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Memória, afetividade e eleições 2019 na África do Sul: satisfeitos ou não, seguiram o ANC

Memory, affectivity and elections in South Africa 2019: satisfied or not, they followed the ANC

Resumos

Resumo

A África do Sul, aos 25 anos após apartheid, experimentou uma eleição presidencial com a maior taxa de abstenção e a menor votação do partido Congresso Nacional Africano - ANC de sua história. A agenda foi prioritariamente negativa: corrupção no governo federal, desemprego e violência urbana. Argumentamos que mágoa e rancor do apartheid permanecem entre os sul-africanos e sustentam a adesão ao ANC em eleições a despeito das insatisfações. Portanto, busca-se mensurar o impacto das avaliações das ações do presidente no combate ao desemprego, à corrupção e à violência urbana, e da rejeição ao apartheid na adesão ao ANC, ao longo do mandato e em eleição. Para isto, mobiliza-se a teoria do voto econômico e a discussão sobre memória racial, e ainda modelos de regressão logística binária. A adesão ao presidente constará de duas variáveis dependentes: aprovação presidencial no mandato e voto no ANC nas eleições. Os dados advêm do survey do Afrobarometer - 2018. Como achados, destaca-se que, com a mudança da variável dependente de aprovação presidencial em mandato para intenção de voto no ANC em eleição fictícia, houve perda do efeito da aprovação das ações do combate à corrupção e crescimento do impacto da rejeição do apartheid na variável resposta.

Palavras-chave:
África do Sul; Congresso Nacional Africano; Eleições; Relações Raciais; Voto Econômico


Abstract

South Africa, 25 years after the end of apartheid, experienced a presidential election with the highest abstention rate and lowest vote for the African National Congress - ANC party in its history. Agenda was primarily negative: corruption in the federal government, unemployment, and urban violence. A voter said in national media: - This is the last opportunity I will give to the ANC. We argue that resentment of apartheid is still among South Africans. Based on the theory of multidimensional economic voting and the discussion on racial memory, we will measure by an analytical model the impact of evaluations of federal government actions to combat unemployment, corruption, and urban violence in adhering to the president. The accession to the president will be contemplated from two dependent variables: presidential approval and vote in the ANC. Statistical tests will be conducted from Survey provided by the Afrobarometer -2018. As a result, we point out that when we changed the variable dependent from presidential approval to vote in the ANC in a fictitious election there was a loss of effect of the approval of actions to combat corruption and robust growth of the impact of apartheid rejection on the response variable.

Keywords:
South Africa; African National Congress; Elections; Race Relations; Economic vote


Introdução

Este artigo trata da eleição geral que aconteceu na África do Sul, em 2019, por ocasião dos 25 anos do fim do apartheid. O processo eleitoral colocou em xeque - como nenhum outro anteriormente - o Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês), principal partido político do país desde a destituição das antigas leis segregacionistas. Registrou-se a menor participação eleitoral desde 1994 com apenas 49% de público com idade de voto comparecendo às urnas (Roberts et al., 2020ROBERTS, Bem; STRWIG, Jare; GORDON, Steven L.; YUL, Derek Davids. (2020), “The unconvinced vote: The nature and determinants of voting intentions and the changing character of South African electoral politics”, in J.S. Kotze & N. Bohler-Muller (org.), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?, Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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). O ANC viu a sua votação cair abaixo da marca de 60% pela primeira vez na história democrática da África do Sul (Kotze e Bohler-Muller, 2020KOTZE, Joleen Steyn; BOHLER-MULLER, Narnia. (2020), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?. Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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).

Os números foram interpretados como um desagravo de segmento do eleitorado em relação ao ANC, apesar de sua história de libertação. Kotze e Bohler-Muller (2020)KOTZE, Joleen Steyn; BOHLER-MULLER, Narnia. (2020), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?. Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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ressaltaram a crescente tendência dos sul-africanos de estruturarem o seu voto a partir de questões relacionadas à efetividade das políticas públicas governamentais. Outros autores também sinalizaram para o enfraquecimento da natureza mais racializada da política na África do Sul, com componente simbólico e de identidade (Runciman, Bekker e Maggot, 2020RUNCIMAN, Carin; BEKKER, MARTIN; MAGGOT, Terri. (2020), “Voting preferences of protesters and non-protesters in three South African elections (2014 - 2019): Revisiting the 'Ballot and the Brick’”, in J.S. Kotze & N. Bohler-Muller (org.), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?, Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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; Schulz-Herzenberg, 2020SCHULZ-HERZENBERG, Collette. (2020), “The decline in partisan voting and the rise in electoral uncertainty in South Africa’s 2019 General Elections”, in J. S. Kotze & N. Bohler-Muller (org.), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?, Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520
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). Para todos esses autores, a disputa presidencial de 2019 se apresentava como uma oportunidade para entender as fissuras no comportamento histórico do eleitor, que passava a absorver cada vez mais componentes de racionalidade econômica.

Para além da ciência política sul-africana, para um pesquisador do voto econômico, o desafio estava em entender como um partido que gozava de mais de 80% de avaliação negativa em áreas centrais de governo na véspera do pleito logrou sucesso na eleição. O governo do ANC contava com alta taxas de insatisfação em ações no combate à corrupção (82,8%), ao desemprego (80,6%) e à criminalidade (80,5%) (Afrobarometer, 2019AFROBAROMETER. (2019), Surveys and methods. Disponível em Surveys and methods - Afrobarometer, consultado em 26/4/2023.).1 1 Afrobarometer conduziu pesquisas em Beim, Botsuana, Burkina Faso, Camarões, Cabo Verde, Costa do Marfim, Congo, Essuatíni, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Quénia, Lesoto, Libéria, Madagáscar, Maláui, Mali, Maurícias, Marrocos, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria, São Tomé e Príncipe, Senegal, Serra Leoa, África do Sul, Sudão, Tanzânia, Togo, Tunísia, Uganda, Zâmbia e Zimbabué. Omega Research conduziu a pesquisa na República Democrática do Congo. Ou seja, a aprovação presidencial do ANC era baixa e indicava uma reação negativa à situação real que experimentavam na política nacional.

Em fevereiro de 2018, ano que antecedeu a eleição geral, sob o impacto de acusações de corrupção, o então presidente Jacob Zuma (ANC) renunciou ao cargo em favor de seu vice Cyril Ramaphosa. No final daquele mesmo ano, 64% dos sul-africanos acreditavam que a corrupção havia aumentado nos últimos 12 meses (Afrobarometer, 2019AFROBAROMETER. (2019), Surveys and methods. Disponível em Surveys and methods - Afrobarometer, consultado em 26/4/2023.). Somava-se a esse cenário o crescimento nos índices de desemprego e de violência urbana. O desemprego total no país era de 29%, em 2019, e, especificamente, entre os jovens negros sul-africanos estimava-se que a taxa atingisse entre 80 e 90%. Em 2018, o crescimento econômico foi de apenas 0,5% (DW, 06/09/2019DW. África do Sul: Violência reflete problemas socio-económicos. DW Made for Minds. Berlim 6 de setembro de 2019. Disponível em: https://www.dw.com/pt-002/viol%C3%AAncia-na-%C3%A1frica-do-sul-reflete-problemas-sociais-e-econ%C3%B3micos/a-50331013. Acesso em 07 de junho de 2023.
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).

A respeito da violência urbana, como apontou Gideon Van Riet (2020), oVAN RIET, Gideon. (2020), “Intermediating Between Conflict and Security: Private Security Companies as Infrastructures of Security in Post-apartheid South Africa”. Politikon, 47, 1:81-98. DOI: 10.1080/02589346.2020.1714282.
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papel da polícia sul-africana costuma ser visto como controverso, uma vez que teria passado de executor de um governo racista para um serviço percebido por muitos cidadãos como corrupto e incompetente. Fato é que, ainda de acordo com o autor, os níveis de criminalidade, incluindo roubo, arrombamento e crimes violentos aumentaram significativamente desde o advento da democracia.

