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Angiomiolipomas renais gigantes em portadora de esclerose tuberosa

Sr. Editor,

Paciente do sexo feminino, 40 anos, portadora de esclerose tuberosa (ET) diagnosticada há 15 anos, sem acompanhamento periódico, apresentando dor abdominal constante há 20 dias e massa abdominal palpável detectada em consulta médica. Foram realizados exames laboratoriais, que não mostraram alterações. A tomografia computadorizada (TC) abdominal mostrou formações volumosas heterogêneas, parcialmente delimitadas, com extensas áreas de atenuação lipomatosa, determinando acentuada substituição renal bilateral, associadas a distorção arquitetural difusa do parênquima e efeito de massa local (Figura 1). Com base na história clínica da paciente, considerou-se como principal hipótese diagnóstica angiomiolipomas renais (AMLs) gigantes, sendo sugerida correlação com ressonância magnética (RM) do abdome (Figura 2). Devido ao quadro sintomático associado a extensa substituição renal bilateral e risco elevado de hemorragia, a nefrectomia total tornou-se a opção terapêutica mais adequada para a paciente. Posteriormente, evoluiu estável e foi encaminhada para hemodiálise de rotina.

Figura 1
TC de abdome sem contraste com reconstrução coronal (A) e secção axial (B) mostrando formações volumosas heterogêneas, parcialmente delimitadas, com extensas áreas de atenuação lipomatosa, determinando acentuada substituição renal bilateral, associadas a distorção arquitetural difusa do parênquima e efeito de massa local.

Figura 2
RM de abdome mostrando volumosas formações expansivas heterogêneas renais bilaterais com perda de sinal apreciável na sequência ponderada em T2 fat-sat, secção axial (A), caracterizando conteúdo lipomatoso, quando comparada com a aquisição coronal em T2 (B).

Massas do sistema urinário têm sido motivo de várias publicações recentes na literatura radiológica nacional11 Sousa CSM, Viana IL, Miranda CLVM, et al. Hemangioma of the urinary bladder: an atypical location. Radiol Bras. 2017;50:271-2.

2 Fernandes AM, Paim BV, Vidal APA, et al. Pheochromocytoma of the urinary bladder. Radiol Bras. 2017;50:199-200.
-33 Leite AFM, Venturieri B, Araújo RG, et al. Renal lymphangiectasia: know it in order to diagnose it. Radiol Bras. 2016;49:408-9.. Os AMLs são lesões benignas raras, representando 1% a 3% dos tumores renais, sendo considerados hamartomas, devido à presença de tecido adiposo, neovasos e fibras musculares44 Rodríguez WRR, Valbuena JEP, Levi MO. Angiomiolipoma renal gigante y linfangioleiomiomatosis pulmonar esporádica no filiada. A propósito de un caso. Urol Colomb. 2014;23:227-32.. A forma esporádica é a mais comum, porém, 10% dos casos estão associados a ET, com distribuição bilateral e, às vezes, múltipla. São assintomáticos em 60% dos casos, e o surgimento de sintomas e complicações está relacionado com o tamanho do tumor, sendo dor abdominal e massa palpável as manifestações mais frequentes55 Palácios RM, Góes ASO, Albuquerque PC, et al. Tratamento endovascular de angiomiolipoma renal por embolização arterial seletiva. J Vasc Bras. 2012;11:324-8.

6 Gomes P, Rebola J, Carneiro R, et al. Esclerose tuberosa: a propósito de um caso clínico. Acta Urológica. 2007;24:39-43.
-77 Cerqueira M, Xambre L, Silva V, et al. Angiomiolipoma múltiplo bilateral esporádico - caso clínico. Acta Urológica. 2003;20:63-8..

Os AMLs são comumente diagnosticados quando a gordura macroscópica é demonstrada em uma lesão renal. Classicamente, são hiperecogênicos ao ultrassom e na TC caracterizam-se por áreas de atenuação inferior a -10 UH. Na RM, as áreas de gordura intralesionais possuem isossinal à gordura presente em outros órgãos e hipersinal ao parênquima renal em T1. Entretanto, o diagnóstico mais fidedigno é feito com sequências realizadas antes e após a supressão de gordura. O uso de contraste intravenoso não é necessário de rotina para o diagnóstico ou vigilância dos AMLs88 Nelson CP, Sanda MG. Contemporary diagnosis and management of renal angiomyolipoma. J Urol. 2002;168(4 Pt 1):1315-25.. A biópsia renal não está indicada, pois aumenta o risco de complicações graves e habitualmente os seus resultados não alteram a conduta terapêutica44 Rodríguez WRR, Valbuena JEP, Levi MO. Angiomiolipoma renal gigante y linfangioleiomiomatosis pulmonar esporádica no filiada. A propósito de un caso. Urol Colomb. 2014;23:227-32..

