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Deixa o povo falar

Deixa o povo falar

No dia 15 de janeiro de 1985, data da reunião do Colégio Eleitoral que escolheu indiretamente o novo presidente da República, o repórter Hamilton Cardoso, da revista LUA NOVA, deslocou-se por vários pontos da cidade de São Paulo entrevistando a população sobre o significado do governo Tancredo Neves. Ele realizou as primeiras entrevistas no Largo de Pinheiros, a seguir foi para a região central da cidade, na Praça D. José Gaspar. Daí, rumou para a estação Tatuapé do Metrô, indo depois para estações rodoviária (Santana) e ferroviária (Luz), e finalmente na Praça da Sé, onde se realizava a festa da vitória, organizada pelo PMDB e a Aliança Democrática para comemorar a vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Quase meia centena de pessoas responderam à seguinte pergunta: "Qual o significado do governo Tancredo Neves para você?".

Pedro Leite, vigilante, 23 anos.

"Tancredo Neves é uma boa pessoa. Para mim ele é bacana, mas eu não posso falar de política, porque, de política, são eles lá que sabem. Eu não conheço política."

Ricardo Honorato da Cruz, ajudante geral, 27 anos, desempregado.

"Porque você vê esta bagunça que está aí, não é? Todo mundo com dificuldades, nesta situação financeira. Estão todos atrás de serviço e ninguém encontra. Então, isto cria uma bagunça tremenda. Eu acho que o novo governo tem que resolver isto, não é? Eu acredito que ele possa ser um bom presidente, pra frente... Pode ser, sei lá..."

Edson Couto, motorista, 30 anos, casado.

"Para mim não quer dizer nada. Nem ataco nem defendo."

Pedro de Lima, soldador elétrico, 34 anos.

"Para mim ele vai ser uma boa pessoa, porque do jeito que vai indo a carestia não tem jeito da gente viver mais. Ele vai ter que dar um apoio para a gente. Pessoalmente, até. E agir como ele está falando que vai fazer. Para mim, as coisas com esse governo aí (governo Figueiredo) estão cruas. Ninguém tem mais emprego, ninguém tem mais nada. Ele já está até providenciando sacolão para as pessoas que não podem comprar os produtos que não têm seus preços congelados no mercado. Se você ganha salário mínimo, paga aluguel, tem cinco filhos para criar e não tem apoio do governo de onde você mora, você vai ter o apoio de quem? Não tem condições. É isso mesmo: Tancredo Neves."

Donizete, policial militar, 26 anos.

"O governo Tancredo Neves está prometendo muito, mas só ele assumindo é que vamos ver o que é que ele vai fazer pelo povo, não é? Vamos esperar para ver. Por enquanto eu só estou ouvindo promessas, nada ainda de concreto. Se ele se eleger e chegar à Presidência aí ele vai ter que mostrar para nós tudo aquilo que ele disse. Quando estiver com o abacaxi na mão, vamos ver o que ele vai fazer: se ele vai descascar ou chupá-lo..."

Melhorar minha situação não vai mesmo!

Joaquim Ramos de Andrade, pedreiro (atualmente trabalha como engraxate), 61 anos.

"Para mim não significa nada. Para mim, o que entrar está bom. Se eu não trabalhar, eu não vivo. Eu tenho que trabalhar de qualquer maneira; melhorar a minha situação não vai mesmo. A tendência é piorar."

Cristiane, 17 anos, recepcionista.

"Ah, sei lá!... Para mim não significa nada. Nenhum dos dois presta, então, para você escolher entre o Maluf e o Tancredo, é preferível o Tancredo."

Graças a Deus, Tancredo vai resolver muita coisa

Maria Joaquim Nabuque, manicure, 42 anos.

"Vai ser o melhor governo do mundo!"

Odair Simões, operário, 39 anos.

"Eu acho que vai ser melhor que o Figueiredo. Pelo menos na minha opinião. Vai abaixar a inflação, o custo de vida que está muito caro. Nessas coisas será melhor que o outro."

André Luiz, office-boy, 16 anos.

"Para mim o governo Tancredo Neves deverá mudar muitas coisas. Graças a Deus ele ganhará e eu conto com a presença de todos porque ele vai resolver muita coisa no nosso governo. Ele tem que arrancar algumas pessoas que tem lá dentro. Eu acho que a dívida externa está muito alta para o nosso governo. Ele vai entrar com uma bomba muito grande, mas eu espero que ele resolva estes problemas."

Durvalina, aposentada, 43 anos. "Ah! Eu acho ele bastante equilibrado!"

Vera Lúcia da Silva, doméstica, 26 anos.

"Olha, é importante para o nosso país."

Rita, bordadeira, casada, 29 anos. "Para mim é tudo um só. Tanto faz um como o outro, porque eles prometem e não fazem nada."

Pérola Andrade, casada, 27anos.

"Espero que seja melhor que o atual e que ele cumpra o que está falando, porque o que está aí é realmente uma porcaria."

