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Estudo Empírico Sobre a Eficiência da Carteira Teórica do Índice Bovespa

1 OBJETIVO DO ESTUDO

O uso de proxies da carteira de mercado é uma prática usual no campo de finanças. Alguns estudos científicos abordando os fundamentos da teoria de mercado de capitais dependem da consideração da carteira de mercado, que é tratada como carteira de referência (benchmark) para todo o mercado de capitais, especialmente quando se utilizam teorias emanadas da chamada “teoria de carteiras”, cujo precursor foi Harry Markowitz (1952MARKOWITZ, Harry. Portfolio Selection. The Journal of Finance, v.7, p.77-91, 1952., 1959), o qual criou as bases de quase tudo o que se estuda em relação a decisões de investimento em condições de incerteza.

Markowitz fez uma contribuição muito importante no campo do estudo das relações entre risco e retorno, definindo conceitos fundamentais, tais como: efeito diversificação, conjunto eficiente, carteira de tangência, dentre outros. Seu primeiro estudo no campo da moderna teoria de finanças foi um artigo publicado em 1952 no The Journal of Finance, intitulado Portfolio Selection. Posteriormente, em 1959, escreveu um livro sobre o assunto, com o mesmo título do artigo original.

Apesar do fato de que a moderna teoria de mercado de capitais define e utiliza o conceito de carteira de mercado, especialmente quando trata do modelo de equilíbrio de preços de títulos, denominado capital asset pricing model (CAPM), conforme se sabe, é impossível observar a verdadeira carteira de mercado.

Entende-se por carteira de mercado aquela carteira formada por todos os ativos passíveis de negociação na economia do país. Portanto, ela compreende todos os chamados ativos financeiros, que envolvem direitos primários sobre fluxos de caixa futuros, bem como outros ativos que representam riqueza do ponto de vista do investidor, tais como imóveis, obras de arte, raridades etc. É fácil perceber o quão difícil é, para não dizer impossível, do ponto de vista prático, construir a carteira de mercado, mesmo que periodicamente.

Quanto aos mercados organizados, há mais facilidade de se obter o valor e o preço dos ativos, como ocorre, por exemplo, com o mercado de ações. Porém, em outros mercados, até pela inexistência de um sistema de clearing, é inviável obterem-se valores corretos de mercado dos ativos transacionados.

O que inevitavelmente acaba sendo feito é justamente criar proxies, ou seja, representações aproximadas da real carteira de mercado, especialmente quando se estudam empiricamente ou se aplicam, na prática, as teorias relativas ao mercado de capitais.

Roll (1977)ROLL, Richard. A critique of the asset pricing theory’s tests. Journal of Financial Economics, v.4, p.129-176, 1977., em sua famosa crítica aos testes empíricos do CAPM, argumenta ser impossível observar a carteira de mercado, o que, conseqüentemente, implica a falta de objetividade para se concluir acerca da validade do modelo citado. Os testes empíricos do CAPM acabam sendo, segundo Roll, testes de eficiência da carteira de mercado, pois o mencionado modelo requer que esta, à qual todos os títulos estão referenciados, seja eficiente do ponto de vista de média e variância.

Neste estudo, tratamos de avaliar o desempenho da carteira do índice Bovespa, que é o principal índice de mercado utilizado no Brasil do ponto de vista de risco e retorno. Seria desejável que tal proxy do nosso mercado fosse uma boa representação da verdadeira carteira de mercado, o que significa posi-cionar-se sobre a fronteira eficiente relativa aos ativos com risco negociados em nosso mercado. Porém, pela metodologia de construção da carteira teórica do índice, é difícil imaginar que o mesmo faça parte de tal fronteira. A eficiência do índice foi testada estatisticamente mediante procedimentos detalhados mais à frente.

2 METODOLOGIA DE CONSTRUÇÃO DA CARTEIRA TEÓRICA DO ÍNDICE BOVESPA

O valor absoluto do índice Bovespa corresponde ao valor de mercado de uma carteira selecionada de ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo em um determinado momento. A variação do valor do índice, portanto, corresponde a uma taxa de lucratividade ao longo de um determinado período.

O conceito-chave, na metodologia de construção do índice Bovespa, é a negociabilidade.