Contudo, mesmo diante dessa agenda negativa, o ANC sagrou-se vencedor. Destaca-se o registro de uma eleitora em mídia nacional: “É a última oportunidade que darei ao ANC”. Este artigo discute a discrepância entre o julgamento tão negativo do desempenho do governante durante o mandato e a escolha do voto pela sua continuidade na eleição na África do Sul. Posto de outra maneira, pergunta-se: Por que uma atitude tão punitiva na taxa de aprovação presidencial e ainda tão parcimoniosa na definição do voto?

O objetivo com este trabalho é medir o quanto as marcas da colonialidade e da memória do apartheid ainda estruturam o comportamento do eleitor na África do Sul e como se conformaram com determinantes da teoria do voto econômico multidimensional na eleição de 2019. Parte-se do fato de que Jacob Zuma e Cyril Ramaphosa - juntamente com Nelson Mandela - foram símbolos da resistência negra sul-africana, tendo atuado fortemente no combate ao segregacionismo racista e que a história de luta do ANC faz parte da memória e da afetividade de segmentos dos sul-africanos. Nossas hipóteses pontuam que as marcas da colonialidade, expressas na mágoa e no rancor do apartheid, ainda se encontram entre os sul-africanos e interferem na decisão do voto mais do que os condicionantes econômicos exaustivamente estudados na literatura sobre teoria do voto. Contudo, quando se pensa em aprovação presidencial em mandato e não em voto em eleição, acredita-se que tais componentes de afetividade pesem menos que o julgamento das ações governamentais na criação de emprego, no combate à corrupção e no controle da violência urbana.

Para verificar tais pressupostos, apresentamos modelos de regressão logística binária a partir de survey nacional na África do Sul realizado em dezembro de 2018 e disponibilizado pelo Afrobarometer.

O artigo apresenta uma breve discussão teórica sobre o voto econômico multidimensional - tendo em vista, além da economia, aspectos de combate à corrupção e da segurança pública - e sobre a colonialidade. O intuito nesta etapa é tratar dos pontos centrais da discussão da literatura que fundamentam as escolhas das variáveis dependentes e independentes, assim como das hipóteses. A seguir, traremos o contexto em que se deu a disputa presidencial de 2019 na África do Sul. A metodologia e os principais resultados são apresentados na sequência, sendo sucedidos pelas considerações finais.

Importa mostrar que a teoria do voto econômico perde força explicativa quando aferido o peso da satisfação com ações governamentais no apoio ao presidente em situação de campanha eleitoral. Isto quer dizer que há mais efeito da avaliação da economia e dos diversos aspectos da política pública na aprovação do governo do que na intenção de voto. No momento da decisão eleitoral, os sul-africanos tenderam a preterir a satisfação com o mandato a favor da memória e da afetividade históricas do apartheid enquanto determinante de seu voto.

Os resultados corroboram a literatura sobre comportamento do voto na África do Sul que aponta que as eleições nacionais no país vêm sendo afetadas por novos temas como a economia, a corrupção e a segurança pública, mas que - na eleição - a identidade e o simbolismo raciais ainda influenciam a decisão. O componente novo trazido por esta pesquisa é mostrar como, na fase de transição de paradigma explicativo para a escolha do voto, a aprovação presidencial é significativamente mais pragmática e desprovida de identidades e afetividades do que o voto no mandatário.

A Teoria do Voto Econômico Multidimensional

Este trabalho busca identificar o efeito da memória do apartheid frente a outras variáveis do voto econômico numa perspectiva multidimensional. Começamos com a discussão sobre o voto econômico e sua versão multidimensional para, posteriormente, apresentarmos a discussão da colonialidade.

A teoria do voto econômico advém da teoria da escolha racional, que surge com Downs (1999)DOWNS, Anthony. (1999), Uma teoria econômica da democracia. São Paulo, Edusp. ao trazer o comportamento instrumental do eleitor. A premissa central da teoria da escolha racional é que o votante busca eleger aquele partido ou candidato que acredita que lhe garantirá maiores ganhos. Mas foi Key (1966)KEY, V. O. (1966), The responsible electorate: Rationality in Presidential Voting, 1936-1966. Cambridge, The Belknap Press of Harvard University Press. que apresentou a teoria da recompensa-punição e com ela o aspecto mais economicista do voto, no qual o eleitor reagiria positivamente ou negativamente ao voto no mandatário de acordo com a sua experiência prévia com a economia. Fiorina (1981)FIORINA, Morris. (1981), Retrospective Voting in American National Elections. New Haven, Yale University Press., por sua vez, reiterou a importância da economia para o voto, mas ponderou que o julgamento que o eleitor faz do desempenho do mandatário na economia sofre influência também de sua identidade partidária e de variáveis demográficas relevantes.

A teoria do voto econômico traz duas possibilidades como variáveis dependentes: medidas de adesão ao governante no decorrer do mandato (também chamada de aprovação presidencial) ou intenção de voto no mandatário. Em sua versão original, a variável independente é a avaliação que o eleitor faz sobre o desempenho do mandatário na economia (Lewis-Beck e Stegmaier, 2008LEWIS-BECK, Michael; STEGMAIER, Mary. (2008), “Economic Models of Voting”, in R. Dalton & H. D. Klingemann (org.), The Oxford Handbook of Political Behavior, Oxford, Oxford University Press. DOI: 10.1093/oxfordhb/9780199270125.003.0027.
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). Tal avaliação pode ser pautada por análise retrospectiva (Key, 1966KEY, V. O. (1966), The responsible electorate: Rationality in Presidential Voting, 1936-1966. Cambridge, The Belknap Press of Harvard University Press.; Kramer, 1971KRAMER, Gerald. (1971), “Short-Term Fluctuations in U.S. Voting Behavior, 1896-1964”. The American Political Science Review, 65, 1: 131-143. DOI: https://doi.org/10.2307/1955049.
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) - com o olhar voltado para o desempenho do governante na economia no último ano - ou por análise prospectiva, que constaria de um prognóstico a respeito do desempenho da economia no ano que está por vir (Kiewiet, 1983KIEWIET, D. Roderick. (1983), Macroeconomics and micropolitics: The electoral effects of economic issues. Chicago, The University of Chicago Press.).

Evidências recentes mostram que avaliações prospectivas dependem, embora não exclusivamente, de avaliações retrospectivas das condições econômicas (Duch e Stevenson, 2008DUCH, Raymond; STEVENSON, Randolph. (2008), The economic vote: How political and economic institutions condition election results. Cambridge, Cambridge University Press.).

O ajuizamento ainda pode se estruturar a partir de uma perspectiva sociotrópica, que considera a situação da economia nacional, ou de uma perspectiva individual, que evidencia a situação da economia individual e familiar (Kiewiet, 1983KIEWIET, D. Roderick. (1983), Macroeconomics and micropolitics: The electoral effects of economic issues. Chicago, The University of Chicago Press.). Estudos têm mostrado que a avaliação retrospectiva e sociotrópica têm sido mais eficientes em explicar o comportamento dos eleitores (Lewis-Beck e Stegmaier, 2008LEWIS-BECK, Michael; STEGMAIER, Mary. (2008), “Economic Models of Voting”, in R. Dalton & H. D. Klingemann (org.), The Oxford Handbook of Political Behavior, Oxford, Oxford University Press. DOI: 10.1093/oxfordhb/9780199270125.003.0027.
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).

Para este estudo, vamos analisar a teoria do voto econômico não em sua versão clássica, que considera apenas o desempenho do governante na economia, mas a sua versão multidimensional, que envolve também o desempenho do mandatário em outras áreas de governo (Rennó, 2007RENNÓ, Lúcio. (2007), “Escândalos e voto: as eleições presidenciais brasileiras de 2006”. Opinião Pública, Campinas, 13, 2: 260-282. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-62762007000200002.
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). Assim, a partir da adoção da perspectiva multidimensional, iremos considerar também a percepção da corrupção e da segurança pública, na medida em que esses temas ganharam muita centralidade na disputa eleitoral da África do Sul de 2019.

