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Determinação de temperatura de transição dúctil-frágil de plásticos através de testes de impacto instrumentado

Determination of the brittle-ductile transition temperature in plastics by intrumented impact test 76

Resumos

Nesse trabalho é realizada uma análise descritiva do teste de impacto tipo Izod instrumentado e são mostradas suas vantagens em relação ao impacto convencional na obtenção de diagramas de força e energia de fratura em tempo-real. Estes diagramas além de fornecerem dados do material em termos de sua resistência ao impacto tradicional, contém informações detalhadas sobre os mecanismos de fratura e as principais características apresentadas durante a propagação da trinca no corpo de prova. A medida da variação da resistência ao impacto com a temperatura pode ser utilizada como uma forma de se determinar a existência de transições dúctil-frágeis ou alternativamente a suscetibilidade de materiais poliméricos à concentração de tensões, i.e., profundidade e raio da extremidade do entalhe. As curvas de carga e energia, obtidas à várias temperaturas, são utilizadas na determinação de parâmetros do material e da temperatura de transição dúctil-frágil de um copolímero de acrilonitrila-butadieno-estireno (ABS). A análise da superfície de fratura por microscopia eletrônica de varredura, (MEV) permitiu a correlação da forma das curvas de impacto com o modo de fratura observado e detalhes da microestrutura do material.

Tenacidade; impacto instrumentado; transição dúctil-frágil; fratura; microscopia eletrônica de varredura; ABS


The present work intends to point out some of the advantages of using instrumented impact testing over conventional non-instrumented methods in the failure analysis of plastics. In this method, force-displacement diagrams are obtained in "real-time" and used to calculate partial energies of initiation and complete fracture of the specimens. The diagrams yield important information on fracture mechanisms and main characteristics of the failure process. Variations of impact energy with temperature can be used in the determination of brittle-ductile transitions or alternatively for evaluation of material susceptibility to stress concentrations, i.e. depth and crack tip radii. The load and energy diagrams were used to illustrate the calculation of the brittle-ductile transition temperature of an acrilonitrile-butadiene-styrene (ABS) terpolymer by the new method. Analysis of the specimens fractured surfaces by scanning electron microscopy, allowed important correlations between the mode of failure and the main features observed on the load and energy diagrams.

Toughness; instrumented impact test; brittle-ductile transitions; fracture; scanning electron microscopy; ABS


ARTIGO TÉCNICO CIENTÍFICO

Determinação de temperatura de transição dúctil-frágil de plásticos através de testes de impacto instrumentado.

Carlos A. Correa, Roberto S. Yamakawa e Elias Hage Jr.

RESUMO: Nesse trabalho é realizada uma análise descritiva do teste de impacto tipo Izod instrumentado e são mostradas suas vantagens em relação ao impacto convencional na obtenção de diagramas de força e energia de fratura em tempo-real. Estes diagramas além de fornecerem dados do material em termos de sua resistência ao impacto tradicional, contém informações detalhadas sobre os mecanismos de fratura e as principais características apresentadas durante a propagação da trinca no corpo de prova. A medida da variação da resistência ao impacto com a temperatura pode ser utilizada como uma forma de se determinar a existência de transições dúctil-frágeis ou alternativamente a suscetibilidade de materiais poliméricos à concentração de tensões, i.e., profundidade e raio da extremidade do entalhe. As curvas de carga e energia, obtidas à várias temperaturas, são utilizadas na determinação de parâmetros do material e da temperatura de transição dúctil-frágil de um copolímero de acrilonitrila-butadieno-estireno (ABS). A análise da superfície de fratura por microscopia eletrônica de varredura, (MEV) permitiu a correlação da forma das curvas de impacto com o modo de fratura observado e detalhes da microestrutura do material.

Palavras-chave: Tenacidade, impacto instrumentado, transição dúctil-frágil, fratura, microscopia eletrônica de varredura, ABS.

