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O Laboratório Nômade da Cross Pollination: uma práxis entre as práticas

RESUMO

Esta escrita colaborativa apresenta as formas pelas quais os praticantes-pesquisadores da Cross Pollination (CP), plataforma internacional de pesquisa artística com foco na troca de conhecimento, cria laboratórios nômades e temporários. Argumenta-se que o encontro entre diferentes experiências de artes performáticas gera insights epistêmicos que permitem que os membros da plataforma rearticulem suas práticas através da reterritorialização de técnicas especializadas. Além disso, discute-se como um ethos de companheirismo possa aparecer através de práticas dialógicas e horizontais, contribuindo para a atualização do teatro laboratório.

Palavras-chave:
Teatro Laboratório; Performance; Antropologia Teatral; Cross Pollination ; Processos de criação

ABSTRACT

This collaborative writing presents the ways in which practitioner-researchers from Cross Pollination (CP), an international arts research platform with a focus on knowledge exchange, create nomadic and temporary laboratory spaces. It is argued that the encounter between different experiences of performative craft generates epistemic insights that enable members of the platform to rearticulate their practices through the reterritorialization of specialized techniques. Furthermore, the article discusses how an ethos of companionship may appear through dialogical and horizontal practices, contributing to a renewal of the theatre laboratory.

Keywords:
Laboratory Theatre; Performance; Theatre Anthropology; Cross Pollination; Creative Processes

RÉSUMÉ

Cet écrit collaboratif présente les façons dont les praticiens-chercheurs de Cross Pollination (CP), une plateforme internationale de recherche en arts axée sur l'échange de connaissances, créent des espaces de laboratoire nomades et temporaires. Il est soutenu que la rencontre entre différentes expériences d'artisanat performatif génère des idées épistémiques qui permettent aux membres de la plate-forme de réarticuler leurs pratiques à travers la reterritorialisation de techniques spécialisées. En outre, l'article discute comment un ethos de camaraderie peut apparaître à travers des pratiques dialogiques et horizontales, contribuant à un renouvellement du laboratoire du théâtre.

Mots-clés:
Théâtre de laboratoire; Performance; Anthropologie théâtrale; Cross Pollination; Processus Créatifs

Tudo se torna baseado no movimento

(Klee, 2001KLEE, Paul. Sobre a Arte Moderna e outros Ensaios. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001., p. 45).

Introdução

Os autores deste artigo são membros da Cross Pollination (CP), uma plataforma internacional de pesquisa artística com foco na troca de conhecimento, ligada ao Nordisk Teaterlaboratorium (NTL) (DK)1 1 Nordisk Teaterlaboratorium (NTL) é a organização guarda-chuva que compreende Odin Teatret e uma extensa gama de atividades e grupos, tanto na Dinamarca como internacionalmente. . Fundada em 2017 por Marije Nie e Adriana La Selva, a CP promove um laboratório ampliado para o diálogo entre práticas, tanto acadêmicas quanto performáticas, como parte integrante e essencial de uma política de pesquisa corporificada no teatro e na performance.

Esta escrita colaborativa compartilha as formas pelas quais os praticantes-pesquisadores da CP criam espaços de laboratórios nômades e temporários, que se caracterizam por um ethos de companheirismo, interdisciplinaridade e práticas dialógicas que se encontram entre os corpos de conhecimento que cada praticante possui. O encontro entre as diferentes experiências de artes performáticas gera insights epistêmicos que permitem aos membros da plataforma rearticular suas práticas. Assim, este texto traça a transmissão, transformação e geração do conhecimento por intermédio da reterritorialização de técnicas especializadas.

Nosso discurso, a seguir, irá mapear as formas pelas quais entrelaçamos, emaranhados e tecemos nossas práticas no espaço durante nossas sessões, ligando a abordagem emergente da CP à prática laboratorial. Uma reflexão crítica da trajetória da CP, até o momento, será seguida pela abertura do campo epistemológico de investigação no qual nossas práticas dialogam, ao mesmo tempo em que objetivam as táticas que desenvolvemos e continuamos a empregar enquanto trabalhamos juntos. Argumentaremos que as táticas laboratoriais da CP nos permitem atualizar aldeias nômades: assemblagens dinâmicas nas quais nossas práticas semeiam movimentos de rearticulação territorial.

Cross Pollination: o germe para o início

A CP nasceu de um encontro entre duas artistas de formações muito distintas: Marije Nie, uma dançarina de sapateado e artista performática independente, e Adriana La Selva, uma atriz, performer e pesquisadora. As duas se encontraram pela primeira vez no espaço confinado do convento Ripa em Albino, no norte da Itália, em 2016, onde participaram da 15ª sessão da Escola Internacional de Antropologia Teatral (ISTA), organizada por Eugenio Barba, fundador da Odin Teatret/NTL, em colaboração com o Teatro Tascabile di Bergamo. A ISTA serviu como um importante espaço laboratorial para a pesquisa ampliada de Barba e teve reuniões em diferentes períodos, entre 1980 e o presente. Foi concebida como um vilarejo temporário, no qual estudiosos e mestres-praticantes de diferentes tradições teatrais eurasiáticas se reuniram por determinados períodos, variando de dez dias a três meses. Esses encontros foram cruciais na formação de um milieu de artistas e estudiosos ao redor de Barba e do grupo Odin Teatret, baseado no contato pessoal direto, no compartilhamento de experiências e na formação de conexões pessoais. Cada sessão da ISTA também tem participantes; uma seleção colorida de estudantes de teatro, praticantes e estudiosos de diferentes países, que se envolvem em intensas reuniões de trabalho com praticantes de diferentes tradições teatrais de todo o mundo2 2 Para discussões mais detalhadas sobre a ISTA, ver Barba e Savarese (1990) e Barba (1995; 2015). .

Como participantes, Nie e La Selva passaram tempo com os mestres da ISTA, estudando suas técnicas e estéticas performativas com cuidado e resiliência. Elas adotaram uma certa vida monástica, o que lhes proporcionou tempo e foco para se envolverem profundamente, tanto com o trabalho quanto com os outros participantes. La Selva e Nie deixaram a sessão da ISTA maravilhadas e emocionadas. E perplexas. E persuadidas a encontrar uma resposta a essa experiência. E agora? Como elas poderiam levar essa experiência adiante? Como elas poderiam continuar os diálogos que foram colocados em movimento? Com quem? E onde?

Após a sessão da ISTA, La Selva e Nie continuaram a se envolver com Odin Teatret/NTL de forma significativa. Nie, por exemplo, continuou a estudar na sede do Odin Teatret em Holstebro, na Dinamarca, participando de uma Odin Week3 3 No projeto Collective Mind/Cohabitation, Odin Teatret abre as portas de sua sala de ensaios para cerca de 20 participantes selecionados para seguir um processo criativo desenvolvido pelo grupo. Os participantes entram em imersão no delicado, elusivo e, às vezes, repetitivo e exaustivo modo de trabalhar do Odin Teatret. e uma sessão do Collective Mind4 4 A Odin Week é um festival anual no Odin Teatret. O programa inclui treinamento, participação nos ensaios, todas as performances do Odin Teatret e demonstrações de trabalho atualmente em repertório, filmes, encontros com Eugenio Barba, palestras e discussões. antes de ser convidada a ingressar no NTL como Artista Residente5 5 Um número limitado de artistas e grupos de teatro são convidados a residir no NTL para trabalhar em pesquisas e projetos autônomos, resultando, em sua maioria, em produções. Os períodos de residência variam em duração e podem ser distribuídos em estadias repetidas. Uma condição fundamental é que todos os artistas residentes devem realizar intervenções na comunidade. . Nie já havia canalizado suas habilidades profissionais de sapateado para o trabalho com a Radio Kootwijk Live (NL), um laboratório de música do qual foi cofundadora e que foi construído sobre o conceito fundamental de diálogos dramatúrgicos entre músicos e outras disciplinas artísticas, mas também com profissionais de fora das artes6 6 Radio Kootwijk Live (RKL) foi um laboratório de pesquisa artística baseado no monumental edifício da Radio Kootwijk. Realizou quatro sessões de 3 dias e quatro concertos por ano entre 2009 e 2013. Os artistas da RKL eram músicos altamente qualificados e classicamente treinados, acompanhados por iluminadores de teatro, diretores, produtores de teatro específicos do local, escritores, dançarinos e, o que é importante, grupos de plateia, trabalhando juntos sobre a questão: o que é um concerto? Ao longo de quatro anos, o trabalho com grupos de plateia mudou para compartilhar as práticas artísticas dos músicos com profissionais de fora das artes, com foco em temas que envolvem o trabalho. . Para Nie, o efeito de cada uma das diferentes técnicas dos atores do Odin, tecidas por Barba no palco em uma dramaturgia coletiva, era semelhante aos instrumentos musicais de uma orquestra clássica. Isso permitiu que ela reavaliasse suas habilidades como dançarina de sapateado, uma preocupação central na época:

Quando cheguei à ISTA, uma preocupação principal para mim era entender como poderia esta estranha criatura que é o sapateado - que não é atuação, nem música, nem dança, mas é de alguma forma um monstro composto pelos três - viver no palco com outros artistas sem ser visto como um convidado especial ou uma aberração. Onde minha prática pode viver e como ela pode se expandir para outras práticas? Como o sapateado pode ser um caminho para o teatro? (Nie, 2021NIE, Marije. Interview conducted by Patrick Campbell on the 20th April 2021. Manchester. (Unpublished), p. 1).

