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Uma leitura sobre o sentido do desenvolvimento sob a ótica da análise de discurso

A lecture on the meaning of development from the perspective of discourse analysis

Una lectura sobre el significado del desarrollo por la perspectiva del análisis del discurso

Une lecture sur le sens du développement du point de vue de l'analyse du discours

Resumos

Esse texto tem o objetivo de analisar o discurso da mídia impressa a respeito do desenvolvimento pelo qual passa a região Agreste de Pernambuco. O corpus de análise é feita a partir do editorial do maior jornal em circulação no estado, portanto, um formador de opinião. O discurso em questão se mostra preocupado em ressaltar os aspectos econômicos do desenvolvimento e da geração de empregos e deixa a margem o debate sobre desenvolvimento sustentável da região.

Desenvolvimento; Mídia; Discurso


This article seeks to analise the discourse of the printed media in what concerns the development of the Agreste of the Pernambuco region. The analysis is made from the editorial of the biggest newspaper of the state, thus, an opinion maker. The discourse cited concerns itself in highlighting the economic aspects of development and of employment generation and it is not very concerned in discussing sustainable development.

Development; Media; Discourse


Este artículo tiene el objetivo de analizar el discurso de la prensa sobre el desarrollo de la región Agreste de Pernambuco. El análisis se hace a partir del editorial del periódico más importante de la circulación en el estado, un creador de opinión. El discurso en cuestión se centre en el tema del desarrollo económico, la creación de empleo y el desarrollo sostenible de la región.

Desarrollo; Medios de comunicación; Discurso


Ce texte vise à analyser le discours de la presse sur le développement de la región Agreste de Pernambuco. L'analyse est faite a partir de l'éditorial du plus grand journal en circulation dans l'etat. Le discours en question est inquiet aut dans la mesurre que privilegie le développement économique, questión que ne pas suffisant donner compte de la complexité que demande le développement durable de la région.

Développement; Médias des communication; Discours


ARTIGOS

Uma leitura sobre o sentido do desenvolvimento sob a ótica da análise de discurso* * Pesquisa desenvolvida no mestrado em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX), da UFRPE, dentro da disciplina de Análise de Discurso, sob a orientação dos professores Heitor Rocha e Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão.

A lecture on the meaning of development from the perspective of discourse analysis

Une lecture sur le sens du développement du point de vue de l'analyse du discours

Una lectura sobre el significado del desarrollo por la perspectiva del análisis del discurso

Iraê Pereira MotaI; Maria do Rosário de Fátima Andrade LeitãoII

IJornalista, professora da Faculdade do Vale do Ipojuca (Favip) e mestre em Extensão Rural e Desenvolvimento Local, pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Email: iraemota1@yahoo.com.br

IIProfessora da UFRPE, doutora em Estudios Iberoamericanos - Universidad Complutense de Madrid, mestre em Desenvolvimento Urbano pela Universidade Federal de Pernambuco, Email: rosario@dlch.ufrpe.br

RESUMO

Esse texto tem o objetivo de analisar o discurso da mídia impressa a respeito do desenvolvimento pelo qual passa a região Agreste de Pernambuco. O corpus de análise é feita a partir do editorial do maior jornal em circulação no estado, portanto, um formador de opinião. O discurso em questão se mostra preocupado em ressaltar os aspectos econômicos do desenvolvimento e da geração de empregos e deixa a margem o debate sobre desenvolvimento sustentável da região.

Palavras-chave: Desenvolvimento. Mídia. Discurso.

ABSTRACT

This article seeks to analise the discourse of the printed media in what concerns the development of the Agreste of the Pernambuco region. The analysis is made from the editorial of the biggest newspaper of the state, thus, an opinion maker. The discourse cited concerns itself in highlighting the economic aspects of development and of employment generation and it is not very concerned in discussing sustainable development.

Key words: Development. Media. Discourse.

RÉSUMÉ

Ce texte vise à analyser le discours de la presse sur le développement de la región Agreste de Pernambuco. L'analyse est faite a partir de l'éditorial du plus grand journal en circulation dans l'etat. Le discours en question est inquiet aut dans la mesurre que privilegie le développement économique, questión que ne pas suffisant donner compte de la complexité que demande le développement durable de la région.

Mots-clés: Développement. Médias des communication. Discours.