Determination of the brittle-ductile transition temperature in plastics by intrumented impact test 76

The present work intends to point out some of the advantages of using instrumented impact testing over conventional non-instrumented methods in the failure analysis of plastics. In this method, force-displacement diagrams are obtained in "real-time" and used to calculate partial energies of initiation and complete fracture of the specimens. The diagrams yield important information on fracture mechanisms and main characteristics of the failure process. Variations of impact energy with temperature can be used in the determination of brittle-ductile transitions or alternatively for evaluation of material susceptibility to stress concentrations, i.e. depth and crack tip radii. The load and energy diagrams were used to illustrate the calculation of the brittle-ductile transition temperature of an acrilonitrile-butadiene-styrene (ABS) terpolymer by the new method. Analysis of the specimens fractured surfaces by scanning electron microscopy, allowed important correlations between the mode of failure and the main features observed on the load and energy diagrams.

Keywords: Toughness, instrumented impact test, brittle-ductile transitions, fracture, scanning electron microscopy, ABS.

Introdução

A avaliação da resistência ao impacto de materiais poliméricos é um fator decisivo na seleção de materiais para aplicações de engenharia. Este materiais podem apresentar ductilidade em condições de ensaio quasi-estáticas como em ensaios de tração convencional a baixas velocidades. No entanto, quando submetidos a testes dinâmicos, i.e., testes de impacto sob elevadas taxas deformacionais ou a baixas temperaturas, alguns destes materiais apresentam tendência à fragilização. Aspectos críticos como geometria da peça, concentração de tensões, falhas ou defeitos podem provocar um aumento nessa tendência, sendo necessária uma avaliação criteriosa do comportamento do material sob diversas condições de ensaio. Embora existam inúmeros testes de impacto padronizados a maior dificuldade encontrada consiste em se correlacionar os resultados dos testes com o desempenho do material em serviço. Desta forma, estes testes são em sua maioria muito utilizados para avaliar de forma comparativa a tenacidade de materiais diferentes sob as mesmas condições de ensaio, e não necessariamente para prever o comportamento de impacto de produtos acabados.

Os testes de impacto podem, de uma forma geral, ser classificados em duas categorias com base no método utilizado na obtenção da energia de impacto[1]:

• Métodos nos quais a energia de impacto é ajustada até que uma determinada fração de um lote de corpos de prova ensaiados se quebrem. Ex.: Ensaios de impacto por queda de dardo (Falling weight tests);

• Métodos nos quais a energia cinética do martelo é relativamente maior do que a energia requerida para fraturar o corpo de prova. ex.: Ensaios Charpy, Izod e tração-impacto.

Os testes de impacto com pêndulos mais utilizados são os ensaios do tipo Izod e Charpy que permitem a comparação de vários níveis de tenacidade entre materiais plásticos, através da quebra de corpos de prova entalhados sob condições inteiramente padronizadas. Esses ensaios são padronizados segundo as normas internacionais ASTM D256 (Método A) e ISO R180-A para o teste de resistência ao impacto Izod (entalhe em V) e ASTM D256 (Método B) e ISO R179-A para o Charpy (entalhe em V) e DIN 53453 e ISO R179-C (entalhe em U).

Ensaio de impacto convencional com pêndulo a martelo

Os princípios físicos envolvidos em testes de impacto com pêndulos a martelo são baseados na transformação de parte da energia potencial armazenada, pelo pêndulo no repouso, em energia absorvida pela ruptura do corpo de prova, durante o movimento pendular do martelo conforme ilustrado na Figura 1.


