Acessibilidade / Reportar erro

O combate à desinformação sobre a tentativa de golpe: intercorrências de pós-verdade, populismo e fact-checking

The battle against disinformation on the coup attempt: the interplay of post-truth, populism and fact-checking

Resumo

O objetivo deste artigo é identificar os elementos de pós-verdade e populismo e as fontes selecionadas na checagem das informações classificadas como falsas pela agência Aos Fatos sobre a tentativa de golpe de Estado que ocorreu no Brasil em 8 de janeiro de 2023. Para tanto, o aparato metodológico é concedido pelo estudo de caso, conforme Yin (2001), com o auxílio da análise de conteúdo (BARDIN, 2002), estabelecendo categorias analíticas e a discriminação de unidades de análise. Como resultados, verificamos a predominância de frações de verdade e de antagonismos e uso de fontes documentais, mais especificamente jornalísticas, na aferição das narrativas falsas. Assim, concluímos que o fact-checking pode aprimorar suas estratégias de aferição diante de informações falaciosas, que se efetivam na retórica populista e exploram o contexto de pós-verdade.

Palavras-chave
desinformação; pós-verdade; populismo; checagem de fatos

Abstract

The objective of this paper is to identify the elements of post-truth and populism as well as the sources selected when checking the information classified as “false” by Aos Fatos agency about the attempted coup d’état that took place in Brazil on January 8th, 2023. For this purpose, the methodological apparatus is provided by the case study, according to Yin (2001), with the help of content analysis (BARDIN, 2002), establishing analytical categories and the discrimination of units of analysis. As results, we verified the predominance of fractions of truth and antagonisms, with regard to post-truth and populist rhetoric, and the use of documentary sources, more specifically journalistic, in measuring of the narratives. So, we conclude that fact-checking can improve your measurement strategies in the face of fallacious information, which takes effect in populist rhetoric and explores the post-truth context.

Keywords
disinformation; post-truth; populism; fact-checking

Introdução

A desinformação não é um problema restrito ao tempo presente, sendo, inclusive, impulsionada em larga medida por instituições jornalísticas consagradas, nos chamados pseudo-eventos (BOORSTIN, 2007BOORSTIN, D. J. From news-gathering to news-making: a flood of pseudo-events. In: [S.n.], 2007, p. 251-270. Disponível em: <http://www.irfanerdogan.com/dergiweb2008/24/14.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2023.
http://www.irfanerdogan.com/dergiweb2008...
). No entanto, é necessário pontuar que o novo ecossistema informacional, “composto por internet, dispositivos móveis, redes sociais e aplicativos de mensagem” (LUIZ, 2021LUIZ, T. C. “Caso Lázaro”: A Violência Como Lógica Central Da Desinformação, Portal Intercom, 2021. 44º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Virtual – 4 a 9/10/2021, Disponível em: <https://www.portalintercom.org.br/anais/nacional2021/resumos/dt5-cd/thiago-cury-luiz.pdf>. Acesso em: 29 set. 2023.
https://www.portalintercom.org.br/anais/...
), incrementou o fluxo e o volume comunicacionais, extraindo das mídias tradicionais o monopólio da (des)informação. Além disso, as novas plataformas são regradas por algoritmos, cuja capacidade de produzir bolhas (BUCCI, 2019aBUCCI, E. Seriam as fake news mais eficazes para campanhas de direita? – uma hipótese a partir das eleições de 2018 no Brasil. Novos Olhares, [S. l.], v. 8, n. 2, p. 21-29, 2019a. DOI: 10.11606/issn.2238-7714.no.2019.162062. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/novosolhares/article/view/162062. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.revistas.usp.br/novosolhares...
) é propícia ao avanço da retórica populista (CANOVAN, 1999CANOVAN, M. Trust the people! Populism and the two faces of democracy. Political Studies, n. 47 i. 1, p. 2-16, 1999. Disponível em: https://doi.org/10.1111/1467-9248.00184. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://doi.org/10.1111/1467-9248.00184...
; LACLAU, 2001LACLAU, E. La Razón Populista. Tradução: Soledad Laclau. Buenos Aires: FCE, 2001. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4664084/mod_resource/content/1/1%20Laclau-Ernesto-La-Razon-Populista.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.p...
) e sedimenta o contexto da pós-verdade (DUNKER, 2017DUNKER, C. Subjetividade em tempos de pós-verdade. In: DUNKER, C. Ética e pós-verdade. Dublinense: Porto Alegre, 2017. 128 p.; SEIXAS, 2019SEIXAS, R. A retórica da pós-verdade: o problema das convicções. Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, v. 18, n. 1, p. 122-138, 2019. DOI: 10.17648/eidea-18-2197. Disponível em: <https://periodicos.uesc.br/index.php/eidea/article/view/2197/1747>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://periodicos.uesc.br/index.php/eid...
; SANTAELLA, 2019SANTAELLA, L. A pós-verdade é verdadeira ou falsa? Barueri-SP: Estação das Letras e Cores, 2019.).

