradouras8 8 Os dados mencionados dizem respeito aos casos notificados ao Ministério da Saúde até 6 de dezembro de 2021, por intermédio do Sistema de Informações de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe). Tais informações representam o dado mais recente sistematizado encontrado pelas autoras que apresenta o corte etário que abarque o público das crianças. Não há no país uma base de dados que estime o número de crianças com sequelas pós-Covid. Também inexistem sistematizações que levem em consideração o número de crianças e adolescentes, órfãos da pandemia, que estão desamparados em razão da morte de seus pais pela doença. .

Ao levar em consideração o cenário anteriormente retratado, temos implementadas no país um conjunto de medidas de contenção à propagação do vírus, dentre elas está o fechamento de escolas, consideradas locais de aglomeração. Tal iniciativa ocasionou inúmeras divergências e questionamentos que destacavam a relevância social das escolas em um país tão desigual quanto o Brasil. Com o início da vacinação, em 2021 as escolas retomaram o atendimento presencial através de uma série de protocolos que tentavam diminuir o volume de contaminação, já que, à época, a vacinação ainda não compreendia a faixa etária das crianças atendidas na educação infantil.

No contexto em questão, a ausência de diretrizes e orientações sobre a retomada do atendimento educacional presencial por parte do Governo Federal transferiu a tomada de decisão sobre os procedimentos e protocolos a serem adotados para os estados e municípios. Neste sentido, pautamos nosso olhar acerca dos protocolos e das normativas de atendimento no Plano São Paulo (São Paulo, 2021), elaborado pelo Governo Estadual de São Paulo, e o Protocolo sanitário municipal. Medidas de prevenção para o controle da pandemia de COVID-19 e proteção de funcionários e estudantes (Campinas, 2021), produzido pelo Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa) do município de Campinas. Estes documentos normativos propalam estudos e notas técnicas que orientaram diversos aspectos do cotidiano escolar, são eles: distanciamento social, higiene pessoal, limpeza e higienização dos ambientes, superfícies e objetos, e comunicação.

Ambos os documentos preconizaram a distância de 1,5 metros entre as pessoas dentro das escolas, proibiram qualquer tipo de evento social e restringiram o uso de alguns espaços, como a biblioteca, por exemplo. Os pais, que antes tinham acesso às dependências das instituições, também foram orientados a não entrar nos espaços das creches, e a equipe gestora foi orientada a privilegiar atendimentos virtuais em detrimento dos presenciais.

Ao adentrar o espaço educacional, a família deveria responder a um questionário acerca da saúde e do quadro clínico da criança, de modo a atestar que a condição de saúde desta a habilitava para frequentar a escola. De acordo com orientações da vigilância sanitária, se a criança apresentasse dois sintomas gripais, deveria ser impedida de permanecer na escola. Nestes casos a família era notificada e a criança encaminhada ao atendimento na unidade básica de saúde, com retorno autorizado após, no mínimo, vinte e quatro horas e sem os sintomas apresentados. No período mais crítico da pandemia, a existência de apenas um sintoma configurava critério impeditivo para a criança frequentar o ambiente escolar.

Figura 3
Protocolo de entrada na creche.

A Figura 3 retrata o momento da entrada de uma criança em uma unidade de educação infantil. Ela passa por procedimentos e protocolos de higiene que a habilita para adentrar a instituição. Observamos na fotografia um funcionário que guarda distância do menino e, ao mesmo tempo, afere sua temperatura com um termômetro digital. À mesa temos toalhas descartáveis e recipientes com álcool em gel, materialidades e corporeidades que aproximam o adentrar na creche ao contexto de entrada em um ambiente hospitalar.