O índice de negociabilidade é dado pela seguinte fórmula:

Neg = n N × v V

onde:

Neg = negociabilidade da ação num dado período

n = número de negócios (mercado a vista) com a ação num dado período

N = número total de negócios da bolsa no mercado a vista num dado período

v = volume (em R$) dos negócios com a ação no mercado a vista num dado período

V = volume total (em R$) dos negócios realizados na bolsa (mercado a vista) num dado período

Fazem parte da carteira teórica as ações que cumulativamente compreendem 80% dos índices de negociabilidade apurados para todas as ações negociadas a vista nos pregões da Bolsa de Valores de São Paulo. É exigido, também, que cada ação selecionada tenha participado de pelo menos 80% dos pregões do período considerado, e que seu volume de negócios no mercado à vista (em R$), no período, represente mais do que 0,1% do volume total (em R$) de negociações no mercado a vista da Bolsa de Valores de São Paulo, no mesmo período.

A carteira teórica do índice é revista a cada quatro meses, sendo as proporções de cada ação na carteira determinadas pelos respectivos índices de negociabilidade.

Vale ressaltar também que as quantidades teóricas de cada ação na carteira são ajustadas em razão das bonificações, desdobramentos, distribuições de dividendos ou de direitos de subscrição, que têm o efeito de alterar o preço corrente da ação, a qual passa, em um dado momento do tempo, a ser negociada “exdireitos”. Em relação à distribuição de dividendos ou de direitos de subscrição, estes são reinvestidos na carteira, aumentando as quantidades teóricas das ações geradoras desses proventos.

É justamente por conta dos proventos que são distribuídos ao longo do tempo que as cotações das ações podem assumir dois status alternativos no pregão das bolsas: ações “com direitos” ou ações “ex-direitos”.

Ações com “direitos” são aquelas que mantêm, no preço, algum direito ainda não exercido. Uma vez exercidos os direitos contidos na ação, ela torna-se “exdireitos”. Logicamente, ações “com” ou “ex” direitos têm cotações diferentes em razão do valor do direito que está incluído no preço “com”.

Pode-se, com facilidade, determinar a cotação teórica “ex-direitos”, dada a cotação com direitos, desde que não haja flutuação no preço da ação até o momento do exercício do direito contido na cotação “com”. A fórmula para conversão de uma cotação “com” em sua equivalente “ex” é a seguinte:

P ex = P com + s · S D 1 + b + s

em que:

Pex = preço estimado da ação “ex-direitos”

Pcom = preço de mercado da ação “com direitos”

s = taxa percentual de aumento do capital por subscrição

S = preço de subscrição por ação (em R$)

D = montante dos dividendos distribuídos por ação (em R$)

b= taxa percentual de bonificação ou desdobramento

A fórmula acima considera os principais eventos que podem afetar o preço de uma ação. Logicamente, esses eventos não ocorrem necessariamente ao mesmo tempo, exigindo-se, muitas vezes, que, ao longo de um ano, mais de um ajuste por proventos seja efetuado sobre os preços das ações. A fórmula acima mostra, ainda, que a distribuição de dividendos e as bonificações reduzem incondicionalmente o preço “ex-direitos”, o que já foi comentado em parágrafos anteriores.

3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS

Conforme comentado na introdução deste texto, a teoria de investimentos teve um marco significativo com o trabalho célebre de Harry Markowitz, publicado em 1952, que abordou, por meio de um modelo de período único, o problema de seleção da carteira ótima, visando máximo retorno esperado e mínimo risco. É tão significativa a contribuição de Markowitz para o desenvolvimento da teoria de mercado de capitais, que deu base para o surgimento de importantes modelos que abordam o risco como o principal fator de formação de preços de ativos financeiros. Merece especial menção o capital asset pricing model, desenvolvido nos anos 60, que foi construído com base nos fundamentos da teoria de carteiras criada por Markowtiz, e que representa, até os dias de hoje, um dos principais modelos utilizados para o estudo do comportamento de preços de ativos com risco negociados no mercado de capitais.