RESUMEN

Este artículo tiene el objetivo de analizar el discurso de la prensa sobre el desarrollo de la región Agreste de Pernambuco. El análisis se hace a partir del editorial del periódico más importante de la circulación en el estado, un creador de opinión. El discurso en cuestión se centre en el tema del desarrollo económico, la creación de empleo y el desarrollo sostenible de la región.

Palabras claves: Desarrollo. Medios de comunicación. Discurso.

Introdução

Este texto está fundamentado nos conceitos da Análise de Discurso e elabora uma reflexão critica acerca do discurso sobre o desenvolvimento presente na mídia impressa. Discurso que tem sido veiculado de forma acrítica, sem debate aprofundado, limitando a função social e educacional dos meios de comunicação na formação da consciência crítica dos leitores. Este trabalho não tem como objetivo emitir julgamento sobre o posicionamento ideológico ou linha editorial do jornal analisado, mas identificar pistas de um discurso dominante, pertencente à grande mídia, de que o desenvolvimento é relacionado unicamente com o crescimento econômico, sem levantar questões e reflexões sobre as nuances de sustentabilidade presentes no conceito, mais amplo, de desenvolvimento.

Parte-se do pressuposto de que a Análise de Discurso não trata apenas da gramática, mas compreende o discurso enquanto objeto simbólico que produz sentidos, considerando que ele está imerso a significados originados por e para sujeitos. Dessa forma, é possível compreender o homem enquanto ser social, produtor de sentidos, tendo a linguagem como mediação nesta interação social. Orlandi (2007) assegura que o discurso é a palavra em movimento:

[...] E a palavra discurso, etimologicamente, tem em sai a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando. Na análise de discurso, procura-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua história. (ORLANDI, 2007, p. 15).

Entendemos que a prática social que norteia o discurso é determinada pelo contexto sócio-histórico. O contexto nos ajudará a compreender como o objeto simbólico (seja ele um texto, pintura ou música) é capaz de produzir sentidos. São essas afirmativas que nortearão o nosso procedimento de análise.

O trabalho foi organizado com a seguinte disposição de tópicos: inicialmente, apresentaremos o texto, na íntegra, que será analisado. Em seguida, faremos o diálogo da análise com as principais correntes teóricas da Análise de Discurso. A finalização será dada com as considerações finais acerca do tema escolhido.

1 O exemplo do Agreste

O texto escolhido como objeto de análise deste trabalho é o editorial publicado pelo Jornal do Commercio de Pernambuco no dia 30 de janeiro de 2010. O Jornal do Commercio, fundado em 3 de abril de 1919, é um dos principais veículos impressos do Estado, e há mais de 15 anos é líder em circulação. Escolhemos este veículo por saber a influência que o mesmo exerce na formação de opinião dos leitores e por considerá-lo detentor de um dos melhores projetos editoriais de Pernambuco.

Qualquer tipo de jornal abriga vários gêneros jornalísticos, como notícias, reportagens, artigos, colunas, crônicas e editorial. Neste trabalho, escolhemos especificamente o editorial porque este é o tipo de gênero que representa a opinião oficial do veículo de comunicação, como assegura Marques de Melo (2003, p. 104):

Editorial é o gênero jornalístico que expressa a opinião oficial da empresa diante dos fatos de maior repercussão no momento. [...] nas sociedades capitalistas, o editorial reflete não exatamente a opinião dos seus proprietários nominais, mas o consenso das opiniões que emanam dos diferentes núcleos que participam da propriedade da organização1 1 Utilizando a argumentação de Raúl Rivadeneira Prada, Marques de Melo elenca tais organizações como sendo os acionistas majoritários, os anunciantes e o Estado. . [...] a opinião contida no editorial constitui um indicador que pretende orientar a opinião pública.

Segundo Marques de Melo (2003), as instituições jornalísticas atribuem especial atenção à produção dos editoriais, porque é nele que estarão contidas as posições políticas da empresa e os interesses corporativos que dão sustentação à máquina jornalística. Ainda sobre o editorial, este tipo de gênero jornalístico apresenta quatro características básicas fundamentais: 1) impessoalidade (não é escrito em 1a pessoa, porque representa a opinião de um grupo, vem escrito na 1a pessoa do plural ou na 3a do singular); 2) topicalidade (trata de um tema bem delimitado); 3) condensalidade (traz poucas ideias, mas apresenta uma argumentação bem fundamentada); 4) plasticidade (é flexível, não se alimentando de dogmas).