Onde m= massa do martelo;

g = aceleração da gravidade;

h = altura de lançamento do martelo;

L = comprimento do martelo

a = ângulo de lançamento do martelo

h1 = altura alcançada pelo martelo após o impacto

A Figura 2 ilustra esquematicamente a configuração do ensaio pêndulo a martelo tipo Izod normalizado segundo a ASTM D-256/ISO 180R[3,4]:


Nos resultados dos ensaios de impacto tipo Izod, a resistência ao impacto é quantificada em termos da energia de impacto absorvida por unidade de espessura do corpo de prova ao longo do entalhe. Alternativamente, a resistência ao impacto Izod pode ser expressa em termos da energia absorvida no impacto dividida pela área do corpo de prova posterior ao entalhe (área de ligamento) - conforme especificado na norma ISO 180[4]. Assim, no primeiro caso a resistência ao impacto Izod de corpos de prova entalhados seria dada em J/m, Kgf-cm/cm ou libra-pé/polegada de entalhe, e no segundo caso os valores seriam fornecidos em J/m2, Kgf-cm/cm2 ou librapé / pol2.

Cálculo da resistência ao impacto IZOD - ASTM D256/ISO R180

Onde x.y = área de ligamento do corpo de prova em m2.

Ensaio de impacto instrumentado com pêndulo a martelo

No ensaio de impacto instrumentado um sensor piezoelétrico é adaptado à extremidade do martelo, para medir a variação da força F(t) e um dispositivo óptico para medidas de deflexão do corpo de prova em função do tempo durante a fratura. As quantidades obtidas a partir do sinal F(t) são a velocidade do martelo instrumentado n(t), a posição do martelo s(t) e a energia absorvida pelo corpo de prova E(t) durante a fratura. Os principais elementos envolvidos na aquisição de dados em um ensaio de impacto instrumentado são ilustrados na Figura 3.


A principal vantagem do teste de impacto instrumentado em relação ao impacto convencional é que neste é possível se obter informações detalhadas acerca do comportamento dúctil-frágil do material durante o início e propagação da trinca, através do monitoramento da força aplicada sobre o piezoelétrico na extremidade do martelo e a deformação do corpo de prova após o choque. Estas quantidades são determinadas em tempo real com base nas relações físicas descritas a seguir.

Aquisição dos parâmetros de ensaio no impacto instrumentado

A velocidade do martelo n(t) pode ser obtida pela integração do sinal F(t) fornecido pelo sensor piezoelétrico utilizando a lei de Newton para conservação de energia:

onde n0 = velocidade inicial de impacto do martelo

m= massa do martelo; t= tempo de ensaio

A deformação do corpo de prova s(t) pode ser determinada pela integração do sinal de velocidade do martelo n(t)

A partir dos parâmetros de ensaio n(t) e s(t), a energia absorvida pelo corpo de prova durante a fratura pode ser calculada. Assim, a energia total de fratura ET bem como as energias parciais podem ser determinadas por impacto instrumentado conforme ilustrado no diagrama F(t)-E(t) da Figura 4.


A energia absorvida no impacto ou energia de fratura E(n) pode ser determinada pela diferença de altura inicial do martelo e após o impacto definida pela Equação 2 ou através da integração da curva de força-tempo F(t) pela variação de momento do martelo:

ou

onde nt=velocidade do martelo ao término da fratura (tf )

Alternativamente, a energia de impacto pode ser calculada em termos da variação do sinal de força com a posição do martelo durante a fratura, F(s):

onde s=0 no início da fratura e s=s para t=tf.

Energias totais e parciais de impacto

A energia requerida para completa ruptura de um corpo de prova em um ensaio do tipo IZOD é constituída dos seguintes componentes de acordo com a norma ASTM D-256:

Onde:

EA = Energia requerida para iniciar a fratura do corpo de prova entalhado;

EB = Energia requerida para propagação da fratura a partir da extremidade do entalhe através da área de ligamento do corpo de prova;

EC = Energia requerida para arremesso da seção fraturada do corpo de prova (toss correction);

ED = Energia requerida para deflexão do corpo de prova antes do início do crescimento da trinca;

EE = Energia dissipada com a vibração do martelo após o choque;

EF = Energia dissipada na vibração de toda estrutura do equipamento;

EG = Energia dissipada por atrito (dissipação em rolamentos e resistência do ar);

EH = Energia dissipada por deformação plástica na região de choque do martelo com o corpo de prova;

EI = Energia dissipada por fricção na região de contato do martelo com o corpo de prova.

