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Coabitação durante a pandemia de covid-19: a experiência de casais jovens adultos

Cohabitation during the COVID-19 pandemic: the experience of young adult couples

La cohabitación en el transcurso de la pandemia del covid-19: la experiencia de parejas jóvenes adultas

Cohabitation pendant la pandemie de COVID-19 : l’expérience de jeunes couples adultes

Resumo

Este estudo qualitativo visou compreender a experiência de oito casais de adultos jovens em coabitação durante a pandemia de covid-19 e as repercussões do período na vida conjugal. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, seis presenciais e duas online, com casais heterossexuais, sem filhos, que coabitavam há menos de três anos. A análise temática reflexiva gerou três temas: desafios e dificuldades na pandemia; aproximação entre o casal; ganhos e aprendizados. Níveis aumentados de estresse, insegurança e ansiedade, sensação de sobrecarga e de privação devido às medidas de distanciamento social, dificuldades na delimitação dos espaços individuais dentro de casa e aumento nos conflitos conjugais foram os principais desafios relatados. Apesar disso, o enfrentamento colaborativo resultou em maior intimidade e no fortalecimento do vínculo conjugal, aumentando o compromisso com a relação. Tais resultados ilustram como um contexto pandêmico pode impactar relacionamentos durante o início da coabitação.

Palavras-chave:
covid-19; distanciamento social; relações conjugais; dinâmica de casal

Abstract

This qualitative study investigated the cohabitation experience of eight young adult couples during in the pandemic and its repercussions on marital life. Semi structured interviews were conducted, six in-person and two online, with childfree heterosexual couples living together for less than three years. The reflexive thematic analysis generated three themes: pandemic-related challenges and difficulties, couple bonding, gains and learnings. Increased levels of stress, insecurity and anxiety, a sense of of overload and deprivation due to social distancing measures, difficulties in delimiting individual spaces within the home and an increase in marital conflicts were the main challenges reported. Conversely, the ability to collaboratively cope with these challenges resulted in more intimacy and strengthened the marital bond, generating greater couple commitment. These findings illustrate how pandemics can impact relationships during the beginning of cohabitation.

Keywords:
COVID-19; social distancing; marital relations; couple dynamics

Resumen

Este estudio cualitativo tuvo como objetivo comprender las experiencias de ocho parejas de adultos jóvenes en cohabitación en el transcurso de la pandemia del covid-19 y sus repercusiones en la vida conyugal. Se realizaron entrevistas semiestructuradas, seis presenciales y dos en línea, con parejas heterosexuales, sin hijos, que vivían en cohabitación hace menos de tres años. El análisis temático reflexivo generó tres temas: desafíos y dificultades en la pandemia, acercamiento entre la pareja, conquistas y aprendizajes. El aumento de los niveles de estrés, inseguridad y ansiedad, los sentimientos de sobrecarga y privación por las medidas de distanciamiento social, las dificultades para delimitar los espacios individuales dentro del hogar y el aumento de los conflictos conyugales fueron los principales desafíos informados. Además, afrontar estos desafíos de forma colaborativa redundó en mayor intimidad y en el fortalecimiento del vínculo conyugal, repercutiendo en el aumento del compromiso con la relación. Estos resultados muestran cómo el contexto pandémico puede impactar el comienzo de la convivencia de las relaciones de pareja.

Palabras clave:
covid-19; distanciamiento social; relaciones conyugales; dinámica de pareja

Résumé

Cette étude qualitative a examiné l’expérience de cohabitation de huit jeunes couples adultes pendant la pandémie et ses répercussions sur la vie conjugale. Des entretiens semi-directifs ont été réalisés, six face-à-face et deux en ligne, auprès de couples hétérosexuels sans enfants vivant ensemble depuis moins de trois ans. L’analyse thématique réflexive a dégagé trois thèmes: les défis et difficultés liés à la pandémie, le lien du couple, les acquis et les enseignements. Des niveaux accrus de stress, d’insécurité et d’anxiété, des sentiments de surcharge et de privation dus aux mesures de distanciation sociale, des difficultés à délimiter les espaces individuels chez eux et une augmentation des conflits conjugaux sont les principaux défis signalés. Cependant, la capacité à faire face ensemble à ces défis a permis d’accroître l’intimité et de renforcer le lien conjugal, générant ainsi un plus grand engagement du couple. Ces résultats illustrent l’impact que les pandémies peuvent avoir sur les relations au début de la cohabitation.

Mots-clés:
COVID-19; distanciation sociale; relations conjugales; dynamique de couple

Introdução

A pandemia de covid-19 e as medidas utilizadas para conter a propagação do vírus provocaram mudanças significativas no cotidiano das pessoas ao redor do mundo, repercutindo, também, nos relacionamentos conjugais. Um estudo realizado com 781 indivíduos alemães em coabitação indicou que a satisfação conjugal diminuiu para 40% da amostra após o início da pandemia, permaneceu estável para outros 40% e aumentou para os demais (Schmid, Wörn, Hank, Sawatzki, & Walper, 2021Schmid, L., Wörn, J., Hank, K., Sawatzki, B., & Walper, S. (2021) Changes in employment and relationship satisfaction in times of the COVID-19 pandemic: Evidence from the German family panel. European Societies, 23(sup1), S743-S758. doi: 10.1080/14616696.2020.1836385
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). Em uma amostra de 276 portugueses, verificou-se níveis médios de satisfação conjugal durante os primeiros meses de pandemia (Fernandes, Magalhães, Silva, & Edra, 2021Fernandes, C. S., Magalhães, B., Silva, S., & Edra, B. (2021). Marital satisfaction of Portuguese families in times of social lockdown. The Family Journal, 30(2), 148-156. doi: 10.1177/10664807211009809
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). De modo geral, os estudos que investigam a satisfação conjugal a compreendem como uma avaliação global e subjetiva que cada cônjuge faz do relacionamento (Delatorre & Wagner, 2022Delatorre, M. Z., & Wagner, A. (2022). Construção e evidências de validade da Escala de Qualidade Conjugal. Psico-USF, 27(1), 129-141. doi: 10.1590/1413-82712022270110
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).

Nos Estados Unidos, alguns estudos denotam que a satisfação com o relacionamento se manteve estável durante o período inicial da pandemia (de dezembro de 2019 a abril de 2020), observando-se um aumento na tolerância entre os parceiros (Williamson, 2020Williamson, H. C. (2020). Early effects of the COVID-19 pandemic on relationship satisfaction and attributions. Psychological Science, 31(12), 1479-1487. doi: 10.1177/0956797620972688
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) e melhora na comunicação conjugal, explicada pela redução de demandas externas que poderiam gerar ruídos na comunicação (Weber, Wojda, Carrino, & Baucom, 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
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). Outros estudos norte-americanos, porém, encontraram redução na frequência sexual e na intimidade (Luetke, Hensel, Herbenick, & Rosenberg, 2020Luetke, M., Hensel, D., Herbenick, D., & Rosenberg, M. (2020). Romantic relationship conflict due to the COVID-19 pandemic and changes in intimate and sexual behaviors in a nationally representative sample of American adults. Journal of Sex & Marital Therapy, 46(8), 747-762. doi: 10.1080/0092623X.2020.1810185
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).

