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Denúncias inconsequentes ao Santo Ofício no Maranhão (1708-1743): as fontes inquisitoriais como práticas etnográficas

Inconsequential Denunciations to the Holy Office in Maranhão (1708-1743): Inquisitorial Sources as Ethnographic Practices

RESUMO

O presente artigo aborda as ações de comissários do Tribunal do Santo Ofício da Inquisição de Lisboa no Estado colonial do Maranhão e Grão-Pará durante a primeira metade do século XVIII. Objetiva-se analisar as inquirições ocorridas nas diligências desses comissários por vilas e cidades daquele Estado entre 1708 e 1743. Para tanto, utilizam-se documentos digitais do Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT) referentes à Inquisição de Lisboa, bem como documentos digitais do Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) e do Arquivo Público do Estado do Maranhão (APEM). A metodologia consiste na análise das redes de denunciantes e denunciados. Ao cruzar as fontes por meio dos indícios dos nomes, obteve-se uma conjuntura das informações que circulavam no Estado colonial do Maranhão e Grão-Pará e no Reino sobre as práticas religiosas dos Andrades e a influência dos membros dessa família na administração pública local.

Palavras-chave:
Comissário; Devassa; Inquisição; Judaísmo

ABSTRACT

This article deals with the actions of the commissioners of the Tribunal of the Holy Office of the Inquisition of Lisbon in the colonial state of Maranhão and Grão-Pará during the first half of the 18th century. The aim is to analyze the inquiries carried out by these commissioners in the towns and cities of that state between 1708 and 1743. For this purpose, digital documents from the National Archives of Torre do Tombo-ANTT referring to the Lisbon Inquisition are used, as well as digital files from the Overseas Historical Archive-AHU and the Public Archive of the State of Maranhão-APEM. The methodology consists of analyzing the networks of denouncers and denounced. By cross-referencing the sources through name clues, we obtained a snapshot of the information circulating in the colonial state of Maranhão and Grão-Pará and in the Kingdom about the religious practices of the Andrades and the influence of members of this family on local public administration.

Keywords:
Commissioner; Wanton; Inquisition; Judaism

1 INTRODUÇÃO

Os tribunais inquisitoriais da época moderna eram instituições que objetivavam moldar as consciências, investigando e condenando práticas morais e religiosas consideradas ilegítimas pela Igreja e pelo Estado1 1 Sobre o conjunto de práticas heterodoxas que os tribunais inquisitoriais da época moderna condenavam no vasto império português, cf. Vainfas (1989). . Ao longo dos séculos de sua atuação no império ultramarino português, os agentes inquisitoriais2 2 Faz-se uso desta expressão para referir-se ao conjunto de indivíduos que atuaram nos Tribunais do Santo Ofício da Inquisição portuguesa, mas que não constituíam cargos oficiais fixos, sobretudo comissários e familiares, conforme destaca Feitler (2007, p. 83). Portanto, o emprego do termo agente da inquisição, ao longo deste artigo, refere-se, principalmente, aos comissários inquisitoriais que assumiram este cargo nas diligências ocorridas no Maranhão e Grão-Pará, durante a primeira metade do século XVIII. Sobre a Inquisição e seus agentes há uma vasta e rica produção historiográfica clássica e recente, na qual se destacam os seguintes trabalhos: Anita Novinsky (1972), Sônia Siqueira (1978), Ronaldo Vainfas (1989), Daniela Calainho (2006), Bruno Feitler (2007) e Aldair Carlos Rodrigues (2014). reuniram um grande volume de documentos ligados às ações de violência física e simbólica da instituição, que hoje servem de fonte para pesquisadores(as) interessados(as) em historiografar as inquisições3 3 Para além da questão das crenças, os papéis do Santo Ofício são “registros escritos de testemunhos orais [...] profundamente distorcidos, [...] com uma costumeira projeção de estereótipos” (Ginzburg, 2011, pp. 280-291). A característica ambígua e dialógica das fontes inquisitoriais e a retórica judiciária, em que os testemunhos geralmente eram apropriações do que se ouviu dizer, tornou os processos e as denúncias bastante imprecisos, o que justifica a necessidade de se recorrer a outras tipologias de fontes. . Esses estudos permitem a análise e a compreensão de diversos aspectos daquelas sociedades em seu tempo: os problemas relacionados à (in)tolerância religiosa; as complexidades administrativas, jurídicas e culturais; os aspectos mais íntimos de seu cotidiano, suas subjetividades e sociabilidades.

Este vasto campo historiográfico4 4 As historiografias ibérica e brasileira sobre a inquisição apresentam características peculiares e pertinentes à maioria das obras, a descrição da ação do Santo Ofício e a narratividade dos processos inquisitoriais, porém, algumas produções avançaram ou têm avançado nessa tarefa descritiva/narrativa, partindo para análises mais profundas. Para tanto, a influência da interdisciplinaridade, do uso de teorias para além da História, tem contribuído nos olhares mais interpretativos sobre a historiografia da inquisição, em que se destacam a semiótica da cultura (Nogueira, 2012) e a etnografia das práticas religiosas (Rodrigues, D., 2018). de que se faz menção, aqui, possui variados percursos teórico-metodológicos devido à própria complexidade e à profusão de casos com que se deparou ao longo de três séculos a instituição inquisitorial. Análises que perpassam questões políticas, sociais, culturais, deontológicas e religiosas são cada vez mais frequentes na historiografia sobre a inquisição. Para além da clássica discussão sobre judeus e cristãos-novos, os estudos inquisitoriais têm se direcionado para novas vertentes que abrangem questões de gênero, aspectos institucionais, elementos religiosos e simbólicos.

O presente artigo tem como escopo a temática da inquisição em nível local relacionada a um conjunto de denúncias que constituem um riquíssimo corpus documental ligado ao tribunal inquisitorial. Acredita-se ser de crucial importância a reflexão acerca desse fenômeno sociocultural que foi a Inquisição no Maranhão colonial. Neste sentido, a problemática deste artigo é: qual relação se pode estabelecer entre as fontes inquisitoriais, o campo antropológico, religioso e a história?

A possibilidade de historiar percepções da realidade do campo religioso na América portuguesa a partir dos depoimentos, confissões e denúncias aos inquisidores é o que interessa refletir aqui. É nesse sentido que uma etnografia das práticas religiosas é útil, pois, considerando-se as fontes inquisitoriais como indícios das culturas religiosas nas sociedades de outrora, é possível a interpretação de tais relatos.

As transformações no campo das ciências humanas, principalmente após a década de 1960, influenciaram os estudos que envolvem história e religiões. Dentre tantas, destaca-se a antropologia cultural de Clifford Geertz (2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973]. [1973]), que, ao publicar seus estudos no campo da cultura, abriu amplas possibilidades para a pesquisa histórica.

O estudo sobre a cultura não é algo recente para a história, nem tampouco para a antropologia. O historiador Peter Burke (2005BURKE, Peter. O que é história cultural. Tradução de Sérgio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.) divide a história da história cultural em quatro fases, partindo dos clássicos e da história da arte até a nova história cultural. O hegelianismo e a homogeneidade cultural são características da fase clássica. A partir das críticas aos problemas da história cultural e dos debates marxistas, o estudo das tradições, dos conflitos e da cultura popular foram introduzidos nas práticas metodológicas do referido campo. Nas décadas de 1960 e 1970, a interdisciplinaridade ampliou a noção de cultura e as possibilidades de métodos e objetos da história cultural.

Segundo o referido autor, “a interação mais profunda entre a antropologia e a história se estabelece entre as décadas de 1960 e 1990, num movimento que ficou conhecido como cultural turn, que foi global e de campos diversificados” (Burke, 2005BURKE, Peter. O que é história cultural. Tradução de Sérgio Goes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005., p. 44). Clifford Geertz teve uma grande parcela de contribuição para a antropologia histórica, por desenvolver uma teoria interpretativa da cultura, entendo-a como texto, um exercício hermenêutico, rompendo com o estruturalismo histórico e dando ênfase ao episódico e à personificação.

O conceito de cultura ao qual ele se refere

[...] denota um padrão de significados transmitido historicamente, incorporados em símbolos, um sistema de concepções herdadas, expressas em formas simbólicas, por meio das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atitudes acerca da vida (Geertz, 2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973]., p. 66).

Geertz apresenta um conceito semiótico de cultura e o melhor método para pesquisá-la é a interpretação, a busca de significados. Para desenvolver a interpretação sobre a cultura, o autor lança mão da mais corriqueira atividade do antropólogo, a etnografia. Para ele, “[...] é justamente ao compreender o que é etnografia, [...] que se pode começar a compreender o que representa a análise antropológica como forma de conhecimento” (Geertz, 2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973]., p. 4). É nesse contexto que o referido antropólogo lança a “descrição densa”, termo que toma emprestado de Gilbert Ryle, como teoria interpretativa da cultura.

Para Gilbert Ryle (1968 apud Geertz, 2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973]., p. 5) na descrição densa está o objeto da etnografia:

[...] uma hierarquia estratificada de estruturas significantes em termos dos quais os tiques nervosos, as piscadelas, as falsas piscadelas, as imitações, os ensaios das imitações são produzidos, percebidos e interpretados, e sem as quais eles de fato não existiriam [...].