Determinação de parâmetros materiais a partir do diagrama de impacto instrumentado

No diagrama da Figura 4 são mostradas as curvas de força F(t) e de energia E(t) obtidas durante o processo de fratura de uma corpo de prova tipo IZOD com martelo instrumentado. A força exercida sobre o piezoelétrico acoplado à extremidade do martelo é uma medida da resistência do material à propagação da trinca e fornece informações importantes sobre o comportamento de fratura do material. O gráfico de energia representa a energia total ET, absorvida durante o processo de fratura. A partir das duas curvas do diagrama F(t)-E(t) é possível se obter os seguintes parâmetros materiais

Fy: Carga limite para início de escoamento generalizado na região de ligamento do corpo de prova, caracterizando a região de transição de comportamento puramente elástico, segundo a lei de Hooke, para o comportamento não-linear;

Fmax: Máximo da curva de força F(t), (correspondente ao pico);

Finst: Carga no início da propagação instável, i.e. queda brusca na força pela propagação instável da trinca;

Fp: Carga no término da propagação instável da trinca e início da deformação plástica

Valores correspondentes de deformação são sy; smax; sinst; e sp, respectivamente.

Da mesma forma que os termos relativos à força de impacto F(t), a energia total ET e as energias parciais EA e EP também podem ser determinadas com base na definição da ASTM D-256 e obtidas diretamente do diagrama de impacto instrumentado ilustrado na Figura 4.

EA= Energia parcial para iniciação da propagação da trinca correspondente à área sob a curva F(t) de (F=0) até a carga máxima (Fmax) correspondendo também a energia parcial de impacto para inicio da propagação instável da trinca (Einst);

EEP = Energia plástica correspondente à área sob a curva F(t) entre o ponto de escoamento Fy e o início da propagação instável da trinca Fmax. Nessa região dá-se início a ocorrência de processos dissipativos normalmente indicada por esbranquiçamento sob tensão da região do entalhe ou presença de outros componentes dissipativos da energia total (ED; EH e EI)

ET = Energia requerida para fratura completa do corpo de prova. Corresponde à soma das energias parciais de iniciação e propagação da trinca e outros processos dissipativos.

Na literatura são encontrados inúmeros exemplos de aplicação da utilização do impacto instrumentado na caracterização de materiais poliméricos a partir de diagramas de energia de iniciação e propagação da trinca[5-7]. O monitoramento de propriedades através dos parâmetros da mecânica de fratura (K1C; G1C e J1C) utilizando o impacto instrumentado também têm sido relacionados na literatura[8-9].

Fraturas típicas observadas em testes de impacto

Os materiais em geral podem apresentar dois modos de fratura: dúctil ou frágil. Esta classificação é baseada na capacidade do material apresentar ou não deformação plástica durante a fratura. Qualquer processo de fratura normalmente envolve duas etapas ¾ iniciação e propagação da trinca. O modo de fratura é fortemente dependente no mecanismo de propagação da trinca. Desta forma, materiais dúcteis podem exibir níveis consideráveis de deformação plástica nas vizinhanças da trinca representada por uma elevada absorção de energia durante sua propagação. Por outro lado, em materiais frágeis ou vítreos deve ocorrer pouca ou nenhuma deformação plástica durante a fratura. O tipo e as etapas do processo de fratura podem ser claramente visualizadas em diagramas F(t)-E(t) do teste de impacto instrumentado do tipo apresentado na Figura 4, uma vez que o máximo da curva F(t) representa o início da propagação da trinca.