O impacto das denúncias de corrupção sobre a adesão ao mandatário já vem se compondo como uma agenda de pesquisa. Estudo de Costas-Pérez et al. (2012)COSTAS-PÉREZ, Elena; SOLÉ-OLLÉ, Albert; SORRIBAS-NAVARRO, Pilar. (2012), “Corruption scandals, voter information, and accountability”. European Journal of Political Economy, 28, 4: 469-484. DOI:10.1016/j.ejpoleco.2012.05.007.
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visou identificar o peso do montante de informação publicada sobre escândalos (número de notícias sobre cada caso) e a gravidade do caso (expressa pelas decisões judiciais) no apoio a um candidato a prefeito em situação de reeleição. Verificou que um mandatário envolvido em denúncias de corrupção pode perder, em média, 4% de apoio, podendo chegar a 14% a depender da evidência na mídia e da gravidade dos julgamentos. O trabalho versou sobre eleições locais na Espanha entre 1996 e 2009.

Pesquisas recentes reforçaram como a percepção de corrupção influencia negativamente na adesão ao mandatário no que toca à aprovação presidencial. Veiga et al. (2019)VEIGA, Luciana F.; DUTT-ROSS, Steven; MARTINS, Flávia B. (2019), “Os efeitos da economia e da Operação Lava-Jato na popularidade da Presidente Dilma Rousseff no período pré-impedimento”. Revista de Sociologia e Política, 27, 72: 1-22. DOI: https://doi.org/10.1590/1678-987319277202.
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apontam que as denúncias da Operação Lava Jato no Brasil em 2017 impactaram negativamente a opinião pública brasileira, reduzindo a adesão à Presidente Dilma. O que pode ter contribuído para a perda do escudo parlamentar da mandatária e para o seu impeachment em 2016. Este estudo mostrou que entre os entrevistados que consideravam a corrupção como problema no Brasil em 2017, a probabilidade de um indivíduo escolhido ao acaso avaliar o governo federal como péssimo ou ruim é de 63,8%, valor que cai para 9,57% para esse mesmo indivíduo avaliá-lo como bom ou ótimo.

Também encontramos estudos que apontam para o impacto negativo da violência no apoio ao mandatário. Mendez (2018)MENDEZ, Luigi Antônio. (2018), The effects of Criminal Violence on Executive Approval: Aggregate and individual-level analyses of Public Opinion in México. Tese de Doutorado. Universidade de Carolina do Norte, Chapel Hill. apresentou o efeito da violência na aprovação do presidente no México. Usando a análise multinível, ele confirmou as suas hipóteses ao detectar que a violência tem impacto negativo na aprovação do presidente, sendo tal efeito modelado pelo estado da economia e pela distribuição geográfica do crime. Em situação de desemprego e inflação baixos, a violência toma centralidade na aprovação do presidente. Em lugares com mais crimes, o tema também tende a ter mais efeito na aprovação do presidente. Estudos sobre o efeito da sensação de insegurança e vitimização sobre o comportamento político tendem a focar mais na participação política (Bateson, 2012BATESON, Regina. (2012), “Crime Victimization and Political Participation”. American Political Science Review, 106, 3: 570-87. DOI: https://doi.org/10.1017/S0003055412000299.
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; Booth e Seligson, 2009BOOTH, John; SELIGSON, Mitchell. A. (2009), The Legitimacy Puzzle in Latin America. 1a edição, Cambridge, Cambridge University Press.) do que no impacto na aprovação presidencial e na escolha do voto (Ley, 2017LEY, Sandra. (2017), “Electoral Accountability in the Midst of Criminal Violence: Evidence from Mexico”. Latin American Politics and Society, 59, 1: 3-27.; Romero et al., 2016ROMERO, Vidal; MAGALONI, Beatriz; DÍAZ-CAYEROS, Alberto. (2016), “Presidential Approval and Public Security in Mexico’s War on Crime”. Latin American Politics and Society 58, 2: 100-123.).

Posto isso, há uma sinalização na literatura que nos faz acreditar que, em situação de altas e ascendentes taxas de desemprego e inflação, de incremento de escândalo de corrupção e criminalidade, deveria haver uma preponderância do voto oposicionista na eleição de 2019 na África do Sul. Mas não foi o que aconteceu.

Na verdade, o ANC já vinha sofrendo derrotas punitivas desde as eleições de 2016, quando o partido perdeu o poder em Tshwane, Joanesburgo e Nelson Mandela Bay. As denúncias de corrupção e a desilusão com o desempenho do partido na entrega de resultados para a população mais pobre são apontadas como as principais razões para tal declínio eleitoral do ANC (Kotze e Bohler-Muller, 2020KOTZE, Joleen Steyn; BOHLER-MULLER, Narnia. (2020), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?. Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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).

No entanto, na eleição presidencial de 2019, a oposição não capitalizou o eleitor desiludido com o ANC. Em realidade, a oposição também se via em meio a seus próprios escândalos de corrupção e batalhas de facções. O principal desafiante do ANC, a Aliança Democrática (AD), que zelava na prefeitura da Cidade do Cabo por uma narrativa de boa governança e de entrega de serviços públicos para todos os cidadãos (Prevost et al., 2014PREVOST, Gary; KOTZE, Joleen; WRIGHT, Bianca. (2014), “The battle for the Bay: The 2011 Local Government Elections in Nelson Mandela Bay Municipality”. Politikon, 41, 1: 59-83. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2014.885673.
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), também encontrava-se envolvida em escândalos de corrupção contra a mandatária Patrícia De Lille. Em meio a uma luta interna muito pública, a AD terminou por dividir a sua base de apoio, que somou-se ao partido mais conservador Freedom Front Plus em 2019. Para resgatar os eleitores perdidos para o FF+, a AD deu um passo à direita e reduziu a sua capacidade de atrair os eleitores negros liberais que buscavam um novo partido político (Kotze e Bohler-Muller, 2020KOTZE, Joleen Steyn; BOHLER-MULLER, Narnia. (2020), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?. Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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).

Steyn-Kotze (2017)STEYN-KOTZE, Joleen. (2017), Delivering an Elusive Dream of Democracy: Lessons from Nelson Mandela Bay. Stellenbosch, African Sun Media. ressalta que não se deve ignorar a influência do Sonho de 94 ainda atual. Kotze e Bohler-Muller (2020)KOTZE, Joleen Steyn; BOHLER-MULLER, Narnia. (2020), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?. Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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enfatizam que a África do Sul continua a ser uma sociedade altamente dividida, com a permanência de identidades sociopolíticas construídas pelo apartheid e com a concentração da pobreza entre a população negra. Runciman, Bekker e Maggot (2020)RUNCIMAN, Carin; BEKKER, MARTIN; MAGGOT, Terri. (2020), “Voting preferences of protesters and non-protesters in three South African elections (2014 - 2019): Revisiting the 'Ballot and the Brick’”, in J.S. Kotze & N. Bohler-Muller (org.), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?, Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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avaliam o pressuposto de que o protesto seja um engajamento político de eleitores que sentem dificuldade de se desprenderem do ANC para destinar o voto a outro partido. Registram que muitos protestantes permanecem votando na legenda e, quando não, tendem à abstenção, como em 2019. Schulz-Herzenberg (2020)SCHULZ-HERZENBERG, Collette. (2020), “The decline in partisan voting and the rise in electoral uncertainty in South Africa’s 2019 General Elections”, in J. S. Kotze & N. Bohler-Muller (org.), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?, Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520
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reitera o argumento do encolhimento da lealdade partidária a partir do aumento da abstenção, a decisão do voto tardiamente e a divisão dos votos. Dessa forma, inserimos um componente subjetivo na análise desta pesquisa para verificar o peso das marcas da colonialidade/memória do apartheid na aprovação presidencial e na decisão do voto.