O CAPM é um modelo de equilíbrio de preços de ativos de capital, pois estabelece a relação estável desses ativos na medida em que se consideram certas suposições que simplificam a realidade do mercado, tais como: não há impostos e custos de transação; as informações estão publicamente disponíveis e a custo zero para todos os investidores todos os participantes do mercado podem tomar emprestado e investir à mesma taxa de juros sem risco; e os indivíduos têm expectativas homogêneas em relação a risco e retorno esperado dos ativos do mercado.

A equação fundamental do CAPM é dada por:

E r i = r f + E r m r f × β i

onde

E (ri) = taxa de retorno esperada do ativo.

E (ri) = taxa de retorno esperada da carteira de mercado

rf = taxa de retorno de ativo sem risco

ßi = coeficiente beta do ativo

A teoria ensina que todos os ativos devem estar acomodados sobre a denominada linha de mercado de títulos, sem oferecer oportunidades de arbitragem, pelo menos por muito tempo, na medida em que se admite que o CAPM funciona perfeitamente no mercado. Convém ressaltar que a linha de mercado de títulos é construída supondo-se que é possível investir e tomar emprestado a uma dada taxa de juros sem risco, que corresponde à menor taxa de juros praticada no mercado.

O modelo de Markowitz introduziu o conceito de conjunto eficiente, que compreende as carteiras de mínima variância que apresentam a melhor relação risco e retorno do mercado. Tais carteiras são identificadas por intermédio de um algoritmo de programação quadrática, em que se determinam as proporções de cada ativo na carteira. Restrições podem ser colocadas com o intuito de, por exemplo, somente permitir proporções positivas, ou seja, sem considerar a possibilidade de se vender ativos com risco a descoberto.

Algebricamente, o modelo de Markowitz consiste em

min σ p 2 = i = 1 n j = 1 n σ i , j × w i × w j

sujeito a

i = 1 n w i = 1 E r p * = taxa de retorno desejada

onde

s2p = variância dos retornos da carteira

s i, j = co-variâncias entre os ativos i e j

wi,wj = proporções dos ativos i e j

Considerando-se a possibilidade de se investir ou tomar emprestado à taxa de juros sem risco, pode-se comparar o grau de eficiência entre duas ou mais carteiras pelos seus respectivos índices de Sharpe, medida esta que corresponde ao quociente entre retorno médio excedente e desvio-padrão de retornos, ou seja:

sr p = μ p r f σ p

onde

srp = índice de Sharpe

µp = taxa de retorno média da carteira

µf = taxa de retorno de ativo sem risco

sp = desvio-padrão dos retornos da carteira

4 ESTUDOS SOBRE EFICIÊNCIA DE CARTEIRAS

Diversos estudos têm sido realizados, especialmente nos Estados Unidos, abordando a questão de eficência de carteiras, recorrendo-se a diferentes abordagens econométricas. Gibbons (1982)GIBBONS, Michael R. Multivariate testes of financial models. Journal of Financial Economics, v.10, p.3-27, 1982., Jobson & Korkie (1982)JOBSON, J. D., KORKIE, Bob. Potential performance and tests of portfolio efficiency. Journal of Financial Economics, v.10, p.433-466, 1982., Shanken (1985SHANKEN, Jay. Multivariate tests of the zero-beta CAPM. Journal of Financial Economics, v.14, p.327-348, 1985., 1987SHANKEN, Jay. Multivariate proxies and asset pricing relations. Journal of Financial Economics, v.18, p.91-110, 1987. e 1990SHANKEN, Jay.. Intertemporal asset pricing. Journal of Econometrics, v.45, p.99-120, 1990.), Kandel & Stambaugh (1987)KANDEL, Shmuel, STAMBAUGH, Robert F. On correlations and inferences about mean-variance efficiency. Journal of Financial Economics, v.18, p.61-90, 1987., MacKinlay (1987)MACKINLAY, A. Craig. On multivariate tests of the CAPM. Journal of Financial Economics, v.18, p.341-371, 1987., MacKinlay & Richardson (1991)MACKINLAY, A. Craig, RICHARDSON, Matthew P. Using generalized method of moments to test mean-variance efficiency. The Journal of Finance, v.46, p.511-527, 1991. e Haugen & Baker (1991)HAUGEN, Robert A., BAKER, Nardin L. The efficient market inefficiency of capitalization-weighted stock portfolios. The Journal of Portfolio Management, p.35-40, spring 1991. apresentam alguns dos trabalhos mais significativos sobre o tema.