La Selva, que já era membro do grupo de pesquisa internacional The Bridge of Winds, dirigido por Iben Nagel Rasmussen7 7 A Ponte dos Ventos é um grupo teatral internacional e um projeto pedagógico iniciado pela atriz do Odin Iben Nagel Rasmussen em 1989. Os membros do grupo (incluindo La Selva) vêm da Europa, América Latina e China e se reúnem anualmente em diferentes locais do mundo para desenvolver suas pesquisas de treinamento, atuar e colaborar com diferentes comunidades por intermédio de trocas. Para um relato do trabalho do grupo, ver La Selva (2019). , também estava fazendo perguntas semelhantes na época, e estava particularmente interrogando como o teatro poderia levar a outros caminhos além da performance. Ambas as performers estavam interessadas em criar um espaço para pesquisa de laboratório e estavam conscientes de que isso poderia falar à grande multidão de artistas que passavam pela cultura expandida das oficinas do NTL, que sentiam a necessidade de se manterem conectadas entre si, criando espaço para uma troca reflexiva de experiências canalizada por uma investigação sustentável. Após longas discussões, Nie e La Selva conceberam uma estrutura incipiente para um laboratório nômade, recorrendo a pessoas que haviam conhecido na ISTA, outros eventos da NTL e redes mais amplas de colegas profissionais, bem como praticantes-pesquisadores que haviam conhecido em encontros acadêmicos internacionais como IFTR8 8 Federação Internacional de Pesquisa Teatral. e TaPRA9 9 Associação de Teatro e Pesquisa em Performance. , numa tentativa de borrar as fronteiras entre praticantes e pesquisa acadêmica, criando um intercâmbio interdisciplinar além da prática teatral. Elas escolheram potenciais participantes de acordo com seus fundamentos e experiência de trabalho cênicos, em performance e a partir de um senso de ética laboratorial compartilhada. Esse grupo incluiu a performer, dançarina e praticante somática Andrea Maciel e o professor e praticante-pesquisador Patrick Campbell, coautores deste artigo e parte do grupo central da CP.

Os potenciais membros da CP receberam um convite por e-mail, que foi aberto com o seguinte texto:

Cada um de vocês possui experiências, perguntas, técnicas, conhecimento sobre a arte do performer e sua relação com a sociedade em geral, com ângulos que se desafiam e se complementam. A intenção é compartilhar e extrapolar o que estamos trabalhando a fim de se cruzar e deixar que as ideias e pensamentos se desdobrarem, passando-os por nossas diferentes mentes, corpos e práticas. Na reunião, nos concentraremos em diferentes formas de diálogo, técnicas e reflexão, tanto no estúdio quanto ao redor da mesa (ou caminhando pela floresta!) (La Selva; Nie, 2017LA SELVA, Adriana; NIE, Marije. [Private correspondence]. Recipients: Members of Cross Pollination. Ghent/Amsterdam, 2017. (Unpublished)., p. 1).

O e-mail também desafiou os participantes a refletir sobre os seguintes pontos-chave de partida, que se mostraram fundamentais para o desenvolvimento da plataforma:

  1. Infra-estrutura para o conhecimento e como ele atinge os praticantes-pesquisadores.

    Como produzir e compartilhar conhecimento, desenvolvê-lo e documentá-lo, por intermédio de práticas, disciplinas e culturas, incluindo os praticantes que desenvolveram uma mistura altamente pessoal de conhecimentos, disciplinas e habilidades? Como esse conhecimento se torna parte de um 'corpo' ou 'casa' comunitária de conhecimento, para que possa ser tanto pessoal quanto se desenvolva como cultura ou história?

  2. Como mantemos nosso trabalho (e as pessoas que o fazem) vivo?

    Os artistas e pesquisadores independentes que ganham a vida participando de projetos de forma autônoma têm uma posição de trabalho específica em relação às instituições, financiamentos, grupos e outros artistas. Como cada vez mais pessoas estão trabalhando dessa forma, pensamos que é útil olhar para os desafios e oportunidades desses processos. Uma rede de artistas poderia funcionar como um contrapeso às redes de teatro existentes? (La Selva; Nie, 2017LA SELVA, Adriana; NIE, Marije. [Private correspondence]. Recipients: Members of Cross Pollination. Ghent/Amsterdam, 2017. (Unpublished)., p. 2).

É importante notar que, assim como muitos outros artistas independentes, a vida profissional de La Selva e Nie se desenvolveu de forma muito diferente daquela dos mestres-praticantes inseridos nas tradições performáticas que elas haviam encontrado durante a sessão da ISTA a que participaram. As imposições políticas e econômicas do capitalismo globalizado criam circunstâncias particulares para os artistas contemporâneos, que impedem um envolvimento contínuo com um caminho artístico, que muitas vezes pode parecer um ideal a ser perseguido, mas raramente alcançado. Consequentemente, uma das principais preocupações da CP foi dar um lar a profissionais independentes e autônomos, muitos dos quais fundamentaram sua educação no domínio infinito da cultura dos workshops, trabalhando por intermédio de uma ampla gama de habilidades específicas para sustentar suas vidas profissionais fragmentadas. Para os artistas independentes de hoje, além das habilidades artísticas per se, um conjunto de competências profissionais também inclui necessariamente saber escrever projetos, editar vídeos, calcular orçamentos, costurar figurinos, pagar contas, promover atividades nas mídias sociais e, como último recurso, recorrer a trabalhos temporários, como garçonete, por exemplo. Outros trabalham de projeto em projeto ou como pistoleiros contratados, tornando difícil encontrar consistência em seus desenvolvimentos artísticos.

Neste contexto cotidiano, nutrir e melhorar nossas práticas artísticas torna-se uma luta, uma forma política de resistência contra as forças neoliberais que promovem o consumismo em detrimento da criação. Ser artista independente hoje significa viver uma vida precária, como Van Assche (2020)VAN ASSCHE, Annelies. Labor and Aesthetics in European Contemporary Dance: Dancing Precarity. Cham: Palgrave Macmillan, 2020. dissecou exaustivamente em seu recente livro sobre trabalho na dança. Ela nos lembra a etimologia e o significado da precariedade: concedido até novo aviso, em uso temporário. Como ela sugere, "[...] uma pessoa é, portanto, juridicamente incerta porque tem apenas uma residência temporária e não sabe ou pode decidir quando esse período expira" (Van Assche, 2020VAN ASSCHE, Annelies. Labor and Aesthetics in European Contemporary Dance: Dancing Precarity. Cham: Palgrave Macmillan, 2020., p. 8).

Aldeias Nômades

CP surgiu como uma resposta positiva e proativa à fragmentação, ao isolamento, à precariedade e à escassez espaço-temporal enfrentada pelos artistas independentes. Como plataforma, a CP se fundamenta na noção de villageness (que talvez possamos traduzir como aldeianidade), oferecendo um lar nômade a diversos artistas que procuram se conectar uns com os outros para renovar seu ofício. A noção de villageness é influenciada, em parte, pelo conceito de Hastrup (1996)HASTRUP, Kirsten (ed.). The Performers' Village: Times, techniques and theories at ISTA. København: Drama, 1996. sobre a aldeia do performer, em seu relato etnográfico das configurações socioculturais de uma sessão da ISTA. Para Hastrup, a experiência dessa vida em aldeia durante uma sessão da ISTA é caracterizada por viajantes itinerantes, e "[...] foi mais um acampamento do que um assentamento" (Hastrup, 1996HASTRUP, Kirsten (ed.). The Performers' Village: Times, techniques and theories at ISTA. København: Drama, 1996. , p. 9). Como um tropo potencialmente mais amplo, a aldeia do performer:

[...] é um meio de criar espaço social por intermédio das práticas dos habitantes, e não pelos parâmetros físicos fixos [...] nenhum mapa da aldeia pode ser desenhado. O que parece ser possível é fazer um itinerário, definido não por coordenadas fixas no espaço, mas pelo movimento em direção a um objetivo [...] podemos identificar seu centro em movimento: o poço do vilarejo. É um manancial de vida, de bios, uma fonte sagrada de energia. É o lugar no qual uma prática performativa particular define o ponto de maior densidade dentro do espaço social (Hastrup, 1996HASTRUP, Kirsten (ed.). The Performers' Village: Times, techniques and theories at ISTA. København: Drama, 1996. , p. 11-12).