Geertz se apropria da lógica de Ryle ao entender que descrever práticas ou fenômenos culturais já consiste em uma interpretação, considerando que “os textos antropológicos são interpretações de segunda e terceira mão” (Geertz, 2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973]., p. 11). Dentro dessa grande teia de relações de significados construída e transmitida, o antropólogo Clifford Geertz insere também a religião como um sistema cultural.

A partir dessa referida interpretação sobre a religião, o antropólogo em questão passou a ser considerado revolucionário por contribuir para uma das viragens mais significativas nos estudos das religiões no século XX, considerando que, segundo ele,

[...] uma religião é [...] um sistema de símbolos que atua para [...] estabelecer poderosas, penetrantes e duradoras disposições e motivações nos homens através [...] da formulação de conceitos de uma ordem de existência geral e [...] vestindo essas concepções com tal aura de fatualidade que [...] as disposições e motivações parecem singularmente realistas [...] (Geertz, 2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973]., p. 67).

Contudo, qual a implicação dessas concepções de cultura e religião para os estudos inquisitoriais? A resposta a essa pergunta encontra-se na aplicabilidade da teoria geertziana na análise das fontes inquisitoriais. Estas, como já dissemos, têm uma característica antropológica muito forte. Entendê-las e interpretá-las requer um trabalho mais aprimorado.

O método da descrição densa de Geertz (2008GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: LTC, 2008 [1973].]) é o início para esse aprimoramento. Tomaremos como exemplo, aqui, na tentativa de aplicabilidade da referida teoria, as denúncias contra Gregório de Andrade e sua parentela. Nas páginas seguintes, buscaremos, a partir de um estudo de caso, exemplificar os “indícios” de diferentes significados atribuídos às práticas religiosas de uma família de cristãos-novos da cidade de São Luís, no século XVIII, no intuito de pensar sobre a religiosidade como artefato, poder e representação da sociedade que o forja.

2 A INQUISIÇÃO PORTUGUESA E SEUS AGENTES

Embora a Inquisição portuguesa nunca tenha estabelecido uma sede oficial na América, ela exerceu influência e atuou no território por meio de várias estratégias ao longo do tempo. Algumas das principais estratégias pelas quais a Inquisição exerceu sua presença na América Portuguesa foram: as visitas de agentes do Santo Ofício e as denúncias e delações coletadas por eles.

A Inquisição enviava visitadores à América Portuguesa periodicamente. Esses visitadores tinham autoridade para investigar e perseguir heresias e práticas contrárias à fé católica. Eles realizavam interrogatórios, julgamentos e aplicavam punições aos suspeitos de heresia. Além disso, a Inquisição incentivava a população a denunciar qualquer suspeita de heresia ou prática não católica. Os denunciantes podiam permanecer anônimos e, muitas vezes, motivados por disputas pessoais ou interesse próprio, acusavam seus vizinhos, conhecidos ou desafetos de atividades consideradas heréticas (Siqueira, 1978SIQUEIRA, Sonia A. A inquisição portuguesa e a sociedade colonial. São Paulo: Ática, 1978.).

Os processos inquisitoriais podiam ser enviados para Portugal. Os acusados eram julgados pelos tribunais do Santo Ofício em Lisboa ou em outros locais de Portugal. Caso fossem considerados culpados, poderiam enfrentar penas que variavam desde prisão, confisco de bens, trabalhos forçados, até a pena de morte.

A Inquisição controlava a circulação de livros e literatura na América Portuguesa. Eles mantinham um índex, uma lista de livros proibidos, que continha obras consideradas heréticas ou contrárias à fé católica. Livros suspeitos eram apreendidos, e os que continham heresias eram queimados publicamente. A Inquisição mantinha também um sistema de vigilância sobre a população, tanto por meio de visitadores como de informantes locais. Eles buscavam identificar comportamentos considerados suspeitos e práticas religiosas não católicas, como o judaísmo ou outras formas de religião dissidente.

Essas estratégias garantiram que a Inquisição portuguesa exercesse influência e atuasse no Brasil colonial, mesmo sem uma sede oficial. O medo e a perseguição inquisitorial afetaram a vida religiosa e social da população, criando um ambiente de temor e desconfiança (Rodrigues, 2014RODRIGUES, Aldair Carlos. Igreja e Inquisição no Brasil: agentes, carreiras e mecanismos de promoção social - século XVIII. São Paulo: Alameda, 2014.).

De acordo com o historiador Aldair Carlos Rodrigues (2009RODRIGUES, Aldair Carlos. Formação e atuação da rede de comissários do Santo Ofício em Minas colonial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 29, n. 57, pp. 145-164, 2009. , p. 146), os três grupos que compuseram o corpo de agentes da Inquisição portuguesa no Brasil colonial eram compostos por comissários, notários e familiares. Em relação aos comissários da Inquisição portuguesa, ele aponta que

esses agentes constituíram um mecanismo fundamental para o funcionamento da engrenagem inquisitorial, pois eles eram a autoridade inquisitorial máxima na Colônia e acabavam desempenhando funções catalisadoras nas regiões em que atuavam.

Os comissários eram os principais agentes do Santo Ofício em Lisboa e nas áreas ultramarinas. Eles eram nomeados pelo inquisidor-geral e tinham autoridade para prender, interrogar e processar suspeitos de heresia. Os comissários eram geralmente membros do clero ou juristas com conhecimento em direito canônico. Os notários eram responsáveis por registrar os depoimentos e os procedimentos do tribunal. Eles documentavam as confissões, as denúncias e as sentenças, garantindo a precisão e a autenticidade dos registros. Os notários desempenhavam um papel fundamental na burocracia do tribunal, assegurando a manutenção dos documentos legais. Os familiares eram colaboradores leigos do Santo Ofício, escolhidos entre a nobreza local. Eles eram responsáveis por auxiliar os comissários nas tarefas administrativas e de investigação. Os familiares exerciam funções de vigilância, informação e captura de suspeitos de heresia, atuando como uma extensão do poder inquisitorial nas comunidades locais (Siqueira, 1978SIQUEIRA, Sonia A. A inquisição portuguesa e a sociedade colonial. São Paulo: Ática, 1978.; Calainho, 2006CALAINHO, Daniela Buono. Agentes da fé: familiares da Inquisição portuguesa no Brasil colonial. Bauru, SP; Edusc, 2006.; Fleiter, 2007; Rodrigues, 2014RODRIGUES, Aldair Carlos. Igreja e Inquisição no Brasil: agentes, carreiras e mecanismos de promoção social - século XVIII. São Paulo: Alameda, 2014.).

2 COMISSÁRIOS DO SANTO OFÍCIO NO MARANHÃO

Frei Pedro do Espírito Santo, um clérigo franciscano da Província reformada da Conceição da Beira e Minho, natural da Vila de Arouca, do Bispado de Lamego, em uma denúncia encaminhada ao Tribunal do Santo Ofício da Inquisição de Lisboa, em 9 de outubro de 1732, escreveu estas palavras: “este é o miserável estado a que tem chegado aquela triste terra, composta de gente pouco radicada em a nossa santa fé e governada por quem é oposto a ela” (Denúncia do Padre Pedro..., circa 1730-1732DENÚNCIA DO PADRE PEDRO do espírito Santo contra Gregório de Andrade, circa 1730-1732. Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 15293. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). circa 1730-1732. Disponível em: <Disponível em: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=2315412 >. Acesso em: 15 jan. 2023.
http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=2...
, fl. 1). Ele se refere à cidade de São Luís do Maranhão, região onde o clérigo morou durante seis anos e em cujo tribunal atuou como comissário. São as conclusões que ele apresentou ao inquisidor das diligências5 5 A visitação às localidades pelo poder eclesiástico e secular foi uma prática que se perpetuou desde a época medieval e se estendeu para as áreas coloniais. Incorporada pelo Tribunal do Santo Ofício da Inquisição, consistia numa “inspeção periódica, que, por determinação do Conselho Geral do Santo Ofício, instituía um delegado seu para inquirir sobre o estado das consciências em relação à pureza da fé e dos costumes” (Siqueira, 1978, p. 183). Destas inquirições se forjavam as denúncias, que persuadiam, por intermédio do interrogatório, os indivíduos à delação. que fez sobre o comportamento religioso e social de Gregório de Andrade da Fonseca e sua parentela, estigmatizados pela sociedade local de cristãos-novos.

Porém, ele não foi o único comissário a reunir testemunhos sobre a conduta de Gregório e outros indivíduos de sua família, que pudessem constatar sua suspeita na fé e suas práticas judaicas. Outros clérigos, na condição de agentes da inquisição, também fizeram o mesmo. Não era a primeira vez que a Inquisição lançava seus tentáculos no Maranhão e Grão-Pará. Desde o século XVII, comissários do Santo Ofício faziam diligências pelas vilas e cidades daquele Estado, preenchendo os cadernos dos Promotores com denúncias sobre diversos tipos de crimes contra a fé Católica, sobretudo os de judaísmo6 6 O olhar da inquisição voltou-se para o Maranhão no início do século XVII no ano de 1619, quando ainda estava se consolidando o processo de conquista e colonização daquela região pelos portugueses. Uma das primeiras denúncias aos Inquisidores do Tribunal do Santo Ofício de Lisboa, referente a um morador do Maranhão, foi contra o Capitão Francisco Caldeira, conforme menciona Anita Novinsky (2006). .