Uma das obras mais importantes sobre o assunto é a de Gibbons, Ross & Shanken (1989)GIBBONS, Michael R., ROSS Stephen A., SHANKEN, Jay. A test of the efficiency of a given portfolio. Econometrica, v.57, n. 5, p.1121-1152, 1989., em que os autores desenvolveram uma estatística multivariada de teste aproximada a uma distribuição F com T-N-1 grau de liberdade, onde né o número de ativos ou carteiras e té o número de observações da amostra. Interpretando geometricamente a estatística de Gibbons, Ross & Shanken, podemos entendê-la como sendo baseada na diferença entre os índices de Sharpe da carteira estudada e os da carteira tomada como referência.

Gibbons, Ross & Shanken aplicaram o teste acima com base num conjunto de dados muito similar ao que foi usado por Black, Jensen & Scholes (1972)BLACK, Fisher, JENSEN, M. C., SCHOLES, M. The capital asset pricing model: some empirical findings, In: JENSEN, M. C. (Ed.). Studies in the Theory of Capital Markets. New York: Praeger, 1972.. Tomando retornos mensais de 10 carteiras ordenadas pelos betas dos títulos, e abrangendo o período de janeiro de 1931 a dezembro de 1965, determinou-se uma estatística F de 0,96, com 10 e 409 graus de liberdade, que tem um p-value de 0,48. Ou seja, o teste conclui que a eficiência ex ante do CRSP equally weighted index não pode ser rejeitada.

Grinold (1992)GRINOLD, Richard C. Are benchmark portfolios efficient? The Journal of Portfolio Management, p.34-40, fall 1992. efetuou um estudo sobre índices de mercado de cinco países – ALLORDS, da Austrália, DAX, da Alemanha, TOPIX, do Japão, FTA, do Reino Unido e S&P500, dos Estados Unidos, concluindo ser pouco provável que os índices de mercado sejam eficientes em quatro dos cinco países, sendo a única exceção o índice da Alemanha.

Silva & Stern (1995)SILVA, Marcos Eugênio da, M. STERN, Julio M. Efficient Portfolios at São Paulo Stock Exchange (BOVESPA) in 1994, Anais do XVII Encontro Brasileiro de Econometria de 12 a 15/12/1995, Salvador, BA, p.995-1013. fizeram uma aplicação do modelo de Markowitz no mercado brasileiro de ações, considerando as 108 ações mais líquidas, em 1994, da Bolsa de Valores de São Paulo.

Fazendo uso de um software específico, foram determinadas as carteiras de tangência e as carteiras de mínima variância, tanto para o universo das 108 ações quanto para o universo das ações que formaram o índice Bovespa em cada quadrimestre.

Pela própria análise gráfica da localização do índice Bovespa no espaço de média-variância, no qual também se desenha a curva que corresponde à fronteira eficiente em cada caso, chega-se à conclusão de que a carteira do referido índice de ações não é eficiente, suscitando dúvidas acerca da validade de tomála como boa proxy da carteira de mercado no Brasil.

Considerando os vários estudos realizados sobretudo nos Estados Unidos com respeito à eficiência de índices de mercado, não se pode afirmar, com muita certeza, que tais índices não são eficientes do ponto de vista da teoria de carteiras. Logicamente, seria desejável, do ponto de vista dos modelos teóricos de precificação de ativos com risco, que os índices de mercado fossem eficientes, pois assim estes tenderiam a se tornar mais válidos na prática.

5 ESTUDO DA EFICIÊNCIA DA CARTEIRA TEÓRICA DO ÍNDICE BOVESPA

Desenvolvemos um estudo sobre o índice Bovespa do Brasil utilizando uma metodologia parecida com a de Gibbons, Ross & Shanken. No nosso caso, levantamos os retornos mensais de 39 ações, dentre as mais negociadas no Brasil, abrangendo o período de janeiro de 1990 a abril de 1997. Os valores de retorno médio, desvio-padrão de retornos, co-variância com o índice Bovespa e beta de cada ação estão apresentados na Tabela 1.