A noção de villageness delineada pelo relato antropológico da Hastrup reflete o impulso inicial para desenvolver a CP como plataforma de troca de conhecimentos e como rede artística internacional. La Selva e Nie foram inspiradas pela vivacidade da ISTA, pelas relações pessoais forjadas entre os membros do círculo interno da rede que faz a ponte entre disciplinas e continentes, pela estrutura de reuniões contínuas, porém periódicas, e pela consistência do trabalho realizado entre eles. Além disso, ao falarmos de uma aldeia nômade, nos tornamos-com a abordagem de Deleuze e Guattari sobre o conceito de nomadismo, que aponta para um "[...] modo específico de se relacionar com o terreno em que nos movemos" (Groot Nibbelink, 2019,GROOT NIBBELINK, Liesbeth. Nomadic Theatre: Mobilizing Theory and Practice on the European Stage. London: Methuen Drama, 2019. p. 13). Deleuze e Guattari (2004)DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. A Thousand Plateaus: Capitalism and Schizophrenia. London: Continuum, 2004. argumentam que a formação hegemônica dos territórios justifica a distribuição desigual do poder pelo Estado, reforçando um modo de vida baseado em propriedade, fronteiras e posse. Em contraste, em CP nossa aldeia nômade se alinha com outro modo de ser, no qual nossas práticas podem ser desterritorializadas, colocadas em movimento e em relação com outras tradições da técnica por meio do diálogo, implementando uma atitude desestabilizadora em relação a conhecimentos pré-existentes.

Durante a curta existência da CP, continuamos a expandir essa aldeia nômade, tanto face a face como digitalmente. Nosso laboratório é uma pausa, um lugar no qual ficamos para partirmos. Um feriado profissional.

Uma Vida através das Sessões

Primeira Sessão: o corpo coletivo

A primeira sessão da CP, que ocorreu em 201710 10 A reunião foi realizada de 02 a 10 dez. 2017. Lista de participantes: Adriana La Selva (BR/BE), Marije Nie (NL), Vilja Itkonen (FI), Gonzalo Alarcon (CH/BE), Arkadius Rogozinski (PO), Daniel Mroz (CAN), Marieke Breine (BE), Andrea Maciel Gomes (BR/UK), Alex Boyd (UK), Clara Solana (SP), Joaquim Carlos Bezerra de Carvalho (BR/DE), Simon Bronikowski (DE). , foi em grande parte dedicada a entender o que a CP poderia oferecer a fim de expandir a noção de teatro laboratório pela troca e pela geração de conhecimento. É importante ressaltar que ficou claro para o grupo que precisávamos romper com as relações tradicionais de mestre-discípulo desde o início e encontrar formas horizontais de questionar e responder uns aos outros em, e por intermédio de, nossas práticas disciplinares profissionais. A abordagem dessa horizontalidade, antes da Sessão através de correspondência eletrônica, permitiu que os participantes viessem com a mente aberta em relação à transformação e ao questionamento de seu próprio corpo de conhecimento.

As manhãs foram dedicadas ao trabalho de estúdio, ao intercâmbio prático da ampla gama de técnicas adquiridas por cada indivíduo. Não havia agendas definidas no início de um dia de trabalho; o espaço do estúdio era uma página branca pronta para ser preenchida por práticas, reflexões e documentação. Por exemplo, em um dia qualquer, todos os participantes entrariam no estúdio e começariam a se aquecer individualmente, antes que as conexões começassem a surgir organicamente, levando gradualmente o grupo a ações compartilhadas. A partir desse terreno coletivo, um praticante somático poderia sugerir um exercício centrado na conscientização física; isso poderia ser respondido por uma exploração codificada de treinamento de atores, como a Dança do Ventos11 11 "A Dança dos Ventos consiste em três passos bastante simples, quase como a valsa, mas nos quais o primeiro passo desce em direção ao chão com os joelhos dobrados, a fim de dar o impulso (sats) e pular no segundo passo. O terceiro passo funciona como uma transição para o início de um novo ciclo, criando uma estrutura ternária de movimento em constante renovação. Esse exercício desenvolve um tipo de energia leve, na qual o corpo do ator está constantemente decolando do chão. Por ser um exercício cíclico, deve ser feito por um tempo mais longo; o objetivo não são os passos em si, mas as 'portas', os passos se abrem, permitindo ao ator ir além do cansaço e encontrar fontes ocultas de energia [...]". Disponível em: <https://bridgeofwinds.com/training/>. Acesso em: 17 mar. 2021. ; uma sequência de treinamento rítmico inspirado pelo sapateado poderia então começar, sendo completada pelo compartilhamento de músicas em círculo e uma prática vocal estendida na tradição Wolfsohn-Hart. Durante a tarde, as sessões foram dedicadas ao trabalho com canções e reflexão por intermédio de formas dialógicas12 12 Inspirado por métodos como Lois Wever's Long Table (http://www.splitbritches.com/long-table), os diálogos de Bohm (2004 [1955]), Performing Back Scores (2015) e o trabalho do laboratório de música Live Radio Kootwijk (NL, 2009-2013). . O trabalho musical surgiu muito espontaneamente como um desejo compartilhado no grupo e descobrimos que o envolvimento conjunto no aprendizado das canções trazia um sentido de conexão com o grupo, fornecendo material compartilhado para o trabalho. Também nos deu a oportunidade de participar de atividades artísticas em colaboração com outros grupos residentes no espaço, como Ikarus Stage Arts, Teatr Brama e KompaniTO13 13 Para mais informações sobre grupos e artistas residentes no NTL, ver: <https://odinteatret.dk/nordisk-teaterlaboratorium/>. .

Assim, ao invés de uma preocupação com blocos de conteúdo pré-estruturados, o grupo começou a olhar para as conexões fluidas entre as práticas, para a forma como elas dialogam. A partir desse senso de abertura, começaram a surgir táticas de troca de conhecimento. O termo tática é empregado, segundo De Certeau (1988)DE CERTEAU, Michel. The Practice of Everyday Life. Berkeley: University of California press, 1988., para se referir a práticas concretas nas quais a agência individual pode se manifestar além dos limites das estruturas hegemônicas de poder. Na CP, essas táticas aparecem como modos dialógicos entre nossas diferentes práticas, que permitem tanto uma renovação criativa quanto um senso coletivo de uma aldeia nômade, uma cultura profissional em expansão. Na CP, as táticas oferecem estruturas de suporte que levam o trabalho adiante em vez de ditar resultados; elas abrem um espaço laboratorial no qual diferentes questões da práxis podem se desdobrar. As duas táticas-chaves que surgiram durante essa primeira Sessão foram intituladas Drifting (Deriva) e What If (E se).

Em termos objetivos, o Drifting consiste em uma improvisação espacial estendida e não estruturada que flui do aquecimento individual para o movimento e/ou sondagem coletiva. Essa tática combina precisão e serendipidade, instigando uma habilidade de criar sintonias pela escuta cuidadosa e pela atenção focada. Há um rigor técnico nesse exercício de escuta e reação em conjunto; isso não é um jogo de formas livres - já existe um diálogo tácito acontecendo entre nós, que coletamos de nossas diferentes técnicas artísticas enquanto as tecemos juntas para formar uma teia coletiva. Essa deriva é semelhante a um espaço liminar em que entramos juntos, permitindo que nossos corpos encontrem um mundo obscuro no qual as percepções internas e externas começam a se misturar, em que os estímulos começam a ser traduzidos como assemblagens imanentes. O estúdio torna-se então uma arqui-textura: um emaranhado de múltiplos enredos energéticos, pronto para ser habitado.