O Apartheid e as marcas da colonialidade na África do Sul

A colonialidade imprimiu marcas indeléveis para as sociedades do Sul Global. Para além da expansão e dominação geopolítica, fundou uma complexa estrutura de relações de poder e dominação, cuja base foi solidamente construída a partir da elaboração de rígida dicotomização entre colonizador/colonizado (Trajano Filho e Dias, 2015TRAJANO FILHO, Wilson; DIAS, Juliana Braz. (2015), “O colonialismo em África e seus legados: classificação e poder no ordenamento da vida social”. Anuário Antropológico, 40, 2: 9-22. DOI: https://doi.org/10.4000/aa.1371.
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) e da produção de um sistema de classificação fundado na utilização da raça como uma categoria mental (Quijano, 2005QUIJANO, Anibal. (2005), “Colonialidade do Poder e Classificação Social”, in E. Landred (org.), A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas, Buenos Aires, Clacso.), ou seja, na ideologização, sistematização e categorização dos povos colonizados a partir de características físicas, com subsequente hierarquização e naturalização da condição de superioridade branca e de inferioridade de qualquer grupo não-branco, enfim, “naturalização dessas relações coloniais de dominação entre europeus e não-europeus” (Quijano, 2005, pQUIJANO, Anibal. (2005), “Colonialidade do Poder e Classificação Social”, in E. Landred (org.), A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas, Buenos Aires, Clacso.. 118).

O imbricamento entre a perspectiva liberal (com intensa exploração de mão de obra e força de trabalho, monopólio dos meios de produção e instauração de um rígido sistema de classes), os discursos raciais produzidos ao longo das etapas de colonização e práticas típicas do colonialismo (desumanização do outro, apropriação territorial) fez com que, ao controle econômico e político das sociedades colonizadas, fosse associado o controle dos dispositivos culturais e das narrativas que dão suporte à realidade social, tais como: discursos de identidade e pertencimento racial, linguagem, religião, entre outros. Por consequência, a colonialidade agiu objetivamente, por meio do controle de instituições sociais, e subjetivamente, a partir da difusão de ideologia legitimadora impondo para todas as sociedades e povos a visão de mundo e de realidade social produzidos a partir de perspectivas eurocêntricas (Trajano Filho e Dias, 2015TRAJANO FILHO, Wilson; DIAS, Juliana Braz. (2015), “O colonialismo em África e seus legados: classificação e poder no ordenamento da vida social”. Anuário Antropológico, 40, 2: 9-22. DOI: https://doi.org/10.4000/aa.1371.
https://doi.org/10.4000/aa.1371...
; Quijano, 2005QUIJANO, Anibal. (2005), “Colonialidade do Poder e Classificação Social”, in E. Landred (org.), A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas, Buenos Aires, Clacso.; Dussel, 2005DUSSEL, Enrique. (2005), “Europa, modernidade e eurocentrismo”, in E. Landred (org.), A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas. Buenos Aires, Clacso.). “Habituada a vencer sem ter razão, exigiu aos colonizados que mudassem as suas razões de viver e, como se não bastasse, que mudassem também de razão” (Mbembe, 2014, pMBEMBE, Achille. (2014), Sair da grande noite: Ensaio sobre a África descolonizada. Lisboa, Pedago.. 19).

Para além dos efeitos sobre as sociedades dominadas, as experiências coloniais atuaram como um conjunto de dispositivos que, dialeticamente, ajudaram a consolidar as narrativas sobre a hegemonia ocidental, o capitalismo industrial, a branquitude e, em um limite, sobre a própria modernidade. Apesar de encerradas na segunda metade do século XX, seus efeitos foram pouco analisados no campo das ciências humanas e filosofia produzidas nos países centrais, embora desde a metade do século XX tenham surgido, nos países outrora colonizados, conjuntos teóricos dedicados não somente a analisarem as consequências desta experiência, mas, sobretudo, investirem na desconstrução das fundações do fazer científico convencional. Assim, os estudos Pós-coloniais, Subalternos e Decoloniais, ao refletirem respectivamente sobre a África, Ásia e América Latina, apresentam uma crítica ao Ocidentalismo, à perspectiva de Modernidade eurocentrada e à hegemonia das epistemologias do norte. Do mesmo modo, vinculam irremediavelmente as práticas capitalistas às dinâmicas racistas e de gênero, propondo novos eixos de análise para a realidade social.

Contudo, de forma geral, fora dos campos intelectuais periféricos, como “nem todos os crimes produzem necessariamente coisas sagradas” (Mbembe, 2011, pMBEMBE, Achille. (2011), A universalidade de Frantz Fanon. Cidade do Cabo. Disponível em http://www.buala.org/pt/da-fala/a-universalidade-de-frantz-fanon-de-achille-mbembe, consultado em 22/4/2023.
http://www.buala.org/pt/da-fala/a-univer...
. 33), o colonialismo, ao contrário de outras experiências traumáticas como o nazismo, por vezes foi entendido como um episódio encerrado no passado, uma experiência para não se lembrar; embora seus desdobramentos ainda sejam visíveis nas sociedades que foram submetidas a essa relação predatória; dentre os quais, os mais evidentes revelam-se na produção de uma memória hegemônica sobre os eventos vivenciados (Costa e Hipólito, 2020COSTA, Andrea Lopes; HIPÓLITO, Jessica Maria de Vasconcellos Santana. (2020), “Memória Social e perspectiva decolonial”, in M. A. S. A. de Oliveira; A. Curcino; L.F. da Costa & F. Magalhães (org.), Ensaios sobre memória (Volume 01), Lisboa, Escola Superior de Educação e Ciências Sociais - Politécnico de Leiria.) e, objetivamente, na precariedade das relações econômicas e políticas.

Nesse sentido, é no continente Africano, e mais precisamente na África do Sul, que encontra-se um dos mais emblemáticos desdobramentos das experiências coloniais, cujas agudas consequências são sentidas até a atualidade: o apartheid.

O território sul-africano, disputado por séculos entre holandeses e britânicos, foi objeto de um projeto de colonização até 1910, quando os ingleses fundaram a União da África do Sul. Formalmente, o colonialismo terminou. Contudo, a manutenção do controle político e econômico pelos britânicos permitiu a continuidade dos pilares do pensamento colonial, sobretudo aquele que defendia a superioridade branca europeia, com consequente não-integração racial.

Se, por si, a oposição colonizadores/colonizados, conseguira estabelecer as bases para uma relação de distinção nas sociedades controladas, com o fim do colonialismo formal, tornaram-se necessárias novas regras que mantivessem e reforçassem as hierarquias outrora construídas. Assim, logo foram criadas as primeiras leis de segregação, como a Native Land Act (Lei de Terras Nativas), de 1913, que destinou 7% do território sul-africano para a população nativa.

Tais leis, ao incidirem desde as dimensões estruturais da sociedade (como a interdição para que negros habitassem áreas destinadas às pessoas brancas), até a regulação das subjetividades e da vida afetiva (como a proibição para que negros e brancos se relacionassem sexualmente), restringiram, gradativamente, os direitos dos negros sul-africanos, ao mesmo tempo em que estimularam o desejo pela radicalização da segregação, em grande parte da população branca.

Esse desejo foi colocado à prova no processo eleitoral que levou à vitória da coalizão liderada pelo Partido Reunido Nacional (PRN), em 1948, cuja principal bandeira resumia-se no termo apartheid (separação), o qual foi elevado à política de Estado e legitimado juridicamente.

As primeiras medidas produzidas após a vitória do Partido Nacional foram: a) a ampliação da interdição para as relações sexuais entre brancos e não-brancos (negros sul-africanos e indianos), a partir de 1949, de forma a proibir o casamento entre indivíduos de raças diferentes; b) a lei de registro populacional dos dados de identidade com a definição de raça (brancos, negros e mestiços); e c) a separação territorial, apreensão de propriedades e remoções compulsórias para a redefinição dos locais de moradia conforme o pertencimento racial. As duas últimas medidas foram decretadas em 1950.