TABELA 1

O retorno médio mensal do índice Bovespa foi, no período analisado, de 21,16%, ao passo que o desvio-padrão de retornos foi de 29,74%. O menor retorno médio mensal foi de 15,68% (EST4), com um desvio-padrão de 40,08%. Por outro lado, o maior retorno médio mensal foi de 29,52% (CES4), com um desvio-padrão de 71,13%. Os betas calculados variaram de 0,64 (LIG3) a 1,42 (CMI4). No entanto, nota-se uma forte predominância de ações com betas próximos ao beta médio de mercado. Vale lembrar que o beta de um título é tanto mais alto, quanto mais alta for a co-variância dos retornos do título com os retornos do índice Bovespa. Na verdade, o beta mede a sensibilidade dos retornos de uma ação em relação a variações dos retornos de um dado índice de mercado. Este grau de sensibilidade é que determina o nível de risco envolvido do título analisado.

Os betas calculados foram utilizados para que pudéssemos formar quatro carteiras de tamanhos semelhantes, porém, com riscos diferentes. A primeira carteira (CART1) é aquela que envolve o menor grau de risco (beta = 0,78), a segunda carteira (CART2) vem em segundo lugar no que se refere ao grau de risco (beta = 0,92), e assim por diante. Supostamente, os títulos que compõe uma certa carteira têm alguma semelhança relativamente a risco do negócio e risco financeiro.

A Tabela 2 mostra os parâmetros de análise das quatro carteiras consideradas, bem como do índice Bovespa, sendo destacável notadamente o índice de Sharpe, que se presta para se estimar a estatística de teste desenvolvida por Gibbons, Ross & Shanken (1989)GIBBONS, Michael R., ROSS Stephen A., SHANKEN, Jay. A test of the efficiency of a given portfolio. Econometrica, v.57, n. 5, p.1121-1152, 1989.. Eles demonstraram que uma possível medida estatística do grau de eficiência de uma carteira de mercado é dada por:

Estat í stica GRS = T N 1 N μ ̂ q σ ̂ q μ ̂ M σ ̂ M 1 + μ ̂ M 2 σ ̂ M 2
TABELA 2
RETORNO MÉDIO, DESVIO-PADRÃO DE RETORNOS, CO-VARIÂNCIA COM O ÍNDICE BOVESPA, BETA E ÍNDICE DE SHARPE DAS QUATRO CARTEIRAS CRIADAS COM BASE EM 39 AÇÕES

Tabela 1 – Retorno médio, desvio-padrão de retornos, co-variância com a carteira do índice Bovespa e beta de 39 ações, calculados com base em retornos mensais do período de janeiro de 1990 a abril de 1997, onde a carteira denotada por q representa a carteira de tangência ex post dos N ativos mais a carteira de mercado. É interessante lembrar que a carteira com o máximo quadrado do índice de Sharpe de todas as carteiras é a carteira de tangência. Assim, quando a carteira de mercado ex post é a carteira de tangência, a estatística GRS é igual a zero, e à medida que o quadrado do índice de Sharpe da carteira de mercado diminui, a referida estatística aumenta, indicando uma evidência mais forte contra a eficiência da carteira de mercado. Portanto, a eficiência da carteira de mercado é tanto mais provável quanto menor o valor calculado da estatística GRS.

Convém destacar que utilizamos como recurso computacional para identificação da carteira de máximo índice de Sharpe o SAS System, mais especificamente o módulo de pesquisa operacional, que exigiu até o desenvolvimento de um programa específico na linguagem do SAS para que pudéssemos obter os valores desejados.

Conforme indicado na tabela abaixo, o valor da estatística GRS calculada é igual a 0,2723, o que nos leva a concluir pela não rejeição da hipótese da eficiência do índice, resultado este semelhante ao obtido por Gibbons, Ross & Shanken, conforme mencionado anteriormente. A interpretação econômica da estatística GRS é a de que quanto menor o valor dessa estatística, mais próximos estão localizados o índice analisado e a carteira eficiente, com mesmo nível de risco do referido índice.

6 CONCLUSÕES

Este estudo se centrou na aplicação dos conceitos da moderna teoria de carteiras, cujas raízes foram criadas por Markowitz. Tais conceitos são, até os dias de hoje, as bases fundamentais sobre quase tudo o que se estuda em relação a investimentos no mercado de capitais.