What if desafia o grupo a enunciar perguntas em resposta às práticas uns dos outros, de uma forma que também permita uma investigação autorreflexiva das técnicas que cada um possui. Esse questionamento dialógico é, então, traduzido em propostas de pesquisa acionáveis. As perguntas são articuladas claramente ao grupo e podem tomar muitas direções diferentes: alguns exemplos incluem transformar a proposta original em um meio diferente (e se tentarmos canalizar as respostas cinestésicas de improvisação de contato em trabalho de voz, em pares?), propor uma continuação da pesquisa por intermédio de um exercício ou disciplina diferente (e se usarmos técnicas de sapateado14 14 Na técnica da torneira o equilíbrio é usado como um princípio dinâmico. Enquanto bate, o bailarino move seu peso fora do equilíbrio para um lado, reunindo energia e depois desloca e redireciona essa energia para outra direção, de modo que a entrada inicial de energia se mantenha ativa durante toda a dança (Nie, 2021). para investigar a dinâmica proposta pelo exercício Fora de Equilíbrio da Ponte dos Ventos?)15 15 No exercício fora de equilíbrio, "[...] o corpo é desequilibrado e, pouco antes de cair, move-se para uma direção oposta, de modo que a energia que deveria terminar em uma colisão com o chão é jogada de volta no espaço" (La Selva, 2019, p. 142). ou sugerir uma atividade contrastante (e se explorarmos as respostas proprioceptivas das artes marciais agora a fim de nos centrarmos?).

Encontrar essas respostas que são perguntas e ajustá-las para serem abertas e acessíveis ao grupo é um processo delicado. Elas pedem aos praticantes que equilibrem seu próprio caminho pessoal de pesquisa com o do coletivo. Ao optar por introduzir a ruptura que uma nova pergunta traz para o grupo, cada praticante tenta entender em um nível indizível o que estamos procurando neste momento, com tal grupo de pessoas, sem quebrar o fluxo e a direção do processo coletivo. A necessidade de traduzir a techne de um praticante para a de outro exige uma escolha cuidadosa do nível técnico da proposta, o que faz com que a ponte entre habilidade técnica e experiência aconteça de uma maneira sensível. Não tentamos aprender as praxes uns dos outros; aprendemos com elas ao nos descentrarmos, enquanto habitamos um espaço dialógico entre elas. Assim, a troca de conhecimentos no What If não é apenas superficial; é um processo similar ao descamar de cascas de cebolas. Há diferentes níveis de aprendizagem e questionamento em um espaço liminar que é constantemente atualizado.

Portanto, essa primeira reunião permitiu que um corpo coletivo se formasse e abrisse espaço para que surgissem táticas de troca de conhecimentos, baseadas em um diálogo contínuo e aberto, canalizado pelo know-how técnico e das experiências de cada praticante. O reconhecimento de um laboratório emergente foi extremamente importante para a continuação de nossas pesquisas individuais, pois voltamos a trabalhar como artistas independentes, mas agora apoiados por uma rede de parceiros com os quais podíamos colaborar. Ao longo do ano, os membros da CP se reuniram em diferentes constelações para participar dos projetos uns dos outros - apresentações, concertos, workshops, simpósios organizados em conjunto e sessões de laboratório menores focadas em abordagens técnicas específicas16 16 As principais atividades incluíram um evento de intercâmbio de conhecimentos de pós-graduação na Queen Mary University of London (UK), organizado por Andrea Maciel (abril de 2018), um compartilhamento de trabalhos colaborativos no IFTR (2018) e uma apresentação no De Koer, em Gent (BE). . Esse envolvimento uns com os outros ao longo do ano também definiu naturalmente um certo grupo central de participantes da CP, que continuam a trabalhar ativamente juntos até o presente momento.

Segunda Sessão: consolidação das táticas

A segunda sessão da CP foi realizada no NTL, em novembro de 201817 17 A reunião ocorreu de 22 a 28 nov. 2018. Lista de participantes: Adriana La Selva (BR/BE), Marije Nie (NL), Gonzalo Alarcon (CH/BE), Andrea Maciel (BR/UK), Alex Boyd (UK), Joaquim Carlos Bezerra de Carvalho (BR/DE), Patrick Campbell (UK), Sara Strand Holmsby (DK), Ramiro Silveira (BR/UK), Dina Abu Hamdan (JO/DK), Jonas De Rave (BE). . Uma companheira teórica concreta foi selecionada para nos acompanhar durante nossa pesquisa laboratorial - o livro de Donna Haraway (2016)HARAWAY, Donna Jeanne. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press, 2016. Staying with the trouble: Making Kin in the Chthulucene, que La Selva havia solicitado aos participantes a leitura antes do começo do trabalho em conjunto. Essa foi a primeira vez que os membros da CP se engajaram sistematicamente na preparação teórica dirigida antes de uma sessão e isso nos permitiu trazer uma lente crítica mais consistente para nossas partilhas práticas ao longo da semana. O texto de Haraway também nos ajudou a estabelecer um vocabulário comum para falar sobre a práxis emergente da CP, baseando-se em alguns de seus conceitos, tais como figuras de cordel, gerar parentesco e pensamento tentacular 18 18 Para mais informações sobre esses conceitos, consulte Haraway (2016). . Nossas sessões matinais continuaram a expandir o escopo de trocas corporais e o trabalho sobre Drifts e What Ifs continuou. As tardes foram dedicadas ao trabalho vocal polifônico, pelas práticas de kecak, sapateado, drones e canções em círculo19 19 Kecak, é uma forma de dança e drama musical hindu balinês desenvolvida nos anos 1930 em Bali, na Indonésia. . Esse trabalho fluiria, então, para a geração de material com foco dramatúrgico, seguindo as táticas emergentes descritas abaixo.

Uma tática-chave desenvolvida nesse ponto foi o Interview Threads [Linhas de entrevista'], que se inspira livremente na ferramenta Perform Back Score criada por Lilia Mestre (2015)MESTRE, Lilia. Perform Back Score: Conditions for the Emergence of Poetics. Brussels: a-pass, 2015. e as intervenções de guerrilha espacial de Guillermo Gomez-Peña e Roberto Sifuentes (2011)GOMEZ-PEÑA, Guillermo; SIFUENTES, Roberto. Exercises for Rebel Artists: Radical Performance Pedagogy. New York: Routledge, 2011.. Essa tática, que foi trazida à CP por La Selva, utiliza o trabalho performativo como uma ferramenta criativa de feedback que interfere ativamente sobre nossas práticas individuais. Nossas Linhas de Entrevista começam com a oferta de um presente poético e performático, que pode tomar a forma de um fragmento dramatúrgico, uma canção ou uma persona performática. Depois de assistir a todos os presentes e sem mais deliberação ou reflexão sobre as apresentações, cada um decide a quem vai responder, certificando-se de que todos os presentes tenham uma resposta. Isso cria o início de várias linhas que serão cultivadas por um período de tempo acordado, com compartilhamentos e respostas ocorrendo durante vários dias consecutivos, construindo um corpo enredado de trabalho dramatúrgico. Quando respondemos às ofertas criativas de nossos colegas, estamos capturando peças da poética uns dos outros, borrando territórios autorais. Interview Threads são cada vez mais empregados como uma ferramenta dramatúrgica-chave pela CP em nosso trabalho paralelo de criação cênica.

Uma outra tática que surgiu durante esse período por intermédio de um intercâmbio prático concreto no espaço entre os participantes foi o Juggling (Malabarismos). O Juggling se baseia na técnica de Teatro Playground de Ramiro Silveira, membro da CP, uma abordagem prática para o desenvolvimento de material cênico, e no conhecimento artesanal de Gonzalo Alarcón sobre comédia física e habilidades circenses20 20 Para mais informações, consultar Silveira (2014). . No caso da CP, as técnicas pessoais de Silveira e Alarcón foram amalgamadas e transpostas para um contexto de pesquisa e exploradas como uma forma de treinamento coletivo. Em Juggling, colocamos as coisas no espaço - ações, objetos - e criamos partituras individuais, conectando-as. Em seguida, executamos nossas partituras ao mesmo tempo, repetindo as ações de forma maleável, interagindo (porque é inevitável) e adaptando posteriormente nossos tempos e o fluxo de energia dos objetos à medida que eles passam de mão em mão. Nossos materiais individuais criam uma dramaturgia coletiva e são colocados em um delicado equilíbrio uns com os outros. O Juggling abre espaço para uma comunicação multiespécies, parafraseando Haraway (2016)HARAWAY, Donna Jeanne. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press, 2016., na qual nossa presença e a memória sob nossa pele aparecem como um terreno nômade concreto. Nossos corpos de conhecimento atuam uns entre os outros, produzindo triangulações inesperadas de praxes. A qualidade cíclica das partituras no Juggling é um experimento afiado e preciso de desterritorialização, um chamado ao nomadismo. Um treinamento que induz uma atitude coletiva.