Impactos negativos nos relacionamentos conjugais também foram observados em uma pesquisa espanhola que revelou diminuição no ajustamento diádico e piora na vida sexual dos participantes (Torres-Cruz, Aznar-Martínez, & Pérez-Testor, 2022Torres-Cruz, D., Aznar-Martínez, B., & Pérez-Testor, C. (2022). Impact of the COVID-19 confinement on couple satisfaction and sexuality. Journal of Sex & Marital Therapy , 48(4), 363-375. doi: 10.1080/0092623X.2021.1998271
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). Neste mesmo sentido, casais mexicanos registraram conflitos devido ao estresse relacionado à pandemia, ao tempo de uso do celular pelo companheiro, à ausência de tópicos de conversa em comum, ao desacordo sobre o que devem ou não fazer durante a pandemia, entre outros (Salazar & Morales, 2020Salazar, T. R., & Morales, Z. R. (2020). Intimidad y relaciones de pareja durante la pandemia de la COVID-19 en Guadalajara. Espiral, 27(78-79), 215-264. doi: 10.32870/eees.v28i78-79.7206
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).

As medidas de distanciamento social que passaram a vigorar durante a pandemia parecem influenciar, de modo importante, grande parte desses efeitos na conjugalidade. A impossibilidade de realizar atividades de lazer externo, citada por americanos (Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
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) e mexicanos, estar em home office, impedidos de interagir fisicamente com outros, sem poder sair de casa para trabalhar ou viajar foram situações referidas como estressores relevantes (Quezada-Berumen, Landero-Hernández, & González-Ramírez, 2020Quezada-Berumen, L. C., Landero-Hernández, R., & González-Ramírez, M. T. (2020). Satisfacción marital e impacto del confinamiento por Covid-19 en México. Interacciones, 6(3), Artigo e173. doi: 10.24016/2020.v6n3.173
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). O aumento nas tarefas domésticas e parentais, com maior sobrecarga das mulheres, mesmo com crescimento da participação masculina nessas demandas, também foram consequências do distanciamento social observadas em casais heterossexuais da Austrália (Craig & Churchill, 2021Craig, L., & Churchill, B. (2021). Dual-earner parent couples’ work and care during COVID-19. Gender, Work & Organization, 28(S1), 66-79. doi: 10.1111/gwao.12497
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), Inglaterra (Garcia, 2021Garcia, R. (2021). Exploring the domestic division of labor when both parents are involuntarily working from home: The effects of UK COVID pandemic. Gender, Work & Organization , 29(4), 1065-1081. doi: 10.1111/gwao.12796
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), Alemanha (Hank & Steinbach, 2021Hank, K., & Steinbach, A. (2021). The virus changed everything, didn’t it? Couples’ division of housework and childcare before and during the Corona crisis. Journal of Family Research, 33(1), 94-114. doi: 10.20377/jfr-488
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) e Israel (Waismel-Manor, Wasserman, & Shamir-Balderman, 2021Waismel-Manor, R., Wasserman, V., & Shamir-Balderman, O. (2021). No room of her own: Married couples’ negotiation of workspace at home during COVID-19. Sex Roles, 85, 636-649. doi: 10.1007/s11199-021-01246-1
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).

Uma pesquisa longitudinal alemã comparou dados de 3.176 respondentes, coletados entre maio e julho de 2020, com dados de 9.435 participantes, coletados em 2018 e 2019 por meio do German Family Panel, e constatou que casais com filhos tiveram menor declínio na satisfação conjugal do que casais sem filhos ao longo dos meses de pandemia, mesmo com a demanda de conciliar o home office e o homeschooling. Apesar disso, os casais sem filhos reportaram níveis mais altos de satisfação conjugal no início do estudo (Schmid et al., 2021Schmid, L., Wörn, J., Hank, K., Sawatzki, B., & Walper, S. (2021) Changes in employment and relationship satisfaction in times of the COVID-19 pandemic: Evidence from the German family panel. European Societies, 23(sup1), S743-S758. doi: 10.1080/14616696.2020.1836385
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). Dados de outra pesquisa alemã corroboram parcialmente este achado ao apontar que casais jovens apresentaram melhor qualidade conjugal do que casais mais velhos, tanto antes quanto durante o período de confinamento (Sachser et al., 2021Sachser, C., Olaru, G., Pfeiffer, E., Brähler, E., Clemens, V., Rassenhofer, M., Witt, A., & Fegert, J. M. (2021). The immediate impact of lockdown measures on mental health and couples’ relationships during the COVID-19 pandemic-results of a representative population survey in Germany. Social Science & Medicine, 278, Artigo 113954. doi: 10.1016/j.socscimed.2021.113954
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).

Outros estudos (Bar-Kalifa, Randall, & Perelman, 2022Bar-Kalifa, E., Randall, A. K., & Perelman, Y. (2022). Daily dyadic coping during COVID-19 among Israeli couples. Emotion, 22(8), 1713-1722. doi: 10.1037/emo0000971
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; Budiartini, 2021Budiartini, N. N. (2021). Effect of COVID-19 related stress on marital quality during COVID-19 pandemic. Psychological Research and Intervention, 4(1), 9-18. doi: 10.21831/pri.v4i1.43287
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; Schmid et al., 2021Schmid, L., Wörn, J., Hank, K., Sawatzki, B., & Walper, S. (2021) Changes in employment and relationship satisfaction in times of the COVID-19 pandemic: Evidence from the German family panel. European Societies, 23(sup1), S743-S758. doi: 10.1080/14616696.2020.1836385
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; Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
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) demonstraram a complexidade da interação entre diferentes variáveis na compreensão dos efeitos da pandemia na conjugalidade, indicando que o contexto, mesmo sendo um estressor fundamental, não parece determinante para os relacionamentos. Dentre estes, um estudo alemão indicou redução na satisfação conjugal de homens e de mulheres independentemente de ter havido mudanças em suas circunstâncias de trabalho (Schmid et al., 2021Schmid, L., Wörn, J., Hank, K., Sawatzki, B., & Walper, S. (2021) Changes in employment and relationship satisfaction in times of the COVID-19 pandemic: Evidence from the German family panel. European Societies, 23(sup1), S743-S758. doi: 10.1080/14616696.2020.1836385
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). Ainda, pesquisas com indivíduos norte-americanos (Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
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), indonésios (Budiartini, 2021Budiartini, N. N. (2021). Effect of COVID-19 related stress on marital quality during COVID-19 pandemic. Psychological Research and Intervention, 4(1), 9-18. doi: 10.21831/pri.v4i1.43287
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) e israelenses (Bar-Kalifa et al., 2022Bar-Kalifa, E., Randall, A. K., & Perelman, Y. (2022). Daily dyadic coping during COVID-19 among Israeli couples. Emotion, 22(8), 1713-1722. doi: 10.1037/emo0000971
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) apontaram que a pandemia trouxe impactos negativos a nível individual, como maior estresse, depressão, ansiedade, humor negativo e desajustamento, sem que isso impactasse no ajuste e na qualidade do relacionamento.

Assim, torna-se relevante compreender com maior profundidade quais são as variáveis que moderam a relação entre os estressores externos e os desfechos relacionais, de modo a entender como essas mudanças acontecem. Há evidências de que o desejo pelo divórcio foi registrado quando o estresse gerado pela pandemia amplificou dificuldades prévias (Evans et al., 2020Evans, S., Mikocka-Walus, A., Klas, A., Olive, L., Sciberras, E., Karantzas, G., & Westrupp, E. M. (2020). From “it has stopped our lives” to “spending more time together has strengthened bonds”: The varied experiences of Australian families during COVID-19. Frontiers in Psychology, 11, Artigo 588667. doi: 10.3389/fpsyg.2020.588667
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). Verificou-se maior frequência de pensamentos sobre divórcio em indivíduos mais jovens; em relacionamentos com presença de agressão verbal, invalidação e baixa satisfação conjugal (Fleming & Franzese, 2021Fleming, C. J. E., & Franzese, A. T. (2021). Should I stay or should I go? Evaluating intimate relationship outcomes during the 2020 pandemic shutdown. Couple and Family Psychology: Research and Practice, 10(3), 158-167. doi: 10.1037/cfp0000169
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); assim como naqueles com pouca comunicação; diferença de interesses e de objetivos de vida entre o casal (Salazar & Morales, 2020Salazar, T. R., & Morales, Z. R. (2020). Intimidad y relaciones de pareja durante la pandemia de la COVID-19 en Guadalajara. Espiral, 27(78-79), 215-264. doi: 10.32870/eees.v28i78-79.7206
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). Em uma amostra de 1.121 brasileiros, 32% relataram vontade de se separar durante os primeiros meses da pandemia. Aqueles que reportaram aumento de conflitos conjugais tiveram seis vezes mais chances de pensar em separação. Da mesma forma, indivíduos que experimentaram redução do afeto conjugal e da frequência de relações sexuais também pensaram mais em se separar durante a pandemia (Rocha, Manara, Wagner, & Trentini, 2023Rocha, F., Manara, K. M., Wagner, A., & Trentini, C. M. (2023). Impacts of social distancing on marital life during COVID-19 pandemic. Psico-USF , 28(2), 295-307. doi: 10.1590/1413-82712023280207
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).

