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‘Maráia Quéri’ e o Futuro Queer da Cena Contemporânea

Maráia Quéri’ et le Futur Queer de la Scène Contemporaine

RESUMO

‘Maráia Quéri’ e o Futuro Queer da Cena Contemporânea – O ensaio destaca elementos da encenação de Maráia Quéri – peça teatral com dramaturgia de Raquel S., estreada em 2022 no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, interpretada e dirigida pelo ator aveirense Romeu Costa – que justifiquem sua classificação na qualidade de uma peça-conferência. Ao se perguntar qual sua implicação estética e ética com questões relativas a gênero e sexualidade, ressalta-se que o espetáculo estabelece importantes conexões interdisciplinares, como com as políticas de subjetivação e a temporalidade queer. Por fim, responde-se que peças, como Maráia Quéri, são importantes produções de desprogramação colonial.

Palavras-chave:
Maráia Quéri ; Peça-Conferência; Teatro Contemporâneo; Temporalidade Queer; Políticas de Subjetivação

RÉSUMÉ

Maráia Quéri’ et le Futur Queer de la Scène Contemporaine – L'essai met en évidence les éléments de la mise en scène de Maráia Quéri – une pièce dramaturgique de Raquel S., créée en 2022 au Teatro Nacional D. Maria II, à Lisbonne, interprétée et mise en scène par l'acteur d'Aveiro Romeu Costa – qui justifient sa classification comme pièce de conférence. Lorsqu’on se demande quelles sont ses implications esthétiques et éthiques sur les questions liées au genre et à la sexualité, il est souligné que le spectacle établit d’importants liens interdisciplinaires, comme avec les politiques de subjectivation et de temporalité queer. Finalement, la réponse est que des pièces de théâtre comme Maráia Quéri sont d’importantes productions de déprogrammation coloniale.

Mots-clés:
Maráia Quéri ; Pièce de Conférence; Théâtre Contemporain; Temporalité Queer; Politiques de Subjectivation

ABSTRACT

‘Maráia Quéri’ and the Queer Future of Contemporary Theater – This text highlights elements of the staging of Maráia Quéri – a play written by Raquel S., premiered in 2022 at the D. Maria II National Theatre in Lisbon, performed and directed by the Aveiro actor Romeu Costa. These facts justify its classification as a conference play. Enquiring into its aesthetic and ethical implications for issues regarding gender and sexuality, we highlight the play’s interdisciplinary connections – with the politics of subjectivation and queer temporality, for example – and finally conclude that plays like Maráia Quéri are important sites of colonial deprogramming.

Keywords:
Maráia Quéri; Conference Request; Contemporary Theatre; Queer Temporality; Subjectivation Policies

A minha vergonha não cabe numa reposta (Raquel S.).

Maráia Quéri – escrita assim, em português fonético –, peça teatral com dramaturgia de Raquel S. (1986), é a base para o espetáculo estreado em 2022 no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa (Portugal), interpretado e dirigido pelo ator aveirense Romeu Costa (1979). O objetivo deste texto é destacar, de maneira mais detida, o uso estratégico de certos dispositivos e elementos da encenação que a justifiquem na qualidade de uma peça-conferência e, ainda como peça-conferência, como sua implicação com questões de gênero e sexualidade, por meio de políticas de subjetivação e sob a ótica da temporalidade queer, tornam a peça um terreiro de politização e de desprogramação colonial.

Para tanto, desenvolvemos uma metodologia queer de leitura do teatro contemporâneo livremente inspirada pela scavenger methodology, que seria, segundo Halberstam (1998, p. 13)HALBERSTAM, Jack. Female masculinity. Durham: Duke University Press, 1998., uma metodologia de escavação que, ao reconhecer que não existe uma única práxis, ortodoxia ou forma de intersectar os métodos de investigação, que não é possível apreender numa só teoria todo o movimento do mundo contemporâneo, usa diferentes métodos para recolher, analisar e produzir informações, o que permite que a interação e o diálogo interdisciplinar, no caso da análise de Maráia Quéri, tenham a tarefa final de questionar normatividades.

Os estudiosos queer podem defender, metodologicamente, as mesmas possibilidades lúdicas e instáveis que desafiam os pressupostos sexuais e de gênero heteronormativos. Nesse sentido, somam-se várias estratégias de conhecimento, além da assistência da peça por duas vezes (2022 e 2023), uma perspectiva etnográfica queer, que considera a entrevista realizada com o ator realizada por um dos autores deste texto (2023), em Lisboa (2023), além de inúmeros materiais dispostos sobre a peça na internet: críticas, matérias de jornais, sites etc.

Ao prestar atenção nos aspectos da encenação de Maráia Quéri, dentro do panorama de peças contemporâneas autodenominadas peças-conferência, interessa-nos responder como esse espetáculo pode perturbar os entendimentos tradicionais sobre gênero e sexualidade e convidar o público a pensar e experimentar “futuros que são mais complexos do que o momento presente parece permitir” (Thürler; Nogueira; Lobo, 2022, p. 230THÜRLER, Djalma; NOGUEIRA, Marcelo; LOBO, Marcus. The Prom: o queer também pode ser zazz ou o amor enquanto tecnologia para a revolução. Aceno – Revista de Antropologia do Centro-Oeste, v. 9, n. 21, p. 227-240, September – December, 2022.).

Teatro, políticas de subjetivação e guilty pleasures

Quando Anzaldúa (1987, p. 87)ANZALDÚA, Gloria. La conciencia de la mestiza: towards a new consciousness. In: ANZALDÚA, Gloria. Borderlands: the new mestiza = La frontera. San Francisco: Aunt Lute Books, 1987. p. 77-101. afirma, em La conciencia de la mestiza, que “nada acontece no mundo ‘real’ a não ser que aconteça primeiro nas imagens das nossas cabeças”, está a mencionar o poder que as políticas de subjetivação exercem sobre nosso imaginário. Quando se criam as narrativas sociais normativas sobre raça, gênero e sexualidade, por exemplo, determinando a forma como as pessoas subalternizadas são representadas e concebidas nas produções culturais contemporâneas, reforça-se a maneira como tais pessoas são tratadas e compreendidas no mundo “real” e, também, como podem comentar o nosso mundo e fazer-nos imaginar aquilo que pode ser bom ou ruim, ambivalente ou absolutamente aterrador, digno de audiência ou abjeto.