Dentro dessa lógica, escolhemos o editorial abaixo, publicado pelo Jornal do Commercio, para analisarmos, sob a ótica da Análise de Discurso, qual o discurso dominante a respeito do desenvolvimento pelo qual passa a Região Agreste, principalmente quanto são ressaltados, no texto, características essencialmente econômicas, sem levar em consideração a necessidade de um debate aprofundado sobre esse desenvolvimento do interior de Pernambuco.

O exemplo do Agreste

Publicado em 30.1.2010

Quem atravessa a BR-232, a "espinha dorsal" de Pernambuco, no seu trecho mais movimentado – os 133 quilômetros que ligam o Recife a Caruaru -, pode testemunhar os primeiros passos de um esperado maior avanço no que já é o mais importante polo de confecções do Nordeste. Esses passos são visíveis em Caruaru, numa frente de trabalho para a duplicação da BR-104, 51,4 quilômetros que vão ligar a entrada da PE-160, distrito de Pão de Açúcar, em Taquaritinga do Norte, à entrada da BR-149, em Agrestina. Será, também, a interligação de Pernambuco à Paraíba, via Campina Grande. Uma obra que vai expor ainda mais um dos maiores empreendimentos do Nordeste.

A reportagem Pequenos gigantes do Agreste, publicada recentemente neste jornal, traz de volta as atenções sobre esse empreendimento. É uma exposição a mais desta vitrine do grande polo de confecções do Agreste - e, seguramente, não será a última. Talvez, até, seja mais apropriado ressaltar os exemplos das microrregiões Alto Capibaribe e Vale do Ipojuca, quando entendemos que o Agreste é uma mesorregião pernambucana que abriga 78 municípios e seria extraordinário se todos tivessem a mesma pujança que encontramos hoje naquelas duas microrregiões, referências da economia de nosso Estado.

O polo de confecções nasceu em Caruaru, ramificou-se por Santa Cruz do Capibaribe e Toritama, mas hoje é uma árvore frondosa em 14 municípios que desconhecem o desemprego e produzem 800 milhões de peças por ano. Sem nenhum bairrismo, pode ser visto como um dos maiores exemplos de empreendedorismo no País atualmente. Esses pequenos gigantes do Agreste materializam os objetivos que deram forma e vida à Sudene no início dos anos 60, mas que ficaram atravessados no meio do caminho, como um ideal de economia sustentável não alcançado.

O que isso significa pode ser dimensionado pela chegada do impulso das confecções muito mais além das três cidades que deram os passos iniciais - Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe e Toritama. Agora é possível ver como essa história com duas décadas de relato já inclui muitos outros cenários e personagens. A exemplo de Santa Maria do Cambucá e Vertentes, no Alto Capibaribe, onde se dá uma interação entre rural e urbano, criando novos corredores de produção, trabalho, renda, onde até pouco tempo atrás só se imaginava uma saída: os caminhos do Sul do País ou da Região Metropolitana do Recife.

São histórias como essas que passam do relato cotidiano, agora através dos mais avançados meios de comunicação social e de instrumentos institucionais, como a Associação dos Confeccionistas de Santa Cruz do Capibaribe, que abre caminhos profissionais para os jovens, através de cursos direcionados para o mercado cada vez mais carente de mão de obra especializada. Os meios acadêmicos universitários de Pernambuco, particularmente na área de administração, acompanham com atenção cada passo dado pelo polo de confecções e começa a ganhar forma uma bibliografia resultante desses estudos, mostrando, entre outras coisas, como se dá uma evolução social nas cidades que fazem parte desse polo.

Como ficou visto na mais recente reportagem deste jornal sobre o desenvolvimento da área que compreende o polo de confecções, estamos diante de um segmento econômico pernambucano e nordestino que responde por 15% da produção de vestuário em todo o País, um desempenho que repercute imediatamente no mercado de trabalho, por ser um dos setores que mais gera empregos. E, surpreendentemente, as cidades pernambucanas envolvidas nesse processo estão sendo capazes de sobreviver e até desconhecer a "síndrome da China" - com seus preços em forma de dumping - que ameaçava com um processo de depressão na economia e na vida dos que fazem esse pequeno mas notável núcleo produtivo.