Bruno Feitler (2007FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: igreja e inquisição no Brasil: Nordeste 1640-1750. São Paulo: Alameda; Phoebus, 2007.) menciona que, na década de 1640, já havia provisões do Tribunal da Inquisição de Lisboa nomeando Comissários para o Maranhão, a exemplo da que empossou o religioso jesuíta Luís Figueira em 18 de abril de 1643. A prática do uso desses agentes no rito jurídico dos tribunais inquisitoriais de Portugal e suas possessões ultramarinas era um costume instituído a partir das três últimas décadas do século XVI, quando foi ordenado pelo cardeal D. Henrique, por meio de um decreto de 12 de abril de 1570, o qual instituía aos tribunais inquisitoriais que encontrassem, nas localidades do Império ultramarino, clérigos dispostos a representar a Inquisição portuguesa, formando-se, nestas conjunturas, as primeiras redes de comissários inquisitoriais (Feitler, 2007FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: igreja e inquisição no Brasil: Nordeste 1640-1750. São Paulo: Alameda; Phoebus, 2007.).

Isso não garantiu, porém, de imediato a atuação desses agentes nos processos inquisitoriais, pois somente a partir do século XVII houve uma frequência maior de nomeações de comissários no Reino e nas áreas coloniais para fazerem diligências e produzirem inquéritos para aqueles tribunais. É no regimento inquisitorial de 1613 que o cargo de comissário aparece de forma mais especificada, estabelecendo que eram atribuições do cargo “manter os inquisidores informados sobre os crimes cometidos pelos fiéis” (Andrade e Silva, 1855ANDRADE E SILVA, José Justino de. Collecção Chronologica da Legislação Portugueza compilada e Annotada - 1613-1619. Lisboa, Imprensa de J. J. A. Silva, 1855. , p. 24), por meio de devassas, decretando também prisões, sequestros de bens e o envio de réus para os cárceres.

Os autos produzidos pelos comissários no exercício de seus cargos eram enviados ao Reino, para as sedes dos tribunais inquisitoriais, e anexados aos cadernos dos Promotores. Estes cadernos contêm informações sobre os Andrades, colhidas por clérigos que moraram ou passaram pelo Maranhão e Grão-Pará durante os séculos XVII e XVIII e estiveram a serviço do Tribunal do Santo Ofício da Inquisição. Ao todo, foram sete comissários que reuniram denúncias sobre as condutas e práticas religiosas dessa família de cristãos-novos do Maranhão, totalizando cerca de 150 depoimentos, ao longo de aproximadamente quatro décadas, conforme se vê na tabela abaixo.

Tabela 1:
Agentes da Inquisição Portuguesa no Maranhão (1700-1745)

A análise das trajetórias desses agentes na Colônia e no Reino elucida as redes de denunciantes e denunciados dos costumes religiosos da família Andrade. Portanto, para compreender como a inquisição de Lisboa procedeu no caso dos membros dessa família, é necessário refazer os passos e os procedimentos dos mencionados clérigos pelas principais cidades e vilas do Estado do Maranhão e Grão-Pará.

Por meio da documentação analisada, é possível destacar as localidades de onde partiram as denúncias e para onde se deslocaram as diligências. Além da cidade de São Luís, da vila de Santo Antônio de Alcântara, denominada também de Tapuitapera, as comitivas inquisitoriais ainda adentraram as regiões dos rios Mearim, Itapecuru e Muni, na capitania do Maranhão. No Grão-Pará, elas se concentraram na cidade de Santa Maria de Belém. Na capitania do Piauí, o comissário João da Purificação fez diligência no distrito de Parnaguá, região onde alguns dos ascendentes dos Andrades habitavam e tinham terras.

Não se sabe, precisamente, quando tiveram início as denúncias contra os Andrades. A mais antiga registrada no caderno do Promotor da inquisição de Lisboa refere-se a 1708, feita por meio de uma carta que o clérigo José Palheta de Andrade escreveu aos inquisidores7 7 Sobre a afirmação de que a denúncia do padre José Palheta de Andrade, de 1707, é a primeira das quais se têm registros nos cadernos do Promotor da Inquisição de Lisboa, cf. Mendonça (2011, p. 237). . Não se encontraram, nos mencionados cadernos do Promotor, registros de diligências e inquéritos anteriores a esta data, porém, as palavras do padre José Palheta indiciam que elas existiram, mas não houve abertura de processos contra os denunciados. Isto porque, segundo ele, os clérigos da Companhia de Jesus do Maranhão, em exercício do cargo de comissários do Tribunal do Santo Ofício, eram parciais nas diligências que faziam, pois tinham relações de amizade e compadrio com os Andrades, ao ponto de um dos comissários vir a defendê-los no púlpito da igreja matriz da cidade de São Luís (Cadernos do Promotor, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2...
, fl. 17).

O vigário José Palheta de Andrade não mencionou em suas denúncias quais eram esses comissários e clérigos da Companhia de Jesus que faziam parte da rede de sociabilidade daquela família. Porém, Gregório de Andrade da Fonseca foi Procurador dos padres da ordem jesuíta naquele Estado, os representando, dentre outras causas, na arrematação do contrato de fornecimento de carne para os açougues da cidade de São Luís e da venda de uma sumaca que tinha vindo da Bahia, no ano de 1712 (Registro da Procuração..., circa 1712REGISTRO DA PROCURAÇÃO do Reverendo Padre Reitor do Colégio. Arquivo Público do Maranhão, Câmara de São Luís, Acórdãos, Acórdãos da Câmara de São Luís, L. 7, fl. 134. São Luís (Arquivo Público do Maranhão - APEM). circa 1712. Disponível em: file:///C:/Users/eloya/Downloads/livro_f_38_n_7_37%20(3).pdf. Acesso em: 15 jan. 2023. , fl. 134).

No entanto, a parcialidade dos comissários, à qual se referiu o vigário denunciante, não evitou as ações de investigação da inquisição de Lisboa no Maranhão e Grão-Pará a respeito dos indivíduos que faziam parte do clã Andrade, mas prolongou a etapa de coletas das denúncias das suas supostas práticas judaicas, ao ponto de muitos deles virem a falecer sem que nenhum processo tivesse sido instaurado. Ao longo de quatro décadas do século XVIII, cerca de 30 membros das famílias Andrade foram denunciados ao Tribunal do Santo Ofício da Inquisição de Lisboa, principalmente Duarte Rodrigues de Távora, os padres José e Inácio de Távora e Andrade, e Gregório de Andrade da Fonseca - embora recaísse sobre este último o maior número de acusações, ele foi degredado para o Reino e morreu na cadeia do Limoeiro, em 1733, por outras circunstâncias de conflitos políticos e sociais.

Ainda que Gregório de Andrade da Fonseca não tenha sido julgado e sentenciado pelo tribunal inquisitorial, a sombra desta instituição da justiça eclesiástica sobre sua pessoa contribuiu para fundamentar, além do estigma de cristão-novo “judaizante”, os de perturbador e conspirador contra a ordem política e religiosa do Maranhão, agravando os pedidos de seu banimento e de morte física e simbólica que contra ele requereram vários representantes dos poderes locais e de centro, secular e religioso. É sobre a circulação dessas infamações que tratam os tópicos a seguir deste artigo, começando pelo perfil social das testemunhas interrogadas nos inquéritos dos comissários mencionados na Tabela 1. Em seguida, narram-se algumas dessas inquirições no intuito de se elucidar a prática dos tribunais inquisitoriais no século XVIII e os costumes religiosos dos Andrades.

2.1 Perfil social dos denunciantes

Um primeiro aspecto a se destacar em relação às denúncias feitas nas inquirições dos comissários do Santo Ofício no Estado colonial do Maranhão e Grão-Pará diz respeito ao quantitativo de testemunhas no espaço de 35 anos: cerca de 150 denunciantes, alguns deles recorrentes nas diligências dos oito agentes da inquisição, distribuídos conforme ilustra a Tabela 2.

Tabela 2:
Percentual de testemunhas por inquirição no Estado do Maranhão e Grão Pará (1700-1750)

As inquirições dos comissários Carlos Pereira (jesuíta) e João da Purificação (franciscano) foram as que concentraram o maior número de testemunhas interrogadas. Somadas, perfazem um total de 52% em relação aos demais comissários. Do montante de denunciantes ao longo destas oito inquirições, 74% eram homens e 26% eram mulheres. Em relação ao aspecto étnico-racial, a maioria dos denunciantes eram brancos. Já a somatória dos percentuais de negros, índios e mestiços consistia em 39% das testemunhas inquiridas. Em relação ao estado civil e à naturalidade dos denunciantes, 49% eram casados e 16% eram de origem portuguesa, conforme se observa na Tabela 3.

Tabela 3:
Perfil social dos denunciantes nas inquirições dos comissários no Maranhão e Grão-Pará (1708-1743)

2.2 As inquirições do comissário João de Villar (1708-1711)

Em 18 de agosto de 1708, no Colégio Nossa Senhora da Luz, da Companhia de Jesus da cidade de São Luís do Maranhão, o então Reitor, na condição de comissário do Santo Ofício, deu início à sua diligência para investigar questões tocantes à Inquisição, nomeando para o cargo de escrivão, inicialmente, o padre Cláudio Gomes (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2...
, fl. 17). Ao longo dos três anos que durou a diligência, depuseram 16 testemunhas, o que correspondeu a 11% do total de denúncias contra os Andrades, nas quatro primeiras décadas do século XVIII.