A máxima “onde há subjetivação, não há sujeito”1 1 là où il y a subjectivation, il n’y a pas de sujet. (Tassin, 2014, p. 158TASSIN, Étienne. Subjectivation versus sujet politique. Réflexions à partir d'Arendt et de Rancière. Tumultes, v. 2, n. 43, p. 157-173, 2014., tradução nossa) revela a novidade conceitual da ideia de subjetivação em relação ao entendimento clássico da noção de sujeito. Nesse sentido, o conceito de políticas de subjetivação, ao contrário da noção de sujeito – “chose, moi ou vassal” –, designa um processo e não um princípio, estado ou resultado. Esse processo não é o de um devir sujeito, ou da produção de um sujeito em si (ou o que se sabe o que seja um sujeito ou como se tornar um). Mais do que um acontecer de si, de uma apropriação de si, de uma ‘rememoração’ de si mesmo identificando um ser com o que é suposto ser ou com o que é exigido dele para ser, as políticas de subjetivação servem para a produção de um desvio de si, de uma desidentificação, de uma saída de si.

Assim, se, por um lado, políticas de identificação nos permitem imaginar a produção de uma subjetividade determinada, uma “identidade notável”, estabelecida pelo normal, natural, aceitável ou verdadeiro, “que é a mentira muitas vezes repetida” (Andrade, 2022, p. 512ANDRADE, Oswald de. A Antropofagia como visão do mundo (1930). In: ANDRADE, Oswald de. Diário Confessional. Organização de Manuel da Costa Pinto. São Paulo: Companhia das Letras, 2022. p. 511-552.), por outro, as políticas de subjetivação, concordando com Tassin (2014)TASSIN, Étienne. Subjectivation versus sujet politique. Réflexions à partir d'Arendt et de Rancière. Tumultes, v. 2, n. 43, p. 157-173, 2014., não são uma autodeterminação do sujeito por si mesmo, pois o sujeito não está na origem do processo, ele não é o motor ou o operador.

Por estarem ligadas a uma forma de indefinição ou errância – o que a torna uma aventura –, as políticas de subjetivação nos permitem o contrário, visualizar um mundo ou futuro alternativo, já que o ser está exposto apesar de si mesmo. Concretamente, isso significa que “quem acontece” com e pelos processos de subjetivação não é o herdeiro testamentário de “o que ele é” alhures. Ou ainda, significa que o que sou, segundo meu nascimento ou minhas filiações socio-históricas, não decide, de antemão, quem me descubro, segundo esse processo de subjetivação. Isso é pelo menos o que poderíamos entender quando se diz que a subjetivação é política.

Para as pessoas subalternizadas, descobrir-se outro, por causa das articulações entre o individual e o coletivo, pode significar imaginar um futuro ou um espaço longe da opressão ou, pelo menos, no qual as relações entre os grupos atualmente empoderados e os que não têm poder são alteradas ou melhoradas. É nesse sentido, fazendo-nos indagar sobre os nossos prazeres culpados, os nossos guilty pleasures, que Maráia Quéri põe em xeque a suposta naturalidade do sujeito (social, político, racial, sexual), como se dá na evidência das afirmações dominantes.

A política de subjetivação, como aqui a entendemos, é a experiência de uma desidentificação, designa uma pluralidade de processos de desterritorialização (Guattari, 1990GUATTARI, Félix. As três ecologias. Translation: Maria Cristina F. Bittencourt. Revision: Suely Rolnik. Campinas: Papirus, 1990.), de desancoramento, de despertencimento, cujos desdobramentos são diversos, mas que abre o acesso à política, quer esse acesso se manifeste na forma de uma construção identitária coletiva ou não, de uma ação coletiva organizada ou não.

Para Sami Schalk (2019)SCHALK, Sami. Lowbrow Culture and Guilty Pleasures? The Performance and Harm of Academic Elitism. Inside Higher Education. 2019. Available at https://www.insidehighered.com/advice/2019/02/22/professor-asks-who-arbiter-lowbrow-scholarly-interests-and-pursuits. Accessed on April 5th, 2023.
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, a associação de culpa com prazer tem, inevitavelmente, a ver com grupos marginalizados ou menos poderosos a quem muitas vezes é negado o prazer. Romeu Costa, em vídeo de divulgação da temporada de Maráia Quéri, no Centro Cultural da Mapaposta, ocorrida entre 23 e 26 de março de 2023, disse:

Se eu ocupo o palco e digo que tenho vergonha de gostar de Mariah Carey, isso é um convite para que as pessoas, também, expurguem de alguma forma as próprias vergonhas que tem, sempre associadas com o prazer. O fato de um homem dizer que gosta de uma cantora, cantora norte-americana, não te valoriza na maior parte dos círculos que nós nos inserimos. E eu acho que a minha vergonha de gostar de Mariah Carey era um ponto de partida suficientemente forte para criar empatia com o público (Costa, 2023COSTA, Romeu. Divulgação. YouTube: Centro Cultural da Malaposta. 2023. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=R9Yoow5nu8c&t=94s. Accessed on April 5th, 2023.
https://www.youtube.com/watch?v=R9Yoow5n...
, não paginado [n. p.]).

Sami Schalk, professora de estudos de gênero e mulheres da Universidade de Wisconsin-Madison, no texto Lowbrow Culture and Guilty Pleasures? The Performance and Harm of Academic Elitism, responde ao Twitter do repórter Jack Grove, que tinha o seguinte teor: “Olá, Twitter acadêmico. Estou à procura de alguns estudiosos que queiram escrever para o THE sobre os seus prazeres culturais culpados/amor desavergonhado por assuntos/atividades supostamente lowbrow. Escolhas duvidosas de televisão e literatura são muito bem-vindas. Se tiveres ideias criativas, envia-me um DM”2 2 Do original em inglês: Hi academic Twitter. I'm looking for some scholars who would write for THE about their guilty cultural pleasures/unashamed love for supposedly ‘lowbrow’ subjects/activities. Dubious TV & literature choices are most welcome. DM me if you have some creative ideas. (Schalk, 2019, n. p.,SCHALK, Sami. Lowbrow Culture and Guilty Pleasures? The Performance and Harm of Academic Elitism. Inside Higher Education. 2019. Available at https://www.insidehighered.com/advice/2019/02/22/professor-asks-who-arbiter-lowbrow-scholarly-interests-and-pursuits. Accessed on April 5th, 2023.
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tradução nossa).