Outro ponto a ser destacado com relação ao distanciamento refere-se à regra de que os grupos não poderiam ter contato uns com os outros. Para isso, foi criado um sistema de ‘blocos’, na tentativa de conter, de forma mais efetiva, possíveis focos de contaminação, ação que nos remete a uma versão atualizada da quarentena estabelecida na CBL, à ocasião da epidemia da Gripe Espanhola9 9 A organização estabelecida pelo Plano São Paulo (São Paulo, 2021) estabeleceu que, a depender dos níveis de ocupação dos leitos de UTI no estado de São Paulo e do avanço da vacinação de idosos e adultos, a taxa de ocupação dos espaços seriam alteradas. Nesse sentido, o retorno presencial do atendimento escolar ocorreu com 35% do número de alunos das turmas a partir de maio de 2021. . Com relação à higiene pessoal, limpeza e higienização dos ambientes, os protocolos proibiram o compartilhamento de quaisquer materiais sem a devida higienização, inclusive brinquedos. Máscaras e álcool em gel passaram a ser materiais pedagógicos, essenciais ao trabalho dos professores, que deveriam dar preferência ao uso de brinquedos de plástico, devido à facilidade de limpeza. Os demais materiais, categorizados como não higienizáveis, foram inutilizados, inclusive, o parque externo das unidades escolares, o que levou ao fechamento de playgrounds de madeira.

No mesmo município, uma creche universitária elaborou uma cartilha enviada às famílias com informações e protocolos acerca do retorno presencial das atividades, que ocorreu a partir de agosto de 2021. Em acordo com as regras semelhantes às da Secretaria de Educação do município, as orientações traziam de forma explícita a proibição do acesso às famílias dentro dos espaços da creche: “[...] as famílias não estão autorizadas a entrar na unidade, para evitar a aglomeração e circulação de pessoas. Para isso, devem acompanhar a sua criança, apenas até o local combinado para a recepção” (Unicamp. Divisão de Educação Infantil e Complementar [DEdIC], 2021).

A regra chamou a atenção da comunidade, já que, especialmente no berçário da creche, o acesso das famílias foi uma construção histórica daquela instituição que atendia os filhos dos membros da universidade. Essa proximidade do público com a creche permitia acessos como a visita no horário do almoço, quando pais e mães iam até o local para amamentar seus bebês ou simplesmente passar um período junto a eles. De modo muito semelhante, o conjunto de orientações extraído da cartilha de protocolos de atendimento de uma creche pública do município de Campinas, neste mesmo contexto, determina que se deve “Priorizar, sempre que possível o atendimento ao público por canais digitais (telefone, aplicativo ou online) visando evitar aglomeração” (Campinas, 2021).

Em virtude da pandemia da Covid-19, regulamentações com este teor instituíram protocolos de atendimento que instauraram uma mudança na relação entre escola e família, agora também mediada pelo uso das tecnologias e dos ambientes virtuais. Se anteriormente a presença das famílias no espaço escolar era fomentada, a proibição justificada pelo risco iminente de contaminação, tal qual ocorrera no início do século XX, novamente, modifica as relações no interior das instituições e, nesse ínterim, a cultura escolar, segundo Vidal (2017Vidal, D. G. (2017). História da educação como arqueologia: cultura material escolar e escolarização. Revista Linhas, 18(36), 251-272.), se concretiza nas práticas escriturais e não escriturais.

Ao cotejar passado e presente, verifica-se o retorno da intensificação da perspectiva higienista como modulação das relações no interior das escolas e, por consequência, sobrepondo-se aos princípios educativos. Artefatos como máscaras, álcool gel e materiais de fácil higienização compuseram uma nova materialidade que preconiza a saúde e o higienismo, em detrimento das ações e dos princípios pedagógicos da educação infantil. A cultura escolar que marcava a educação infantil se mostrou bastante frágil com o aparecimento da pandemia da Covid-19. Nesse ponto, é pertinente refletir sobre a forma escolar da educação infantil no país, visto que esta se apresenta dotada de uma “[...] identidade pouco consolidada da Educação Infantil” (Cruz, 2017Cruz, M. N. (2017). Educação infantil e ampliação da obrigatoriedade escolar: implicações para o desenvolvimento cultural da criança. Cadernos CEDES, 37(102), 259-276., p. 263) e, sobretudo, sobre a falta de transparência no que se refere à compreensão da infância pela sociedade (Rosemberg, 2007Rosemberg, F. (2007). Para uma outra educação infantil paulistana pós Fundeb. In 1º Encontro Educação para uma outra São Paulo, São Paulo.).