Estudos demonstram que o uso de estratégias de coping negativas, como culpabilizar o parceiro, relacionou-se a um aumento no humor negativo deste em uma amostra israelense (Bar-Kalifa et al., 2022Bar-Kalifa, E., Randall, A. K., & Perelman, Y. (2022). Daily dyadic coping during COVID-19 among Israeli couples. Emotion, 22(8), 1713-1722. doi: 10.1037/emo0000971
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). O uso de estratégias de coping diádico negativo, compreendido como o comportamento de minimizar ou desqualificar as condutas e as preocupações expressas pelo(a) parceiro(a), também amplificou a associação entre sofrimento psicológico e piora na qualidade conjugal em sete países (Austrália, Bélgica, Coréia do Sul, Grécia, Hungria, Índia e Irlanda) (Randall et al., 2022Randall, A. K., Leon, G., Basili, E., Martos, T., Boiger, M., Baldi, M., … Chiarolanza, C. (2022). Coping with global uncertainty: Perceptions of COVID-19 psychological distress, relationship quality, and dyadic coping for romantic partners across 27 countries. Journal of Social and Personal Relationships , 39(1), 3-33. doi: 10.1177/02654075211034236
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). Por outro lado, parceiros chineses que receberam apoio positivo durante o período mais crítico da pandemia sentiram mais gratidão e menos estresse (Jiang, Chiu, & Liu, 2022Jiang, D., Chiu, M. M., & Liu, S. (2022). Daily positive support and perceived stress during COVID-19 outbreak: The role of daily gratitude within couples. Journal of Happiness Studies, 23, 65-79. doi: 10.1007/s10902-021-00387-0
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), e o apoio do parceiro se associou positivamente à satisfação conjugal em outros estudos (Enestrom & Lydon, 2021Enestrom, M. C., & Lydon, J. E. (2021). Relationship satisfaction in the time of COVID-19: The role of shared reality in perceiving partner support for frontline health-care workers. Journal of Social and Personal Relationships, 38(8), 2330-2349. doi: 10.1177/02654075211020127
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; Genç, Su, & Turhan, 2021Genç, E., Su, Y., & Turhan, Z. (2021). The mediating role of dyadic coping on the effects of COVID-19 and relationship satisfaction among Turkish couples. The American Journal of Family Therapy, 51(4), 421-439. doi: 10.1080/01926187.2021.1984338
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). Casais mexicanos mais satisfeitos tenderam a experienciar menos impactos do confinamento no bem-estar geral e a acompanhar menos notícias relacionadas à covid-19 (Quezada-Berumen et al., 2020Quezada-Berumen, L. C., Landero-Hernández, R., & González-Ramírez, M. T. (2020). Satisfacción marital e impacto del confinamiento por Covid-19 en México. Interacciones, 6(3), Artigo e173. doi: 10.24016/2020.v6n3.173
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). O coping diádico também mediou a relação entre o estresse com a pandemia e a satisfação conjugal para homens e mulheres turcos (Genç et al., 2021Genç, E., Su, Y., & Turhan, Z. (2021). The mediating role of dyadic coping on the effects of COVID-19 and relationship satisfaction among Turkish couples. The American Journal of Family Therapy, 51(4), 421-439. doi: 10.1080/01926187.2021.1984338
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), reduzindo o impacto negativo do sofrimento psicológico relacionado à pandemia na qualidade conjugal para a maioria dos participantes de um estudo multinacional (Randall et al., 2022Randall, A. K., Leon, G., Basili, E., Martos, T., Boiger, M., Baldi, M., … Chiarolanza, C. (2022). Coping with global uncertainty: Perceptions of COVID-19 psychological distress, relationship quality, and dyadic coping for romantic partners across 27 countries. Journal of Social and Personal Relationships , 39(1), 3-33. doi: 10.1177/02654075211034236
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). O estabelecimento de rotina com horários, a prática de atividades prazerosas de lazer e de exercícios físicos também auxiliaram casais mexicanos a melhor atravessar o período de confinamento (Quezada-Berumen et al., 2020Quezada-Berumen, L. C., Landero-Hernández, R., & González-Ramírez, M. T. (2020). Satisfacción marital e impacto del confinamiento por Covid-19 en México. Interacciones, 6(3), Artigo e173. doi: 10.24016/2020.v6n3.173
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).

Diante desse panorama, nota-se que os impactos da pandemia na vivência individual e conjugal foram múltiplos e sujeitos a um grande número de variáveis. Os estudos têm avançado na compreensão dos processos que intermedeiam diferentes desfechos relacionais para casais com demandas e recursos distintos. Nesse sentido, investigar esses processos e seus impactos em públicos com características diferenciadas, como os casais jovens vivendo a fase inicial do relacionamento, pode contribuir para a literatura ao explorar quais variáveis podem facilitar ou dificultar a adaptação a esse contexto, e de que forma esse impacto acontece. Nesse momento do ciclo vital, os casais estão descobrindo sua identidade conjugal, negociando regras implícitas e explícitas e estabelecendo os seus padrões de relacionamento (McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). Becoming a couple: The joining of families. In M. McGoldrick, N. G. Preto & B. Carter (Eds.), The expanding family life cycle: Individual, family, and social perspectives (5a ed., pp. 259-279). London, England: Pearson.; Nichols & Pace-Nichols, 1993Nichols, W., & Pace-Nichols, M. A. (1993). Developmental perspectives and family therapy: The marital life cycle. Contemporary Family Therapy, 15, 299-315. doi: 10.1007/BF00897760
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; Ríos-González, 2011Ríos-González, J. A. (2011). Los ciclos vitales de la familia y la pareja ¿Crisis u oportunidades? (2a ed.). Madrid, España: CCS.). Ao mesmo tempo, estão em uma fase de busca pela realização de seus projetos de vida (Cerveny & Berthoud, 2009Cerveny, C. M. O., & Berthoud, C. M. (2009). Ciclo vital da família brasileira. In L. C. Osório & M. E. P. do Valle. Manual de terapia familiar (pp. 25-37). Porto Alegre, RS: Artmed.), ou seja, muito suscetíveis às demandas profissionais (Heckler & Mosmann, 2014Heckler, V. I., & Mosmann, C. P. (2014). Casais de dupla carreira nos anos iniciais do casamento: Compreendendo a formação do casal, papéis, trabalho e projetos de vida. Barbarói, 2(41), 119-147.). Por essas razões, a etapa de formação é considerada uma das mais desafiadoras do ciclo vital do casal, ainda que seja erroneamente romantizada pelo senso comum (McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). Becoming a couple: The joining of families. In M. McGoldrick, N. G. Preto & B. Carter (Eds.), The expanding family life cycle: Individual, family, and social perspectives (5a ed., pp. 259-279). London, England: Pearson.).