Importa dizer que o termo lowbrow, também trazido por Romeu Costa em Maráia Quéri, em português, pode ser traduzido por algo que não é complicado ou que não exige muita inteligência para ser compreendido, não intelectual ou culto, de qualidade duvidosa, e que, relacionado a coisas consideradas suspeitas ou não confiáveis, acaba por estabelecer uma divisão entre alta/baixa cultura, o que reforça a fronteira elitista entre uma e outra. Para Schalk (2019, n. p.)SCHALK, Sami. Lowbrow Culture and Guilty Pleasures? The Performance and Harm of Academic Elitism. Inside Higher Education. 2019. Available at https://www.insidehighered.com/advice/2019/02/22/professor-asks-who-arbiter-lowbrow-scholarly-interests-and-pursuits. Accessed on April 5th, 2023.
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, essa percepção pode ser destacada nas respostas ao tweet original de Grove:

Mas, em vez disso, o enquadramento parecia reforçar essa fronteira elitista. A dinâmica que estou destacando foi reproduzida nas respostas ao tweet original de Grove. Uma pessoa perguntou se tocar em uma banda, ir a jogos de futebol e ver televisão de geek contava. Grove respondeu que não. Isso é ‘mais uma atividade geral de lazer fora do trabalho’, explicou. Outra pessoa perguntou se a leitura de cartas de tarô e a astrologia contavam. Sim, disse Grove. Esta categorização desdenhosa e aleatória é algo que enfureceria minhas muito amigas bruxas queer e curandeiras de cor que têm trabalhado para resistir à desvalorização destes mesmos assuntos e têm usado a astrologia e a leitura de cartas de tarô como práticas antirracistas, queer-friendly e feministas3 3 Do original em inglês: But instead, the framing seemed to reinforce this elitist boundary. The dynamic I’m highlighting played out in the replies to Grove’s original tweet. One person asked if playing in a band, going to football games and watching geeky television counted. Grove said it did not. That’s “more just general leisure activity outside of work,” he explained. Another person asked if tarot-card reading and astrology counted. Yes, Grove said. This dismissive and random categorizing is something that would infuriate my many queer witch friends and healers of color who have worked to resist the devaluing of these very subjects and have used astrology and tarot-card reading as antiracist, queer-friendly, feminist practices. (tradução nossa).

Como sugeriu em seus tweets, muito do que é considerado baixa cultura, objetos supostamente menos cultos e de menor qualidade, para Schalk, estão associados a pessoas pobres e da classe trabalhadora, mulheres e grupos racializados, como a ficção-científica, por exemplo, gênero em que Octavia Butler (1947-2006) foi pioneira. Com as sci-fi, Butler passou a se situar na vanguarda do Afrofuturismo, fenômeno que celebra a exploração de futuros para a diáspora africana.

Em artigo que escreveu para o Inside Higher Education, que expõe nos seus comentários no Twitter, Schalk argumentou que o termo ‘prazer culpado’ está ligado a uma descrença de que as pessoas inteligentes ou sérias só devem desfrutar de coisas que são altamente elitistas. Ela disse que são frequentemente as pessoas com mais poder – tradicionalmente, os homens brancos ricos – que determinam o que é valioso para desfrutar, versus o que é um prazer culpado.

Schalk, que se autodeclara como mulher queer de cor, amante da cultura pop e estudiosa da literatura contemporânea, incluindo a infantil, passou a pensar, então, em como esses “prazeres culpados” se baseiam no classismo, racismo e sexismo:

Respondi dizendo que muitas das coisas que as pessoas diziam ser os seus prazeres culpados são, na verdade, coisas que têm muita importância para elas, que têm muita profundidade quando se reserva tempo para aprender sobre elas, e que são frequentemente coisas associadas a mulheres e pessoas de cor, pessoas marginalizadas4 4 Do original em inglês: I responded to say that a lot of these things that people were saying were their guilty pleasures are actually things that have a lot of importance for people, have a lot of real depth to them when you take time to learn about them, and are often things that are associated with women and people of color, marginalized folks. (Schalk, 2019, n. p.,SCHALK, Sami. Lowbrow Culture and Guilty Pleasures? The Performance and Harm of Academic Elitism. Inside Higher Education. 2019. Available at https://www.insidehighered.com/advice/2019/02/22/professor-asks-who-arbiter-lowbrow-scholarly-interests-and-pursuits. Accessed on April 5th, 2023.
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tradução nossa).

Nesse sentido, Maráia Quéri, ciente de que a vida social é atravessada por múltiplas relações de dominação, subordinação e subjugação, procura melhorar a vida humana e reduzir o nosso impacto negativo uns sobre os outros – e sobre a sociedade – quando encoraja o público a colocar a questão do porquê. Em outras palavras, qual é o problema em gostar da Mariah Carey? E mais, qual é o problema em continuar gostando de Mariah Carey depois dos 40 anos? O prazer, distante dos marcos heteronormativos, como o casamento e a reprodução, fere alguém? A forma como se vive o mundo com alegria é ruim porque é diferente da forma como se vive a alegria no mundo pautado pelas convenções heteronormativas?

Ao responder essas indagações, Maráia Quéri, peça teatral escrita na encruzilhada entre o ficcional e o autobiográfico, atenua marcadores tradicionais da idade adulta, assinala que as vidas queer seguem sua própria lógica temporal (Halberstam, 2022HALBERSTAM, Jack. Temporalidade queer e geografia pós-moderna. Periódicus, n. 8, v. 1, p. 282-305, Oct/Nov. 2022.) e que não progridem da mesma forma que as vidas não-queer.