Ao final da semana, juntos, também descobrimos uma outra tática, a Spatial Fabulation (Fabulação espacial), que surgiu de nossas leituras de Haraway e particularmente das práticas de artes visuais de Sara Strandby, membro da CP. Spatial Fabulation (SF) é ostensivamente uma resposta aos mundos de SF de Haraway (2016)HARAWAY, Donna Jeanne. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press, 2016.: um trabalho poético baseado em permanecer com o problema, que consiste em "[...] possibilidades modestas de recuperação parcial e de se ficar juntos" (Haraway, 2016HARAWAY, Donna Jeanne. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press, 2016., p. 10). Nossas fabulações espaciais se baseiam em práticas de artes visuais como colagem, instalação e design de mídia para compor uma reflexão em movimento sobre uma sessão coletiva. Elas reúnem rastros do trabalho realizado - textos, imagens, vídeo, som - e os colocam em uma constelação literalmente conectada por linhas, criando um labirinto atado de companheirismos. Os praticantes, mas também os visitantes externos, são convidados a trilhar seus caminhos no espaço, criando um sentido próprio do material exibido. Essa interação com a constelação de material costurado desperta memórias, respostas e convida às ações de reflexão e criação de sentido. Dessa forma, ninguém é encarregado de definir o que aconteceu, e o efêmero, o invisível e o desconsiderado ainda é capaz de ressoar no espaço.

Ao longo da sessão, um vocabulário da práxis compartilhado começou a vir claramente à tona, por intermédio de um emaranhado mais sistemático de teoria e prática dentro das táticas que estávamos desenvolvendo. É importante ressaltar que essas táticas abriram um espaço dialógico no qual nossas diferentes técnicas poderiam colidir e se conectar mutuamente.

Terceira Sessão: problemas

A terceira sessão da CP, realizada em Holstebro, na Dinamarca, em fevereiro de 202021 21 A reunião foi realizada de 04 a 08 fev. 2020. Lista de participantes: Alex Boyd (UK), Andrea Maciel (BRA /UK), Marije Nie (NL), Adriana La Selva, (BRA / BE), Joaquim Bezerra (BRA / DE), Jonas de Rave (BE), Sara Holm Strandby (DK), Dina Abu Hamdan (JOR / DK), Simon Bronikowski (DE), Patrizia Marzioli (AR / DE), Christoph Falke (DE), Melina Scialon (BRA), Emilie Lund (DK / DE), Theophile Choquet (FR), Lucas Duran (ARG), Linda Lyn Cunningham (IR). , seguiu-se ao segundo Festival NTL e foi iniciada por uma reunião de um dia com uma rede maior de pesquisadores e estudiosos, que lançou o Parliament of Practices (PoP) [Parlamento das Práticas]22 22 A reunião do Parlamento de Práticas (PoP) ocorreu no NTL em 13/02/2020 e foi iniciada por La Selva e Nie. O PoP permaneceu ativo durante toda a pandemia de COVID-19, com várias reuniões on-line, investigando formas de diálogo e conectando uma ampla rede de artistas, trabalhadores culturais e pesquisadores em modos alternativos de estar juntos por intermédio da virtualidade. Para mais informações sobre PoP, consultar: <www.parliamentofpractices.space>. Lista de Participantes: Adriana La Selva, performer, diretora, pesquisadora, Universidade de Gent / BE / BRA, Marije Nie, sapateadora, performer / NL, Dr. Alex Boyd, praticante taoísta / UK, Dr. Andrea Maciel, artista de dança / BRA / UK, Joaquim Bezerra, performer, figurinista / BRA / DE, Jonas de Rave, músico / BE, Simon Bronikowski, ator, Estúdio 7 / DE, Christoph Falke, diretor, Estúdio 7 / DE, Prof. dr. Melina Scialon, artista de dança e performance, Unicamp / BRA , Emilie Lund, artista de dança / DK / DE, Theophile Choquet, ator / FR, Lucas Duran, ator / ARG, Sara Holm Strandby, artista visual / DK, Dina Abu Hamdan, diretora / JOR / DK, Linda Lyn Cunningham, De Montfort University / IR, Ofer Ravid, coreógrafa / ISR / DK , Dr. Adam Ledger, Universidade de Birmingham / UK, Daniel Jacewitz, diretor de teatro, Teatr Brama / PL, Maciej Ratajczyk, Teatr Brama, ator / PL, Prof. Jane Turner, Universidade Metropolitana de Manchester / UK, Dr. Patrick Campbell, Universidade Metropolitana de Manchester / UK, Marta Wryk, cantora de ópera / PL / DE, Tomasz Prasqual, compositor / PL / DE. . O nome da nova iniciativa, que foi cunhado por La Selva, responde à proposta de Bruno Latour (1991)LATOUR, Bruno. We Have Never Been Modern. Translated by Catherine Porter. Cambridge: Harvard University Press, 1991. para um Parlamento das Coisas e visa ativar uma rede mais ampla de pesquisadores e praticantes por intermédio de pesquisas profundas sobre formas de diálogo e escrita que ativam nossas práticas dentro de um contexto social. O PoP também tem um objetivo mais social de oferecer um espaço no qual uma comunidade mais ampla de praticantes, tanto acadêmicos quanto artísticos, possam se engajar uns com os outros além da CP. Como mencionamos em outro lugar:

O impulso orientador por trás do PoP foi movido pelo questionamento de como dar voz às práticas e por intermédio de práticas, ao mesmo tempo em que respondemos a genealogias (de ofício) e engajamo-nos com preocupações sociais contemporâneas, tais como diversidade, interseccionalidade e participação democrática (Campbell; La Selva; Nie; Maciel, 2021CAMPBELL, Patrick; LA SELVA, Adriana; NIE, Marije; MACIEL, Andrea. Parliament of Practices: No-topian tactics for praxical dialogue. Performance Research, Aberystwyth, v. 25, n. 8, p. 11-13, June 2021. , p. 11).

Nesta terceira sessão de CP La Selva e Nie sugeriram três temas para enquadrar o trabalho dos novos praticantes-participantes do evento: genealogias pessoais, construção/objetos e a noção de estúdio de William Kentridge (2014)KENTRIDGE, William. Six Drawing Lessons. London: Harvard University Press, 2014. como mapeada em seu livro Six Drawing Lessons. O trabalho, no entanto, teve seu próprio curso, que testaria a cultura laboratorial emergente da CP e seu delicado e dinâmico equilíbrio de táticas, atitudes e valores. Após a explosão criativa da segunda sessão, surgiu o desafio de equilibrar as atitudes centrais de ouvir e se tornar-com outros, juntamente com as expectativas pré-concebidas tanto dos participantes novos quanto dos mais experientes. Aqui segue um fragmento das notas de Nie da sessão, que oferece uma visão dos problemas que surgiram na CP neste ponto:

Como uma oferta espontânea para abrir os trabalhos, um dos membros da CP, J. R. traçou uma enorme figura de cordel da 'Árvore da Vida' da Cabala Judaica23 23 A Árvore da Vida é um diagrama utilizado em várias tradições místicas, incluindo a Cabala. Os diferentes pontos nodais representam diferentes emanações de divindade. no chão da Sala Branca no NTL, um ato que carregava profundo significado pessoal, conhecimento e conexões afetivas para ele. Ao longo do dia, o grupo se envolveu com a Árvore de diferentes maneiras; e quando os objetos chegaram lá dentro, ela também se tornou um Wunderkammer24 24 O Wunderkammer ou Gabinete de Curiosidades surgiu no século XVI, apesar de coleções mais rudimentares terem existido antes e serem precursoras de museus. - um 'gabinete de curiosidades', uma coleção de objetos notáveis. No dia seguinte, no entanto, no decorrer de um movimento de improvisação energética, A. M. entrou na forma da Árvore como um vento forte e, com vigor, alegria e brincadeira, destruiu a árvore, entrelaçando seus fios, espalhando os objetos ao redor e deixando para trás o caos, para o deleite do grupo. Ao olhar para a destruição, C. F. observou que 'a misericórdia25 25 Um dos pontos nodais da Árvore da Vida. é a primeira a ir' e que 'agora que o espaço foi desalojado, tudo pode acontecer'. J. R., entretanto, ficou chateado com a destruição da Árvore e o grupo decidiu recriar a forma proposta por ele, que permaneceu no espaço até o final da sessão, com uma presença bastante pesada, atuando como um obstáculo ao fluxo do trabalho (Nie, 2020NIE, Marije. CP Session notes. Amsterdam, 2020. (Unpublished)., p. 2).