Estudos apontam que a trajetória do relacionamento do casal ao longo da vida é influenciada, sobremaneira, pela forma como a relação se estrutura nos anos iniciais (Karney & Bradbury, 2020Karney, B. R., & Bradbury, T. N. (2020). Research on marital satisfaction and stability in the 2010s: Challenging conventional wisdom. Journal of Marriage and Family, 82(1), 100-116. doi: 10.1111/jomf.12635
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; Lavner & Bradbury, 2019Lavner, J. A., & Bradbury, T. N. (2019). Trajectories and maintenance in marriage and long-term committed relationships. In D. Schoebi & B. Campos (Eds.), New directions in the psychology of close relationships (pp. 28-44). London, England: Routledge. doi: 10.4324/9781351136266-3
https://doi.org/10.4324/9781351136266-3...
; Tong, Jia, He, Lan, & Fang, 2021Tong, W., Jia, J., He, Q., Lan, J., & Fang, X. (2021). The trajectory of marital satisfaction among Chinese newlyweds: Intrapersonal, interpersonal, and stress predictors. Developmental Psychology, 57(4), 597-608. doi: 10.1037/dev0001156
https://doi.org/10.1037/dev0001156...
; Williamson & Lavner, 2020Williamson, H. C., & Lavner, J. A. (2020). Trajectories of marital satisfaction in diverse newlywed couples. Social Psychological and Personality Science, 11(5), 597-604. doi: 10.1177/1948550619865056
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). Assim, compreender como estas relações estão se estruturando em sua fase inicial, considerando o contexto pandêmico associado, pode permitir melhor compreensão dos eventos futuros. Tendo isso em vista, este estudo teve por objetivo compreender a experiência de oito casais de adultos jovens em coabitação durante a pandemia de covid-19, bem como as repercussões do período na vida conjugal.

Método

Delineamento e participantes

Este estudo qualitativo, exploratório e transversal foi realizado com oito casais heterossexuais que residiam em Porto Alegre e região metropolitana. Esta amostra intencional (Fontanella, Ricas, & Turato, 2008Fontanella, B. J. B., Ricas, J., & Turato, E. R. (2008). Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: Contribuições teóricas. Cadernos de Saúde Pública, 24(1), 17-27. doi: 10.1590/s0102-311x2008000100003
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) foi composta por casais que moravam juntos há no mínimo seis meses e no máximo três anos, com relacionamentos não formalizados oficialmente e sem filhos. Em média, os casais tinham quatro anos de tempo total de relacionamento e dez meses de coabitação. Os participantes eram adultos jovens (Papalia & Feldman, 2013Papalia, D. E., & Feldman, R. D. (2013). Desenvolvimento humano (12a ed.). Porto Alegre, RS: Artmed .), com idades médias de 27 anos para mulheres e 28 anos para homens.

A situação laboral durante a pandemia foi a seguinte: o tempo de trabalho diário dos participantes variou entre 6 e 12 horas (média: 7,6 horas), e quem exercia mais de 8 horas por dia eram trabalhadores autônomos. Duas participantes trabalhavam em instituições de saúde e tiveram suas jornadas reduzidas. Além dessas, outras três pessoas seguiram exercendo suas funções laborais presencialmente. Sete participantes passaram a trabalhar remotamente, e dois deles compareciam em dias de escala ao trabalho presencial (cerca de uma ou duas vezes por mês). Ademais, a pandemia trouxe alterações na residência apenas do casal D (Diana passou a residir com Daniel). Informações mais detalhadas acerca dos participantes encontram-se na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização dos casais participantes

Instrumentos

Os instrumentos utilizados, produzidos pelos autores, foram: um questionário de caracterização sociodemográfica, constituído por 15 perguntas abertas e fechadas, e uma entrevista composta por perguntas exploratórias. A entrevista, realizada com ambos os parceiros em conjunto, teve por objetivo compreender a vivência da coabitação desde o processo de adaptação à moradia conjunta, investigando a divisão das tarefas domésticas, a administração financeira, as atividades de lazer, a vida sexual, os conflitos e sua resolução, as relações com as famílias de origem, a vivência da pandemia de covid-19 e os projetos futuros dos casais. Esses temas foram escolhidos a partir da literatura sobre a coabitação e a etapa de formação do casal (Heckler & Mosmann, 2014Heckler, V. I., & Mosmann, C. P. (2014). Casais de dupla carreira nos anos iniciais do casamento: Compreendendo a formação do casal, papéis, trabalho e projetos de vida. Barbarói, 2(41), 119-147.; McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). Becoming a couple: The joining of families. In M. McGoldrick, N. G. Preto & B. Carter (Eds.), The expanding family life cycle: Individual, family, and social perspectives (5a ed., pp. 259-279). London, England: Pearson.; Ríos-González, 2011Ríos-González, J. A. (2011). Los ciclos vitales de la familia y la pareja ¿Crisis u oportunidades? (2a ed.). Madrid, España: CCS.), assim como em função do contexto pandêmico. Foi realizada uma entrevista piloto online com um casal para verificar a adequação das perguntas.

Procedimentos de coleta de dados e aspectos éticos

Os dados foram coletados entre junho e novembro de 2020. O acesso aos participantes se deu por indicação da rede de contatos dos autores. Ao receber indicações de casais que se encaixassem nos critérios de inclusão, os autores entraram em contato com os possíveis participantes por e-mail, fazendo o convite para participar da pesquisa e explicando seus objetivos, os procedimentos de coleta de dados e os aspectos éticos. Após aceitarem o convite, o questionário sociodemográfico online foi enviado aos participantes e a entrevista com o casal foi agendada. Diante do contexto pandêmico, foram oferecidas as opções de realizar a entrevista presencialmente, tomando as medidas sanitárias de prevenção contra a covid-19 cabíveis, ou virtualmente. Seis casais foram entrevistados presencialmente, cinco em suas residências e um em um consultório privado. Outros dois casais foram entrevistados online, por meio da plataforma Google Meet. Em ambas as circunstâncias, os casais foram orientados a estar juntos durante a entrevista, em um espaço reservado que garantisse a sua privacidade. Nas entrevistas online, os pesquisadores estavam sozinhos em um cômodo que garantia o sigilo dos dados, com a porta fechada. As entrevistas tiveram duração média de 2h02 (entre 57 min e 4h19) e foram gravadas em áudio, com anuência dos participantes. Nas entrevistas online, um gravador de voz foi posicionado na saída de áudio do computador. Dados sensíveis que pudessem identificar os participantes foram modificados ou ocultados. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi assinado e recolhido na ocasião das entrevistas ou via e-mail. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (parecer nº. 4.143.492) .

Análise de dados

O conteúdo das entrevistas foi transcrito na íntegra e importado para o software NVivo 14. Os dados foram explorados e interpretados a partir da análise temática reflexiva (Braun, Clarke, Hayfield, & Terry, 2019Braun, V., Clarke, V., Hayfield, N., & Terry, G. (2019). Thematic analysis. In P. Liamputtong (Ed.), Handbook of research methods in health social sciences (pp. 843-860). New York, NY: Springer. doi: 10.1007/978-981-10-5251-4_103
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), realizada em cinco etapas: a) familiarização, feita a partir da leitura e imersão nos dados, em que se destacaram os aspectos considerados significativos; b) geração de códigos, que envolveu a releitura dos dados de modo rigoroso, com objetivo de elaborar e organizar sistematicamente os códigos iniciais; c) construção de temas, etapa em que os códigos iniciais foram (re)organizados, visando à criação de temas candidatos; d) revisão de temas, que consistiu na avaliação da adequação dos temas candidatos quanto à significância do conteúdo e organização dos dados como um todo. Para auxiliar neste processo, elaborou-se um mapa temático inicial; e) definição e nomeação dos temas, quando também foi elaborado o mapa temático. O processo de análise de dados foi conduzido por uma autora e revisado por outra, que avaliou a congruência da análise no que diz respeito ao nome e ao conteúdo de cada tema e subtema. Estas autoras realizaram juntas o refinamento das categorias e de seus nomes. Após, os demais autores realizaram a leitura crítica do material, validando a congruência da análise realizada.