O tempo queer é constituído pela ambivalência fundamental

Para Mariela Solana, não há consenso sobre a noção de temporalidade queer e, como qualquer expressão relacionada ao queer, seu sentido não é claramente definido. Os sujeitos da “temporalidade queer”, na literatura analisada pela filósofa, podem ser indivíduos que não apenas não se enquadrem às narrativas e convenções socialmente legitimadas, como gays, lésbicas, bissexuais e transvestigêneres, mas, especialmente, que se oponham a elas. De modo geral, tem sido utilizada

[...] para se referir a toda uma série de narrativas, metáforas e figuras sobre práticas, experiências e sensações de gênero-sexuais que entram em tensão com as normas temporais socialmente legitimadas. A noção de temporalidade queer permite-nos ligar três ideias – tempo, gênero-sexualidade e normas – que não são necessariamente pensadas em conjunto5 5 Para referirse a toda una serie relatos, metáforas y figuras sobre prácticas, experiencias y sensaciones genérico-sexuales que entran en tensión con la normativa temporal socialmente legitimada. La noción de temporalidad queer permite conectar tres ideas – el tiempo, lo genérico-sexual y las normas – que no necesariamente son pensadas en conjunto. (Solana, 2017, p. 39,SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017. tradução nossa).

Portanto, trata o tempo queer – que de nenhum modo quer fazer “referência a uma metafísica do tempo – o tempo objetivo, quantitativo ou natural do universo –” (Solana, 2017, p. 43SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017.) de uma vida ambígua, em oposição aos cinco “objective life events”, ainda frequentemente utilizados no discurso dominante para medir a entrada na vida adulta – “[...] concluir os estudos, ingressar na força de trabalho, tornar-se financeiramente independente, casar-se e tornar-se pai” (Aronson, n. p. apud Jaffe, 2018, n. p.JAFFE, Sara. Queer Time: The Alternative to “Adulting”. JSTOR Daily, January 10th, 2018. Available at https://daily.jstor.org/queer-time-the-alternative-to-adulting/. Accessed on April 4th, 2023.
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)6 6 Kveller (2021, p. 14), citando Freeman (2010), vai chamar esse processo de “crononormatividade”. .

É essa ambivalência com a temporalidade linear, essa “dislocación esquelética” (Freeman, 2010, n. p. apud Solana, 2017, p. 44SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017.), essa “[...] organização específica da temporalidade que nos indica como devemos sentir, desejar, imaginar e a nos enxergar como sujeitos de um gênero e uma orientação sexual” (Kveller, 2021, p. 14KVELLER, Daniel Boianovsky. Dissidências sexuais, Temporalidades queer: Uma crítica ao imperativo do progresso e do orgulho. 2021. Doctoral Thesis in Psychology, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre 2021.), que tornam Maráia Quéri um terreiro de politização, teatro utilizado como política de subjetivação para a recriação crítica do imaginário do “hetero-planeta” (Despentes; Preciado, 2021, p. 10DESPENTES, Virgínia; PRECIADO, Paul B. Prólogo. In: ZIGA, I. Devir Cachorra. São Paulo: Crocodilo; n-1, 2021. p. 9-12.), terreiro de resposta afetivo-moral, de recuperação criativa e inteligente da potência de certas emoções presumivelmente negativas, que não apenas desafiam as gramáticas afetivas e discursivas heteronormativas, mas todos os seus dispositivos de governamentalidade neoliberal.

Romeu Costa, “aprisionado em um jogo de vergonha” (Hocquenghem, n. p. apud Bréville, 1971BRÉVILLE, Benoît. “Relatório contra a normalidade”, Frente Homossexual de Ação Revolucionária, 1971. Available at: https://we.riseup.net/assets/262475/ofereçoabunda.pdf. Accessed on April 5th, 2023.
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), faz da peça um exemplo de como a temporalidade heterolinear age sobre os sujeitos queer tornando-os anacrônicos, não “[...] sincronizado[a]s a las medidas lineales ordinarias de todos los días” (Dinshaw, 2002, p. 4 apud Solana, 2017, p. 44SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017.). Ao assumir a cantora Mariah Carey como seu guilty pleasures, Costa fala de todas as nossas vergonhas e, assim, chega a uma discussão mais complexa: de como conseguimos sobreviver socialmente aos esquemas cruéis a que somos obrigados a compactuar de alguma forma. E assim, anacronicamente aos 42 anos de idade, quando constrói coragem para confessar sua homossexualidade, dá sinais de um futuro queer disponível no próprio presente da cena contemporânea.

Desse modo, através da confissão da sua vergonha (primeiro o fato de gostar da cantora norte-americana, depois o fato de ser homossexual), o ator-investigador social, numa espécie de Ted Talks, assume um tom professoral e, sozinho no palco, perante alunos imaginários, usa o plural majestático para vestir de veracidade a palestra e procurará entendê-la e entenderse. Nesse momento, o didatismo vai-se transformando e o “investigador social” dá lugar ao ator Romeu Costa, que partilha a sua história individual, os seus gostos, as suas emoções, traçando, nesse processo, um retrato de Portugal e da relação do país com o mundo e consigo, numa tentativa de “conseguir sobreviver” (Costa, 2022, 38:36minCOSTA, Romeu. Entrevista. I don't know her - Cultura e Tendências. Interviewed by Leandro Tavares, March, 2022.)

Maráia Quéri, na qualidade de peça-conferência, convida seu espectador a perceber que, frequentemente, é a sociedade cisheterocristã capitalocena (Krenak, 2022, p. 36KRENAK, Ailton. Futuro ancestral. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.) quem estabelece o que é bom e o que é ruim baseada em normas racistas, sexistas e classistas, afinal,

[...] ao instrumentalizar a ideia de culpa, a Igreja dilui as barreiras entre a experiência íntima e o comportamento social, o comportamento público. Pensemos na onipresença: Deus tudo vê. E as nossas escolhas são eleitas como boas ou más e nos habilitam para ir para o céu ou para sermos enfiados no inferno. Há comportamentos acetáveis e não aceitáveis, bons e maus, certos e errados. [...] Com essa lógica, excluem-se outras formas de vida diferentes das do Ocidente, diferentes das do Hemisfério Norte e, ao definirmos normas de harmonia social, círculos de pertença a um clube, um grupo, uma sociedade, desenhamos, ao mesmo tempo, margens, espaços de exclusão, espaços fora de consonância e identificamos experiências que devem ser categorizadas como erradas (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.).