Em ensaios com corpos de prova entalhados, o entalhe tem por finalidade concentrar tensões, minimizar deformação plástica e guiar a propagação da trinca ao longo da área de ligamento do corpo de prova. Idealmente, em materiais tipicamente frágeis, não há qualquer deformação plástica antes e após a propagação da trinca, sendo que o máximo da curva F(t) representa o início da propagação instável da trinca com a força caindo a zero bruscamente. Em materiais dúcteis o máximo da curva F(t) é precedido por desvios da linearidade antes do processo de iniciação e propagação estável da trinca a velocidades reduzidas após a iniciação. Na fratura dúctil a força não cai a zero bruscamente uma vez que a deformação plástica nas vizinhanças da propagação da trinca consome energia continuamente até a fratura completa do corpo de prova (ver Figura 4). Em polímeros a deformação plástica pode ocorrer através de processos dilatacionais, i.e. com aumento de volume (microfibrilação e cavitação); não dilatacionais, i.e. a volume constante (escoamento por cisalhamento) ou através de ambos[1,10-11].

Uma classificação mais abrangente do conceito dúctil e frágil segundo a ASTM D-256 - além da energia de iniciação e propagação da trinca - outros processos dissipativos que compõe a energia total de fratura ET da equação 8, devem ser considerados.

• Materiais tipicamente frágeis: representada pelos componentes EA e EC. Para materiais com resistência ao impacto inferior a 27 J/m deve-se efetuar a correção de arremesso ("toss correction") - ASTM D-256 (Método C)

• Materiais dúcteis: representada pelos componentes EB; EE e EI;

• Materiais "moles": devem ser consideradas perdas por deflexão e perdas por indentação. Assim, as componentes parciais de energia ED e EH tornam-se significativas e devem ser avaliadas.

Vale a pena ressaltar que a classificação "frágil" ou "dúctil" em materiais é um conceito relativo e depende fortemente das condições de ensaio. Assim, particularmente em materiais plásticos, devido ao caráter viscoelástico, a tenacidade é uma função da temperatura, taxa deformacional, geometria e estado de tensões. Além disso, alguns polímeros podem apresentar grandes variações de resistência ao impacto devido a extrema sensibilidade ao nível de concentração de tensões[1-2]. Estes materiais devem ser avaliados segundo a norma ASTM D-256 (Método D) quanto a sensibilidade ao raio da extremidade do entalhe[3].

Caracterização do comportamento de fratura do ABS sob impacto instrumentado

Copolímeros de Acrilonitrila-Butadieno-Estireno (ABS) representam uma vasta gama de termoplásticos com propriedades que possibilitam diversas aplicações de engenharia. Estes materiais pertencem a classe dos chamados plásticos estirênicos sendo obtidos através da interpolimerização de copolímeros de estireno-acrilonitrila com borracha de polibutadieno. As propriedades de impacto desses materiais dependem fortemente da morfologia e das características intrínsecas dos componentes do sistema tenacificado - basicamente da estrutura e dispersão da fase rica em polibutadieno na matriz SAN e da quantidade de SAN enxertado em relação ao SAN total presente na mistura[12]. A utilização de impacto instrumentado na caracterização do ABS permite o monitoramento das componentes parciais de energia de impacto e determinação de transições dúctil-frágil como função da morfologia do sistema ou da temperatura de teste. Nesse trabalho, o impacto instrumentado Izod é utilizado para determinação da energia de iniciação da trinca e fratura completa de uma formulação comercial de ABS na faixa de 23 a ¾80 oC. A relação entre as energias de iniciação e de fratura é utilizada como método para determinação da temperatura de transição dúctil-frágil (TB) do material.

Experimental

Amostras de ABS 810 da Nitriflex SA (Bayer) descrita na Tabela 1, foram injetadas em corpos de prova tipo Izod (63.5x12.0x3.17) mm e a seguir entalhadas segundo a norma ASTM D256. Os corpos de prova entalhados foram acondicionados em atmosfera controlada de 23 oC e 65% umidade relativa por 48 horas antes do ensaio. Os testes de impacto instrumentado foram realizados entre as temperaturas 23 e ¾80 oC em câmara climatizada com nitrogênio líquido, utilizando uma máquina CEAST Resil 25 com martelo instrumentado para ensaio tipo Izod. Foram computados diagramas de força e energia em função do tempo e deslocamento do martelo após o impacto utilizando parâmetros da Tabela 2.