Resultados

A análise temática reflexiva das entrevistas gerou três temas: “Desafios e dificuldades na pandemia”, “Aproximação entre o casal” e “Ganhos e aprendizados”. A Figura 1 ilustra os temas e seus respectivos subtemas.

Figura 1
Representação do mapa temático

Desafios e dificuldades na pandemia

O primeiro tema versa sobre as adversidades relacionadas à vivência da pandemia. Verificam-se os impactos desse contexto na saúde mental (subtema 1) dos participantes, assim como o aumento dos desafios devido às privações (subtema 2) exigidas. No âmbito conjugal, notaram-se repercussões negativas do contexto na relação (subtema 3), constatadas por meio da intensificação de conflitos conjugais e pelo surgimento de novos desafios às díades.

O primeiro subtema - impacto psicológico individual - revela a percepção dos indivíduos sobre a vivência da pandemia, em geral, compreendida como um período “bem difícil” (Amanda), “bem caótico” (André) e “conturbado” (Bárbara). Nota-se uma recorrência de falas indicando o impacto psicológico agravado, à medida que se sentiram mais estressados, ansiosos, inseguros e frustrados: “Essa semana foi a primeira vez em um ano que eu tive um pré-ataque de ansiedade por causa dessa situação toda” (André); “A gente tem sofrido muito de um estresse, de uma exigência emocional, uma insegurança, um medo de tudo” (Cesar).

Percebe-se, assim, quão difícil foi a vivência da pandemia para os participantes. As privações impostas diante do contexto inseguro da pandemia foram bastante mencionadas como importantes desafios. Tais privações referem-se à impossibilidade de realizar atividades que antes faziam livremente, como os momentos de lazer e de socialização com amigos, colegas de trabalho e familiares. Os casais relataram sentir falta de desenvolver essas atividades: “Eu sinto muita falta de outras pessoas, de conversar com outras pessoas, de conviver com outras pessoas, de abraçar outras pessoas” (Claudia); “Eu sempre fui muito ativo [refere-se a atividades físicas], e essa falta de válvula de escape tem sido foda, porque fisiologicamente, às vezes, eu preciso extravasar” (Cesar).

Assim, essas privações somaram ainda mais desafios ao atravessamento da pandemia, por contribuírem para a estagnação da rotina, gerando sensação de tédio e maior estresse: “Eu, principalmente, estava ficando muito estressada dentro de casa, muito cansada, muito entediada, porque eu gosto de conviver com pessoas” (Gisele). Ao mesmo tempo, o entendimento de que a suspensão dessas atividades foi feita em prol de um bem maior, isto é, pela saúde própria e da coletividade, auxiliou a mitigar tais dificuldades: “Foi uma escolha que eu fiz de acreditar no confinamento e no distanciamento social e que isso vai fazer a diferença para algumas pessoas. E cuidar das minhas pessoas queridas, né, de não me expor” (Cesar). Todos os casais mencionaram ter deixado de realizar atividades de lazer e de socialização em função do contexto pandêmico.

A pandemia também repercutiu negativamente no relacionamento conjugal. Neste sentido, as falas de Cesar elucidam tanto a consciência desse impacto - “Tem sido bem difícil [pois perdeu suas válvulas de escape], acho que acaba espirrando na Claudia também” - quanto o entendimento de que tais desafios relacionam-se ao complexo contexto imposto - “Não é o Cesar, não é a Claudia, é mais complexo . . . tem sido exigente, porque acaba sobrecarregando um ao outro”. Também perceberam que alguns conflitos se agravaram na pandemia: “Agora na quarentena acaba se sobressaindo um pouco mais, mas o André tem uma certa dificuldade, às vezes, de se desligar do trabalho” (Amanda).

Dentre os principais desafios enfrentados, a readaptação da rotina, especialmente para aqueles que passaram a trabalhar em casa durante a pandemia, foi bastante citada: “Organizar as rotinas de trabalho foi difícil, entender que a gente tinha que ter um horário de almoço, que não dava pra ser . . . as coisas muito soltas. Então, criar uma rotina foi difícil no início” (Gisele). Nessa perspectiva, delimitar as fronteiras entre o momento de trabalho, de lazer e de descanso mostrou-se laboriosa - “Tu trabalha muito, não tem limite de hora pra nada, tá muito estressante” (Fernanda) -, além de ter gerado conflitos durante o período de adaptação a este novo modo de convivência - “No começo a gente teve problema com você entender que eu estava em um momento de trabalho, porque eu estava fazendo home office” (Bernardo);

Ter essa vivência do Daniel em casa no começo foi um pouco estranho, não só por morar juntos, mas de entender que estaríamos juntos a todo momento. E que teria momentos que ele iria querer ficar sozinho ou eu iria querer ficar sozinha. E aí, teria que achar aquilo natural, né, porque, por mais que eu goste da proximidade, a gente tem que dar o espaço pro outro (Diana).

No caso dos participantes que dividiam um ambiente físico pequeno, o estabelecimento de tais fronteiras parece ter sido ainda mais desafiador: “Eu acabava invadindo o espaço de trabalho dele e ele invadindo o meu espaço de trabalho. . . . A gente estava meio que… faltando espaço físico mesmo” (Gisele).

Diante dessas dificuldades e desafios, os participantes compartilharam algumas estratégias de enfrentamento que se mostraram úteis. A prática de exercício físico destacou-se como um meio de “dar uma arejada na cabeça” (Gisele), bem como encarar a situação com foco no que é possível fazer, evitando antecipar situações de sofrimento não controláveis.

Aproximação entre o casal

Embora os desafios e dificuldades decorrentes da vivência da pandemia tenham se destacado, este contexto também gerou repercussões positivas no relacionamento conjugal. Neste sentido, o segundo tema discorre sobre elas, relacionadas, mais especificamente, com a aproximação entre o casal. Engloba o aumento do tempo de convívio (subtema 1) e o fortalecimento de vínculos (subtema 2) entre os casais, assim como algumas mudanças percebidas na comunicação entre o par (subtema 3).

O tempo de convívio aumentou para todos os casais, embora em gradações distintas. Quatro deles (D, E, G e H) experienciaram um aumento significativo na quantidade de horas de convívio, já que ambos os companheiros passaram a exercer suas atividades laborais em casa. Especificamente para o casal D, a diferença com relação ao período anterior foi muito grande, uma vez que namoravam a distância e, durante a pandemia, passaram a coabitar. Para o restante dos casais (A, B, C e F), este aumento no tempo conjunto não foi tão considerável, por pelo menos um dos parceiros ter seguido trabalhando fora de casa. Dentre esses, os casais A e F indicaram não ter sofrido tanta alteração na quantidade total de horas compartilhadas, enquanto os casais B e C ampliaram o tempo de convívio.

Esse aumento do convívio favoreceu o fortalecimento do vínculo entre as díades. De modo geral, o relacionamento foi considerado um dos poucos aspectos positivos em meio às dificuldades da pandemia: “[A relação é] uma das poucas coisas que estão bem no momento” (Amanda). A companhia e o apoio mútuo entre o casal foram aspectos valorizados: “Eu me sinto feliz de estar em quarentena . . . e poder contar com a companhia dele. A gente tem no outro uma companhia, sabe? Pra conversar, pra dividir a distração desse momento, pra dividir o estresse” (Gisele).