Ao constatar que o “horizonte judaico-cristão”, por intermédio do dispositivo da culpa como mecanismo para organizar a sociedade, atravessa nossas experiências, filtra nossos gostos, Romeu Costa quer que, cada vez mais, interroguemo-nos, que criemos dissonâncias em vez de deixar essas normas inquestionáveis. A certa altura da peça, o palestrante filosofa:

É importante criar abertura para a dissonância. Tendemos a pensar essa dissonância como falha, como falta e associamos a isso o valor de culpa, vergonha que atribuímos a certos filmes, a certas músicas. A culpa, tal como a vergonha, implica uma avaliação exterior de nosso comportamento. A culpa coloca o problema no ato: (escreve no chão do palco) ‘Eu fiz uma coisa horrível’! A culpa dá ênfase ao sujeito (escreve novamente no chão do palco) ‘Eu sou uma pessoa horrível’! Eu sou uma pessoa horrível porque fiz isso. Quando caímos em nós – ‘Quando caímos em nós’ é uma expressão em si problemática, é como se saíssemos do eu para fazer asneiras, ou como se o eu fosse uma entidade definida, cívica e restrita da qual saímos quando não correspondemos às expectativas –, quando voltamos ao que identificamos como nós [...] – depois de ouvirmos ‘Hero’, da Mariah Carey e cantarmos ao espelho, talvez com uma escova na mão e, com certeza, imaginando um concerto [...], nesse reino de fantasias, cantamos no palco do nosso próprio imaginário, mas ao cairmos em nós, ficamos envergonhados, como se mesmo dentro de casa, no nosso quarto, no nosso carro, houvesse um olhar público, como se cantar ‘Hero’ revelasse sobre nós verdades terríveis. No guilty pleasures, privado e público cruzam-se na arena de imaginários. É uma batalha entre o que nos dá prazer e o que cremos não tem qualidade suficiente (S., 2020, n. p.).

Ao nos fazer pensar, segundo uma epistemologia binária (Preciado, 2022PRECIADO, Paul B. Dysphoria mundi (Narrativas hispánicas) (Spanish Edition). Spain: Editorial Anagrama, 2022. Edição do Kindle.), sobre as relações prazer-vergonha, privado-público, masculino-feminino, Maráia Quéri dá ação e voz a um conflito sobre as atribuições sociais que regem a sociedade e aponta, mais uma vez, para os efeitos críticos que podem ser causados pelas políticas de subjetivação em nós.

Se entendermos que as políticas de subjetivação ocorrem em uma esfera de existência social, a partir de uma multiplicidade de relações de poder, em um domínio específico de práticas (práticas culturais, inclusive) que designam processos de autoinvenção, a arte teria o papel importante de, ao “incorporar una nueva crítica al essencialismo” (Solana, 2017, p. 49SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017.), transbordar as forças de rememoração e performatividade impostas pela sociedade. A arte, portanto, ao alargar tudo o que a prende ao mundo social normativo e de temporalidade nomotética, ao valorizar determinados objetos culturais, diferencia as pessoas como sendo humanos especiais. Por isso,

[...] como es sabido, desde los albores de los estudios queer, el esencialismo genérico-sexual emergió como un enemigo conceptual y político. Frente a representaciones fijas, inmutables y ahistóricas de la sexualidad, los autores queer proponen una concepción ontológica alternativa que pone en primer plano su carácter mutable, contingente, incoherente y situado. En estas nuevas incursiones teóricas, lo que se critica es principalmente el esencialismo temporal (Solana, 2017, p. 49SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017.).

A aposta, portanto, das políticas de subjetivação tem sido não apenas de dialetizar a explicação dos fenômenos sociais, os níveis do social e do individual, do público e do privado, mas redefinir certa interpretação do estruturalfuncionalismo social. É assim, em outras palavras, que Maráia Quéri, como terreiro de politização, ao remeter as lógicas de produção subjetiva às lógicas do mundo social em que opera o processo, colabora com a produção de um novo sujeito político, que, ao denunciar que o prazer é político, “[...] problematiza os processos socioculturais que geram corpos heteronormativos que acabam por limitar nossa compreensão sobre a provisoriedade e instabilidade da categorização de sexo e gênero” (Thürler, 2022, p. 250THÜRLER, Djalma. A coreografia da descolonialidade e a qualidade perfomativa da escrita queer. In: MOURA, Iago et al. (Org.). Cutucando o cu do cânone: insubmissões teóricas e desobediências acadêmicas. Salvador: Devires, 2022. p. 247-261.). Parafraseando a própria Schalk (2019)SCHALK, Sami. Lowbrow Culture and Guilty Pleasures? The Performance and Harm of Academic Elitism. Inside Higher Education. 2019. Available at https://www.insidehighered.com/advice/2019/02/22/professor-asks-who-arbiter-lowbrow-scholarly-interests-and-pursuits. Accessed on April 5th, 2023.
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, o prazer não deve fazer-nos sentir culpados.

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Foto de Divulgação.

A peça-conferência

Em entrevista a Leandro Tavares para o Podcast I don't know her -Cultura e Tendências, Romeu Costa (2022)COSTA, Romeu. Entrevista. I don't know her - Cultura e Tendências. Interviewed by Leandro Tavares, March, 2022. afirma que poderia ter realizado uma peça convencional, um espetáculo

[...] com uma história, um cenário, uma família fictícia e escalar um adolescente que seria uma espécie de alter ego meu, que andava a ouvir Mariah Carey pela casa e a família toda, que representaria um pouco a sociedade, dizia: ‘Para de ouvir Mariah Carey! Tu não vais poder ser um bom profissional se continuar a ouvir Mariah Carey! Ela não vai de trazer nada de bom para a vida!!’ Poderia ter pegado por essa perspectiva da ficção, mas achei que um investigador tentar analisar teoricamente, analiticamente, cientificamente, pragmaticamente a Mariah Carey, seria suficientemente estranho, mas muito interessante ao mesmo tempo (Costa, 2022, 37:11 minCOSTA, Romeu. Entrevista. I don't know her - Cultura e Tendências. Interviewed by Leandro Tavares, March, 2022.).