2 Análise de discurso do texto

Inicialmente, encontramos no texto a presença das principais leis do Discurso, tal qual nos revela Dominique Maingueneau (2008), no livro Análise de Textos de Comunicação. A primeira lei presente no texto é a lei da pertinência, caracterizada por Maingueneau como sendo a necessidade de uma enunciação interessar ao destinatário, fornecendo-lhe informações que alterem determinada situação. No caso do texto, ele é pertinente porque, como o jornal tem circulação também no interior, trazer como tema de editorial o crescimento pelo qual passa o Agreste faz com que os próprios leitores se interessem em ler notícias sobre sua região.

Outra lei encontrada é a da sinceridade, considerada por Maingueneau aquela que diz respeito ao engajamento do enunciador no ato de fala que realiza, ou seja, para afirmar algo, deve-se ter condições de garantir a verdade no que diz. No texto, o editorialista2 2 Editorialista é a função do jornalista que escreve o editorial do jornal onde atua. Geralmente, os editorialistas são funcionários mais experientes, que têm ampla ligação com a cúpula da empresa e conseguem transmitir em textos o posicionamento político-editorial do jornal. sustenta suas argumentações em dados oficiais e nas estatísticas da região Agreste.

O texto ainda possui a lei da informatividade, entendida como a característica do enunciado que estipula que não se deve falar para não dizer nada, que os enunciados devem trazer informações novas ao destinatário. No editorial O exemplo do Agreste, o jornal apresenta a visão que possui sobre esta região pernambucana, ressaltando os aspectos que levam a localidade a um patamar de desenvolvimento considerado exemplo, segundo o próprio jornal.

Por fim, outra lei presente no texto é a lei da exaustividade, que especifica a necessidade de o enunciador dar a informação máxima, considerando-se a situação. No editorial, quando o editorialista traz dados como a participação de 14 municípios no polo de confecções de Pernambuco, o leitor não questiona quais os critérios que fazem de tais municípios aptos a constituírem o polo, pois acredita veementemente na informação divulgada pelo jornal.

Encontramos no editorial O exemplo do Agreste outra característica presente nas linhas teóricas da Análise de Discurso: a relação de sentidos, fator das condições de produção que constituem o discurso. Orlandi (2007, p. 39) explica como a relação de sentido funciona:

Segundo essa noção, não há discurso que não se relacione com outros. Em outras palavras, os sentidos resultam de relações: um discurso aponta para outros que o sustentam, assim como para dizeres futuros. Todo discurso é visto como um estado de um processo discursivo mais amplo, contínuo. Não há, desse modo, começo absoluto nem ponto final para o discurso.

No texto, o editorialista faz a relação do tema com a reportagem Pequenos gigantes do Agreste, que foi publicada recentemente3 3 A reportagem foi publicada nos dias 17 e 18 de janeiro de 2010, na editoria Economia, e trata sobre os pequenos empreendimentos que conseguiram construir o Polo de Confecções do Agreste, que, segundo a reportagem escrita por Viviane Barros de Lima, "se formou no meio do nada". pelo jornal, e que, segundo o editorial, trouxe de volta as atenções para o desenvolvimento da área que compreende o Polo de Confecções do Agreste. Trabalhando a relação de sua argumentação com a reportagem divulgada pelo próprio jornal, o editorialista assegura o posicionamento do próprio jornal a respeito do Polo de Confecções, ou seja, que é um polo em expansão e que estamos testemunhando "os primeiros passos de um esperado maior avanço no que já é o mais importante polo de confecções do Nordeste".

Como é possível perceber, por meio do discurso, o jornal reproduz a ideia dominante a respeito do desenvolvimento da região Agreste, sem se colocar como partícipe de um debate mais aprofundado sobre a sustentabilidade da região. O editorial em questão fala que o Polo de Confecções é uma "árvore frondosa em 14 municípios que desconhecem o desemprego e produzem 800 milhões de peças por ano". Na verdade, a generalização provocada pela expressão "desconhecem o desemprego" acaba maquiando a realidade da região. Só para se ter uma ideia, Caruaru, cidade que faz parte do Polo de Confecções do Agreste, apresentou o número de 14.316 desocupados na população economicamente ativa, de acordo com os indicadores do mercado de trabalho do Censo, em 20004 4 Disponível em: < http://perfildomunicipio.caged.gov.br/result_SPER.asp?entrada=SPER&tpCST=cstMUN&UF=PE&codmun=260410&ufacesso=PE>. Acesso em: 20 fev. 2010. .