Ademais, os casais puderam se aproximar, compreender melhor as necessidades um do outro e fazer atividades que antes não conseguiam, como ter momentos de lazer a sós: “Antes a gente até tinha momentos só nós dois, mas eram muito mais momentos com outras pessoas do que só nós dois” (Estela), e pretendem manter algumas dessas atividades posteriormente à pandemia: “Isso é uma coisa que vai ficar de positivo, a gente vai separar um dia só pra nós” (André).

Desta forma, verifica-se que, apesar de custosa em diversos sentidos, a vivência da pandemia possibilitou, por outro lado, o estreitamento dos laços entre a díade: “É maluco que, apesar de tudo isso, a gente conseguiu se encontrar melhor, sabe?” (Gabriel).

Erick: Na nossa relação, eu não sinto que esteja piorando, pelo contrário, eu acho que está criando mais laços talvez por estar mais tempos juntos. A gente está fazendo tudo juntos, o que a gente não fazia antes, né. Então, eu acho que pra nós, pro nosso relacionamento em si, tem sido bom.

Estela: É, surpreendeu positivamente. Acho que realmente tem sido muito melhor do que eu imaginava que pudesse ser.

Essa grata surpresa com relação à boa convivência conjugal durante a pandemia também foi relatada por outros casais. Percebe-se que atravessar este período forneceu maiores certezas sobre o futuro do casal:

Hoje em dia, eu tenho muito mais certeza do nosso futuro como casal do que antes. Não que antes eu não tivesse, mas agora justamente por a gente estar passando por essa situação e estar conseguindo lidar com isso de uma maneira tão boa me faz ter mais fé no nosso futuro (Claudia).

No que diz respeito à comunicação, a percepção sobre alterações influenciadas pelo contexto pandêmico foi variada. Dois casais (A e B) indicaram não notar nenhum tipo de mudança comunicacional em comparação com o período anterior à pandemia. Outros perceberam um aumento na quantidade de diálogo, mas não necessariamente na forma como se comunicam: “A gente falava muito, mas agora fala muito mais. Na pandemia ainda mais” (Helena). Erick: Aumentou o número de horas que a gente conversa com certeza, mas a forma de comunicação… Tu acha? Estela: Acho que não, não sei. E um casal percebeu mudanças na comunicação verbal e não verbal: “Acho que essa comunicação não verbal tenha sido aflorada” (Cesar), o que sugere um afinamento maior entre eles, uma vez que conseguiram observar melhor as necessidades um do outro. A parceira verificou uma melhora também na comunicação verbal, apesar de atribuir este avanço a uma construção e investimento anteriores à pandemia: “Acho que a comunicação - não só essa não verbal - mas a verbal também acabou melhorando. Mas acho que é um processo que vem desde o começo, de a gente estar cada vez mais alinhados e afinados um com o outro” (Claudia).

Ganhos e aprendizados

O último tema divide-se entre os ganhos (subtema 1) adquiridos a partir da vivência da pandemia, concentrando pontos mais objetivos, e os aprendizados e reflexões (subtema 2), os quais revelam aspectos valorizados pelos participantes e reflexões obtidas em meio à pandemia.

Embora tenha aparecido de forma menos representativa, foram citados alguns ganhos oportunizados pelo contexto pandêmico. A possibilidade do home office foi valorizada por alguns participantes, pois retirou o tempo gasto com o deslocamento. Esta otimização de tempo abriu espaço para retomar antigos hábitos, assim como aumentar o tempo de convívio com o parceiro: “Foi um hábito [leitura] que a gente conseguiu retomar na quarentena por ter tempo, sabe? Porque daí tu consegue focar mais o teu trabalho . . . e acaba que tu fica com tempos livres” (Gisele). Além disso, este casal revelou ter aumentado sua produtividade, após se adaptarem à nova rotina, por poder eleger o melhor horário de trabalho, conforme a preferência de cada um. Outro aspecto positivo advindo deste contexto foi ele ter possibilitado “ser mais econômico [financeiramente]” (Fernanda).

Outras falas sugerem que alguns participantes obtiveram ganhos secundários com a pandemia, uma vez que evitaram o contato com temas potencialmente conflituosos. Por exemplo, um casal - em que um dos membros gostava de ficar em casa e o outro, de ir a festas - postergou desavenças relacionadas a esse tema. Similarmente, Bárbara considerou positivo o companheiro interromper suas viagens de trabalho, antes muito frequentes: “Eu não gostava quando ele ia viajar, que eu ficava sozinha. Então, isso foi um ponto bem positivo” (Bárbara).

A pandemia também proporcionou aprendizados e reflexões aos participantes. O fato de se depararem com a finitude da vida e a fragilidade humana parece ter suscitado reflexões aos casais, no sentido de os impulsionar a perseguir sonhos e desejos, contactar pessoas queridas e demonstrar afeto:

[Deu] pra enxergar o quanto a gente é frágil, o quanto a gente é finito e às vezes a gente vai “ah tá, vou, não sei quê”, e acaba não fazendo. . . . Tem que aproveitar, sabe? É o momento que a gente tem, querendo ou não a gente é jovem ainda, então tem várias coisas que eu almejo fazer, que eu posso dizer que a pandemia me aflorou (Cesar).

Outras falas sugerem a valorização de aspectos corriqueiros, mas cerceados durante a pandemia, como passear livremente, o contato com outras pessoas, o toque físico: “Eu já tenho esse pensamento de que a vida é muito frágil, sabe? E que tu tem que aproveitar os momentos . . . e como as pequenas coisas fazem diferença, enfim, o contato com o outro” (Bárbara). Também foi mencionada a percepção sobre o aumento do senso de coletividade e de união entre as pessoas, assim como do quão resilientes e solidárias as pessoas podem ser:

Acho que a gente é muito mais capaz do que a gente imagina, de abdicar de coisas e de se importar com o outro. . . . Acho que a gente virou muito mais resiliente nesse sentido, muito mais solidário com o mundo, sabe? Eu vejo as pessoas se ajudando mais, estreitando relações também, as pessoas - a meu ver - finalmente valorizando as coisas que devem ser valorizadas (Claudia).

Este tema se encerra com as reflexões compartilhadas pelos participantes obtidas a partir da pandemia. Vale destacar que eles não romantizaram a travessia deste período, mas reconheceram alguns ganhos e aprendizados obtidos em meio ao contexto.

Considerações finais

A partir das experiências dos casais entrevistados, pode-se perceber nos depoimentos que, de modo geral, as dificuldades e desafios relacionados à pandemia ecoaram a nível individual e conjugal. Também foi possível observar algumas repercussões positivas para a relação, visto que propiciou aproximação física e consequente fortalecimento do vínculo conjugal, assim como o favorecimento de aprendizados e reflexões significativas para os participantes.