A convocação das testemunhas desta inquirição se deu logo em seguida à sua abertura e à posse do primeiro escrivão, sendo Josefa de Barros de Novais a primeira a depor. Moça solteira, natural da cidade de Caldas da Rainha, Josefa, que na ocasião de seu depoimento estava com 43 anos, disse que, em 1707, ou até mesmo antes desta data,

Ouviu dizer a sua irmã, Luiza Maria, que Ângela Ribeira e Josefa, ambas filhas de Inácio Ribeira, lhe disseram que o padre José Rodrigues de Távora, tido e havido por cristão novo, fora achado por uma negra açoitando uma imagem de Cristo crucificado, a qual negra dissera que ouvira, e vigiara, e que vira. Depois declarou que ouvira dizer a Inácio Ribeira falando-se no fato sem se mencionar o sujeito, que o sujeito que fizera o dito fato era o Timbu8 8 De acordo com o dicionário de Raphael Bluteau, no século XVIII, a expressão timbu era uma palavra de origem indígena do tronco Tupi, que significava gambá (Silva, 1789). alcunha que diz ter o dito Padre José Rodrigues; e declarou mais que ele lhe dissera a ela denunciante, seu cunhado, Manuel de Quadros, o qual o ouvira contar a Manuel Licar. Declarou, porém, a denunciante que não sabia nem ouvira dizer o tempo em que o dito caso sucedeu, nem tão pouco sabia, ou ouvira qual era o nome da negra que vira o fato (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2...
, fl. 19).

Analisando os pronunciamentos de Josefa de Novais a respeito do que ouvira dizer sobre o padre José Rodrigues de Távora, é possível perceber como se formavam as redes de circulação de informações sobre indivíduos com estigmas de cristão-novo. Uma primeira constatação é a de que a denunciante não era uma testemunha ocular. Neste caso, apenas a negra, que Josefa disse não saber o nome, nem a data do fato, teria testemunhado a atitude do padre. Segundo, as infamações ou denúncias de práticas ilícitas poderiam partir dos ambientes e núcleos mais íntimos dos indivíduos com fama de cristão-novo e se estender a outros ambientes e núcleos, por meio das redes de sociabilidade e troca de informações. Por último, a circularidade dos fatos poderia se estender por anos, décadas e até séculos, perpassando por várias gerações, criando-se várias redes de informação.

A rede de informação constituída por Josefa de Barros de Novais, sua irmã Luiza Maria, seu cunhado Manuel de Quadros, e Inácio Ribeira Bitencourt e suas filhas Ângela e Josefa, além de Manuel Licar e do padre José Teixeira de Morais, é a primeira que aparece mencionada nos cadernos do Promotor da inquisição de Lisboa. Tendo em vista o que disse a denunciante Josefa de Barros de Novais nos autos da inquirição de 18 de agosto de 1708 - que soubera do suposto fato do açoite da imagem de Cristo crucificado pelo padre José de Távora, não por ter testemunhado o fato, mas por ouvir dizer por outras pessoas de seu convívio social -, ao referir-se a tais pessoas abriu caminho para que o comissário João de Villar as convocasse para denunciar aquele e outros fatos referentes ao Santo Ofício por desencargo de suas consciências, fazendo-o no dia seguinte ao depoimento de Josefa.

O primeiro a ser convocado foi o padre José Teixeira de Morais, um clérigo secular, morador da cidade de São Luís e natural da vila de Alenquer, na época, com 50 anos de idade. O motivo da sua convocação foi o fato de Josefa de Novais ter contado que o episódio do delito cometido pelo padre cristão-novo “sucedera detrás do paiol da farinha, onde a dita negra ia buscar farinha e declarou mais que ouvira dizer ao padre José Teixeira” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 20). Diante da comitiva de inquirição, instalada nas dependências do Colégio de Nossa Senhora da Luz, quando questionado sobre “se sabia, ou ouvira dizer que alguma pessoa açoitara a imagem de Cristo crucificado” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 20), José Teixeira de Morais negou ter conhecimento do fato, mesmo sendo admoestado pelo comissário de que “havia informação de que ele testemunha sabia da matéria” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 20).

A sonegação de informações aos tribunais do Santo Ofício da Inquisição incutia em grave crime, segundo o direito canônico, tendo a excomunhão como punição. Possivelmente, o padre José Teixeira não desconhecia essa jurisdição do Tribunal do Santo Ofício, porém ele manteve o seu depoimento de “que nem sabia, nem ouvira dizer o que se lhe perguntava”, advertindo que “se ouvira, ou soubera, o havia logo de denunciar, como sabe que era obrigado” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 20).

Manuel Licar, a terceira testemunha a depor na inquirição, também relatou que desconhecia o fato do maltrato e açoite da imagem de Cristo crucificado, diferentemente do que afirmou Inácio Ribeira Bitencourt, ao depor nos autos da diligência do comissário João de Villar, em 20 de agosto de 1708, declarando que

[...] ouvira dizer, sem se lembrar a quem, houvera 3 ou 4 anos que o padre José Rodrigues de Távora, no lugar do paiol da farinha, açoitara uma imagem de Cristo crucificado, e que ouvira dizer o vira uma negra, cujo nome não sabe, nem conhece, a qual negra se disse que vindo furtar farinha vira o fato, e que não ouvira dizer se achassem mais algumas pessoas (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 21).

Além de confirmar ter conhecimento do fato, da mesma forma como fizera também sua filha, Ângela Ribeira, em depoimento no dia 22 de agosto de 1708, Inácio Ribeira apontou que “falara no fato diante de seu genro Estevão de Abreu Pereira Bombarda” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 21). Já Ângela Ribeira declarou que soubera do fato pelo padre José Arnaud Vilella, quando este a advertiu da amizade que tinha com as parentas do padre José Rodrigues de Távora, que embora aparentassem ser boas cristãs, não o eram (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 22). As falas dos membros da família Ribeira indicam a existência de outra rede de informação sobre o testemunho ocular da negra, que disse ter visto o padre José de Távora açoitar a imagem de Cristo crucificado.

Analisando a formação dessa outra rede, por meio dos depoimentos do padre José Arnaud Vilella, Joana da Pascoa e do capitão Manuel Afonso Pereira, é possível perceber que a informação sobre o fato do açoite da imagem circulou em dois núcleos de sociabilidades diferentes, intermediados pelo padre José Arnaud Vilella. Um composto por Joana de Pascoa, uma negra chamada Marcelina, João Barbosa, Manuel Afonso, sua esposa Angélica e uma negra que testemunhou o caso. O outro era o da família Ribeira, composto por Inácio Ribeira Bitencourt, as suas filhas Ângela e Luiza, o seu genro Estevão, casado com esta última, e as irmãs Ângela de Barros e Luiza Maria. Em outras palavras, a negra que disse ter visto a cena do açoite contou a Manuel Afonso Pereira e a uma mameluca chamada Marcelina, que disse a Joana de Pascoa, da mesma forma como fez Manuel Afonso, contando também a sua mulher Angélica e a João Barbosa, seu vizinho. Já Joana de Pascoa mencionou o fato ao padre José Arnaud, que compartilhou a informação com a família dos Ribeira Bitencourt.

Outro aspecto a se destacar, na análise da primeira inquirição de que se tem notícia sobre os Andrades, diz respeito ao tempo do ocorrido, que diverge muito entre as testemunhas, variando de dez a quinze anos antes do momento da inquirição. Portanto, era incerto quando teria se dado o fato, que supostamente teria ocorrido quando José de Távora ainda não era clérigo e administrava os escravos de seu pai, Duarte Rodrigues de Távora (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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).

Por último, é importante ressaltar que, segundo os relatores das inquirições ocorridas entre 1708 e 1711, presididas pelo Reitor do Colégio Nossa Senhora da Luz da Companhia de Jesus do Maranhão - o então comissário João de Villar -, a fama de cristão-novo “judaizante” atribuída a José Rodrigues de Távora teria partido de uma negra escravizada, propriedade do pai do referido padre, mas que eles não sabiam quem era. Contudo, as denúncias não se restringiram somente à pessoa do padre José de Távora, mas também a seu pai, seus irmãos e irmãs e seu cunhado, Gregório de Andrade da Fonseca, que foram citados nos depoimentos dos padres João Capistrano, João e José de Morais Lobo, e dos capitães Domingos de Matos, Manuel de Quadros e Simão Dornelas, todos proferidos entre 1710 e 1711.