Finalmente, no último dia de trabalho, os participantes se reuniram em torno da instalação Wunderkammer no canto do estúdio e compartilharam as conexões pessoais e genealógicas que os objetos reunidos mantinham para eles de forma performativa e narrativa. No fluxo dramatúrgico da sessão, esse momento serviu como um platô, uma fogueira de aldeia na qual foram compartilhadas biografias, tanto profissionais como pessoais. O Wunderkammer começou assim a funcionar como uma porta aberta entre o estúdio e a vida pessoal dos praticantes, à medida que os objetos traçavam caminhos afetivos dentro da instalação, que foram articulados pelos participantes da CP por um momento generoso e curativo de compartilhamento.

Por intermédio do problema, a terceira sessão revelou a solidez da CP como uma cultura de laboratório emergente, com atitudes fluidas e abertas que levavam o trabalho coletivo de formas intangíveis, mas importantes e uma insistência na presença da confusão como parte integrante da troca e geração de conhecimento. Isso revelou a precariedade de uma cultura fundamentada na imanência, porque a solidez acarretou petrificação, porque os diálogos tornaram-se discussões. O processo coletivo pedia decisão e estrutura e as portas abertas do laboratório foram questionadas. Além disso, em uma reunião com Barba, que visitou o trabalho em uma manhã, ficou claro que os processos de pesquisa enredados da CP poderiam ser difíceis de serem percebidos a partir de uma posição externa, possivelmente porque não estavam obviamente centrados na pesquisa dos princípios pré-expressivos do ator. Pelo contrário, uma parte importante do trabalho foi realizada entre os profissionais pelas trocas tácitas dentro de territórios desconhecidos.

Após a sessão, o grupo central da CP questionou se a natureza de uma sessão deveria ser mais cuidadosamente identificada e dividida em sessões de introdução, sessões nucleares para membros mais experientes e workshops, a fim de atender e se sintonizar mais conscientemente com as expectativas das pessoas envolvidas. Além disso, foi restabelecida a importância dos princípios centrais da CP que haviam sido propostos desde o início; foi entendido que cada praticante deve trazer para as sessões uma prática profissional madura, uma constelação única de técnicas, experiências e conhecimentos; que o trabalho na CP é baseado no diálogo entre essas (constelações de) práticas; e que tudo trazido para o trabalho pode muito bem ser transformado ao longo do processo. Os participantes precisam estar abertos a essas possíveis perturbações de forma, intenção e estrutura.

Em muitos aspectos, a noção de Haraway de ficar com o problema se revelou como mais uma tática central e talvez uma atitude-chave, ressaltando a delicada natureza interna da cultura compartilhada da CP. Um ethos coletivo havia sido estabelecido durante as duas primeiras sessões por intermédio de um processo orgânico de pesquisa criativa e, inevitavelmente, começaram a surgir questões relativas a acesso, pertencimento e devires. Ficar com o problema permitiu que a realidade confusa de uma política de portas abertas ganhasse voz, na qual diferentes praticantes-pesquisadores são acomodados, em que a mudança é sempre bem-vinda e os parâmetros do laboratório permanecem abertos para reconfigurações que acomodem praxes de outras disciplinas artísticas. A proposta de transformações técnicas no coração do processo dialógico de troca e geração de conhecimento da CP foi reconhecida como um processo dialético muito mais amplo, no qual modelos preconcebidos, resultados desejados e estruturas fixas seriam necessariamente desafiados, contaminados e rearticulados. A capacidade de permitir essas derrapagens, de permanecer no desconhecido e de aceitar a ambiguidade se tornaram claramente condições-chave dessa aldeia-laboratório em particular.

Emaranhamento entre Teoria e Prática

Para Barad (2007)BARAD, Karen Michelle. Meeting the Universe Halfway: Quantum Physics and the Entanglement of Matter and Meaning. Durham: Duke University Press, 2007., o conhecimento é uma articulação aberta, baseada no emaranhamento. Emaranhamento aqui não diz respeito simplesmente ao entrelaçar-se com um outro, como na união de entidades separadas, mas um reconhecimento da primazia da relacionalidade intrassubjetiva em oposição à existência independente e autocontida. Esse estado de emaranhamento é endereçado às táticas dialógicas no coração da práxis da CP, inculcando uma capacidade de ouvir e aceitar a incerteza, dando sentido aos eventos coletivos retroativamente pelo conhecimento da práxis.

Na CP, teoria e prática estão inextricavelmente emaranhadas, ambas se conectando e se transmutando enquanto trabalhamos em conjunto. Isso reflete a experiência vivida pelos membros da plataforma, que são praticantes-pesquisadores constantemente amalgamando pensamento conceitual e conhecimento corporificado em um processo vivo de pesquisa artística. Na CP nós falamos de como caminhar de volta para o futuro; nós seguimos nossas práticas na medida em que elas nos oferecem insights, baseando-nos nas muitas genealogias da práxis dos membros do grupo para questioná-las e redirecioná-las à luz de nossas preocupações e necessidades atuais. Nosso fazer e pensar nos ajuda a eco-localizar companheiros de caminhada, fontes de inspiração, que podem variar desde os mestres-praticantes que orientaram nossos treinamentos até filósofos contemporâneos e teóricos críticos preocupados com questões sociais, epistêmicas e ônticas mais amplas. De fato, quando falamos de um laboratório nômade de aldeia, já estamos apontando para um tipo de abordagem laboratorial que se afasta da ideia de uma investigação científica isolada e objetiva. A complexidade das conexões a que temos acesso pelas nossas práticas corporificadas nos mantém conectados à ação do presente, ao mesmo tempo em que a teorizamos.

Além disso, nossas investigações práticas coletivas não são guiadas por noções binárias de sucesso ou fracasso, mas sim por uma busca de interrupções e rupturas. As táticas que desenvolvemos nos permitem abrir nossas técnicas artísticas, permitindo o surgimento de conexões rizomáticas no estúdio, que abrem novos caminhos criativos. A utilidade de nossas experiências é julgada necessariamente em um nível subjetivo e fenomenológico, pois nosso foco está nas genealogias corporificadas e de práxis que cada um de nós carrega dentro de si. O processo é, por necessidade, confuso, amorfo e não construtivista e, às vezes, rompe com o rigor externo das práticas tradicionais de teatro laboratório. Entretanto, é justamente nesses momentos de caos controlado que somos capazes de contrapor nossos automatismos profissionais e descobrir novas possibilidades, coletivamente.

Existe, no entanto, um rigor na práxis emergente da CP, que se baseia em diferentes raízes. A primeira raiz está nas técnicas e práticas especializadas de cada membro. Os anos de treinamento, o trabalho profissional no qual a prática é posta em ação, a relação íntima entre o praticante e o ofício: esses elementos constroem um rigor prático que é testado dentro e por intermédio do fazer. Essas técnicas alimentam o laboratório da CP e são um elemento crucial para seu poder. O que é trazido para o trabalho por cada participante define o que pode ser gerado pelas diferentes táticas coletivas empregadas.

A segunda raiz é uma atitude compartilhada; a habilidade delicada, porém diligente, de estar presente e ser generoso, escutando e sintonizando com os parceiros, estando ao mesmo tempo aberto e vulnerável. Essa atitude não pode se manifestar de forma pouco sincera: estar presente fala da insistência em se ater à pesquisa, em não desistir e não abandonar. Também significa esperar pacientemente pelo momento certo no processo coletivo para trazer uma sugestão ou optar por mantê-la como pesquisa pessoal se o momento não for propício para compartilhar. Ficar com o problema implica na necessidade de permitir a transformação de tudo o que é trazido.

A terceira raiz está nos interesses pessoais e nos momentos de eureka (ou PoPs, como nós os chamamos). No laboratório emaranhado e polivocal da CP é crucial que cada participante permaneça em contato com seus interesses pessoais e questões profissionais, para não perder os fios da meada. Isso significa que um praticante tem que continuar ouvindo a voz interior do saber técnico fundamentada na primeira raiz aludida acima - a prática pessoal - enquanto participa do processo coletivo, criando uma malha de pesquisa simultânea.

O Laboratório como Aldeia: o problema em que nos encontramos

Uma questão recorrente tem sido como a cultura laboratorial emergente da CP está relacionada com o território vizinho da criação artística. Como a CP estava centrada na fase de pré-produção/pré-expressão das práticas artísticas, a produção de espetáculos a princípio parecia estar fora do escopo de nossa pesquisa. Entretanto, dentro do próprio trabalho de laboratório, momentos performativos e materiais começaram a aparecer consistentemente como montagens móveis, material artístico que transita de um artista para o outro, de um contexto para outro. Finalmente, chegamos à conclusão de que performar é, por si só, uma tática dentro da aldeia-laboratório da CP, com o mesmo peso que qualquer outra tática aludida acima. Performar na CP, no entanto, não é reificado como resultado final - é parte de nosso processo contínuo e emaranhado de pesquisa laboratorial26 26 Em 2020, a CP desenvolveu uma série de desfiles de rua e apresentações ao ar livre em colaboração com o terceiro grupo de teatro Studio 7 em Schwerte (DE) e produziu a apresentação on-line La Petite Mort, que misturou vídeos gravados e a participação do público. Esses dois exemplos concretos de projetos de pesquisa performática falam das formas emergentes nas quais a prática da CP pode englobar performances ao vivo e gravadas como resultados de uma pesquisa em andamento. .