As superfícies de fratura após o impacto foram observadas em um microscópio eletrônico de varredura LEO S400 utilizando um detetor de elétrons secundários; voltage de aceleração de 20 keV e distância de trabalho de 31 mm.

Resultados e Discussão

Temperatura de transição dúctil-frágil (TB)

Em materiais viscoelásticos como polímeros, os processos de relaxação são extremamente sensíveis a variações de temperatura. Uma das principais utilidades dos testes de impacto com pêndulos a martelo do tipo Izod e Charpy é a possibilidade de determinação de alterações no modo de fratura do material com a temperatura. Assim, a temperatura na qual ocorre uma mudança acentuada no comportamento de fratura ¾ passando de um caráter dúctil para frágil - é definida como a temperatura de transição dúctil-frágil, TB, do material. Na figura 5 são apresentadas curvas de iniciação (Energia no pico, EA) e de fratura (Energia total, ET) para o ABS 810, obtidas por impacto Izod instrumentado entre 23 e -80 oC .


Na Tabela 3 são detalhados valores da Força máxima Fmax, energia para iniciação da fratura ou energia no pico EA, energia total de fratura ET e o indíce de fragilização BI obtidos a partir de diagramas F(t)E(t) na faixa de 23 a ¾80 oC. O índice de fragilização BI é calculado com base na equação 9 e utilizado na determinação da temperatura de transição dúctil-frágil, TB, conforme ilustrado na Figura 5.

O índice de fragilização, BI é determinado pela relação entre a energia de propagação (ET-EA) e a energia de iniciação da trinca dada pela relação:

onde

EA = Energia para iniciação da trinca (pico);

ET= Energia total de fratura

De acordo com as faixas de BI os tipos de fratura podem ser classificados em:

Frágil: BI£40%

Dúctil-Frágil: 40%£BI£53%

Dúctil BI³ 53%

A temperatura de transição dúctil-frágil TB é definida como a temperatura na qual o índice de fragilização corresponde a 50%, i.e. BI=50% .

Para o ABS 810 a temperatura de transição dúctil-frágil TB para BI de 50% determinada com base na equação (9) foi ¾52,50 oC.

Análise de fratura do ABS por microscopia eletrônica de varredura

De forma complementar aos diagramas F(t)-E(t) do impacto instrumentado, a análise da superfície de fratura pode ser utilizada para auxiliar a determinação da temperatura de transição dúctil-frágil do material. A microscopia eletrônica de varredura possui excelente profundidade de foco e permite a observação de detalhes da superfície de fratura após impacto e o modo de fratura do material. Assim é possível se correlacionar a tenacidade medida no teste de impacto com a natureza da fratura observada ao microscópio. A fratura dúctil apresenta-se através de regiões cisalhadas enquanto na fratura frágil são observadas superfícies lisas ou espelhadas decorrentes de possíveis clivagens. Além das informações sobre o modo de fratura a superfície de fratura fornece informações importantes sobre os caminhos de menor energia para propagação da trinca indicando possíveis falhas, concentração de tensões, morfologia, defeitos ou contaminações no material fraturado.

A superfície de fratura do ABS-810 após teste de impacto à ¾80 oC representando a área de ligamento do corpo de prova posterior ao entalhe, é ilustrada na Figura 6. O padrão de fratura observado é de natureza tipicamente frágil ilustrando o locus de fratura e superfícies espelhadas. A formação de estrias do tipo crinas de fratura caracteriza as regiões em que houve mudanças de aceleração durante a propagação da trinca.