A partir da análise dos referidos depoimentos, é possível estabelecer uma terceira e última rede de informações sobre as condutas religiosas dos Andrade, nestes primeiros anos de investigação do tribunal inquisitorial de Lisboa, de que se tem notícia nos cadernos do Promotor. Dessa terceira rede de delatores, o primeiro depoimento que se encontra registrado nos autos é de autoria do padre João Capistrano, um franciscano do Convento de Santo Antônio do Maranhão, onde era diácono e pregador. Este compareceu ao colégio dos jesuítas da cidade de São Luís no dia 4 de dezembro de 1710, sob a intimação do comissário João de Villar, e “disse que tinha coisas a denunciar pertencentes ao Santo Ofício” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 23). A primeira acusação feita por João Capistrano em seu depoimento pode ser analisada como um fato que corrobora as relações de amizade e clientela que os Andrades tinham com o governador do Estado, Cristóvão da Costa Freire, pois, segundo o denunciante,

[...] disse que aos vinte e quatro de novembro deste presente ano de 1710, estando na Casa Forte do Iguará para fazer jornada para a Bahia, daí para Lisboa com licença dos seus Prelados, que para isso tinha o querendo ir em um comboio de gente que o queria levar em sua companhia; o tenente da dita Casa Forte, João Nogueira lhe impediu a jornada dizendo que era assim ordem do Governador Cristóvão da Costa Freire, e fazendo lhe um protesto de que era religioso, e que com ele senão entendia a dita ordem do Governador, nem assim o quis deixar passar [...] (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 23).

A proibição da viagem do frei João Capistrano à Bahia e depois a Lisboa, decretada pelo governador do Maranhão e Grão-Pará, Cristóvão Freire, pode estar relacionada ao fato da intimação que o clérigo havia recebido para ir se apresentar ao Santo Ofício em Lisboa, “para aliviar sua consciência de coisas que lhe pertenciam e se não podia cá dizer” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 23), conforme afirmou em seu relato ao Comissário. É possível que esta ação do governador tenha sido uma estratégia para evitar que denúncias contra os Andrades chegassem até a Corte. Uma manobra sem sucesso, pois há registros, no caderno do Promotor n. 77, de uma denúncia feita por João Capistrano em 29 de outubro de 1711, em Lisboa, cujo teor se analisa no tópico seguinte.

No entanto, antes de se passar para as denúncias feitas em Lisboa, é necessário retornar aos depoimentos de 1710 e 1711 pronunciados no Maranhão, sobretudo ao episódio da Casa Forte do Iguará, pois foi nesta ocasião que o padre João Capistrano, segundo seus relatos, disse que, ao passar pela Ilha da Faixa, ouviu do padre João de Morais Lobo que, na cidade de São Luís, se faziam algumas “judiarias”. Já na cidade de Icatu, ouviu de José da Costa que, em uma casa da cidade de São Luís, pertencente a Duarte Rodrigues de Távora, se açoitava uma imagem de Cristo, segundo tinha ouvido de outras pessoas (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 24).

As denúncias do frei João de Capistrano fizeram com que a diligência do comissário João de Villar se deslocasse para a vila de Icatu, nomeando para este fim o escrivão Sebastião Pereira, padre da Companhia de Jesus, que assim o fez em 20 de dezembro de 1710, indo até a casa do alferes José da Costa Mendes para tomar seu depoimento. Quando questionado pelo escrivão “se sabia, ou ouvira, que alguma pessoa açoitara um Cristo” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 25), José da Costa respondeu que, certa vez, estando ele doente em sua casa na cidade de São Luís, ouviu um homem desconhecido dizer que ouviu de uma mameluca da casa de Duarte Rodrigues de Távora que naquela casa se açoitou um Cristo (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 25).

Com o depoimento do alferes José da Costa, mais uma vez recaiu sobre os Andrades a suspeita de terem cometido crime de heresia, porém, seu depoimento não trouxe indícios para o comissário inquirir novas testemunhas, diferentemente da denúncia do padre João de Morais Lobo, que, em 18 de janeiro de 1711, compareceu à convocação do escrivão para prestar seu depoimento. Em seus relatos, o então padre secular contou que

[...] ouvira dizer a Manuel de Quadros, que as mais sextas-feiras se ajuntava a família de Duarte Rodrigues de Távora [...] para alguma coisa contra nossa Santa Fé, e que algumas vezes nestas ocasiões, passava um cafuz[o], por nome Hilário, com um crucifixo em um tabuleiro, e que este Hilário era escravo de Isabel Aires, pertencente a esta família e que o dito Manuel de Quadros dissera mais ouvira ao genro de Duarte Rodrigues João Camelo estranhar muito estes ajuntamentos que faziam, porém que não sabia e para que eram e que quando Manuel de Quadros contava isso estava presente Manuel Dias oficial de barbeiro (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 26).

Os supostos relatos de Manuel de Quadros, além de intensificarem as acusações de práticas de repúdio à religião católica por parte das já mencionadas famílias cristãs-novas estigmatizadas, ampliou o número de suspeitos de tais práticas e das testemunhas de tais ações que geraram as suspeitas. A começar pelo próprio genro do capitão Duarte de Távora, que, interrogado pelo comissário em oito de maio do mesmo ano, negou que soubera ou ouvira qualquer informação da reunião de pessoas para cometerem algo contra a fé católica.

Manuel de Quadros, conforme se disse anteriormente, era casado com Luiza Maria de Novais, a irmã de Josefa de Barros de Novais, que depôs na inquirição do padre João de Villar em 1708. Ele repetiu ao padre João de Morais Lobo o que ouviu de Manuel de Licar, sobre o fato de José Rodrigues de Távora ter açoitado um Cristo crucificado. As citações do nome de Manuel Borges de Quadros nas inquirições levaram o comissário a interrogá-lo em 7 de maio de 1711. Ele compareceu ao Colégio Nossa Senhora da Luz e contou que

[...] houvera dois meses, pouco mais ou menos, que ouvira dizer ao padre Inácio Rodrigues de Távora [...] visitador geral deste Bispado do Maranhão, que ele dissera na cidade do Grão Pará, em um sermão que fez de São João Batista, que este santo fora três vezes santo, isto é, santo na conceição, santo no ventre da mãe, e santo depois de nascido (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 26).

O depoimento acima é um indício de que as interpretações da exegese dos Santos Evangelhos feita pelos clérigos desta família com fama de cristã-nova, principalmente em momentos de cerimônias públicas, também eram alvos de denúncias, caso se ouvisse alguma blasfêmia ou heresia por parte deles.

No entanto, não foi só de Manuel de Quadros que o padre João de Morais Lobo disse ter ouvido acusações de heresias perpetradas por aquela dilatada família. O capitão Domingos de Matos Leitão Silva, que é o primeiro a mencionar em seu relato de suspeita de práticas heréticas o nome de Gregório de Andrade, também contou ao padre Morais Lobo que

[...] uma preta de Gregório de Andrade da Fonseca, lhe pedira a comprasse, e que perguntando-lhe a causa porque não queria servir a seu Senhor, lhe dissera, que vindo um dia de fora de um recado que lhe tinham mandado fazer, e subindo por uma escada de casa do dito seu Senhor, achara em cima na casa a seu Senhor e outros seus parentes açoitando a um Cristo, e que por ela entrar ou subir, e se retirar logo para baixo, a castigaram rigorosamente (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 27).

Mais uma vez se vê nas inquirições contra os Andrades a circulação da informação de açoite a uma imagem religiosa partir do relato de uma negra escravizada pertencente e do convívio cotidiano daquelas famílias, como testemunha ocular. Quando foi convocado a depor, no dia 5, e retornando a falar no dia 6 de maio de 1711, Domingos Leitão confirmou o que ouviu de uma negra escrava de Gregório de Andrade da Fonseca, chamada Esperança. Segundo o denunciante, Esperança pediu que ele a comprasse e que estava bastante machucada por ter sido açoitada pelo seu senhor, e que isso aconteceu por ela “ver uma vez a ele dito Gregório de Andrade e as irmãs de sua mulher em uma torrinha que tem em sua casa de sobrado, estar açoitando a imagem de um crucifixo” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 27).

O capitão de infantaria da praça de São Luís, Domingos de Matos Leitão da Silva, que havia chegado àquela cidade em 26 de março de 1687, para servir no posto de alferes, contou ao comissário que dava crédito ao que disse a negra por tê-la visto “tão lastimada, e que tivera a intenção de a comprar” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 27v), porém não o fez porque não falava com Gregório de Andrade, “mas que ouvira dizer que fora a dita preta para o Pará” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 27v), sendo vendida a Manuel Rodrigues Chaves. No Pará, a negra Esperança também contou ao capitão mor João Duarte Franco e a outras pessoas brancas “que na casa de Gregório de Andrade se ‘judiava’” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 28), porém não deram muito crédito ao que disse a negra.

Este fato requereu da ação do tribunal da inquisição de Lisboa mais diligências e busca de mais testemunhas para que as acusações fossem consideradas legais pela doutrina do direito inquisitorial. Porque, para o modus operandi do tribunal do Santo Ofício bastavam três testemunhas legais de acusação para que o crime de heresia fosse considerado, porém, se o réu ou o investigado tivessem a fama de “vis” e “ruins”, esse número diminuía para duas testemunhas. No caso de testemunhas menos idôneas, ou inábeis, que consistiam em pessoas excomungadas, espúrias, infames, ou que tivessem outros “defeitos” de direito, bastavam duas para serem consideradas legais, e seis para convencer os tribunais de que foi cometido o crime.