A implementação dessas primeiras leis não foi casual. Em um primeiro momento, permitiu a catalogação, classificação e hierarquização dos grupos raciais existentes. A seguir, deu subsídios para a elaboração de uma espécie de política de “pureza” racial, com a separação formal de diferentes grupos (inclusive com o afastamento de membros inter-raciais de uma mesma família) e o impedimento de que relações sexuais e casamentos levassem à criação de grupos mestiços e miscigenados, ou seja, o controle do perfil racial das gerações futuras.

Dessa forma, tais leis, em conjunto, revelaram-se emblemáticas, pois permitiram preparar a África do Sul para o projeto de nação idealizado. Sob o regime do apartheid foram criadas mais de 300 leis de segregação com pesadas restrições para a população não-branca, sobretudo para os negros sul-africanos.

A principal resistência a esse cenário foi promovida pelo Congresso Nacional Africano (ANC) que, fundado em 1912 para uma atuação política pacífica, assumiu ações mais contundentes à medida que se radicalizaram as intervenções do governo da África do Sul e, especialmente, após o episódio que ficou conhecido como Massacre de Sharpeville, em 1960, no qual 69 pessoas foram mortas e quase duas centenas ficaram feridas devido à desproporcional reação policial em uma manifestação pacífica.

Esse episódio foi um ponto de virada para que, diante da comunidade internacional, o regime apartheid se tornasse conhecido e passasse a ser alvo de críticas e boicotes; e, internamente, Nelson Mandela assumisse a liderança da ANC, tornando-se clandestina após cassação pelo governo sul-africano, e direcionasse suas ações para greves, manifestações e ações armadas. Por suas ações, Mandela foi preso, em 1963, e condenado à prisão perpétua.

A flexibilização do regime foi iniciada somente em 1990 com a revogação de uma série de leis segregacionistas, a legalização dos partidos que haviam sido fechados, como o ANC, e a libertação de Mandela (1990), durando até o ano de 1994, quando o apartheid foi oficialmente abolido. Mas até que isso ocorresse, a África do Sul foi alvo de intensas sanções internacionais, lideradas pela Organização das Nações Unidas (ONU), que incluíam o veto à participação de atletas e equipes esportivas em eventos e competições internacionais, assim como de embargos econômicos. Concomitantemente, dentro do país o cenário era tenso: as principais lideranças de resistência foram mortas, como Steve Biko, exiladas, como Oliver Tambo, ou presas. A violência policial crescia na mesma proporção com que se intensificavam os protestos e as manifestações de resistência, como notado no Levante de Soweto, em 1976, do mesmo modo que eram ampliadas as notícias sobre assassinatos de pessoas brancas.

O fim do apartheid foi marcado pela icônica eleição de Nelson Mandela à presidência do país, concorrendo pelo ANC. Neste ponto, é fundamental observar como o ANC, para além de atuar como efetiva instância de representação da população negra, foi, ao longo dos anos, adquirindo contornos fortemente simbólicos por constituir, para os sul-africanos, a principal instituição de resistência às políticas segregacionistas; e, para os demais países, sobretudo aqueles localizados em África, um paradigma para as lutas contra o colonialismo.

Até a vitória do ANC, o apartheid - sendo um constructo jurídico, político, econômico e, sobretudo, ideológico - pode ser entendido como um artifício utilizado para pacificar conflitos entre brancos na África do Sul, como defendeu Marx (1998)MARX, Anthony. (1998), Making Race and Nation: A Comparison of South Africa, the United States, and Brazil. New York, Cambridge University Press., permitindo a elaboração de um discurso sobre identidade nacional fundamentado na defesa da hegemonia branca “assentada em uma aliança entre capitalistas de língua inglesa e uma elite política africânder” (Schierup, 2018, pSCHIERUP, Carl-Ulrik. (2018), “Sob o Arco-Íris: Migração, Precariedade e Poder Popular na África do Sul Pós-Apartheid”. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, 26, 54: 115-150. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-85852503880005407.
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. 119) e que, do mesmo modo, “integrou uma classe trabalhadora branca, que se beneficiou da cidadania, do bem-estar social e do acesso privilegiado a ocupações qualificadas (...)” (Schierup, 2018SCHIERUP, Carl-Ulrik. (2018), “Sob o Arco-Íris: Migração, Precariedade e Poder Popular na África do Sul Pós-Apartheid”. REMHU: Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana, 26, 54: 115-150. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-85852503880005407.
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, [p.119]).

Contudo, a partir dos anos 1990, o apartheid passou a compor o capital político do ANC por meio da manutenção, na sociedade sul-africana, da memória do apartheid que incluía a ainda viva lembrança das restrições à cidadania da população negra sul-africana, da subjugação racial e das violências simbólicas e objetivas exercidas. Associada à memória do colonialismo, as narrativas até então “subterrâneas” (Pollack, 1989POLLACK, Michel. (1989), “Memória, esquecimento, silêncio”. Estudos Históricos, 2, 3: 03-15.) sobre o longo período de subalternização alimentaram não somente a “irrupção de ressentimentos acumulados no tempo e de uma memória da dominação e de sofrimentos que jamais puderam se exprimir publicamente” (Pollack, 1989, pPOLLACK, Michel. (1989), “Memória, esquecimento, silêncio”. Estudos Históricos, 2, 3: 03-15.. 5), mas também o próprio crescimento do ANC como partido político-síntese dos interesses de uma nova nação sul-africana.

De fato, desde 1994, o ANC tem conseguido eleger presidentes. Desde Nelson Mandela (1994) assumiram o comando da África do Sul Thabo Mbeki (1999, 2004), Jacob Zuma (2009, 2014) e, mais recentemente, Cyril Ramaphosa (2019).

Contudo, as consequências de um passado de colonização e os desdobramentos do apartheid ainda são fortemente sentidos. Não obstante a política conciliatória iniciada por Mandela, ainda ecoam no país ressentimentos raciais que, por vezes, tornam-se evidentes em episódios de violência, como assassinatos de pessoas brancas e a ascensão de uma extrema direita defensora de um radical retorno à separação racial (Moutinho, 2015MOUTINHO, Laura. (2015), “The other side? Das implicações morais de certos horizontes imaginativos na África do Sul”. Anuário Antropológico, 40, 2: 77-97. DOI: https://doi.org/10.4000/aa.1403.
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).

Do mesmo modo, a persistência das desigualdades sociais mantiveram a assimetria entre grupos raciais, impedindo o acesso igualitário aos bens sociais e garantindo a permanência das tradicionais elites, as quais nem mesmo a proposta de empoderamento econômico negro (Black Economic Empowerment) conseguiu reverter. Somam-se a este cenário as elevadas taxas de desemprego e a insegurança causadas pela violência urbana. Ademais, o próprio ANC tem sido alvo de recorrentes denúncias de corrupção envolvendo seus principais líderes.

Após 25 anos do fim do apartheid, as esperanças de reconstrução de um tecido social fragilizado por anos de exploração têm sido recorrentemente abaladas, embora o ANC tenha saído, mais uma vez, vitorioso no pleito eleitoral.

Contexto da eleição na África do Sul de 2019

As eleições na África do Sul em 2019 foram de caráter nacional e provincial. Foram eleitos 400 representantes para a Assembleia Nacional e de 30 a 80 membros para compor cada um dos nove legislativos provinciais. Todos para mandatos de cinco anos.

O sistema eleitoral adotado no país é o proporcional de lista fechada. Trata-se de uma república parlamentarista, em que o presidente e os governadores provinciais são escolhidos pelos seus respectivos parlamentos.

Uma vez mais o ANC se manteve na presidência da República, o que ocorre desde a queda do regime do apartheid em 1994. Nas disputas intermediárias de 2016, o ANC havia perdido a eleição nas capitais de Joanesburgo e Pretória, em meio às denúncias de corrupção do governo de Zuma e à grave situação da economia. O que sinalizava uma tendência de punição ao partido.

Os dois partidos de oposição que mais se destacam na política da África do Sul na atualidade são a Aliança Democrática (DA, na sigla em inglês) e os Lutadores pela Liberdade Econômica (EFF, na sigla em inglês).

