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Violência contra a pessoa idosa no contexto de pandemia pelo novo coronavírus

A população idosa do Brasil está mais longeva com incremento, sobretudo, da parcela com mais de 80 anos. Se por um lado, viver mais pode ser um ganho, por outro, pode significar mais pessoas dependentes de cuidadores e de cuidados11 Minayo MCS [Editorial]. Idosos dependentes de cuidadores. Ciênc Saúde Colet. 2021;26(1):1-1. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232020261.36602020 .. Lamentavelmente, grande parte dos idosos brasileiros não tem o direito básico de acesso garantido aos cuidados de saúde garantido. Além de ter que lutar pelos direitos: moradia, renda, segurança alimentar, previdência, acesso à assistência social, dentre outros. O direito de envelhecer com dignidade neste país tem gerado forte pressão sobre as políticas públicas, as quais inexistem ou não conseguem contemplar a complexidade das diversas, e muitas vezes adversas, condições de vida dessas pessoas22 Giacomin KC, Duarte YAO, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Cuidado e limitações funcionais em atividades cotidianas – ELSI-Brasil. Rev Saúde Pública. 2018;52( Supl 2):1-9. Disponível em: http://dx.doi.org/10.11606/s1518-8787.2018052000650 .. Assim, falar sobre a heterogeneidade do envelhecimento requer abordagens e olhares que contemplem as especificidades do que é ser idoso em um país com imensas e gritantes desigualdades estruturais e, por isso mesmo, extremamente violento.

Em 2020, com o advento da pandemia de Covid-19, ficaram claras as dificuldades que muitos idosos tinham para cumprir as recomendações das autoridades sanitárias de higiene e de distanciamento social, haja vista os que se encontravam em instituições de longa permanência, os idosos encarcerados e aqueles sem condições socioeconômicas de manter o requerido distanciamento por residirem em moradias com um só cômodo e sem água potável. Desde o início da pandemia, os idosos foram os mais afetados e apresentaram formas mais severas da Covid-19, bem como elevadas taxas de mortalidade. Embora tenham feito parte do grupo prioritário para a vacinação, nem todos puderam ainda ser vacinados. Falta vacina e os idosos com limitações funcionais têm grande dificuldade de obtê-la, o que foi objeto de uma nota que reivindica a inclusão prioritária dessas pessoas e dos seus cuidadores, cuja grande maioria é de familiares mulheres também idosas33 Romero D, Groisman D, Souza ER, Barreto ICHC, Temporão JG, Telles JL, et al. Acesso prioritário à vacinação contra a Covid-19 para as pessoas idosas com limitações funcionais e seus cuidadores(as) [Internet]. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2021. Nota Técnica do Comitê Saúde da Pessoa Idosa-Fiocruz. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/documento/acesso-prioritario-vacinacao-contra-covid-19-para-pessoas-idosas-com-limitacoes-funcionais .
https://portal.fiocruz.br/documento/aces...
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Ante tais circunstâncias, estima-se que muitas situações de violências, às quais os idosos já eram submetidos, acirraram-se e outras tantas passaram a ser vivenciadas devido às dificuldades da realidade imposta por tempos difíceis de pandemia e crise econômica.

O Estatuto do Idoso (Lei 10.741, de 01 de outubro de 2003), define como violência contra a pessoa idosa “qualquer ação ou omissão praticada em local público ou privado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico”. E a Organização Mundial de Saúde classificou a natureza da violência contra as pessoas idosas como: física, psicológica, sexual, negligência, autonegligência, abandono e financeira. Além da violência interpessoal, considera-se ainda a violência estrutural resultante das desigualdades socioeconômicas, raciais, de gênero, culturais, religiosas e institucionais.

Como se observa, são várias e distintas as abordagens e os objetos que podem ser tomados no âmbito das reflexões acadêmicas com foco nas violências contra pessoas idosas. Neste número temático da RBGG espera-se contribuir para a maior compreensão das violências que se abatem contra os idosos, bem como identificar e propor estratégias e soluções para essa dura realidade que fere, gera sofrimento e leva à morte.

No escopo deste número temático incentivam-se artigos que:

  • Caracterizem os casos (díade vítima e agressor), e as dinâmicas dos contextos de ocorrência da violência . Sabe-se que expressiva parcela das violências contra pessoas idosas ocorrem nos locais onde residem e seus principais agressores são aqueles que lidam mais diretamente com o seu cuidado – familiares e cuidadores profissionais ou não;

  • Busquem discutir e mostrar como a violência estrutural, que se expressa nas desigualdades das condições de vida, tem impactado o processo vital dos distintos grupos de pessoas idosas. Nesse caso, por exemplo, para um idoso nascer, viver e morrer em sociedades com extremas desigualdades, como o Brasil, é, em última instância, estar submetido a muitas situações de violência, cujo pano de fundo é a violência estrutural que privilegia uns e submete outros a condições indignas;

  • Identifiquem e tragam maior compreensão sobre como as instituições (públicas e privadas) têm atuado frente aos direitos das pessoas idosas. Sabe-se que as pessoas idosas têm contato frequente com certas instituições – serviços de saúde, bancos, dentre outras, e que existem leis e normas que deveriam garantir a prioridade, a escuta qualificada e o atendimento integral a essas pessoas, o que nem sempre ocorre, constituindo-se como práticas de violência institucional;

  • Elaborem análises sobre como tem funcionado o atendimento aos casos de violência contra pessoas idosas. Os serviços que atendem as pessoas idosas em situação de violência precisam ter profissionais formados para realizar o acolhimento, a escuta qualificada, o diagnóstico, o registro do caso suspeito ou confirmado e o encaminhamento para o acionamento das redes de atenção e de proteção. É importante mostrar e discutir se os serviços atuam em rede, se o atendimento realizado é integral, dentre outras questões;

  • Analisem e identifiquem como e quais políticas públicas podem prevenir e reduzir as situações de violências. Identificar quais políticas incluem o tema da violência como uma questão importante para a saúde da população idosa, com qual abrangência abordam esse tema e se têm sido avaliadas para verificar como estão respondendo às necessidades dessa população frente às vivências de violências e quais têm sido os resultados alcançados.

REFERENCES

  • 1
    Minayo MCS [Editorial]. Idosos dependentes de cuidadores. Ciênc Saúde Colet. 2021;26(1):1-1. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232020261.36602020 .
  • 2
    Giacomin KC, Duarte YAO, Camarano AA, Nunes DP, Fernandes D. Cuidado e limitações funcionais em atividades cotidianas – ELSI-Brasil. Rev Saúde Pública. 2018;52( Supl 2):1-9. Disponível em: http://dx.doi.org/10.11606/s1518-8787.2018052000650 .
  • 3
    Romero D, Groisman D, Souza ER, Barreto ICHC, Temporão JG, Telles JL, et al. Acesso prioritário à vacinação contra a Covid-19 para as pessoas idosas com limitações funcionais e seus cuidadores(as) [Internet]. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2021. Nota Técnica do Comitê Saúde da Pessoa Idosa-Fiocruz. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/documento/acesso-prioritario-vacinacao-contra-covid-19-para-pessoas-idosas-com-limitacoes-funcionais
    » https://portal.fiocruz.br/documento/acesso-prioritario-vacinacao-contra-covid-19-para-pessoas-idosas-com-limitacoes-funcionais

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021
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