Mas não eram só açoites ou qualquer outro tipo de ato considerado agressivo às imagens sacras do culto católico que eram tidos como crimes de heresia ou judaísmo, atitudes festivas profanas ou de regozijo que envolvessem as tais imagens também o eram. Exemplo disso é o relato que fez Domingos Leitão, quando disse que ouviu de seu enteado, Simão Dornelas da Câmara,

[...] que o padre José Rodrigues de Távora [...] saíra uma vez de uma câmara para uma sala, onde [...] estava Roberto Serrão, que agora é já defunto, com outras pessoas fazendo um descante, e que saiu o dito padre dançando com um crucifixo nas mãos, e dizia estas palavras ao som da viola (aqui o tendes, aqui o tendes), e que visto a estas pessoas que estavam fazendo o descante pararam e o dito padre se tornou a recolher para a câmara (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 27).

Outro depoimento tomado a partir das relações de sociabilidade do padre João de Morais Lobo foi o de seu irmão José, que também era clérigo do hábito de São Pedro, o mesmo dos irmãos José e Inácio de Távora, e que foi intimado a depor em 4 de maio de 1711 por contar ao seu irmão que ouviu do sacristão e tesoureiro da Sé da cidade de São Luís, Antônio Velho, que Inácio Rodrigues de Távora, ao batizar uma criança, pediu-lhe que “botasse a água fora pelo sumidouro” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 28v). Segundo Antônio Velho, Inácio de Távora teria feito isso outra vez e teria enchido a pia batismal com outra água, e que, ao dar parte disso ao padre José Gonçalves, este o pediu que tomasse as chaves da igreja da mão do padre Inácio de Távora.

Em seu testemunho, José de Morais Lobo confirmou o que tinha dito ao seu irmão, acrescentando que suspeitava do padre Inácio Rodrigues de Távora ter feito algum batismo às escondidas, com menos reverência daquele sacramento. É possível que o denunciante tenha se referido ao fato de o padre, suspeito de cristão-novo “judaizante”, ter batizado alguém de sua família, como fizera em outra ocasião, ao batizar Isabel, filha de Guilherme Everton e Vitória de Andrade, em 18 de janeiro de 1716, tendo como padrinhos a sua irmã Maria Brandoa e o padre José de Távora, que era avô da criança, por ser pai de Vitória de Andrade. Uma celebração de um sacramento da igreja católica em que todos os envolvidos eram suspeitos na fé, com exceção de Guilherme Everton.

Uma das últimas testemunhas interrogadas pelo Comissário João de Villar foi Simão Dornelas da Câmara, em 9 de maio do ano de 1711. O denunciante, que era natural e morador na cidade de São Luís, quando interrogado sobre a ocasião do descante, em que o padre José de Távora, quando ainda era estudante, havia dançado e cantado com um crucifixo na mão, confirmou que foi verdade e que ouviu dizer estar presente nesta ocasião José Baldes da Silva, que era casado com Lourença de Távora, irmã do dito padre.

A análise detalhada destas primeiras diligências, de que se tem notícia, da inquisição de Lisboa no Maranhão, para investigar os supostos crimes contra a fé católica praticados por membros da família Andrade, é importante para compreender como o estigma de cristãos-novos instigara a investigação, e esta, por sua vez, intensificara o estigma. Neste primeiro momento, as acusações se resumiram em delatar os supostos crimes de heresia e blasfêmia, sendo o de açoite de imagens sacras um dos mais pertinentes nos depoimentos.

2.3 Denunciantes em Lisboa

Conforme se disse anteriormente, as denúncias contra os Andrades, estigmatizados de cristãos-novos, não se restringiram às capitanias do Estado do Maranhão e Grão-Pará, elas também foram proferidas na Corte, em Lisboa, sede do Tribunal do Santo Ofício. A primeira delas, a constar nos autos dos Promotores daquele tribunal, é a do vigário José Palheta de Andrade, da qual já se falou, e que aqui se retoma para tratar de como este procedeu em suas diligências.

Uma primeira questão que se destaca é a suposta inabilidade e não oficialidade do exercício do cargo de Comissário pelo padre José Palheta. Segundo o frei Vitoriano Pimentel, agente da inquisição que assume as diligências no Maranhão a partir de 1715, o clérigo, que era natural da cidade de Belém e tinha se ordenado em Lisboa, chegou ao Maranhão no final do mês de janeiro de 1710 trazendo uma provisão da Mesa da Consciência para atuar no ofício de vigário encomendado na igreja de Nossa Senhora de Belém. Porém era um sujeito falador e que bebia em demasia entre homens maduros, tido em alguns casos por ridículo (Cadernos do Promotor 109, 1723-1750CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 109, livro 277, fl. 118. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1723-1750. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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). Mas esta suposta má fama não impediu que o referido clérigo atuasse como agente inquisitorial, mesmo que não fosse oficialmente.

José Palheta de Andrade aproveitou sua ida à Corte para denunciar algumas coisas que tinha ouvido sobre o padre Inácio Rodrigues de Távora e seu pai, quando, segundo ele, recebeu do Tribunal da Inquisição de Lisboa permissão para procurar as informações que pudesse e as enviar para o Reino. No Maranhão, o então vigário encomendado tratou de pôr em prática o que lhe foi designado por meio de um sumário de testemunhas que, segundo o Frei Vitoriano Pimentel, ele mesmo escreveu, sem constar nos autos a ordem dos inquisidores para fazer a dita diligência.

Ao destacar, na carta que escreveu do Pará aos Inquisidores no Reino em 3 de agosto de 1711, que o Maranhão se achava numa “lastimosa queixa geralmente de todo o Povo” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 17), em virtude das relações que os comissários tinham com os Andrades, José Palheta acusou Duarte Rodrigues de Távora de ser o sacerdote daquelas famílias, em meio às quais o tratavam, “até muitos gentios e escravos, por Pai Abrão, e dizem que entre si todos tem nomes daqueles da nação hebreia” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 17). Seguindo em seu extrato das notícias que disse ter recolhido sobre aquelas famílias, José Palheta advertiu aos inquisidores que as testemunhas pediam que ficassem livres destes judeus.

Não há registros, nos cadernos do Promotor da inquisição de Lisboa, das vias das diligências que fez o vigário José Palheta. Essa ausência pode ser explicada devido ao fato de que o referido clérigo não conseguiu despachá-las para a Corte por dois motivos: primeiramente, por ter naufragado o navio que levava uma das cópias das denúncias; e, em segundo lugar, por impedimento do governador do Estado do Maranhão, Cristóvão da Costa Freire, e do padre Inácio de Távora. Ou seja, nas palavras do padre Palheta, a parcialidade do governador do Maranhão e Grão-Pará nas diligências sobre os Távora e os Andrade se devia ao desejo de defendê-los publicamente, ao passo que “atabafa tudo, e muitas queixas que deles se tem remetido a esse Santo Tribunal, tudo apanha as mãos e some, como foi a dos Religiosos Capuchos e dos clérigos do Maranhão” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 18).

Ao fazer estas acusações a Cristóvão da Costa Freire, na carta que escreveu aos inquisidores em 3 de agosto de 1711, José Palheta de Andrade se referia ao sumário, que ele próprio escreveu, das denúncias que fizeram os clérigos, e pediu que eles as assinassem, e que o governador, ao saber da existência de uma cópia, o fez entregá-la a ele, afirmando ser familiar do Santo Ofício, de forma que ele lhe entregou os papéis. De fato, há nos arquivos da inquisição de Lisboa um registro da diligência de habilitação de Cristóvão da Costa Freire, feita em 1678, para servir como agente da inquisição (Diligência de Habilitação de Cristóvão..., 1678DILIGÊNCIA DE HABILITAÇÃO DE CRISTÓVÃO da Costa Freire, circa 1588/1820. Tribunal do Santo Oficio, Conselho Geral, Habilitações, Cristóvão, mç. 5, doc. 86. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). circa 1588/1820. Disponível em: <Disponível em: https://digitarq.arquivos.pt/details?id=2324288 >. Acesso em: 15 jan. 2023.
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). Portanto, subentende-se que era verdade, e que o intuito do governador era ficar com o resumo dos depoimentos, aproveitando-se do seu poder de Familiar do Santo Ofício.

A relação de amizade entre Cristóvão da Costa Freire e os Andrades foi muito importante para livrá-los de uma possível condenação por parte dos tribunais inquisitoriais, haja vista o grande poder que aquele possuía, por ser um fidalgo e ter relações de parentesco com funcionários régios. Cristóvão era natural de Lisboa, filho de Simão da Costa Freire - o senhor de Pancas, título que depois ele também herdou - e casado com a filha de Francisco Correa de Lacerda, um secretário do Estado.

Conforme afirma o padre José Palheta, estas prerrogativas do governador do Maranhão e Grão-Pará faziam dele um homem temido por todos naquelas terras, e que, por isso, e por ele confirmar na sua familiatura ao Santo Ofício, entregou-lhe os inquéritos. De posse deles, Cristóvão da Costa Freire alegou que o vigário encomendado da igreja de Belém, o padre Palheta, não tinha ordem dos inquisidores para atuar como comissário e fazer diligências. De fato, ele não possuía nenhuma provisão que lhe garantisse esse direito, ou ao menos não há registro dela nos arquivos inquisitoriais. Todavia, é provável que a Mesa dos Inquisidores não a tenha feito formalmente e por escrito, pois José Palheta afirmou em sua carta que “a ordem foi vocal” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 17). Alegações à parte, quando o padre tentou recolher novamente em suas mãos o papel, Cristóvão da Costa Freire disse que “já o tinha queimado” (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 18v).