A Aliança Democrática é o segundo maior partido do país, fundado em 2000, de ideologia de centro e liberal, em geral associado ao voto da minoria branca. Defendem o livre mercado e uma “África do Sul não racial”. Por sua vez, a legenda Lutadores pela Liberdade Econômica surgiu em 2013, representando a esquerda desencantada com o ANC. Defende as desapropriações de terras sem compensação e a nacionalização de setores estratégicos, como o de mineração. O ANC não conseguiu cumprir a meta de transferir 30% das terras agrícolas comerciais à população negra até 2014, o que alimentou a agitação das comunidades que vivem em condições precárias e exigem melhores moradias e serviços, de acordo com relato do jornal O Globo (08/05/2019).2 2 Disponível em <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/05/08/africa-do-sul-realiza-eleicoes-nesta-quarta-veja-o-que-esta-em-jogo.ghtm>l, consultado em 22/4/2023. Historicamente, a questão agrária é um tema importante nas eleições da África do Sul.

Os resultados das urnas mostraram o menor índice de participação desde 1994. Os jovens demonstraram apatia diante da política institucional, são eles os mais acometidos pelo desemprego. O ANC venceu a disputa com 57,5% dos votos válidos, uma vitória com um quê de derrota já que perderam 19 assentos na Assembleia Nacional. A Aliança Democrática obteve 20,7% dos votos válidos, mantendo-se como a segunda força no parlamento, e o Lutadores pela Liberdade Econômica alcançou 10,8% dos votos, crescendo quatro pontos em relação ao pleito anterior. O argumento predominante do EFF é que o ANC “nos deram a liberdade, mas não nos deram direitos sociais”.

Metodologia

Este artigo procura responder às seguintes perguntas: Que variáveis explicam a aprovação presidencial a Cyril Ramaphosa - ANC -, no final de 2018, há poucos meses de ele ser reeleito em pleito presidencial de 2019? E, ainda, que variáveis explicam o voto fictício ao ANC no dia seguinte da realização da pesquisa no final de 2018? A amostra foi coletada em Afrobarometer, 2019, a respeito da South African, e conta com 2338 entrevistas.

Para isso, foi adotado um modelo de regressão logística binária. As regressões logísticas utilizam variáveis dependentes dicotômicas e variáveis independentes de qualquer natureza (dicotômicas, ordinais, contínuas).

Começamos pela identificação das variáveis dependentes, elas são duas. Primeiro, tomamos a aprovação do desempenho do presidente como variável dependente. Tem-se valor 1 para os respondentes que manifestam satisfação com o desempenho do Presidente Cyril Ramaphosa e o valor 0 para os insatisfeitos.

Posteriormente, tomamos a intenção de voto na ANC numa eleição fictícia no dia seguinte da aplicação do questionário no final de 2018. Trata-se de uma questão já tradicionalmente aplicada pelo Afrobarometer. A pergunta utilizada para esta variável foi: If presidential elections were held tomorrow, which party’s candidate would you vote for?. Tem-se o valor 1 para os entrevistados que manifestaram que votariam na ANC na eleição fictícia e 0 para os eleitores de outros partidos.

Os dois modelos mobilizam sete variáveis independentes: 1) a satisfação do eleitor com o desempenho do presidente na criação de empregos; 2) a satisfação do eleitor com o desempenho do presidente no combate à corrupção; 3) a satisfação do eleitor com o desempenho do presidente na redução do crime; 4) a avaliação das relações raciais hoje em comparação com o ano de 1994; 5) a avaliação das oportunidades de emprego hoje em comparação com o ano de 1994; 6) a avaliação da segurança hoje em comparação com o ano de 1994; 7) a rejeição ao apartheid.

As três primeiras variáveis independentes listadas se referem à avaliação/satisfação com o desempenho do presidente em 2018 no que tange à criação de emprego, ao combate da corrupção e à redução do crime e são mensuradas em 0 - desaprovam e 1 - aprovam. Tais variáveis foram recodificadas, pois inicialmente eram categóricas ordinais, variando de 1 a 4 (1 - desaprova fortemente; 2 - desaprova; 3 - aprova; 4 - aprova fortemente). A decisão por transformar as seis variáveis independentes em dummy pode ser explicada também por que as suas categorias de maior aprovação (“aprova fortemente” e “muito melhor”) sempre contavam com uma distribuição inferior a 5%. De acordo com Fernandes et al. (2020)FERNANDES, Antônio Alves Tôrres; FIGUEIREDO FILHO, Dalson Britto; ROCHA, Enivaldo Carvalho da; NASCIMENTO, Willber da Silva. (2020), “Read this paper if you want to learn logistic regression”. Revista de Sociologia e Política, 28, 74: 1-20. DOI: https://doi.org/10.1590/1678-987320287406en.
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, isto não deve acontecer porque enquadra o fenômeno como evento raro, sendo necessário aplicar correções para lidar com essa situação.

Três outras variáveis independentes listadas na sequência se referem à avaliação das relações raciais, às oportunidades de emprego e à percepção da segurança que experimentam hoje (na data da realização da pesquisa) em comparação com 1994, quando rompido o apartheid, e são dummy, assumindo o valor 0 para a avaliação que no presente está pior, e valor 1 para a avaliação que no presente está melhor. Estas variáveis também foram recodificadas, inicialmente elas eram categóricas ordinais, variando de 1 a 4 (1 - muito pior; 2 - pior; 3 - melhor; 4 - muito melhor). Elas trazem a memória do apartheid para a elaboração da comparação do momento atual com o anterior.

A sétima variável refere-se à rejeição ao apartheid, também dummy, assumindo 0 para desaprova e 1 para indiferentes, ou que aprovam o apartheid. Esta variável era uma categórica inicialmente, com os valores: 1 - desaprova muito; 2 - desaprova; 3 - não desaprova, nem aprova; 4 - aprova; 5 - aprova muito. A pergunta específica para aferir a rejeição ao apartheid foi: “28. There are many ways to govern a country. Would you disapprove or approve of the following alternatives? If the country returned to the old system we had under Apartheid.”.

Testaremos sete hipóteses, neste artigo, para cada uma das variáveis dependentes, que se replicam, assim, totalizando quatorze. Para evitar que escrevamos 14 hipóteses, que fique claro que a probabilidade de adesão será mensurada com duas variáveis dependentes: aprovação presidencial (no mandato) de Cyril Ramaphosa (irá gerar sete hipóteses) e voto (na eleição fictícia) no ANC (que gerará mais sete hipóteses):

  • H1: A aprovação do desempenho do presidente no que tange à criação de emprego tem efeito positivo sobre a probabilidade de adesão a ele (isto é, aprovação presidencial (H1A), e voto no ANC (H1B)).

  • H2: A aprovação do desempenho do presidente no que tange à redução do crime tem efeito positivo sobre a probabilidade de adesão a ele.

  • H3: A aprovação do desempenho do presidente no que se refere ao combate à corrupção tem efeito positivo sobre a probabilidade de adesão a ele.

  • H4: A avaliação sobre as relações raciais, no presente, estarem melhores do que em 1994 exerce efeito positivo sobre a probabilidade de adesão ao presidente.

  • H5: A avaliação sobre as oportunidades de emprego, no presente, estarem melhores do que em 1994 exerce efeito positivo sobre a probabilidade de adesão ao presidente.

  • H6: A avaliação sobre a segurança, no presente, estar melhor do que em 1994 exerce efeito positivo sobre a probabilidade de adesão ao presidente.

  • H7: A rejeição ao apartheid exerce efeito positivo sobre a probabilidade de adesão ao presidente.

Análise dos Resultados

Para começar a análise de resultados, apresentamos as frequências simples das variáveis dependentes e independentes (ver Tabela 1). Os dados do Afrobarometer 2018 mostravam forte insatisfação com o desempenho do presidente, que viria a ganhar a eleição em 2019. A taxa de desaprovação presidencial somava 65,9%. A intenção de voto no ANC somava 48,3% versus 51,7% que disseram votar em outro partido ou não votar.