Nas figuras 7 e 8 são ilustradas superfícies de fratura do ABS 810 fraturado à temperatura ambiente e a ¾60 oC, respectivamente. A temperatura ambiente a superfície de fratura possui características tipicamente dúcteis com a presença de regiões de escoamento por cisalhamento decorrente de "esbranquiçamento" sob tensão. À ¾60 oC (Figura 8) são observadas regiões de transição dúctil-frágil, nas quais são claramente distintas as mudanças de aceleração durante a propagação da trinca. Nas regiões em que houve fratura tipicamente frágil, superfícies espelhadas permitem a observação de detalhes da morfologia do material caracterizada por partículas de borracha finamente dispersas na matriz de SAN (Figura 9a). Ao contrário, em regiões com excessiva deformação plástica a morfologia apresenta-se totalmente descaracterizada pelo cisalhamento (Figura 9b).




A microscopia eletrônica de varredura fornece informações complementares ao impacto instrumentado para caracterização do tipo de fratura. O monitoramento da propagação da trinca durante o impacto em materiais que apresentam transições dúctil-frágil é de extrema importância uma vez que a energia de impacto é constituída por energias parciais que caracterizam a tenacidade do polímero. Desvios da linearidade no diagrama de F(t) indicam processos dissipativos que podem ocorrer na extremidade da trinca antes que esta se propague. Assim, existe uma correlação direta entre o desvio da linearidade ou início de escoamento com a formação de uma zona de "esbranquiçamento" sob tensão na extremidade do entalhe. A formação desta zona é de grande importância no estudo da mecânica de fratura de materiais que não são totalmente frágeis, i.e. não seguem a lei de Griffith.

No diagrama de F(t)-E(t), a região de propagação instável da trinca representada pela queda brusca na força após o pico de máximo (Figura 4). A aceleração brusca da propagação da trinca no material é caracterizada por superfícies de fratura tipicamente frágeis tal como observadas no ABS à ¾80o C. Regiões de transição dúctil-frágil também podem ser observadas no MEV e correlacionadas com os diagramas de impacto instrumentado, visto que a presença de alguma tenacidade residual após a propagação instável da trinca é refletida por alterações de energia absorvida na região dúctil do diagrama F(t)-E(t).

Conclusões

O impacto instrumentado apresenta inúmeras vantagens em relação ao impacto convencional. Através dos respectivos diagramas de F(t)-E(t) é possível se acompanhar o processo de iniciação e propagação da fratura além de outros processos dissipativos relacionados ao modo de fratura. O ensaio se torna extremamente útil na determinação da temperatura de transição dúctil-frágil de polímeros tenacificados a partir da determinação do índice de fragilização do material à várias temperaturas. O índice de fragilização é determinado a partir da relação entre a energia absorvida para iniciação da trinca (EA) e a energia total para completa fratura do corpo de prova ET. A observação da superfície de fratura por MEV permite a correlação do tipo de fratura às características apresentadas pelo diagrama F(t)-E(t). Parâmetros obtidos em termos de força e energia de impacto podem ser determinados a partir do diagrama e utilizados na caracterização da tenacidade do material. O método apresentou excelentes resultados na determinação da temperatura de transição dúctil-frágil de um ABS comercial, possibilitando o monitoramento do comportamento de fratura do material em função da temperatura de ensaio.

Agradecimentos

Os autores agradecem à FAPESP processos 97/09741-9 e 96/8550-2 pelo apoio financeiro concedido para execução desse trabalho. Agradecimentos ao Sr. Mário Miranda pela confecção dos corpos de prova em injetoras adquiridas pelo PADCT.

Recebido: 22/09/98

Aprovado: 22/01/99

Carlos A. Correa, Roberto S. Yamakawa, Elias Hage Jr., Departamento de Engenharia de Materiais, Universidade Federal de São Carlos, C.P. 676, CEP: 13564-905, São Carlos, SP.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jun 2010
  • Data do Fascículo
    1999

Histórico

  • Aceito
    22 Jan 1999
  • Recebido
    22 Set 1998
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