O objetivo do tratamento é a preservação da função renal, portanto, embolização arterial, ablação por radiofrequência e cirurgias com preservação máxima do parênquima renal, como a enucleação, são algumas das opções terapêuticas99 Azevedo AS, Simão NMMS. Multicentric angiomyolipoma in kidney, liver, and lymph node: case report/review of the literature. J Bras Patol Med Lab. 2015;51:173-7.,1010 Schneider-Monteiro ED, Lucon AM, Figueiredo AA, et al. Bilateral giant renal angiomyolipoma associated with hepatic lipoma in a patient with tuberous sclerosis. Rev Hosp Clín Fac Med S Paulo. 2003;58:103-8..

Diante de lesões maiores que 4 cm, queixas álgicas, hemorragia ativa, alterações do tumor, AMLs múltiplos, bilaterais ou unilaterais em rim único e pacientes com ET, a intervenção cirúrgica torna-se necessária55 Palácios RM, Góes ASO, Albuquerque PC, et al. Tratamento endovascular de angiomiolipoma renal por embolização arterial seletiva. J Vasc Bras. 2012;11:324-8.,77 Cerqueira M, Xambre L, Silva V, et al. Angiomiolipoma múltiplo bilateral esporádico - caso clínico. Acta Urológica. 2003;20:63-8.. A nefrectomia total deve ser reservada para casos restritos, por exemplo: os que apresentam a maior parte do rim substituído pelo tumor; lesão volumosa ou solitária situada próximo ao hilo, com alto risco de complicações; exame de imagem inconclusivo; suspeita de malignidade ou hemorragia retroperitoneal significativa77 Cerqueira M, Xambre L, Silva V, et al. Angiomiolipoma múltiplo bilateral esporádico - caso clínico. Acta Urológica. 2003;20:63-8..

Nos AMLs renais múltiplos e bilaterais associados a ET, a terapêutica ideal continua sendo um desafio. É necessário avaliar os riscos de cada paciente e estabelecer condutas que preservem o máximo de parênquima renal. Entretanto, em determinados casos, como o aqui relatado, a nefrectomia total bilateral é inevitável.

REFERENCES

  • 1
    Sousa CSM, Viana IL, Miranda CLVM, et al. Hemangioma of the urinary bladder: an atypical location. Radiol Bras. 2017;50:271-2.
  • 2
    Fernandes AM, Paim BV, Vidal APA, et al. Pheochromocytoma of the urinary bladder. Radiol Bras. 2017;50:199-200.
  • 3
    Leite AFM, Venturieri B, Araújo RG, et al. Renal lymphangiectasia: know it in order to diagnose it. Radiol Bras. 2016;49:408-9.
  • 4
    Rodríguez WRR, Valbuena JEP, Levi MO. Angiomiolipoma renal gigante y linfangioleiomiomatosis pulmonar esporádica no filiada. A propósito de un caso. Urol Colomb. 2014;23:227-32.
  • 5
    Palácios RM, Góes ASO, Albuquerque PC, et al. Tratamento endovascular de angiomiolipoma renal por embolização arterial seletiva. J Vasc Bras. 2012;11:324-8.
  • 6
    Gomes P, Rebola J, Carneiro R, et al. Esclerose tuberosa: a propósito de um caso clínico. Acta Urológica. 2007;24:39-43.
  • 7
    Cerqueira M, Xambre L, Silva V, et al. Angiomiolipoma múltiplo bilateral esporádico - caso clínico. Acta Urológica. 2003;20:63-8.
  • 8
    Nelson CP, Sanda MG. Contemporary diagnosis and management of renal angiomyolipoma. J Urol. 2002;168(4 Pt 1):1315-25.
  • 9
    Azevedo AS, Simão NMMS. Multicentric angiomyolipoma in kidney, liver, and lymph node: case report/review of the literature. J Bras Patol Med Lab. 2015;51:173-7.
  • 10
    Schneider-Monteiro ED, Lucon AM, Figueiredo AA, et al. Bilateral giant renal angiomyolipoma associated with hepatic lipoma in a patient with tuberous sclerosis. Rev Hosp Clín Fac Med S Paulo. 2003;58:103-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2018
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