Os protocolos sanitários editados pelo município de Campinas seguiram as mesmas indicações dos publicados pelo Governo do Estado de São Paulo. Ambos eram constituídos por uma parte geral, que se referia aos diversos segmentos que atendiam o público infantil e uma parte específica que versava sobre a educação infantil. De acordo com o documento de Campinas, “[...] o objetivo do protocolo sanitário é baseado em evidências, determinar as medidas de controle para prevenção da infecção pelo novo coronavírus COVID-19 considerando as especificidades de cada setor” (Campinas, 2020). As diretrizes deste documento foram divididas em cinco tópicos, são eles: distanciamento, higiene pessoal, limpeza e higienização dos ambientes, superfícies e objetos e comunicação.

Para o atendimento de bebês e crianças nesse período, destaca-se o distanciamento de 1,5 metros em todas as atividades escolares e o uso da máscara, obrigatório a partir de 2 anos de idade (exceto autistas); recomendava-se, inclusive, não misturar as turmas para se ter maior controle em caso de contaminação e necessidade de suspensão da turma. Há que se problematizar quais práticas são essas que passam a compor o cotidiano da educação infantil, mediado por máscaras e separação dos corpos, visto que a própria concepção de currículo para essa etapa de ensino compreende a primazia da interação.

Atrelados a tais rotinas, passaram a compor a ordem do dia das instituições discursos como: ‘vamos manter o distanciamento’; ‘passa álcool na mão’ e ‘arruma a máscara’. No cotidiano das instituições, foi possível assistir a uma série de conflitos entre aquilo que se preconizava nos protocolos e aquilo que de fato era possível de ser realizado. Como manter um distanciamento mínimo entre os corpos de bebês? Ou, ainda, distanciar os corpos de crianças tão pequenas e dos profissionais que delas precisam cuidar, sob a perspectiva de que cuidar e educar configuram-se como práticas indissociáveis?

Os aspectos sanitários predominaram na nova dinâmica de atendimento das escolas de educação infantil, incutindo novas relações onde vemos um olhar mais higienista para as crianças e o espaço escolar, consolidando assim novas relações. Os protocolos ainda indicavam que as crianças não levassem brinquedos de casa para escola, que não manipulassem alimentos durante atividades pedagógicas, que somente fossem utilizados brinquedos possíveis de serem lavados e higienizados, bem como colchonetes, cadeirinhas, lençóis e toalhas. A partir de tal normativa, vimos uma profusão de dispensers e totens de álcool em gel em todos os ambientes das unidades escolares10 10 O uso de dispensers e totens com álcool, objetos até então não utilizados no espaço escolar, corroborou a difusão de uma noção contínua e por vezes automatizada de higiene das mãos. Até aquele momento, a utilização do álcool restringia-se à manipulação das funcionárias responsáveis pela limpeza dos espaços. A emergência da Covid-19 subitamente habilitou o seu uso direto por crianças pequenas, num primeiro momento com supervisão e orientação por parte dos educadores e posteriormente de forma mais autônoma. Se nos atentarmos ao provimento de materiais disponibilizados pelo poder às escolas para o enfrentamento da pandemia, vemos o massivo envio de álcool em gel para as unidades escolares abastecerem seus totens. . Cartazes orientando distanciamento, obrigatoriedade do uso da máscara, lavagem correta das mãos e uso do álcool gel foram fixados e adornavam as paredes das instituições de educação infantil (Figura 4).