Antônio Correia de Souza, corretor de vendas, 20 anos.

"Para mim não tem nenhum significado porque ele ainda não assumiu. Não o conheço como político, porque eu sou de uma geração nova. Então não posso dar opinião. É esperar e ver a cabeça dele."

Muda quase tudo: emprego, salário e condução

Moisés Rodrigues de Souza, encarregado de obras, 43 anos.

"Para mim a eleição de Tancredo Neves é uma grande coisa para o país. Eu acho que ele vai melhorar a situação e o país vai mudar e ficar bem melhor que com essa ditadura que não dava para entender. Acredito que melhorarão os empregos, os salários dos empregados e a condução, enfim quase tudo."

Silvana Gomes, estudante, 19 anos.

"Eu não entendo nada. Não entendo nem um pouquinho disto aí."

Rita de Cássia, sem profissão, 19 anos.

"Ai, de política eu não entendo nada..."

Hamilton — Mas a senhora sabe que Tancredo Neves foi eleito hoje, presidente da República?

Rita — "Não, não estou sabendo ainda, não..."

Hamilton — Sabia que haveria a votação?

Rita — "Eu estava achando que ele ia ganhar..."

Hamilton — E qual o significado da vitória dele?

Rita — "Ah! Espero que ele faça alguma coisa para melhorar o nosso país."

Maria Cecília, professora, 22 anos.

"Bom, ele promete muita coisa. Eu acho que, de repente, a gente tem que confiar, não é? Dar um voto de confiança e esperar coisas boas..."

Getúlio, ajudante de cargas, 23 anos.

"Ah! Eu não sei dizer, não, viu, meu... Esse cara aí... Lamentável, lamentável..."

Jorge dos Santos, jornalista, 46 anos.

"Eu vejo a coisa de uma maneira um pouco complicada. Ele não é uma solução definitiva, mas uma esperança muito grande; uma forma de transição para a posse de um outro presidente que na minha opinião deveria ser o Leonel Brizola. Este, eu acho que trabalhou para isso. Tanto fora do país, após a sua expulsão da nossa pátria, como depois da volta dele e de seus companheiros como Miguel Arraes e outros mais. O que ocorre hoje é um trabalho deles, foi o trabalho deles lá fora. Então, eu acho que o Tancredo Neves não é uma solução definitiva, mas um preparativo para quem vai entrar..."

Sebastião Barbosa, camelô, 28 anos.

"Acho bom. Para mim ele é uma pessoa boa mesmo. Eu quero mais que ele entre, que ele ganhe mesmo, para ver se melhora isso aí. Do jeito que tá, a gente trabalhando na rua, com problemas para trabalhar — a polícia e os fiscais se metendo, todo mundo se metendo, não dá. Nós somos trabalhadores, chefes de família com crianças para cuidar e tudo. E esse governo que está aí, esse presidente (Figueiredo) não está trazendo melhorias para ninguém. Ele está cada vez arrasando mais a gente. Só a classe alta está vivendo, e a classe baixa está se fudendo, se arrasando cada vez mais. Então, o que eu quero dele é isso aí. Que entre logo e comece a governar, para ver se melhora para a gente. Não é só para mim, é para todos. Eu quero a melhoria para todos..."

Arnaldo Teodoro, engenheiro, 59 anos.

"É uma grande realização para nós. Uma grande realização no Brasil, porque ele é um homem de alta experiência no campo político e administrativo. Em todos os pontos ele é alto, de alto conhecimento."

Cícero, empregado de fábrica de papel, 54 anos.

"Eu acho que se ele fizer ao menos o que fez o Figueiredo, tá bom demais."

Maria Pereira, solteira, desempregada, 23 anos.

"Para mim é uma boa. Ele é uma pessoa com capacidade de levar alguma coisa à frente."

Clementina, prendas domésticas, 37 anos.

"Não sei responder. Por enquanto não vejo significado, viu?"

Hamilton — Mas por que a senhora não sabe responder?

Clementina — "Ah! Porque tem tantos significados!..."

Hamilton — Então, pode dar alguns deles?

Clementina — "O senhor quer dizer escola? A gente precisa de mais escola para as crianças. E o preço das coisas que a gente gostaria que fossem menores."

Hamilton — E a senhora acha que Tancredo Neves tem alguma relação com isso?

Clementina — "Ah! Sim, claro que sim! Mas o senhor devia perguntar é para meu filho..."

João, comerciário, sambista, 44 anos.

"Para mim, vai mudar pouco, porque o povo está sempre sendo prejudicado. Em qualquer governo eu não vejo muita mudança. Eu acho que o povo tinha que participar direto, ou seja, eu sou pela eleição direta."

Maria Aparecida, faxineira, 42 anos.

"Eu não entendo. Tanto faz um como o outro."

Fernando, engenheiro, 29 anos, carioca.

"Uma esperança, né?"

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Jun 1985
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