Além disso, uma preocupação com a dimensão social da aldeia nômade e uma ampliação do impacto político potencial do trabalho da CP, levou-nos a uma série de novas iniciativas. Grande parte deste trabalho tem se baseado implicitamente no legado de trocas do Terceiro Teatro, ações culturais e intercâmbio horizontal27 27 A troca é uma tática de intercâmbio performático entre culturas desenvolvida por Eugenio Barba e o Odin Teatret. Para maiores informações sobre as trocas, consultar Barba (1999). . As táticas dialógicas desenvolvidas pela CP permitem uma abordagem andragógica particular de ensino e aprendizagem que começamos a compartilhar com os estudantes dos institutos de Ensino Superior de toda a Europa28 28 Projetos educacionais foram realizados pela CP em instituições incluindo a Universidade de Aarhus (DK), Escola de Atuação East 15 (UK), Academia Fontys (NL). Em março de 2021, Marije Nie desenvolveu uma série de workshops internacionais on-line no âmbito da EUGLOH, uma rede universitária internacional, com um grupo de trabalho de PoP, Embracing the Unknown, intitulado E-Spaces of Encounter, com Marta Wryk, Tapani Mononen, Vera Dickman e Christoph Falke. . Os membros da CP também estão desenvolvendo projetos significativos de engajamento social, tanto online como in situ, que estão alcançando comunidades tanto em nível local como global29 29 Os membros da CP iniciaram vários projetos de engajamento social performativo, tais como o projeto Wunderkammer (DK, 2021) de Marije Nie e Gonzalo Alarcon, Nye Tide i Vinden de Sara Strandby (DK, 2020-2021), Andrea Maciel e Alex Boyd co-criaram a ONG Raízes Interculturais para Artes, Saúde e Mudança Social, e o projeto 1001 Fires do Parlamento de Práticas, com Marije Nie, Adriana La Selva, Linda Cunningham, Emilie Lund e Jenny Crissey. .

É importante ressaltar que todas essas atividades nos permitiram permanecer ativos durante o período de lockdown gerado pelo Covid-19; durante a pandemia percebemos que nossa aldeia nômade também poderia migrar para o espaço digital e encontrar casas temporárias em plataformas online como o Zoom. As limitações do isolamento social tornaram-se parte de nossas condições laboratoriais e nosso esforço para permanecer com o problema nos permitiu responder aos desafios que o momento atual colocou em nosso caminho. Mais do que nunca, nossas atividades de pesquisa em andamento permitiram que o companheirismo florescesse em um momento de grande dificuldade para artistas independentes de todo o mundo.

Com o desenvolvimento da CP, a plataforma nos permitiu chegar a outras redes que operam de maneira semelhante. O espírito do chamado Terceiro Teatro e as tradições do teatro laboratório estão começando a ressoar com uma nova geração de profissionais, incluindo muitos de fora do teatro. As práticas laboratoriais artísticas e interdisciplinares, como as da CP, estão ganhando novo terreno pelo desenvolvimento de redes, atitudes nômades e aldeias, conectando o local com o transnacional de muitas maneiras diferentes. A transição de um modo de produção para um modo processual se endereça a um zeitgeist, uma comunidade emergente de profissionais independentes, porém profundamente emaranhados, que podem trabalhar juntos com fluidez e em constelações mutáveis, que seguem suas práticas e as imanências das arqui-texturas oraculares que elas constroem. Sugeriríamos que essa transição acentua a imanência como uma pedra fundamental metodológica e o companheirismo como paradigma. Afastamo-nos de uma ontologia orientada ao sujeito/objeto para uma ontologia orientada pela prática, na qual corpos e objetos se unem por intermédio de táticas criativas, atualizadas, interrompidas e re-territorializadas no momento presente, persistentemente.

CP floresceu como uma resposta à ISTA e às necessidades dos artistas contemporâneos e nós reconhecemos esses pontos de partida. Nossa própria aldeia-laboratório encontra-se em um iminente arquipélago de arte autônoma, fundamentado no intercâmbio de conhecimentos. É dentro deste espaço de diálogo suave que traçamos um ethos emergente orientado pela prática, permanecendo com os problemas juntos, por intermédio do companheirismo, cum panis.