Destruídos pela água ou pelo fogo, ocorre que não restaram registros dos depoimentos que o padre José Palheta disse ter colhido em diligências pelo Maranhão e Grão Pará. Mas a partir do resumo que fez das denúncias na carta, referida acima, que escreveu à Corte, confiada para ser entregue pelo frei Valentim - um clérigo capuchinho do Convento de Santo Antônio -, é possível traçar a rede de informação que o mesmo percorrera para fazer suas acusações, que retoma alguns indivíduos das outras redes, analisadas no item anterior.

Temeroso em relação à própria vida, José Palheta reuniu nesta carta a lembrança das principais acusações que os denunciantes que ele interrogou fizeram contra as famílias de Duarte Rodrigues de Távora e de Gregório de Andrade da Fonseca, cerca de 3% do total de testemunhas ouvidas ao longo de quatro décadas do século XVIII. O primeiro ato de heresia, supostamente praticado por Duarte Rodrigues de Távora, destacado pelo padre José Palheta, refere-se ao açoite de uma imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo, que uma negra, Ana Cains, teria presenciado na dispensa da casa dos Távoras. Em consequência disto, assim como Esperança, que teria presenciado Gregório de Andrade também açoitando uma imagem religiosa, a escrava foi vendida para o capitão-mor Luís de Morais, no Grão-Pará. Deslocando sua diligência para aquela região, José Palheta disse ter ouvido da escrava Esperança que seus antigos senhores costumavam dar-lhe tapas na boca e introduzir nela sujeira de galinha, quando ela vinha comungar (Cadernos do Promotor 77, 1703-1713CADERNOS DO PROMOTOR. Caderno 77, livro 271. ANTT, TSO, IL, 030. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). 1703-1713. Disponível em: Disponível em: http://digitarq.arquivos.pt/details?id=2318095 . Acesso em: 30 mar. 2023.
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, fl. 17v).

Outros crimes de heresias relatados pelo padre Palheta dizem respeito a várias práticas de desdém que o capitão Duarte Rodrigues de Távora teria feito contra os cristãos-velhos, os rituais e os símbolos da religião Católica, inclusive em seus locais sagrados e de culto. São eles: dar figas ao altar da imagem do Santíssimo Sacramento da igreja da Sé de São Luís; dar as boas festas em sexta-feira da Paixão; oferecer tabaco (cigarro) com excremento humano misturado ao fumo, como supostamente fez a um escrivão chamado Manuel da Costa; e oferecer aguardente com a qual supostamente teria lavado suas partes pubianas, segundo relatos de uma pessoa desconhecida da casa do meirinho Francisco Leitão.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os Andrades eram publicamente conhecidos pelos moradores das vilas e cidades do Maranhão e Grão-Pará. Estavam constantemente presentes em eventos, missas e festividades religiosas católicas. Suas lavouras e suas residências em São Luís eram frequentadas pelos cidadãos, grupos políticos, vizinhos e escravizados. A fama de serem cristãos-novos, as acusações de irreverentes relações que tinham com os cultos católicos e o conhecimento das práticas judaicas que exerciam partiram de denunciantes inseridos nos grupos sociais que conviviam com eles.

A fama pública da prática de crimes contra a fé católica, por parte de indivíduos ou famílias suspeitos de serem cristãos-novos, poderia circular dentro das redes sociais ligadas a eles, incluindo o próprio seio familiar, criados, clientes e amigos. Mesmo que a privacidade das moradias não isentasse o indivíduo do estigma de ser um cristão-novo, os boatos e rumores sobre a conduta religiosa suspeita dos indivíduos podiam se espalhar e perdurar ao longo do tempo. Uma vez iniciado um processo com base em uma denúncia, mais testemunhas poderiam ser interrogadas e mais locais investigados à medida que nomes de pessoas e cidades fossem mencionados nos registros.

Nas páginas das inquirições dos comissários há um discurso persuasivo, exemplificado com relatos das testemunhas, a respeito do grande temor e do “miserável” estado de conturbação, tanto temporal quanto espiritualmente, causado por um grupo de pessoas de origem judaica, composto pelos Andrades. Havia uma grande crença, ou o relator tenta convencer os inquisidores disso, de que Gregório de Andrade era um homem poderoso, vingativo e diabólico. Ao longo das recorrentes denúncias, há uma série de depoimentos que demonstram a híbrida religiosidade dos Andrades e suas relações com as instituições da Igreja.

Segundo as denúncias do Frei Pedro do Espírito Santo, religioso congregado à ordem franciscana, os Andrades eram homens de nação hebraica e causavam grandes perturbações na cidade de São Luís, onde Gregório de Andrade era “o cabeça e maquinador de todos os motins” (Denúncia do Padre Pedro..., circa 1730-1732DENÚNCIA DO PADRE PEDRO do espírito Santo contra Gregório de Andrade, circa 1730-1732. Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 15293. Lisboa (Arquivo Nacional da Torre do Tombo - ANTT). circa 1730-1732. Disponível em: <Disponível em: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=2315412 >. Acesso em: 15 jan. 2023.
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, fl. 2).

Para ele, Gregório de Andrade fingia ser grande beato e pregava rezas todos os dias numa capela em seu engenho. Em tempo de festas, principalmente na Semana Santa e no Natal, os Andrades costumavam fazer imagens de Jesus Cristo com farinha de mandioca, dançavam com elas e as comiam.

Na inquirição de 1731, do Padre Carlos Pereira, em São Luís, durante a qual “foram arguidas trinta testemunhas9 9 A maioria dos denunciantes fazia parte da Companhia da Nobreza, eram cidadãos ou privilegiados e disputavam espaços políticos e cargos com Gregório de Andrade, ou seja, para além das questões religiosas havia conflitos de sociabilidade que contribuíram para agravar as denúncias contra os Andrade da Fonseca. que falaram sobre os cristãos-novos, e sobre as ‘judiarias’ praticadas pelos descendentes de Duarte Rodrigues”, há muitas informações sobre Gregório de Andrade e da Fonseca e seus familiares, sendo recorrentes falas sobre as práticas religiosas singulares dos Andrades (Novinsky, 2006NOVINSKY, Anita Waingort. O Santo Ofício da Inquisição no Maranhão: a inquirição de 1731. São Luís: UEMA, 2006., p. 19).

Dentre o que se verbalizou nos depoimentos colhidos pelo padre Carlos Pereira, Comissário do Santo Ofício, no interior do Colégio da Companhia de Jesus denominado de Nossa Senhora da Luz, a principal acusação contra os Andrades era o fato de serem cristãos-novos e não terem uma conduta cristã católica condizente com o que pregava a Igreja.

O padre Frei Manoel da Conceição, que na ocasião das inquirições ocupava o cargo de guardião do Convento de Santo Antônio em São Luís, afirmou ter ouvido dizer, por José Maciel Parente, que viu o padre José de Távora10 10 Os Rodrigues de Távora eram uma família de cristãos-novos instalada na Capitania do Maranhão desde o século XVII. Passaram a ser perseguidos pela Inquisição no Maranhão a partir de 1715, quando os irmãos Inácio e José de Távora, ambos padres do hábito de São Pedro, foram denunciados pelo Frei Luiz da Anunciação, da Província de Conceição no Grão-Pará (cf. Novinsky, 2006). , cunhado de Gregório de Andrade, dançar com uma imagem de “Cristo crucificado e sem calvário” na mão, no tempo da Páscoa.

Na denúncia feita em 1731 por Victoriano Pinheiro Meirelles, as mulheres da família Andrade foram acusadas por Raimundo de Azevedo de mandarem fazer um menino Jesus de massa, tendo cometido “grandes judiarias” com o tal menino na noite de Natal. O denunciante evidencia em seu depoimento que a referida imagem fora feita com “certa invenção”, o que leva a crer que provavelmente fugia de algum padrão ou dos estilos e formas em que comumente as esculturas eram fabricadas.

A preocupação com o formalismo das esculturas religiosas de Cristo, Maria e dos santos era uma questão recorrente nas doutrinas da Igreja. Qualquer sintoma de fuga aos padrões estilísticos das imagens poderia se tornar motivo de denúncia aos olhos do Tribunal do Santo Ofício da Inquisição, porque rompia com as convenções religiosas e estabelecia outras. Guiomar da Conceição, irmã de Gregório de Andrade, fora acusada de vestir as suas próprias roupas na imagem de Nossa Senhora do Carmo. A montagem de um presépio, em cima de um molinete de fabricar aguardente, pelos filhos de Gregório de Andrade, fora alvo de crítica e estranhamento por parte do relator dos depoimentos, dizendo ser “muito ridículo”.

O aspecto afetivo, por parte dos cristãos, com o imaginário religioso católico do século XVIII, intensificava o estranhamento dos denunciantes em relação ao desprendimento e à reverência de Gregório de Andrade e seus familiares com as imagens de Cristo e outros objetos sagrados, pois ao mesmo tempo em que serviam como elemento componente de um presépio ou altar, também eram brinquedos para seus netos11 11 Pelo traslado do testamento de Lourença de Távora, irmã de Ignês de Andrade, é possível identificar o nome de algumas netas de Gregório de Andrade. Anna Maria, filha de Michaella com Francisco Cavalcanti; e as irmãs Ignês, Anna e Angélica, filhas de Isabel com Antônio Alvares de Brito. Para Anna Maria, Lourença deixou dez mil réis em dinheiro. Já para Ignês, designou a quantia de vinte mil réis, também em dinheiro. Ana e Angélica herdaram, juntamente, cinco mil réis em dinheiro (Mota, 2001, p. 87). .