Tabela 1
Frequência simples da variável dependente e das variáveis independentes

Ainda de acordo com o Afrobarometer (2019)AFROBAROMETER. (2019), Surveys and methods. Disponível em Surveys and methods - Afrobarometer, consultado em 26/4/2023., figuravam entre os principais problemas do país: a) desemprego (45%); b) crime/segurança (8%); e c) corrupção (7%). As ações do governo federal tendiam a ser mal avaliadas nestas áreas. Iniciativas de Cyril Ramaphosa para a criação de empregos contavam com 80,6% de desaprovação; para reduzir o crime, com 80,5%, e, para o combate da corrupção, com 82,8%.

Os dados colocam um desafio para a teoria da racionalidade do comportamento eleitoral. Afinal, qual o peso das insatisfações com o desempenho do governo federal nas três áreas tomadas como mais importantes pela população na adesão ao presidente, que em 2019 se lançaria à reeleição e sairia vitorioso?

Colocamos em teste também a influência da memória do apartheid no comportamento dos eleitores. A fim de trazê-la para o modelo analítico, considerou-se a variável “rejeição ao apartheid” e outras variáveis relacionadas a uma comparação entre a realidade atual e a de 1994 sobre os principais problemas do momento: oportunidade de emprego e segurança, e questões raciais.

Verifica-se que, se comparado a 1994, 69,7% da população acredita que as relações raciais estão melhores atualmente do que em 1994. Mas menos eleitores acreditam que tenha havido melhoras na segurança (50,4%) e nas oportunidades de trabalho (35,7%). Rejeitam o apartheid 78% da população.

Uma vez mostrados os dados descritivos, busca-se apresentar agora os modelos de regressão logística. Tomamos inicialmente o modelo que traz como variável dependente a avaliação do governo do Presidente Cyril Ramaphosa. Em termos de ajuste do modelo, de acordo com Tabela 2, o teste Omnibus apresenta um resultado significativo (p<0,000) que nos permite rejeitar a hipótese nula de independência estatística entre as variáveis dependente e independentes (Fernandes et al., 2020FERNANDES, Antônio Alves Tôrres; FIGUEIREDO FILHO, Dalson Britto; ROCHA, Enivaldo Carvalho da; NASCIMENTO, Willber da Silva. (2020), “Read this paper if you want to learn logistic regression”. Revista de Sociologia e Política, 28, 74: 1-20. DOI: https://doi.org/10.1590/1678-987320287406en.
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).

Tabela 2
Testes de Omnibus de Coeficientes do Modelo

Avançando na análise dos coeficientes, o teste Wald - presente na tabela 3 - informa sobre a significância estatística dos resultados observados (Fernandes et al., 2020FERNANDES, Antônio Alves Tôrres; FIGUEIREDO FILHO, Dalson Britto; ROCHA, Enivaldo Carvalho da; NASCIMENTO, Willber da Silva. (2020), “Read this paper if you want to learn logistic regression”. Revista de Sociologia e Política, 28, 74: 1-20. DOI: https://doi.org/10.1590/1678-987320287406en.
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). Adotando como parâmetro um p-valor de 5%, duas variáveis não apresentam significância estatística: “ação para criar emprego” (Wald = 3,034; p-valor = 0,082) e “comparação entre hoje e 1994, quanto à oportunidade de emprego” (Wald = 1,628; p-valor = 0,202). Ou seja, não é possível rejeitar a hipótese nula de independência estatística entre cada uma destas variáveis e a avaliação do presidente. As hipóteses 1 e 5 não são confirmadas. Os dados descritivos nos mostram que não só a grande maioria das pessoas estava insatisfeita com as ações para criar emprego pelo ANC (80,6%), como também acreditava que as condições de emprego haviam piorado de 1994 aos dias atuais (64,3%). A despeito de tal atitude tão negativa quanto ao emprego, fato é que a opinião sobre esse assunto não exerce efeito na avaliação do mandatário.

Tabela 3
Modelo com Variável Dependente Avaliação do Governo do Presidente Cyril Ramaphosa

Ao comparar os sinais dos coeficientes com as demais hipóteses, verifica-se um efeito positivo de todas elas sobre a probabilidade de adesão ao presidente. Assim, as hipóteses 2, 3, 4, 6 e 7 estão confirmadas.

Quanto à magnitude do impacto das variáveis, aprovar a ação que o governo federal desenvolve para reduzir o crime aumenta em 1,636 (ou em 64%) a chance de aprovar o presidente. Eleitores que aprovam as ações de combate à corrupção pelo governo federal têm 3,390 (ou 239%) mais chances de aderir ao presidente do que aqueles que não as aprovam; é a variável testada que mais impacta na adesão. Eleitores que avaliam que as relações raciais estão melhores atualmente do que em 1994 têm 2,035 (ou 104%) mais chances de aderir ao presidente. Aqueles que avaliam que a segurança está melhor agora do que estava em 1994, por sua vez, têm mais 1,813 (ou 81,3%) chances de aderir ao presidente. E rejeitar o apartheid eleva em 52% a probabilidade de um eleitor aprovar o presidente.

Um segundo modelo de regressão logística binária foi elaborado a partir da variável dependente intenção de voto em Cyril Ramaphosa em uma eleição fictícia que ocorreria no dia seguinte à aplicação do questionário.

Também para esse segundo modelo, o teste Omnibus traz um resultado significativo (p<0,000) que nos permite rejeitar a hipótese nula de independência estatística entre as variáveis dependentes e independentes (Fernandes et al., 2020FERNANDES, Antônio Alves Tôrres; FIGUEIREDO FILHO, Dalson Britto; ROCHA, Enivaldo Carvalho da; NASCIMENTO, Willber da Silva. (2020), “Read this paper if you want to learn logistic regression”. Revista de Sociologia e Política, 28, 74: 1-20. DOI: https://doi.org/10.1590/1678-987320287406en.
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).

A partir da tabela 4, verifica-se que três variáveis não apresentam significância estatística: “ação para criar emprego” (Wald = 0,179; p-valor = 0,652), “comparação entre hoje e 1994, quanto a relações raciais” (Wald = 0,029; p-valor = 0,864) e “comparação entre hoje e 1994, quanto à oportunidade de emprego” (Wald = 0,465; p-valor = 0,495). Ou seja, não é possível rejeitar a hipótese nula de independência estatística entre cada uma destas variáveis e o voto no presidente. As hipóteses 1, 4 e 5 não são confirmadas. Uma vez mais percepções sobre o tema emprego não apresentaram efeitos na variável dependente intenção de voto em Cyril.

Tabela 4
Modelo com Variável Dependente Intenção de voto em Cyril Ramaphosa em uma eleição fictícia

Ao analisar os sinais dos coeficientes com as demais hipóteses, verifica-se um efeito positivo de todas elas sobre a probabilidade de adesão ao presidente. Assim, as hipóteses 2, 3, 6 e 7 estão confirmadas.

Quanto à magnitude do impacto das variáveis, destaca-se que, com a mudança da variável dependente de aprovação do desempenho do presidente para intenção de voto no ANC em eleição fictícia, houve perda acentuada do efeito da aprovação das ações do combate à corrupção e forte crescimento do impacto da rejeição do apartheid na variável resposta. Merece destaque que a aprovação das ações de combate à corrupção pelo governo federal elevou em 239% a probabilidade de um eleitor aprovar o presidente e elevou em 84% a probabilidade de voto no ANC em uma eleição fictícia. Já rejeitar o apartheid elevou em 52% a probabilidade de um eleitor aprovar o presidente e aumentou em 170% a probabilidade de um eleitor votar no ANC. O que os dados indicam é que, quando se trata de avaliar o presidente, o seu desempenho nas principais e mais preocupantes áreas políticas ganham relevância. Todavia, na hora da definição do voto, embora os efeitos do desempenho permaneçam na decisão do voto, a rejeição ao apartheid cresce em importância, sobrepondo-se como a variável mais explicativa. Quanto aos efeitos da avaliação do desempenho do presidente nas ações de combate ao crime e à comparação entre a situação de hoje e a de 1994 quanto à segurança, prevalecem os pesos de 76% e de 73%, respectivamente, na probabilidade do voto.