Ao optar pela peça-conferência, Romeu Costa está ciente de que o seu papel em cena é o de atenuar a personagem, diluir seus contornos, questionar o procedimento fabular. Distante do ator que representa, agora ele é o ator-epistemólogo (Thürler; Woyda; Moreno, 2020, p. 6THÜRLER, Djalma; WOYDA, Duda; MORENO, Mariana. Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo. Urdimento, Florianópolis, v. 2, n. 38, p. 1-31, August -September 2020.) e, como tal, conduz “uma reflexão encenada”, “um modo de performar o texto; de justapor o conceito e a ação” (Rocha, 2014, n. p. apud Lordelo, 2020, p. 306LORDELO, Lia da Rocha. Códigos e fronteiras na palestra-performance: por uma poética do conhecimento. Repertório, Salvador, Year 23, n. 35, p. 302-319, 2020.), sempre em constante negociação com o público.

A peça-conferência (Thürler; Woyda; Moreno, 2020;THÜRLER, Djalma; WOYDA, Duda; MORENO, Mariana. Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo. Urdimento, Florianópolis, v. 2, n. 38, p. 1-31, August -September 2020. Sanches, 2020;SANCHES, João Alberto Lima. A Conferência como estratégia dramatúrgica de desvio. Revista Cena, Porto Alegre, n. 31, p. 300-311, September – December, 2020. Lordelo, 2020LORDELO, Lia da Rocha. Códigos e fronteiras na palestra-performance: por uma poética do conhecimento. Repertório, Salvador, Year 23, n. 35, p. 302-319, 2020.) é um subgênero da performance, uma espécie de prática artística expandida que ultrapassa o formato de uma conferência acadêmica e impulsiona o “embaralhamento das fronteiras entre artes e ciências” (Lordelo, 2020, p. 304LORDELO, Lia da Rocha. Códigos e fronteiras na palestra-performance: por uma poética do conhecimento. Repertório, Salvador, Year 23, n. 35, p. 302-319, 2020.), ou seja, as peças-conferências incorporam “[...] elementos tanto da palestra acadêmica quanto da performance artística, funcionam simultaneamente como meta-leitoras e como meta-performativas e, como tal, desafiam ideias estabelecidas sobre a produção de conhecimento e significado em cada uma das formas a que se referem” (Thürler; Woyda; Moreno, 2020, p. 5THÜRLER, Djalma; WOYDA, Duda; MORENO, Mariana. Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo. Urdimento, Florianópolis, v. 2, n. 38, p. 1-31, August -September 2020.). Nesse tipo de cena, “[...] as personagens, os atores e/ou performers falam diretamente para/com o público, utilizando variadas estratégias discursivas que misturam gêneros próximos como palestra, bate-papo, depoimento, confissão, relato de experiência, entre outros” (Sanches, 2020, p. 302SANCHES, João Alberto Lima. A Conferência como estratégia dramatúrgica de desvio. Revista Cena, Porto Alegre, n. 31, p. 300-311, September – December, 2020.).

A peça-conferência, “[...] ao abandonar o ilusionismo teatral burguês se propõe em tom de conversa a uma espécie de pensamento encenado com claro posicionamento à esquerda” (Thürler; Woyda; Moreno, 2020, p. 15THÜRLER, Djalma; WOYDA, Duda; MORENO, Mariana. Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo. Urdimento, Florianópolis, v. 2, n. 38, p. 1-31, August -September 2020.), abre espaço para o protagonismo dos movimentos do pensamento.

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Foto de Divulgação.

O figurino da peça-conferência é, quase sempre, a roupa do palestrante e vai ao encontro do que Thürler, Woyda e Moreno (2020, p. 10)THÜRLER, Djalma; WOYDA, Duda; MORENO, Mariana. Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo. Urdimento, Florianópolis, v. 2, n. 38, p. 1-31, August -September 2020. denominaram como “desespetacularização”. Em Eu subloco meu próprio desejo, por exemplo, Lordelo (2020, p. 308)LORDELO, Lia da Rocha. Códigos e fronteiras na palestra-performance: por uma poética do conhecimento. Repertório, Salvador, Year 23, n. 35, p. 302-319, 2020. descreve: “No palco, sob luz branca, vestindo camisa listrada, calça jeans e tênis, Osório começa sua ‘palestra’ apresentando-se, no meio de duas cadeiras, um notebook, uma impressora e o celular sempre à vista”.

É assim, também, que Romeu Costa de apresenta, em uma sala de conferência, uma tela para projeções, o projetor no chão, de forma que todos possam vê-lo e uma mesa com alguns objetos que são utilizados durante a conferência, como um aparelho de fitas k7 e um teclado, como podemos notar na foto acima.

A peça é carregada de signos que se aproximam de uma conferência, mesmo os linguísticos. A pesquisa, sobre a liberdade com que nos permitimos gostar de algo, anuncia o palestrante, é realizada com 1.700 pessoas

[...] e nos gráficos que vamos ver, apresentamos alguns desses resultados. Das pessoas que responderam ao nosso inquérito, 40% se identificam como mulheres, 30 % como homens, 30% como outros; 5% não definem sua orientação sexual, 10% são homossexuais, 20% heterossexuais e 65% bissexuais. As profissões variam muito, professores, cabelereiros, enfermeiros, reformados, engenheiros, atores, drag queens, empregados de limpeza, investigadores e, para além de recolhermos dados de ordem demográfica, ou seja, relativo à composição da população que respondeu ao nosso inquérito, nós também perguntamos às pessoas, quais são as músicas da tua adolescência (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.).

Em Maráia Quéri, Romeu Costa é o cientista social que tem a cantora norte-americana como objeto de estudo: “A obra de Mariah Carey está [classificada] como pop dançável – é sempre muito difícil definir o que é pop –. O termo refere-se a uma música mais comercial, mais acessível, normalmente com a juventude como público-alvo” (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.), diz em certo momento da peça-palestra.

O desenvolvimento da palestra parte de um estudo realizado sobre música.