O desenvolvimento a que atribuímos a necessidade de discussão pela grande mídia e que, pela nossa análise, não está sendo trabalhada pelo jornal, recebe o acréscimo do adjetivo sustentável. Este tipo de desenvolvimento ganhou forma quando a sociedade ambientalista decidiu fazer pressão nos governos contra os abusos ambientais provocados pelo crescimento econômico, a partir dos anos 1960 e 1970. Segundo Francisco Milanez (2003, p. 76):

A expressão desenvolvimento sustentável significa uma nova forma de ver o desenvolvimento a sociedade ciente dos prejuízos causados ao meio ambiente pelo desenvolvimento econômico, busca conciliar a continuação do processo de desenvolvimento de nossa sociedade com a manutenção do equilíbrio ambiental planetário.

Ressaltamos que o debate em torno do desenvolvimento sustentável na região é importante, porque o Polo de Confecções do Agreste é responsável pela produção de 800 milhões de peças por ano, muitas delas produzidas em condições que degradam o meio ambiente e tornam pequenos córregos e parte da vegetação tão azul quanto a cor do jeans.

No editorial O Exemplo do Agreste, não se observa a presença dessa discussão de sustentabilidade no entorno da região. O texto ressalta os aspectos econômicos e a única vez em que o termo sustentável aparece é quando se fala sobre a criação da Sudene, a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, no início dos anos 1960:

Esses pequenos gigantes do Agreste materializam os objetivos que deram forma e vida à Sudene no início dos anos 60, mas que ficaram atravessados no meio do caminho, como um ideal de economia sustentável não alcançado.

Quando o jornal traz como título do editorial O Exemplo do Agreste bom seria se mostrasse exemplos de empresas e instituições da região que conseguiram aliar o crescimento econômico à sustentabilidade, ou seja, que conseguiram trabalhar na base da formação do desenvolvimento sustentável as estruturas ambiental, social econômica e cultural. Para que o desenvolvimento sustentável exista, é preciso manter o equilíbrio ambiental planetário, ser socialmente justo, economicamente viável – sendo a economia meio e não fim, e culturalmente respeitoso.

O jornal ainda cita, no texto, que os meios acadêmicos estão acompanhando com atenção os passos dados pelo Polo de Confecções, em estudos que mostram, por exemplo, como se dá uma evolução social nas cidades que integram a região. Esse seria um bom "gancho" para discorrer a respeito do papel deste desenvolvimento na formação de uma nova região sustentável, mas o jornal prefere não se posicionar e seguir fazendo referências apenas aos aspectos econômicos da questão.

Os veículos de comunicação são responsáveis pela manutenção de estruturas de poder e por divulgar, muitas vezes, aquilo que mais os convêm. A começar pela escolha do que se tornará notícia e do foco que o texto jornalístico irá adotar. Isso, segundo Patrick Charaudeau, caracteriza-se como estratégia discursiva:

Comunicar, informar, tudo é escolha. Não somente escolha de conteúdos a transmitir, não somente escolha das formas adequadas para estar de acordo com as normas do bem falar e ter clareza, mas escolha de efeitos de sentido para influenciar o outro, isto é, no fim das contas, escolha de estratégias discursivas. (CHARAUDEAU, 2007, p. 39).

Entender o discurso da mídia como produtor de sentido é analisar o meio jornalístico sob a ótica da Análise de Discurso. O editorial é um comentário, uma expressão opinativa do jornal, e por se caracterizar como um comentário do acontecimento (no texto analisado, o desenvolvimento do Polo de Confecções), constitui uma atividade discursiva.

Comentar o mundo constitui uma atividade discursiva, complementar ao relato, que consiste em exercer suas faculdades de raciocínio para analisar o porquê e o como dos seres que se acham no mundo e dos fatos que aí se produzem. [...] o comentário procura revelar o que não se vê, o que é latente e constitui o motor (causas, motivos e intenções) do processo evenemencial do mundo. Problematiza os acontecimentos, constrói hipóteses, desenvolve teses, traz provas, impõe conclusões. (CHARAUDEAU, 2007, p. 176).