Escolhemos como índice de mercado a ser testado, fazendo uso de métodos de pesquisa já adotados no mercado americano, o índice Bovespa. É inquestionável a importância que tal indicador tem tido no Brasil ao longo do tempo, servindo como principal referência do mercado de ações. Os órgãos de imprensa divulgam o comportamento do índice Bovespa a cada dia, tornando-o de conhecimento popular, embora supostamente apenas os investidores e especialistas em mercados financeiros estejam preocupados em entender sua metodologia de construção.

O índice Bovespa é utilizado para diferentes finalidades. De todo modo, seja qual for a finalidade, os usuários desse índice tendem a admiti-lo como uma boa representação da carteira de mercado, lembrando que é impraticável construir a verdadeira carteira de mercado.

Pudemos verificar, em nosso trabalho, que a carteira teórica do índice Bovespa não se baseia ou se situa muito próxima do denominado conjunto eficiente de Markowitz, havendo, portanto, carteiras melhor formadas do ponto de vista de média-variância. No entanto, em que pese essa constatação, não pudemos rejeitar a hipótese de eficiência do referido índice, o que nos leva a considerar que o índice Bovespa tende a se localizar numa região não suficientemente distante do conjunto eficiente, a ponto de torná-lo um referencial ruim do comportamento do mercado de ações como um todo.

Há que se levar em conta que, nesse estudo empírico, não foi considerada uma ampla amostra de ações que são negociadas no mercado. Isto deu-se especialmente pelo fato de que o nosso mercado é muito concentrado em poucos papéis, ao passo que a grande maioria das ações passíveis de negociação em bolsa acabam sendo pouco ou apenas eventualmente negociadas. Portanto, do ponto de vista prático, a amostra que utilizamos em nosso trabalho torna-se bastante representativa, pois não é possível formar carteiras muito numerosas no mercado de ações brasileiro.

Uma outra consideração importante está relacionado, ao fato de que, na obtenção da carteira eficiente do ponto de vista de média-variância, não admitimos a possibilidade de se efetuar venda a descoberto, o que logicamente faria que a estatística GRS aumentasse de valor. Não cremos, entretanto, que estaríamos necessariamente rejeitando a hipótese de eficiência do índice Bovespa.

Vale a pena comentar, também, que os administradores de carteiras podem eventualmente “bater” a carteira do índice Bovespa, na medida em que se leva em conta que, na prática de gestão de ativos de um fundo de investimento, retornos são incrementados pelas transações efetuadas durante o período de pregão – operações essas denominadas de day trade. Além disso, considere-se que na estratégia de escolha de ativos, são incorporados ativos derivados, como opções de ações e futuros de índice, além de outros tipos de títulos, os quais permitem, mediante uma administração ativa, superar a carteira temporariamente estática do índice.

Os betas calculados em relação aos retornos mensais das 39 ações que utilizamos em nosso estudo mostram uma forte correlação de muitas ações em relação ao índice Bovespa, conforme já observado. Logicamente, isto era de se esperar no que se refere às ações que tiveram maior participação na composição da carteira teórica do índice. Porém, sugere também uma certa afinidade do comportamento do índice Bovespa em relação ao comportamento médio das ações em geral, sobretudo as mais negociadas. Este argumento favorece a idéia da possível relativa eficiência do índice Bovespa.

Sendo o índice Bovespa o referencial mais importante do mercado de ações brasileiro, todos querem pelo menos reproduzir o seu desempenho. Isto faz que a própria concentração do índice se auto-sustente ao longo do tempo e que a composição do índice se generalize, pelo menos parcialmente, por todo o mercado. Este argumento também tende a favorecer a idéia da relativa eficiência do índice.

Os resultados obtidos em nosso trabalho indicam, com algumas restrições, que o mercado não tende a ter grandes oportunidades de obter ganhos superiores aos do índice Bovespa. Isto, na verdade, vem confirmar a constatação de algumas pesquisas já realizadas, as quais concluem que os gestores de fundos, em geral, não tendem a conseguir um desempenho superior e consistente no tempo em relação aos principais índices de mercado. Ao mesmo tempo, a relativa eficiência dos índices de mercado favorece a aplicabilidade dos modelos teóricos aplicáveis ao mercado de capitais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Dec 2000
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