Figura 4
Cartazes de orientação presentes nos espaços escolares

Grande parte das orientações visuais constantes nos cartazes acima apresentados reforçou a atmosfera de contínua limpeza e desinfecção dos ambientes, ganhando tônica no fazer pedagógico, na medida em que a transmissão da doença se dá pelo contato físico e/ou gotículas. Nesse sentido, as contribuições de Viñao Frago (1998Viñao Frago, A. (1998) Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. Rio de Janeiro, RJ: DP&A.) nos aclaram a necessidade de um olhar apurado diante dos objetos e das espacialidades da escola, dado que:

A arquitetura Escolar é também por si mesma um programa, uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como os de ordem, disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensorial e motora e toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e também ideológicos (Vinão Frago, 1998, p. 26).

Ao longo do ano de 2022, com a ampla vacinação e com a diminuição do contágio e da incidência de casos mais graves da doença, os protocolos foram revisados. Já no início do ano escolar, o distanciamento de 1,5m foi suspenso. Os protocolos e diretrizes relativos à prevenção da Covid-19 estiveram em vigor até agosto de 2022, momento em que o uso da máscara se tornou facultativo no ambiente escolar.

Por mais que os protocolos e procedimentos tenham sido atualizados, alterados e, em certos aspectos, suspensos, temos que o período de enfrentamento à pandemia infringiu marcas nas práticas pedagógicas. Talvez essas marcas de um histórico higienista nunca deixaram de estar presentes. Nesse sentido, é oportuno olhar para a arquitetura dessas instituições, na medida em que tais espaços foram/são um lugar (Vinão Frago, 1998) planejado para atender a infância, a partir de preceitos médicos, urbanísticos e educativos. Configurações assumidas ao longo do tempo revelam muito da proposta educativa realizada. O trinômio educar-cuidar-assistir, que caracterizava o início do atendimento oferecido a bebês e crianças, foi subsumido pelo binômio cuidar-educar, no intento de superar uma perspectiva assistencial, ao compreender o cuidar como basilar na educação infantil e atrelado à dimensão ética na prática educativa.

Considerações finais

É oportuno refletir acerca das transformações com relação ao atendimento à infância, a partir de legislações mais recentes, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (Lei nº 9.394, 1996), que regulamenta o funcionamento de creches e pré-escolas no país e evidencia, ao menos do ponto de vista legislativo, um novo contexto de atendimento à infância. Contudo, como nos alerta Kuhlmann Jr. (1998Kuhlmann Jr., M. (1998). Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre, RS: Mediação., p. 81),

A história das instituições pré-escolares não é uma sucessão de fatos que se somam, mas a interação de tempos, influências e temas, em que o período de elaboração da proposta educacional assistencialista se integra aos outros tempos da história dos homens.

Dessa forma, embora tenhamos nos documentos normativos uma série de mudanças no caráter educacional das instituições de educação infantil, é a partir da investigação sobre o cotidiano das instituições que podemos nos aproximar das práticas que configuram uma relação dialética. Assim, coloca-se em questão o fato de que, mesmo com uma história de vinculação à assistência, não é possível negar um viés educativo nas práticas das creches. Afinal, a partir do momento em que demarca, por exemplo, um atendimento pautado na moral cristã, como foi o caso da Creche Baroneza, não há dúvidas sobre o fato de que se tinha determinada forma de cuidar e, conjuntamente, educar as crianças. Ao mesmo tempo, a emergência da educação infantil como direito da criança e espaço educativo como promotor das culturas infantis ainda carrega consigo uma história assistencial e higienista, o que aponta para uma historicidade não linear, um constante movimento que relaciona inovação e permanência.

Nesse contexto, a partir da década de 1990, inaugura-se um novo período no que se refere à política educacional em âmbito da educação infantil. Iniciou-se naquele momento a construção de um campo teórico-prático sobre a especificidade do trabalho com bebês e crianças que incluiu o cuidar e educar como indissociáveis da prática educativa.

Um currículo sustentado nas relações, nas interações e em práticas educativas intencionalmente voltadas para as experiências concretas da vida cotidiana, para a aprendizagem da cultura, pelo convívio no espaço da vida coletiva e para a produção de narrativas, individuais e coletivas, através de diferentes linguagens (Parecer nº 20, 2009, p. 14).