Notas

  • 1
    Nordisk Teaterlaboratorium (NTL) é a organização guarda-chuva que compreende Odin Teatret e uma extensa gama de atividades e grupos, tanto na Dinamarca como internacionalmente.
  • 2
    Para discussões mais detalhadas sobre a ISTA, ver Barba e Savarese (1990)BARBA, Eugenio; SAVARESE, Nicola. A Dictionary of Theatre Anthropology: The Secret Art of the Performer. Translated by Richard Fowler. London: Routledge, 1990. e Barba (1995BARBA, Eugenio. The Paper Canoe: A Guide to Theatre Anthropology. Translated by Richard Fowler. London: Routledge, 1995. ; 2015)BARBA, Eugenio. The Moon Rises from the Ganges: My Journey Through Asian Acting Techniques. Translated by Judy Barba. London: Routledge, 2015..
  • 3
    No projeto Collective Mind/Cohabitation, Odin Teatret abre as portas de sua sala de ensaios para cerca de 20 participantes selecionados para seguir um processo criativo desenvolvido pelo grupo. Os participantes entram em imersão no delicado, elusivo e, às vezes, repetitivo e exaustivo modo de trabalhar do Odin Teatret.
  • 4
    A Odin Week é um festival anual no Odin Teatret. O programa inclui treinamento, participação nos ensaios, todas as performances do Odin Teatret e demonstrações de trabalho atualmente em repertório, filmes, encontros com Eugenio Barba, palestras e discussões.
  • 5
    Um número limitado de artistas e grupos de teatro são convidados a residir no NTL para trabalhar em pesquisas e projetos autônomos, resultando, em sua maioria, em produções. Os períodos de residência variam em duração e podem ser distribuídos em estadias repetidas. Uma condição fundamental é que todos os artistas residentes devem realizar intervenções na comunidade.
  • 6
    Radio Kootwijk Live (RKL) foi um laboratório de pesquisa artística baseado no monumental edifício da Radio Kootwijk. Realizou quatro sessões de 3 dias e quatro concertos por ano entre 2009 e 2013. Os artistas da RKL eram músicos altamente qualificados e classicamente treinados, acompanhados por iluminadores de teatro, diretores, produtores de teatro específicos do local, escritores, dançarinos e, o que é importante, grupos de plateia, trabalhando juntos sobre a questão: o que é um concerto? Ao longo de quatro anos, o trabalho com grupos de plateia mudou para compartilhar as práticas artísticas dos músicos com profissionais de fora das artes, com foco em temas que envolvem o trabalho.
  • 7
    A Ponte dos Ventos é um grupo teatral internacional e um projeto pedagógico iniciado pela atriz do Odin Iben Nagel Rasmussen em 1989. Os membros do grupo (incluindo La Selva) vêm da Europa, América Latina e China e se reúnem anualmente em diferentes locais do mundo para desenvolver suas pesquisas de treinamento, atuar e colaborar com diferentes comunidades por intermédio de trocas. Para um relato do trabalho do grupo, ver La Selva (2019)LA SELVA, Adriana. Bridging Monuments: On repetition, time and articulated knowledge at The Bridge of Winds group. In: EVANS, Mark; THOMAIDIS, Konstantinos; WORTH, Libby (ed.). Time and Performer Training. London: Routledge, 2019. P. 139-150..
  • 8
    Federação Internacional de Pesquisa Teatral.
  • 9
    Associação de Teatro e Pesquisa em Performance.
  • 10 A reunião foi realizada de 02 a 10 dez. 2017. Lista de participantes: Adriana La Selva (BR/BE), Marije Nie (NL), Vilja Itkonen (FI), Gonzalo Alarcon (CH/BE), Arkadius Rogozinski (PO), Daniel Mroz (CAN), Marieke Breine (BE), Andrea Maciel Gomes (BR/UK), Alex Boyd (UK), Clara Solana (SP), Joaquim Carlos Bezerra de Carvalho (BR/DE), Simon Bronikowski (DE).
  • 11
    "A Dança dos Ventos consiste em três passos bastante simples, quase como a valsa, mas nos quais o primeiro passo desce em direção ao chão com os joelhos dobrados, a fim de dar o impulso (sats) e pular no segundo passo. O terceiro passo funciona como uma transição para o início de um novo ciclo, criando uma estrutura ternária de movimento em constante renovação. Esse exercício desenvolve um tipo de energia leve, na qual o corpo do ator está constantemente decolando do chão. Por ser um exercício cíclico, deve ser feito por um tempo mais longo; o objetivo não são os passos em si, mas as 'portas', os passos se abrem, permitindo ao ator ir além do cansaço e encontrar fontes ocultas de energia [...]". Disponível em: <https://bridgeofwinds.com/training/>. Acesso em: 17 mar. 2021.
  • 12
    Inspirado por métodos como Lois Wever's Long Table (http://www.splitbritches.com/long-table), os diálogos de Bohm (2004 [1955]), Performing Back Scores (2015) e o trabalho do laboratório de música Live Radio Kootwijk (NL, 2009-2013).
  • 13
    Para mais informações sobre grupos e artistas residentes no NTL, ver: <https://odinteatret.dk/nordisk-teaterlaboratorium/>.
  • 14
    Na técnica da torneira o equilíbrio é usado como um princípio dinâmico. Enquanto bate, o bailarino move seu peso fora do equilíbrio para um lado, reunindo energia e depois desloca e redireciona essa energia para outra direção, de modo que a entrada inicial de energia se mantenha ativa durante toda a dança (Nie, 2021NIE, Marije. Interview conducted by Patrick Campbell on the 20th April 2021. Manchester. (Unpublished)).
  • 15
    No exercício fora de equilíbrio, "[...] o corpo é desequilibrado e, pouco antes de cair, move-se para uma direção oposta, de modo que a energia que deveria terminar em uma colisão com o chão é jogada de volta no espaço" (La Selva, 2019LA SELVA, Adriana. Bridging Monuments: On repetition, time and articulated knowledge at The Bridge of Winds group. In: EVANS, Mark; THOMAIDIS, Konstantinos; WORTH, Libby (ed.). Time and Performer Training. London: Routledge, 2019. P. 139-150., p. 142).
  • 16
    As principais atividades incluíram um evento de intercâmbio de conhecimentos de pós-graduação na Queen Mary University of London (UK), organizado por Andrea Maciel (abril de 2018), um compartilhamento de trabalhos colaborativos no IFTR (2018) e uma apresentação no De Koer, em Gent (BE).
  • 17
    A reunião ocorreu de 22 a 28 nov. 2018. Lista de participantes: Adriana La Selva (BR/BE), Marije Nie (NL), Gonzalo Alarcon (CH/BE), Andrea Maciel (BR/UK), Alex Boyd (UK), Joaquim Carlos Bezerra de Carvalho (BR/DE), Patrick Campbell (UK), Sara Strand Holmsby (DK), Ramiro Silveira (BR/UK), Dina Abu Hamdan (JO/DK), Jonas De Rave (BE).
  • 18
    Para mais informações sobre esses conceitos, consulte Haraway (2016)HARAWAY, Donna Jeanne. Staying with the Trouble: Making Kin in the Chthulucene. Durham: Duke University Press, 2016..
  • 19
    Kecak, é uma forma de dança e drama musical hindu balinês desenvolvida nos anos 1930 em Bali, na Indonésia.
  • 20
    Para mais informações, consultar Silveira (2014)SILVEIRA, Ramiro Bicca da. Teatro Playground: o jogo como metodologia processual de ensaio. Tese (Doutorado em Artes Cênicas) - Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014..
  • 21
    A reunião foi realizada de 04 a 08 fev. 2020. Lista de participantes: Alex Boyd (UK), Andrea Maciel (BRA /UK), Marije Nie (NL), Adriana La Selva, (BRA / BE), Joaquim Bezerra (BRA / DE), Jonas de Rave (BE), Sara Holm Strandby (DK), Dina Abu Hamdan (JOR / DK), Simon Bronikowski (DE), Patrizia Marzioli (AR / DE), Christoph Falke (DE), Melina Scialon (BRA), Emilie Lund (DK / DE), Theophile Choquet (FR), Lucas Duran (ARG), Linda Lyn Cunningham (IR).
  • 22
    A reunião do Parlamento de Práticas (PoP) ocorreu no NTL em 13/02/2020 e foi iniciada por La Selva e Nie. O PoP permaneceu ativo durante toda a pandemia de COVID-19, com várias reuniões on-line, investigando formas de diálogo e conectando uma ampla rede de artistas, trabalhadores culturais e pesquisadores em modos alternativos de estar juntos por intermédio da virtualidade. Para mais informações sobre PoP, consultar: <www.parliamentofpractices.space>. Lista de Participantes: Adriana La Selva, performer, diretora, pesquisadora, Universidade de Gent / BE / BRA, Marije Nie, sapateadora, performer / NL, Dr. Alex Boyd, praticante taoísta / UK, Dr. Andrea Maciel, artista de dança / BRA / UK, Joaquim Bezerra, performer, figurinista / BRA / DE, Jonas de Rave, músico / BE, Simon Bronikowski, ator, Estúdio 7 / DE, Christoph Falke, diretor, Estúdio 7 / DE, Prof. dr. Melina Scialon, artista de dança e performance, Unicamp / BRA , Emilie Lund, artista de dança / DK / DE, Theophile Choquet, ator / FR, Lucas Duran, ator / ARG, Sara Holm Strandby, artista visual / DK, Dina Abu Hamdan, diretora / JOR / DK, Linda Lyn Cunningham, De Montfort University / IR, Ofer Ravid, coreógrafa / ISR / DK , Dr. Adam Ledger, Universidade de Birmingham / UK, Daniel Jacewitz, diretor de teatro, Teatr Brama / PL, Maciej Ratajczyk, Teatr Brama, ator / PL, Prof. Jane Turner, Universidade Metropolitana de Manchester / UK, Dr. Patrick Campbell, Universidade Metropolitana de Manchester / UK, Marta Wryk, cantora de ópera / PL / DE, Tomasz Prasqual, compositor / PL / DE.
  • 23
    A Árvore da Vida é um diagrama utilizado em várias tradições místicas, incluindo a Cabala. Os diferentes pontos nodais representam diferentes emanações de divindade.
  • 24
    O Wunderkammer ou Gabinete de Curiosidades surgiu no século XVI, apesar de coleções mais rudimentares terem existido antes e serem precursoras de museus.
  • 25
    Um dos pontos nodais da Árvore da Vida.
  • 26
    Em 2020, a CP desenvolveu uma série de desfiles de rua e apresentações ao ar livre em colaboração com o terceiro grupo de teatro Studio 7 em Schwerte (DE) e produziu a apresentação on-line La Petite Mort, que misturou vídeos gravados e a participação do público. Esses dois exemplos concretos de projetos de pesquisa performática falam das formas emergentes nas quais a prática da CP pode englobar performances ao vivo e gravadas como resultados de uma pesquisa em andamento.
  • 27
    A troca é uma tática de intercâmbio performático entre culturas desenvolvida por Eugenio Barba e o Odin Teatret. Para maiores informações sobre as trocas, consultar Barba (1999)BARBA, Eugenio. Theatre: Solitude, Craft, Revolt. Translated by Judy Barba. Aberystwyth: Black Mountain Press, 1999..
  • 28
    Projetos educacionais foram realizados pela CP em instituições incluindo a Universidade de Aarhus (DK), Escola de Atuação East 15 (UK), Academia Fontys (NL). Em março de 2021, Marije Nie desenvolveu uma série de workshops internacionais on-line no âmbito da EUGLOH, uma rede universitária internacional, com um grupo de trabalho de PoP, Embracing the Unknown, intitulado E-Spaces of Encounter, com Marta Wryk, Tapani Mononen, Vera Dickman e Christoph Falke.
  • 29
    Os membros da CP iniciaram vários projetos de engajamento social performativo, tais como o projeto Wunderkammer (DK, 2021) de Marije Nie e Gonzalo Alarcon, Nye Tide i Vinden de Sara Strandby (DK, 2020-2021), Andrea Maciel e Alex Boyd co-criaram a ONG Raízes Interculturais para Artes, Saúde e Mudança Social, e o projeto 1001 Fires do Parlamento de Práticas, com Marije Nie, Adriana La Selva, Linda Cunningham, Emilie Lund e Jenny Crissey.
  • Traduzido do original em inglês, também publicado neste número, pelos autores e autoras e revisado por Gilberto Icle.

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Editado por

Editores-responsáveis: Jane Turner e Gilberto Icle

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2021
  • Aceito
    31 Maio 2021
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