As dificuldades experienciadas a nível individual foram relatadas mais enfaticamente por quatro casais, sendo proeminente o relato do aumento do estresse e da ansiedade. O impacto negativo da pandemia na saúde mental, de modo geral, também foi verificado em amostras de norte-americanos, israelenses e indonésios (Bar-Kalifa et al., 2022Bar-Kalifa, E., Randall, A. K., & Perelman, Y. (2022). Daily dyadic coping during COVID-19 among Israeli couples. Emotion, 22(8), 1713-1722. doi: 10.1037/emo0000971
https://doi.org/10.1037/emo0000971...
; Budiartini, 2021Budiartini, N. N. (2021). Effect of COVID-19 related stress on marital quality during COVID-19 pandemic. Psychological Research and Intervention, 4(1), 9-18. doi: 10.21831/pri.v4i1.43287
https://doi.org/10.21831/pri.v4i1.43287...
; Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
https://doi.org/10.1111/famp.12700...
). A literatura sugere que fatores como pertencer a grupos de risco e sofrer mudanças de emprego agravaram o impacto psicológico individual (Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
https://doi.org/10.1111/famp.12700...
). Embora os participantes do presente estudo não integrassem grupos de risco, também demonstraram sentimento de insegurança diante da situação e receio de contaminar conhecidos, especialmente os mais vulneráveis ao vírus.

As restrições atreladas ao confinamento foram consideradas custosas pelos participantes, por limitarem o lazer, a prática de atividades rotineiras em ambientes externos e a interação física com outros, assim como verificado em estudos internacionais (Quezada-Berumen et al., 2020Quezada-Berumen, L. C., Landero-Hernández, R., & González-Ramírez, M. T. (2020). Satisfacción marital e impacto del confinamiento por Covid-19 en México. Interacciones, 6(3), Artigo e173. doi: 10.24016/2020.v6n3.173
https://doi.org/10.24016/2020.v6n3.173...
; Randall et al., 2022Randall, A. K., Leon, G., Basili, E., Martos, T., Boiger, M., Baldi, M., … Chiarolanza, C. (2022). Coping with global uncertainty: Perceptions of COVID-19 psychological distress, relationship quality, and dyadic coping for romantic partners across 27 countries. Journal of Social and Personal Relationships , 39(1), 3-33. doi: 10.1177/02654075211034236
https://doi.org/10.1177/0265407521103423...
; Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
https://doi.org/10.1111/famp.12700...
). Tais medidas restritivas também reverberaram em dificuldades para os relacionamentos conjugais, principalmente no âmbito da sexualidade e dos conflitos, à medida que trouxe novos temas de conflito, como aqueles relacionados ao modo de enfrentar a pandemia, e intensificou problemas já existentes no relacionamento (Luetke et al., 2020Luetke, M., Hensel, D., Herbenick, D., & Rosenberg, M. (2020). Romantic relationship conflict due to the COVID-19 pandemic and changes in intimate and sexual behaviors in a nationally representative sample of American adults. Journal of Sex & Marital Therapy, 46(8), 747-762. doi: 10.1080/0092623X.2020.1810185
https://doi.org/10.1080/0092623X.2020.18...
; Salazar & Morales, 2020Salazar, T. R., & Morales, Z. R. (2020). Intimidad y relaciones de pareja durante la pandemia de la COVID-19 en Guadalajara. Espiral, 27(78-79), 215-264. doi: 10.32870/eees.v28i78-79.7206
https://doi.org/10.32870/eees.v28i78-79....
; Torres-Cruz et al., 2022Torres-Cruz, D., Aznar-Martínez, B., & Pérez-Testor, C. (2022). Impact of the COVID-19 confinement on couple satisfaction and sexuality. Journal of Sex & Marital Therapy , 48(4), 363-375. doi: 10.1080/0092623X.2021.1998271
https://doi.org/10.1080/0092623X.2021.19...
). Tais dificuldades que surgiram ou se intensificaram neste contexto merecem atenção, pois o aumento de conflitos conjugais e dificuldades na vida sexual, por exemplo, aumentam as chances de pensar em separação (Rocha et al., 2023Rocha, F., Manara, K. M., Wagner, A., & Trentini, C. M. (2023). Impacts of social distancing on marital life during COVID-19 pandemic. Psico-USF , 28(2), 295-307. doi: 10.1590/1413-82712023280207
https://doi.org/10.1590/1413-82712023280...
).

Conforme descrito na literatura (Evans et al., 2020Evans, S., Mikocka-Walus, A., Klas, A., Olive, L., Sciberras, E., Karantzas, G., & Westrupp, E. M. (2020). From “it has stopped our lives” to “spending more time together has strengthened bonds”: The varied experiences of Australian families during COVID-19. Frontiers in Psychology, 11, Artigo 588667. doi: 10.3389/fpsyg.2020.588667
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; Fleming & Franzese, 2021Fleming, C. J. E., & Franzese, A. T. (2021). Should I stay or should I go? Evaluating intimate relationship outcomes during the 2020 pandemic shutdown. Couple and Family Psychology: Research and Practice, 10(3), 158-167. doi: 10.1037/cfp0000169
https://doi.org/10.1037/cfp0000169...
; Salazar & Morales, 2020Salazar, T. R., & Morales, Z. R. (2020). Intimidad y relaciones de pareja durante la pandemia de la COVID-19 en Guadalajara. Espiral, 27(78-79), 215-264. doi: 10.32870/eees.v28i78-79.7206
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), o aumento no desejo pela separação é, portanto, outro indicador de piora nos relacionamentos conjugais. Apesar da repercussão negativa da pandemia na relação conjugal ter sido corroborada por este estudo, os participantes não mencionaram o desejo de se separar. Pelo contrário, as falas reafirmaram a satisfação e o compromisso com o relacionamento, apesar das dificuldades contextuais. O ambiente em que as entrevistas foram realizadas, isso é, com ambos os parceiros juntos, pode ter influenciado neste resultado.

Para além das dificuldades vivenciadas individual e conjuntamente, a pandemia também reverberou de modo positivo em alguns aspectos relacionais. Esse contexto possibilitou, por exemplo, um nível de convivência nunca experimentado pela maioria dos participantes, repercutindo na intensificação da intimidade e do vínculo conjugal, justamente em uma etapa do ciclo vital familiar em que o estabelecimento da intimidade e do compromisso é uma das principais tarefas. Ainda, a companhia do parceiro amoroso foi considerada algo positivo em meio a tantas dificuldades suscitadas pela pandemia, corroborando dados internacionais que indicaram que a conjugalidade se manteve satisfatória, apesar das dificuldades vivenciadas a nível individual (Budiartini, 2021Budiartini, N. N. (2021). Effect of COVID-19 related stress on marital quality during COVID-19 pandemic. Psychological Research and Intervention, 4(1), 9-18. doi: 10.21831/pri.v4i1.43287
https://doi.org/10.21831/pri.v4i1.43287...
; Weber et al., 2021Weber, D. M., Wojda, A. K., Carrino, E. A., & Baucom, D. H. (2021). Love in the time of COVID-19: A brief report on relationship and individual functioning among committed couples in the United States while under shelter-in-place orders. Family Process , 60(4), 1381-1388. doi: 10.1111/famp.12700
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). Circunstâncias extremas e de crise, como a pandemia de covid-19, podem motivar os indivíduos a investirem nos relacionamentos mais significativos, favorecendo o aumento da intimidade e do compromisso entre os parceiros (Stanley & Markman, 2020Stanley, S. M., & Markman, H. J. (2020). Helping couples in the shadow of COVID-19. Family Process, 59(3), 937-955. doi: 10.1111/famp.12575
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).