O editorial tem a função de orientar a opinião pública e, consequentemente, possui função educacional. Quando dizemos que os veículos têm função educacional, compreendemos esse aspecto dentro da Análise de Discurso, pois, segundo Foucault, "todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo" (FOUCALT, 2009, p. 44).

A escolha que o jornal faz em ressaltar tanto no editorial O exemplo do Agreste quanto na reportagem Pequenos gigantes do Agreste, a qual o editorial se refere, os aspectos econômicos no desenvolvimento da região mostra que o veículo reproduz o discurso dominante a respeito do desenvolvimento, visto pela veia econômica e não social.

Considerações finais

Analisamos o editorial O exemplo do Agreste sob a ótica da Análise de Discurso, compreendendo a sua formação discursiva enquanto opinião oficial do jornal, a partir da compreensão do que o jornal entende por ser desenvolvimento na região. Com essas reflexões, é possível ressaltar a relevância de tais conceitos para ajudar os leitores a irem além da leitura meramente textual do editorial. É necessário que possamos compreender as nuances que estão por trás dos textos opinativos do jornal, principalmente quando estes representam as opiniões que emanam da organização jornalística, sejam os proprietários ou anunciantes.

O discurso generalizante de que a região Agreste passa por um desenvolvimento invejável, na maioria das vezes, encobre as verdadeiras necessidades de sustentabilidade da região. Esse discurso, como foi possível perceber, é mantido e difundido pelos veículos de comunicação. Não queremos aqui adotar a ideia de que a região não está desenvolvida, a nossa proposta é trazer à tona a real necessidade de discutir para onde esse desenvolvimento está levando a milhares de pessoas que vivem na região Agreste e no seu entorno.

Quando um jornal dedica seu editorial, espaço privilegiado para difusão de opiniões, para ressaltar o desenvolvimento do Agreste mostra que, de fato, a localidade tem potencial ainda para se expandir. Em contrapartida, o grande debate deveria girar em torno da sustentabilidade das ações que chegam à região, principalmente no respeito à cultura local e às necessidades dos municípios.

Para implantar o desenvolvimento sustentável é preciso entendê-lo como conceito local, estimulando, sobretudo, a participação inclusiva de todos os setores da sociedade, visando à transformação social e não apenas econômica de uma comunidade. Os jornais têm sua função social e, como foi visto neste editorial, na grande maioria das vezes, têm dado preferência a elencar os aspectos econômicos do desenvolvimento sem tomar partido ou tomar à frente do grande debate em torno do desenvolvimento sustentável.

Recebido em 10/8/2010; revisado e aprovado em 17/11/2010; aceito em 18/2/2011

  • CHARAUDEAU, Patrick. Discurso das mídias São Paulo: Contexto, 2007.
  • FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso 18. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2009.
  • MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação 5. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
  • MARQUES DE MELO, José. Jornalismo opinativo: gêneros opinativos no jornalismo brasileiro. 3. ed. Campos do Jordão: Mantiqueira, 2003.
  • MILANEZ, Francisco. Desenvolvimento sustentável. In: CATTANI, Antonio David (Org.). A outra economia Porto Alegre: Veraz Editores, 2003. p. 76-84.
  • ORLANDI, Eni Pulccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 7. ed. Campinas, SP: Pontes, 2007.
  • *
    Pesquisa desenvolvida no mestrado em Extensão Rural e Desenvolvimento Local (POSMEX), da UFRPE, dentro da disciplina de Análise de Discurso, sob a orientação dos professores Heitor Rocha e Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão.
  • 1
    Utilizando a argumentação de Raúl Rivadeneira Prada, Marques de Melo elenca tais organizações como sendo os acionistas majoritários, os anunciantes e o Estado.
  • 2
    Editorialista é a função do jornalista que escreve o editorial do jornal onde atua. Geralmente, os editorialistas são funcionários mais experientes, que têm ampla ligação com a cúpula da empresa e conseguem transmitir em textos o posicionamento político-editorial do jornal.
  • 3
    A reportagem foi publicada nos dias 17 e 18 de janeiro de 2010, na editoria Economia, e trata sobre os pequenos empreendimentos que conseguiram construir o Polo de Confecções do Agreste, que, segundo a reportagem escrita por Viviane Barros de Lima, "se formou no meio do nada".
  • 4
    Disponível em: <
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jul 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Aceito
      18 Fev 2011
    • Revisado
      17 Nov 2010
    • Recebido
      10 Ago 2010
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