Mas por que música? Por que a música como objeto de estudo? A música acompanha-nos em momentos íntimos. Quando estamos sós ou em momentos compartilhados. Em casa, no carro, na rua com auriculares. Mas, também, ouvimos músicas em grandes celebrações, em festas, na escola. A música é a banda sonora de memórias, de momentos. A música pode ser uma forma de escolher quem faz parte do nosso grupo, de criar laços, de escolher nossa tribo na escola, por exemplo. De fazermos parte de um coro, cantos de claquete de futebol, as playlists, listas de reprodução compartilhadas com pessoas do mundo inteiro. Formamos um grupo efêmero quando ouvimos juntos um concerto na plateia. E a música permite a instalação desses círculos de pertença e exclusão através, por exemplo, desse empurrar de algumas canções para o terreno do guilty pleasures, para o terreno do prazer que nos dá a sensação de que somos culpados (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.).

Uma das características dos guilty pleasures é serem quase sempre da ordem do que se pode chamar de popular ou de gosto comum, diz o palestrante:

Para um mar inominável de gente não há nenhum problema em gostar da cantora norte-americana, mas em outros contextos, ela é um guilty pleasures. Há algo que dá prazer em ouvir, mas que não está empoderado o suficiente, seja pela simplicidade lírica e musical, pela exibição constante do seu virtuosismo vocal, pela larga aceitação e sucesso comercial, seja pelo o que for, a obra de Mariah Carey tende a enquadrar-se como cultura de massas, como vimos antes, como baixa cultura. E isso configura um possível guilty pleasures (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.).

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Foto de Divulgação.

Nesse momento, o palestrante afirma que o tema que o traz ali não se trata de qualquer música, mas, muito especificamente as canções que ouvimos em privado, e que, muito provavelmente, não teríamos coragem de ouvir em público, ou porque nos envergonham ou porque nos embaraçam:

As perguntas aqui projetadas fazem parte desse estudo. Nós fizemos um questionário que temos feito circular, principalmente através das redes sociais, da internet e que procuram nos dar algumas respostas acerca da nossa relação com a música, em geral, e com as canções que temos vergonha de ouvir em público, na língua inglesa, a associação entre prazer e culpa chamamos de guilti pléjares (sic), mas já falaremos sobre isso (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.).

A partir dessa referência inusitada, desenvolvem-se ideias sobre o medo da desonra ou do ridículo, sobre nossos prazeres culpados como dispositivo hetero-erótico capaz de nos distanciarmos do prazer para, de modo geral, investigar sobre os modos, os mecanismos das coisas, saber como funcionam para depois desmontá-las, afinal, saber como funciona o mundo das pessoas e seus comportamentos – ‘por que fazemos o que fazemos?’ perguntará o ator palestrante ainda no início de sua fala – é fundamental para a criação de contradiscursos.

Maráia Quéri, ao reconhecer que há um “[...] estrangulamento biopolítico que pede brechas, por minúsculas que sejam, para reativar nossa imaginação política, teórica, afetiva, corporal, existencial” (Pelbart, 2013, p. 13PELBART, Peter Paul. O avesso do niilismo - Cartografias do esgotamento. São Paulo: n-1 edições, 2013.), produz um contradiscurso que leva o indivíduo a criar para si um suplemento de ser, prepara o espectador para sua transformação potencialmente ética e política. Em sua estÉtica, portanto, parte do individual micropolítico, do particular, do pessoal, apenas como recurso metonímico para o verdadeiro confronto com as práticas coloniais e suas normas e regras impostas “a nossas trajetórias / existências / simbologias pré-atlânticas” (Nascimento, 2019, p. 10NASCIMENTO, Tatiana. Cuirlombismo Literário. Série Pandemia. São Paulo: n-1 Edições, 2019.), reconhecidas na peça, pelo estabelecimento do cânone e sua capacidade de exclusão de memórias e experiências desviantes ou divergentes. As histórias de mulheres, migrantes, pessoas racializadas e LGBTQ+, como exemplos, muitas vezes estiveram ausentes dos cânones nacionais.

Romeu Costa deixa para o clímax da peça essa discussão, quando conclui que

[...] o cânone foi estabelecendo o que são grandes autores e autores menores e esta definição depende da ideia de alta e baixa cultura, ou seja, da valorização de algumas culturas sobre outras, de pertença e exclusão e, sempre ligado à Academia, o cânone é uma forma de valorizarmos certos estudos, certos meios, certas técnicas, certos discursos em detrimento de outros. Apoia-se de sofisticação ou de erudição, como se a Academia fosse uma peneira que separa o farelo precioso que só a elite pode compreender e distingue radicalmente da farinha, que sedimenta a cultura de massas: alta cultura/baixa cultura, cultura erudita/cultura de massas, high brow / low brow são conceitos que afetam a forma como nos relacionamos com as nossas escolhas musicais, literárias, cinematográficas. E esses conceitos têm resistido ao longo dos séculos porque são, ainda, sintomas de uma herança cultural que é ocidental, eurocêntrica, de classe alta, branca, machista, nacionalista. O cânone exclui, por exemplo, as mulheres escritoras. A literatura escrita por mulheres, por pessoas racializadas, por pessoas queer, dissidentes de gênero, foi sendo excluída, como um nicho, um campo menor que se joga fora da história da grande literatura. O guilty pleasures deixa de ser só o objeto e passa a ser a proteção desses grupos: ser mulher é guilty pleasures, ser queer é guilty pleasures, ser negro é guilty pleasures (S., 2022, n. p.S., Raquel. Maráia Quéri. Dramaturgy, 2022.).

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Foto de Divulgação.

Ao concluir que algumas vivências são guilty pleasures, inscritas por relações de poder que tanto produzem quanto contêm narrativas canônicas de estado, Maráia Quéri alerta para os silêncios “oficiais”, a “violência arquival – o apagamento da história de pessoas que viveram às margens da sociedade” (Felitti, 2022, p. 9FELITTI, Chico. Rainhas da noite: As travestis que tinham São Paulo a seus pés. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.) – de corpos

[....] considerados como pura anatomía, carne comestible, músculos que trabajaban, úteros reproductivos, piel dentro de la que eyacular. Eso fueron y son todavía los que se denominan ‘animales’, los cuerpos colonizados, esclavizados y racializados, pero también, de otro modo, las mujeres, aquellos que son considerados como enfermos o discapacitados, los niños, los homosexuales y aquellos cuya alma, decía la medicina del siglo XIX, pretendía salir del cuerpo en el que estaba y viajar a otro cuerpo que entonces era considerado de otro sexo (Preciado, 2022, n. p.PRECIADO, Paul B. Dysphoria mundi (Narrativas hispánicas) (Spanish Edition). Spain: Editorial Anagrama, 2022. Edição do Kindle.).