A disseminação de informações nas inquirições provavelmente ultrapassou fronteiras geográficas e temporais, o que significa que as alegações e os detalhes dessas supostas condutas chegaram a várias pessoas e lugares. Isso levou a um conjunto de denúncias e delações mais complexas, com um número maior de testemunhas a serem interrogadas e diligências a serem realizadas em diferentes locais, à medida que nomes de pessoas e cidades eram mencionados aos comissários.

Ao mesmo tempo em que Gregório de Andrade era tachado de homem de nação hebraica, ele e a maioria dos seus parentes participavam ativamente da religião católica. Para os relatores do Tribunal do Santo Ofício, a participação de Gregório na religião Católica era fruto de uma fingida devoção, sendo ele um judeu sutil.

Mais de duzentos anos depois da extinção dos tribunais da Inquisição, num contexto marcado pelas revoltas liberais em Portugal, numa Europa revolvida pelas guerras napoleônicas, resta perguntar o quanto ainda prevalece nessas sociedades das vetustas estruturas ideológicas e institucionais do Santo Ofício.

REFERÊNCIAS

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  • VAINFAS, Ronaldo. Trópico dos pecados: Moral, Sexualidade e Inquisição no Brasil. Rio de Janeiro: Campus, 1989.
  • 1
    Sobre o conjunto de práticas heterodoxas que os tribunais inquisitoriais da época moderna condenavam no vasto império português, cf. Vainfas (1989VAINFAS, Ronaldo. Trópico dos pecados: Moral, Sexualidade e Inquisição no Brasil. Rio de Janeiro: Campus, 1989.).
  • 2
    Faz-se uso desta expressão para referir-se ao conjunto de indivíduos que atuaram nos Tribunais do Santo Ofício da Inquisição portuguesa, mas que não constituíam cargos oficiais fixos, sobretudo comissários e familiares, conforme destaca Feitler (2007FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: igreja e inquisição no Brasil: Nordeste 1640-1750. São Paulo: Alameda; Phoebus, 2007., p. 83). Portanto, o emprego do termo agente da inquisição, ao longo deste artigo, refere-se, principalmente, aos comissários inquisitoriais que assumiram este cargo nas diligências ocorridas no Maranhão e Grão-Pará, durante a primeira metade do século XVIII. Sobre a Inquisição e seus agentes há uma vasta e rica produção historiográfica clássica e recente, na qual se destacam os seguintes trabalhos: Anita Novinsky (1972NOVINSKY, Anita Waingort. Cristãos novos na Bahia: 1624-1654. São Paulo: Perspectiva, 1972.), Sônia Siqueira (1978SIQUEIRA, Sonia A. A inquisição portuguesa e a sociedade colonial. São Paulo: Ática, 1978.), Ronaldo Vainfas (1989VAINFAS, Ronaldo. Trópico dos pecados: Moral, Sexualidade e Inquisição no Brasil. Rio de Janeiro: Campus, 1989.), Daniela Calainho (2006CALAINHO, Daniela Buono. Agentes da fé: familiares da Inquisição portuguesa no Brasil colonial. Bauru, SP; Edusc, 2006.), Bruno Feitler (2007FEITLER, Bruno. Nas malhas da consciência: igreja e inquisição no Brasil: Nordeste 1640-1750. São Paulo: Alameda; Phoebus, 2007.) e Aldair Carlos Rodrigues (2014RODRIGUES, Aldair Carlos. Igreja e Inquisição no Brasil: agentes, carreiras e mecanismos de promoção social - século XVIII. São Paulo: Alameda, 2014.).
  • 3
    Para além da questão das crenças, os papéis do Santo Ofício são “registros escritos de testemunhos orais [...] profundamente distorcidos, [...] com uma costumeira projeção de estereótipos” (Ginzburg, 2011GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício. Tradução de Rosa Freire d’Aguiar e Eduardo Brandão. São Paulo: Companhia das Letras, 2011., pp. 280-291). A característica ambígua e dialógica das fontes inquisitoriais e a retórica judiciária, em que os testemunhos geralmente eram apropriações do que se ouviu dizer, tornou os processos e as denúncias bastante imprecisos, o que justifica a necessidade de se recorrer a outras tipologias de fontes.
  • 4
    As historiografias ibérica e brasileira sobre a inquisição apresentam características peculiares e pertinentes à maioria das obras, a descrição da ação do Santo Ofício e a narratividade dos processos inquisitoriais, porém, algumas produções avançaram ou têm avançado nessa tarefa descritiva/narrativa, partindo para análises mais profundas. Para tanto, a influência da interdisciplinaridade, do uso de teorias para além da História, tem contribuído nos olhares mais interpretativos sobre a historiografia da inquisição, em que se destacam a semiótica da cultura (Nogueira, 2012) e a etnografia das práticas religiosas (Rodrigues, D., 2018).
  • 5
    A visitação às localidades pelo poder eclesiástico e secular foi uma prática que se perpetuou desde a época medieval e se estendeu para as áreas coloniais. Incorporada pelo Tribunal do Santo Ofício da Inquisição, consistia numa “inspeção periódica, que, por determinação do Conselho Geral do Santo Ofício, instituía um delegado seu para inquirir sobre o estado das consciências em relação à pureza da fé e dos costumes” (Siqueira, 1978SIQUEIRA, Sonia A. A inquisição portuguesa e a sociedade colonial. São Paulo: Ática, 1978., p. 183). Destas inquirições se forjavam as denúncias, que persuadiam, por intermédio do interrogatório, os indivíduos à delação.
  • 6
    O olhar da inquisição voltou-se para o Maranhão no início do século XVII no ano de 1619, quando ainda estava se consolidando o processo de conquista e colonização daquela região pelos portugueses. Uma das primeiras denúncias aos Inquisidores do Tribunal do Santo Ofício de Lisboa, referente a um morador do Maranhão, foi contra o Capitão Francisco Caldeira, conforme menciona Anita Novinsky (2006NOVINSKY, Anita Waingort. O Santo Ofício da Inquisição no Maranhão: a inquirição de 1731. São Luís: UEMA, 2006.).
  • 7
    Sobre a afirmação de que a denúncia do padre José Palheta de Andrade, de 1707, é a primeira das quais se têm registros nos cadernos do Promotor da Inquisição de Lisboa, cf. Mendonça (2011MENDONÇA, Poliana Gouveia. Um cristão-novo governando o bispado? A trajetória de Felipe Camelo de Brito no Maranhão setecentista. In: COSTA, Yuri; GALVES, Marcelo Cheche (Orgs.). Maranhão: ensaios de biografia e história. São Luís: Café & Lápis, 2011. pp. 231-252., p. 237).
  • 8
    De acordo com o dicionário de Raphael Bluteau, no século XVIII, a expressão timbu era uma palavra de origem indígena do tronco Tupi, que significava gambá (Silva, 1789SILVA, António de Morais. Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D. Rafael Bluteau. Reformado, e acrescentado por Antonio de Moraes Silva. Natural do Rio de Janeiro. Lisboa: na Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789. 2 vols.).
  • 9
    A maioria dos denunciantes fazia parte da Companhia da Nobreza, eram cidadãos ou privilegiados e disputavam espaços políticos e cargos com Gregório de Andrade, ou seja, para além das questões religiosas havia conflitos de sociabilidade que contribuíram para agravar as denúncias contra os Andrade da Fonseca.
  • 10
    Os Rodrigues de Távora eram uma família de cristãos-novos instalada na Capitania do Maranhão desde o século XVII. Passaram a ser perseguidos pela Inquisição no Maranhão a partir de 1715, quando os irmãos Inácio e José de Távora, ambos padres do hábito de São Pedro, foram denunciados pelo Frei Luiz da Anunciação, da Província de Conceição no Grão-Pará (cf. Novinsky, 2006NOVINSKY, Anita Waingort. O Santo Ofício da Inquisição no Maranhão: a inquirição de 1731. São Luís: UEMA, 2006.).
  • 11
    Pelo traslado do testamento de Lourença de Távora, irmã de Ignês de Andrade, é possível identificar o nome de algumas netas de Gregório de Andrade. Anna Maria, filha de Michaella com Francisco Cavalcanti; e as irmãs Ignês, Anna e Angélica, filhas de Isabel com Antônio Alvares de Brito. Para Anna Maria, Lourença deixou dez mil réis em dinheiro. Já para Ignês, designou a quantia de vinte mil réis, também em dinheiro. Ana e Angélica herdaram, juntamente, cinco mil réis em dinheiro (Mota, 2001, p. 87).

Disponibilidade de dados

Citações de dados

AGENTES DA INQUISIÇÃO do Maranhão: banco de dados preparado por Eloy Abreu a partir de diversas fontes com o auxílio do software FileMaker Pro 6.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    07 Fev 2023
  • Aceito
    21 Ago 2023
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