O quadro síntese dos modelos 1 e 2 - ver tabela 5 - explicitam o argumento central apresentado neste artigo. Componentes do voto econômico em sua versão multidimensional e da afetividade e memória do apartheid convivem e explicam tanto a aprovação presidencial quanto o voto no ANC. No entanto, aspectos de desempenho político, como ações de combate à corrupção, explicam acentuadamente a avaliação presidencial, mais do que o voto. Enquanto a rejeição ao apartheid se fortalece na explicação do voto no ANC em comparação com a avaliação presidencial. Diferentemente do esperado, tem-se o comportamento da variável comparação entre a situação atual das relações raciais e a de 1994. Ela explica a aprovação presidencial, mas não o voto no ANC.

Tabela 5
Síntese dos Modelos 1 e 2 (efeito na probabilidade de... VD1 e VD2)

As motivações para o voto na eleição fictícia detectadas pelo Afrobarometer podem ser ilustradas por meio dos depoimentos de eleitores comuns na imprensa da África do Sul. Os meios de comunicação cobriram intensamente todo o pleito presidencial de 2019. Na semana em que ele aconteceu, vários canais de TV aberta e fechada, jornais impressos e internet se colocaram a escutar e publicar as atitudes e razões dos eleitores comuns naquela eleição. Um dos jornais Herald Live, de Port Elizabeth, dedicou particular atenção às explicações de eleitores comuns sobre o seu voto.

Analisando a cobertura do jornal na semana das eleições, buscamos trazer falas de eleitores comuns publicadas que ilustram os dados desta pesquisa. O objetivo é apenas referendar as atitudes expressas nos modelos de regressão.

Como foi comprovado até aqui, havia forte insatisfação com o desempenho do presidente Cyril Ramaphosa nas áreas que mais preocupavam a população: o desemprego, a violência e a corrupção. Constatou-se também que componentes do voto econômico em sua versão multidimensional e da afetividade e memória do apartheid conviveram e explicaram tanto a aprovação presidencial quanto o voto no ANC, mas que a rejeição do apartheid teve mais peso na decisão do voto. Trouxemos também o pressuposto citado por Runciman, Bekker e Maggot (2020)RUNCIMAN, Carin; BEKKER, MARTIN; MAGGOT, Terri. (2020), “Voting preferences of protesters and non-protesters in three South African elections (2014 - 2019): Revisiting the 'Ballot and the Brick’”, in J.S. Kotze & N. Bohler-Muller (org.), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?, Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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, de acordo com o qual o protesto contra o governo significava muitas vezes um engajamento político dos próprios eleitores do ANC, que sentiam dificuldades em desvincular o seu voto da legenda.

Depoimentos de eleitores comuns extraídos do jornal Herald Live, em 9 de maio de 2019, ilustram os achados desta pesquisa: a) a insatisfação com as ações do governo no momento eleitoral; b) o peso da afetividade e da memória do apartheid na escolha pelo ANC, a despeito da insatisfação, e c) mesmo o protesto motivado pela insatisfação com o governo tinha sua interface com o voto na situação. Os depoimentos foram extraídos de matéria escrita por PILLAY et al. (2019)PILLAY, Deneesha; NKOSI, Nomazina; CAPA, Siyamtanda; MALONDE, Zamandulo; MAY, Zizonke. (2019), “Final election results countdown begins after mixed voter turnout”. Herald LIVE, 09 mai. (Politics). Disponível em https://www.heraldlive.co.za/news/politics/2019-05-09-final-election-results-countdown-begins-after-mixed-voter-turnout/, consultado em 26/4/2023.
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.

Estou muito cansada das promessas vazias do governo e desses políticos; dessas mentiras que meu partido político vem vomitando, mas estou aqui para votar nele pela última vez. Se nada mudar, vou parar. (Siphokazi Nkohla, residente de Motherwell NU, 52 anos)

Estamos votando há 25 anos, mas eles não cumpriram as promessas que fazem toda vez que fazem campanha por votos. Queremos casas e terrenos e continuamos a votar na esperança de que sejam cumpridos. Mas desistirei do ANC se nada mudar depois desta eleição. (Siphokazi Nkohla, residente de Motherwell NU, 52 anos)

Organize-se, presidente Cyril Ramaphosa. Esta é a última chance que estou lhe dando. (Ahlumile Nkume, Universidade Nelson Mandela, 19 anos)

Trout, outro entrevistado do jornal e proprietário de uma empresa, disse que o governo vencedor precisará examinar políticas que ajudem os sul-africanos a estabelecerem pequenas empresas. Sobre a influência da memória do apartheid e o impacto da rejeição ao sistema no voto, ele completa: “Eu cresci no regime do apartheid e essas memórias sempre estarão lá” (Jerome Trout, de Mountain View, 51 anos).

Conclusões

Este artigo tratou da eleição geral de 2019 da África do Sul, marcada pela menor participação eleitoral, apenas 49% de público com idade de voto compareceu às urnas, e pelo pior desempenho do ANC em eleições presidenciais desde 1994, com votação abaixo de 60%. No momento da eleição, diziam que os números indicavam um desagravo do eleitorado em relação ao ANC, apesar da sua história de libertação. Fato é que, a despeito da queda no desempenho, o ANC logrou êxito e elegeu o seu candidato a presidente.

Como já mencionamos, estudiosos da ciência política sul-africana olharam para a eleição de 2019 com curiosidade para entender como componentes de racionalidade econômica emergiram no pleito, enquanto pesquisadores do voto econômico se dedicaram a explicar como um partido mandatário, com mais de 80% de avaliação negativa em áreas centrais do governo, conquistou a intenção de voto do eleitor para se reeleger.

Na teoria do comportamento eleitoral, destaca-se que a avaliação de desempenho corresponde ao julgamento e o voto à escolha. Os números apresentados nessa pesquisa corroboram com essa máxima. Enquanto os eleitores avaliavam o mandato do presidente, as suas ações no combate à corrupção e ao crime impactavam mais do que a rejeição ao apartheid. Todavia, na hora de decidir o voto, a rejeição ao apartheid falou mais alto. Por mais insatisfeitos que estivessem, ainda confiavam mais no ANC do que em seu principal adversário, a AD. O resultado sinaliza para o alerta dado por Steyn-Kotze (2017)STEYN-KOTZE, Joleen. (2017), Delivering an Elusive Dream of Democracy: Lessons from Nelson Mandela Bay. Stellenbosch, African Sun Media.: não se deve ignorar a influência do Sonho de 94 nos dias atuais. Da mesma forma ressalta o enunciado de Kotze e Bohler-Muller (2020), aKOTZE, Joleen Steyn; BOHLER-MULLER, Narnia. (2020), Reflections on the 2019 South African General Elections: Quo Vadis?. Routledge. DOI: https://doi.org/10.1080/02589346.2019.1692520.
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África do Sul continua a ser uma sociedade altamente dividida e com identidades sociopolíticas advindas do apartheid.

Sobre o voto econômico, fez-se presente na medida em que o desempenho do presidente em ações para reduzir o crime e a corrupção foi significativo e positivo tanto para a satisfação com o presidente, quanto para o voto pela sua continuidade, ainda que demonstrem menos importância diante do impacto da rejeição ao apartheid na hora do voto.

  • 1
    Afrobarometer conduziu pesquisas em Beim, Botsuana, Burkina Faso, Camarões, Cabo Verde, Costa do Marfim, Congo, Essuatíni, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Quénia, Lesoto, Libéria, Madagáscar, Maláui, Mali, Maurícias, Marrocos, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria, São Tomé e Príncipe, Senegal, Serra Leoa, África do Sul, Sudão, Tanzânia, Togo, Tunísia, Uganda, Zâmbia e Zimbabué. Omega Research conduziu a pesquisa na República Democrática do Congo.
  • 2

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2022
  • Aceito
    11 Dez 2022
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