Ou seja, se arquivar supõe a organização, classificação, avaliação e interpretação de arquivos, as vidas das mulheres, as experiências transnacionais dos migrantes, corpos LGBT+, racializados, eram consideradas experiências menores, privadas, domésticas ou marginais demais e, portanto, irrelevantes para um cânone nacional definido pela formação do Estado e construção da nação.

Sem citar Foucault, o cientista social interpretado por Romeu Costa diz que seu foco é pensar sobre as tecnologias de poder na modernidade, seu sistema de normalização e suas formas de coerção, que funcionam como disciplina social, pois fabricam, observam, criam saberes, instituições, indivíduos etc. que permitem invadir, cercar, administrar, prolongar e “melhorar” a vida. A sociedade disciplinar se afirma, então, como forma de exercício do poder normalizador que acaba por naturalizar certas formas peculiares de organização de tempos e ritmos (Solana, 2017SOLANA, Mariela. Asincronía y crononormatividad. Apuntes sobre la idea de temporalidad queer. El banquete de los Dioses, v. 5, n. 7, p. 37-65, 2017.).

Rumo a uma nova consciência

Em Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo, Thürler, Woyda e Moreno, ao pensarem categorias estéticas da peça-conferência, alertam-nos para o surgimento do ator-epistemólogo. Segundo os autores,

[...] há nesses atores e atrizes algo de diferente quando valorizam o discurso, experimentam o seu pensamento e experimentam o pensamento do outro, tudo em detrimento de elementos espetaculares da cena. Atores intelectuais que, ao atribuírem ao anti-intelectualismo um projeto protofascista, experimentam e elaboram o pensamento em frente à plateia, fazendo com que seu aluno-espectador, de forma socrática, chegue, por si mesmo a algo novo, não importa o quê (Thürler; Woyda; Moreno, 2020, p. 26THÜRLER, Djalma; WOYDA, Duda; MORENO, Mariana. Arte como potência de si, a peça-conferência e o ator-epistemólogo. Urdimento, Florianópolis, v. 2, n. 38, p. 1-31, August -September 2020.).

É, pois, na condição de ator-epistemólogo que Romeu Costa elabora, em frente à plateia, um conhecimento coletivo, de aguda reflexão social.

Atento e crítico às questões do passado colonial traumático, Maráia Quéri revisa conceitos canônicos de certo-errado, erudito-popular e se torna, ela mesma, antítese do cânone, na medida em que, ao evidenciar seu forte caráter interdisciplinar e sua implicação nas discussões, valores e visões do mundo contemporâneo, deve ser reconhecida como um importante terreiro de politização, componente instrumental de desengajamento e desprogramação da síndrome colonial.

Assim, híbrido entre a Arte e a Ciência, poroso entre o teórico e o político, úmido (Hadock-Lobo, 2011HADOCK-LOBO, Rafael. Para um pensamento úmido: a filosofia a partir de Jacques Derrida. Rio de Janeiro: Nau: PUC-Rio, 2011.) entre a objetividade e a subjetividade e, claro, anti-durkheiniano – porque no afã de se obter uma visão impessoal e, portanto, objetiva, da realidade social, não precisa evitar ou eliminar as armadilhas subjetivistas –, o espetáculo Maráia Quéri esmera-se em recuperar identidades e economias afetivas que o sistema hetero-erótico ameaça obliterar.

Notas

  • 1
    là où il y a subjectivation, il n’y a pas de sujet.
  • 2
    Do original em inglês: Hi academic Twitter. I'm looking for some scholars who would write for THE about their guilty cultural pleasures/unashamed love for supposedly ‘lowbrow’ subjects/activities. Dubious TV & literature choices are most welcome. DM me if you have some creative ideas.
  • 3
    Do original em inglês: But instead, the framing seemed to reinforce this elitist boundary. The dynamic I’m highlighting played out in the replies to Grove’s original tweet. One person asked if playing in a band, going to football games and watching geeky television counted. Grove said it did not. That’s “more just general leisure activity outside of work,” he explained. Another person asked if tarot-card reading and astrology counted. Yes, Grove said. This dismissive and random categorizing is something that would infuriate my many queer witch friends and healers of color who have worked to resist the devaluing of these very subjects and have used astrology and tarot-card reading as antiracist, queer-friendly, feminist practices.
  • 4
    Do original em inglês: I responded to say that a lot of these things that people were saying were their guilty pleasures are actually things that have a lot of importance for people, have a lot of real depth to them when you take time to learn about them, and are often things that are associated with women and people of color, marginalized folks.
  • 5
    Para referirse a toda una serie relatos, metáforas y figuras sobre prácticas, experiencias y sensaciones genérico-sexuales que entran en tensión con la normativa temporal socialmente legitimada. La noción de temporalidad queer permite conectar tres ideas – el tiempo, lo genérico-sexual y las normas – que no necesariamente son pensadas en conjunto.
  • 6
    Kveller (2021, p. 14)KVELLER, Daniel Boianovsky. Dissidências sexuais, Temporalidades queer: Uma crítica ao imperativo do progresso e do orgulho. 2021. Doctoral Thesis in Psychology, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre 2021., citando Freeman (2010), vai chamar esse processo de “crononormatividade”.
  • 7
    Disponível em: https://www.tndm.pt/pt/calendario/maraia-queri/. Acesso em: 9 out. 2022.
  • 8
    Disponível em: https://www.tndm.pt/pt/calendario/maraia-queri/. Acesso em: 9 out. 2022.
  • 9
    Disponível em: https://www.tndm.pt/pt/calendario/maraia-queri/. Acesso em: 9 out. 2022.
  • 10
    Disponível em: https://www.tndm.pt/pt/calendario/maraia-queri/. Acesso em: 9 out. 2022.

Disponiblidade de dados da pesquisa:

o conjunto de dados de apoio aos resultados deste estudo está publicado no próprio artigo.

Este texto inédito também se encontra publicado em inglês neste número do periódico.

Referências

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Editor responsável: Gilberto Icle

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    15 Abr 2023
  • Aceito
    05 Set 2023
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