Pesquisas internacionais indicaram que o uso de estratégias de coping positivo se associou a maior satisfação conjugal e menor estresse durante a pandemia (Enestrom & Lydon, 2021Enestrom, M. C., & Lydon, J. E. (2021). Relationship satisfaction in the time of COVID-19: The role of shared reality in perceiving partner support for frontline health-care workers. Journal of Social and Personal Relationships, 38(8), 2330-2349. doi: 10.1177/02654075211020127
https://doi.org/10.1177/0265407521102012...
; Genç et al., 2021Genç, E., Su, Y., & Turhan, Z. (2021). The mediating role of dyadic coping on the effects of COVID-19 and relationship satisfaction among Turkish couples. The American Journal of Family Therapy, 51(4), 421-439. doi: 10.1080/01926187.2021.1984338
https://doi.org/10.1080/01926187.2021.19...
; Jiang et al., 2022Jiang, D., Chiu, M. M., & Liu, S. (2022). Daily positive support and perceived stress during COVID-19 outbreak: The role of daily gratitude within couples. Journal of Happiness Studies, 23, 65-79. doi: 10.1007/s10902-021-00387-0
https://doi.org/10.1007/s10902-021-00387...
; Randall et al., 2022Randall, A. K., Leon, G., Basili, E., Martos, T., Boiger, M., Baldi, M., … Chiarolanza, C. (2022). Coping with global uncertainty: Perceptions of COVID-19 psychological distress, relationship quality, and dyadic coping for romantic partners across 27 countries. Journal of Social and Personal Relationships , 39(1), 3-33. doi: 10.1177/02654075211034236
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). Embora o tipo de estratégia de enfrentamento não tenha sido mapeado neste estudo, é provável que os participantes também tenham adotado estratégias positivas diante das dificuldades, visto que afirmaram experimentar maior certeza sobre o futuro da relação. Observar-se competente no enfrentamento do desafio macroestrutural da pandemia provavelmente facilitou a avaliação positiva da capacidade das díades para lidar com os desafios futuros. Além disso, tal achado também pode ser um indicador da existência de padrões flexíveis prévios à pandemia (Silva et al., 2020Silva, I. M., Schmidt, B., Lordello, S. R., Noal, D. S., Crepaldi, M. A., & Wagner, A. (2020). As relações familiares diante da covid-19: Recursos, riscos e implicações para a prática da terapia de casal e família. Pensando Famílias, 24(1), 12-28.).

Nessa perspectiva, outros aspectos positivos foram descritos, apesar dos inegáveis impactos negativos da covid-19. Dentre os principais aprendizados, destacam-se os ligados à valorização da vida e das relações significativas, à importância de demonstrar afeto e não adiar sonhos. Também apareceu o reconhecimento da resiliência e da solidariedade humanas, citados pelos entrevistados. Assim, pode-se dizer que as adversidades enfrentadas no período da pandemia fizeram os casais do estudo refletirem além do seu contexto microssocial, registrando valores humanos fundamentais, o que pode ser tomado como indicador de maior maturidade.

A etapa em que os entrevistados se encontravam, a de formação do casal, demanda importantes tarefas à dupla, tais como o fortalecimento do compromisso e do vínculo afetivo (Ríos-González, 2011Ríos-González, J. A. (2011). Los ciclos vitales de la familia y la pareja ¿Crisis u oportunidades? (2a ed.). Madrid, España: CCS.), o balanceamento da individualidade e da conjugalidade, de modo a preservar a diferenciação entre os parceiros ao mesmo tempo que fortalecem o laço conjugal (Féres-Carneiro, 1998Féres-Carneiro, T. (1998). Casamento contemporâneo: O difícil convívio da individualidade com a conjugalidade. Psicologia: Reflexão e Crítica, 11(2), 379-394. doi: 10.1590/S0102-79721998000200014
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; McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). Becoming a couple: The joining of families. In M. McGoldrick, N. G. Preto & B. Carter (Eds.), The expanding family life cycle: Individual, family, and social perspectives (5a ed., pp. 259-279). London, England: Pearson.), além de negociações relacionadas à moradia conjunta (por exemplo, a divisão das tarefas domésticas, a administração financeira, a organização do lazer, entre outros) (Heckler & Mosmann, 2014Heckler, V. I., & Mosmann, C. P. (2014). Casais de dupla carreira nos anos iniciais do casamento: Compreendendo a formação do casal, papéis, trabalho e projetos de vida. Barbarói, 2(41), 119-147.; McGoldrick, 2016McGoldrick, M. (2016). Becoming a couple: The joining of families. In M. McGoldrick, N. G. Preto & B. Carter (Eds.), The expanding family life cycle: Individual, family, and social perspectives (5a ed., pp. 259-279). London, England: Pearson.). Por esses motivos, os anos iniciais do casal são considerados desafiadores e, ao mesmo tempo, significativos, devido a sua repercussão na trajetória ao longo da vida a dois (Karney & Bradbury, 2020Karney, B. R., & Bradbury, T. N. (2020). Research on marital satisfaction and stability in the 2010s: Challenging conventional wisdom. Journal of Marriage and Family, 82(1), 100-116. doi: 10.1111/jomf.12635
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; Lavner & Bradbury, 2019Lavner, J. A., & Bradbury, T. N. (2019). Trajectories and maintenance in marriage and long-term committed relationships. In D. Schoebi & B. Campos (Eds.), New directions in the psychology of close relationships (pp. 28-44). London, England: Routledge. doi: 10.4324/9781351136266-3
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; Tong et al., 2021Tong, W., Jia, J., He, Q., Lan, J., & Fang, X. (2021). The trajectory of marital satisfaction among Chinese newlyweds: Intrapersonal, interpersonal, and stress predictors. Developmental Psychology, 57(4), 597-608. doi: 10.1037/dev0001156
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; Williamson & Lavner, 2020Williamson, H. C., & Lavner, J. A. (2020). Trajectories of marital satisfaction in diverse newlywed couples. Social Psychological and Personality Science, 11(5), 597-604. doi: 10.1177/1948550619865056
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). Os casais participantes tinham tempo de relacionamento total diversificado, e o acúmulo de tempo juntos (os casais A, B e G estavam há mais de seis anos juntos) parece ter facilitado, em alguma medida, o enfrentamento dos desafios da fase. Esses casais pareciam compreender com maior profundidade as necessidades e modo de funcionamento um do outro, o que pode ter auxiliado nessa transição. Como os participantes estavam construindo a sua conjugalidade em meio à pandemia, é importante verificar que, de modo geral, demonstraram cumprir as supracitadas tarefas da fase. Assim, pode-se pensar na possibilidade de um viés na constituição da amostra, tendo em vista que indivíduos insatisfeitos com o relacionamento ou enfrentando dificuldades mais expressivas possivelmente não tenham se disponibilizado a conversar sobre esses aspectos em um contexto de pesquisa que requeria a realização de uma entrevista conjunta com ambos os membros do casal.

Desta forma, reitera-se que os dados encontrados se limitam à especificidade do grupo pesquisado - casais heterossexuais, adultos jovens, sem filhos, com alta escolaridade e residentes na região metropolitana de Porto Alegre. Nesse sentido, é necessário considerar o contexto socioeconômico favorável do grupo pesquisado ao avaliar os resultados deste estudo. Casais que vivem em contextos de vulnerabilidade, ou que vivenciaram perdas laborais, financeiras ou de saúde na pandemia possivelmente se depararam com maiores desafios e dificuldades, assim como podem não ter observado os mesmos ganhos relatados pelos participantes deste estudo. Considera-se relevante que pesquisas futuras avaliem amostras mais diversificadas no que diz respeito, por exemplo, à escolaridade, faixa etária, nível socioeconômico, orientação sexual e região do país, bem como grupos que tenham tido impactos financeiros e de saúde mais significativos em decorrência da pandemia. Pesquisas quantitativas representativas da população brasileira são bem-vindas por fornecerem dados generalizáveis, podendo respaldar ações futuras de intervenção com casais. De todo modo, considera-se que este estudo contribuiu com o conhecimento nesta área, fornecendo informações qualitativas sobre a influência da pandemia de covid-19 na etapa de formação desses casais e agregando dados de amostras brasileiras sobre a vivência relacional durante a pandemia.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    16 Abr 2022
  • Revisado
    03 Jan 2023
  • Aceito
    20 Jun 2023
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