Ainda assim, as práticas não se alteram de maneira automática a partir da promulgação das leis, elas são construídas no cotidiano das instituições, com influências de sua história e a partir de inovações trazidas pela reflexão e pelo aprofundamento dos estudos do campo de conhecimento. Embora marcada por contradições, a educação infantil vinha assumindo uma determinada cultura escolar (Julia, 2001Julia, D. (2001). Infância e educação infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre, RS: Mediação.), ou culturas escolares (Viñao Frago, 1998Viñao Frago, A. (1998) Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. Rio de Janeiro, RJ: DP&A.), embora as autoras do presente texto se coloquem a favor, no caso da educação infantil, da denominação ‘culturas educativas da infância’.

Há avanços evidentes na qualidade do serviço ofertado pelas instituições, tal fato pode ser compreendido à luz da materialidade que se buscou apresentar no texto. No entanto, considera-se que a pandemia da Covid-19 impactou sobremaneira tais instituições, suas concepções e práticas pedagógicas, uma vez que protocolos sanitários são reguladores que se sobrepuseram a uma cultura educativa já instaurada. A criança foi concebida tão somente pelo viés médico-sanitarista, sendo as outras áreas que abarcam a pedagogia, como a sociologia da infância, a filosofia e a psicologia, desconsideradas no debate acerca do atendimento na ocasião do retorno presencial.

Do ponto de vista das medidas preconizadas para evitar a disseminação do vírus, encontram-se semelhanças entre os períodos de 1918 e 2021 nos seguintes pontos:

  • - preconização do uso de máscaras;

  • - disseminação de tratamentos de saúde alternativos ineficazes, os quais, considerando os diferentes conhecimentos científicos de cada época, não tinham nenhum tipo de comprovação com relação a sua eficiência;

  • - alta taxa de mortalidade;

  • - isolamento social.

Cada um dos relatos, objetos e dados apresentados por intermédio do acervo documental da Creche Baroneza de Limeira revelam a complexidade e os desafios enfrentados no atendimento de crianças pequenas. A premissa de preservação da vida instituiu no cotidiano destas instituições uma história de conexão entre a educação infantil, assistência social e saúde. Sem cometer anacronismos, analisar e estabelecer relações entre ambos os períodos históricos, 1918 e 2021, é fundamental, pois conhecer a história do trabalho com essa faixa etária subsidia a reflexão e compreensão do momento presente.

Transcorridos pouco mais de cem anos entre os excertos, ressalta-se o fato de que a educação infantil ganhou status educativo apenas no final do século XX, e as conquistas e os avanços desse nível de ensino pouco dialoga com os procedimentos e protocolos de enfrentamento à pandemia no interior das unidades educacionais. Contudo, não há a defesa aqui de que os cuidados com relação à saúde das crianças sejam negligenciados, uma vez que o enfrentamento a uma epidemia requer ações de toda a sociedade.

Todavia, dado o percurso histórico da educação infantil, e a constatação de que ainda há a busca por uma identidade no trabalho educativo para esta faixa etária que, embora faça parte da educação, se pretende distinta do modelo escolar, é necessário buscar romper com um modelo de assistência marcado pela higienização dos corpos infantis vulneráveis. Há que se promover o debate acerca das práticas, para que as conquistas no âmbito pedagógico não se percam em situações de crise, como a da pandemia da Covid-19.

Referências

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  • Rodadas de avaliação:

    R1: três convites; dois pareceres recebidos.
  • Financiamento:

    A RBHE conta com apoio da Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE) e do Programa Editorial (Chamada Nº 12/2022) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
  • 1
    De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), pandemia é a disseminação global de uma nova doença, e o termo é empregado quando uma epidemia, surto que afeta uma região, se espalha por diferentes continentes e com transmissão sustentada de pessoa para pessoa.
  • 2
    Considerada uma das epidemias mais letais da história, a Gripe Pneumónica foi causada pela virulência incomum de uma estirpe do vírus Influenza A, do subtipo H1N1, e alastrou-se pelo mundo no contexto da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A denominação ‘gripe espanhola’ foi cunhada devido ao fato de muitas das informações a respeito da doença terem sido transmitidas pela imprensa da Espanha.
  • 3
    A tese de Oliveira (2020) aborda, pela perspectiva da história cultural da educação, o surgimento das creches no Brasil a partir do acervo documental, dos artefatos e do espaço edificado da Creche Baroneza de Limeira, em São Paulo. A pesquisa investiga como as práticas de atendimento à infância são representadas, tomando a cultura material como um dos seus elementos fundamentais e percebendo como os artefatos contribuem para configurar formas de educar as crianças em um ambiente institucionalizado.
  • 4
    A grafia da época foi preservada nas transcrições das atas.
  • 5
    Sobre a Gotta de Leite: assim como a creche, era um modelo institucional de atendimento à infância importado da Europa. A primeira Gotta de Leite da cidade de São Paulo foi fundada em 1905 e fornecia leite esterilizado às famílias pobres. Quando a CBL foi criada, em 1911, vinculou-se à Gotta de Leite, sendo ambas localizadas no mesmo prédio.
  • 6
    “En estas nuevas perspectivas historiográficas, la fotografía como documento histórico ya no es considerada como la vía de entrada a un encuentro directo e inmediato entre presente y pasado. La investigación de los documentos fotográficos supone adentrarse en una combinación de tecnologías, impulsos archivísticos, signos y cuerpos que portan miradas y temporalidades heterogéneas”.
  • 7
    Por mais que haja um grande esforço da comunidade científica na produção de levantamentos e análises sobre a pandemia da Covid-19 e suas implicações, há ainda escassez de dados sistematizados que dialoguem a nível regional e nacional, bem como de transparência na divulgação de tais informações. Segundo Castro, Siqueira e Périssé (2022), quando tais dados existem, faz-se necessário questionar a precisão e confiabilidade das informações apresentadas, as quais, somadas aos cortes e desatualização do Censo, prejudicam a elaboração e o planejamento de políticas públicas.
  • 8
    Os dados mencionados dizem respeito aos casos notificados ao Ministério da Saúde até 6 de dezembro de 2021, por intermédio do Sistema de Informações de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe). Tais informações representam o dado mais recente sistematizado encontrado pelas autoras que apresenta o corte etário que abarque o público das crianças. Não há no país uma base de dados que estime o número de crianças com sequelas pós-Covid. Também inexistem sistematizações que levem em consideração o número de crianças e adolescentes, órfãos da pandemia, que estão desamparados em razão da morte de seus pais pela doença.
  • 9
    A organização estabelecida pelo Plano São Paulo (São Paulo, 2021) estabeleceu que, a depender dos níveis de ocupação dos leitos de UTI no estado de São Paulo e do avanço da vacinação de idosos e adultos, a taxa de ocupação dos espaços seriam alteradas. Nesse sentido, o retorno presencial do atendimento escolar ocorreu com 35% do número de alunos das turmas a partir de maio de 2021.
  • 10
    O uso de dispensers e totens com álcool, objetos até então não utilizados no espaço escolar, corroborou a difusão de uma noção contínua e por vezes automatizada de higiene das mãos. Até aquele momento, a utilização do álcool restringia-se à manipulação das funcionárias responsáveis pela limpeza dos espaços. A emergência da Covid-19 subitamente habilitou o seu uso direto por crianças pequenas, num primeiro momento com supervisão e orientação por parte dos educadores e posteriormente de forma mais autônoma. Se nos atentarmos ao provimento de materiais disponibilizados pelo poder às escolas para o enfrentamento da pandemia, vemos o massivo envio de álcool em gel para as unidades escolares abastecerem seus totens.

Editado por

Editor-associado responsável:

Carlos Eduardo Vieira (UFPR) E-mail: cevieira9@gmail.com https://orcid.org/0000-0001-6168-271X

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Set 2022
  • Aceito
    28 Abr 2023
  • Publicado
    15 Set 2023
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