Sendo uma das alternativas no enfrentamento do fenômeno desinformacional, as agências de fact-checking surgem para adicionar um componente ao ofício do jornalismo: se até o início deste século a profissão se incumbia de mediar a relação entre a sociedade e os fatos, agora compreende que não é a única instituição a produzir relatos sobre a realidade. Na medida em que os nós do fluxo comunicativo estão pulverizados, ampliando o espectro de quem produz e veicula conteúdos (MOUNK, 2019MOUNK, Y. O povo contra a democracia: por que a nossa liberdade corre perigo e como salvá-la. Tradução: Cássio de Arantes Leite e Débora Landsberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.), a imprensa, agora, encarrega-se de aferir materiais veiculados em redes sociais e aplicativos de mensagem, por intermédio da checagem (SACRAMENTO, PAIVA, 2020SACRAMENTO, I.; PAIVA, R. Fake news, WhatsApp e a vacinação contra febre amarela no Brasil. Matrizes, [S. l.], v. 14, n. 1, p. 79-106, 2020. DOI: 10.11606/issn.1982-8160.v14i1p79-106. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/matrizes/article/view/160081. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.revistas.usp.br/matrizes/art...
).

Nesse sentido, o objetivo central do estudo é identificar as nuances de pós- verdade e da narrativa populista na desinformação produzida sobre o 8 de janeiro de 2023, dia em que extremistas de direita tentaram emplacar um golpe de Estado, após derrota eleitoral de Jair Bolsonaro, em 30 de outubro de 2022. Além disso, situar as fontes selecionadas pela agência Aos Fatos para checar as informações definidas como falsas sobre os atentados consiste em outro anseio desta investigação.

Para tanto, as perguntas que direcionam esta pesquisa são: [1] quais elementos da pós-verdade e do populismo figuram nas narrativas falaciosas acerca do 8 de janeiro e como eles podem alterar a percepção da sociedade? [2] A que modalidade de fontes, à luz da conceituação proposta por Lage (2008)LAGE, N. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. São Paulo: Record, 2008., a Aos Fatos recorre em suas checagens?

Para responder às perguntas, selecionamos as aferições da agência sobre o assunto, cuja etiqueta aplicada foi falsa, realizadas entre 9 de janeiro e 6 de abril de 2023. As 25 checagens, que representam todas as publicações de Aos Fatos acerca dos atentados de 8 de janeiro, constituem o corpus da pesquisa, com base no qual faremos um estudo de caso (YIN, 2001YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e método. 2.ed. Porto Alegre-RS: Bookman, 2001.) com análise de conteúdo (BARDIN, 2002BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2002.), discriminando as unidades e as categorias de análise.

O estudo, além deste texto introdutório e do resumo (em português e inglês), apresenta, a seguir, a pesquisa bibliográfica, abordando desinformação, pós-verdade, populismo, fact-checking e seleção de fontes. Posteriormente, expõe os aspectos metodológicos para a condução do estudo. Na sequência, apresentamos e discutimos os resultados da pesquisa. Por fim, fazemos algumas considerações sobre a investigação, certos de que os desafios — à sociedade, aos profissionais do jornalismo e à academia — são enormes e precisam ser enfrentados.

Demarcações conceituais da pesquisa

Ao funcionarem como sistemas cibernéticos invertidos e não lineares, as redes sociais se constituem em plataformas antiestruturais permanentes e, por isso, são espaços para criação e circulação de discursos disruptivos, como argumenta Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022.. Além disso, segue a autora, a lógica algorítmica das plataformas faz com que o usuário, apesar da sensação de liberdade, seja o ambiente no qual o elemento não humano atua.

Esta inversão de papéis enclausura os indivíduos em bolhas (BUCCI, 2019aBUCCI, E. Seriam as fake news mais eficazes para campanhas de direita? – uma hipótese a partir das eleições de 2018 no Brasil. Novos Olhares, [S. l.], v. 8, n. 2, p. 21-29, 2019a. DOI: 10.11606/issn.2238-7714.no.2019.162062. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/novosolhares/article/view/162062. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.revistas.usp.br/novosolhares...
; SANTAELLA, 2019SANTAELLA, L. A pós-verdade é verdadeira ou falsa? Barueri-SP: Estação das Letras e Cores, 2019.), induzindo-os a uma realidade condicionada pelo seu sistema de crenças (SANTAELLA, 2019SANTAELLA, L. A pós-verdade é verdadeira ou falsa? Barueri-SP: Estação das Letras e Cores, 2019.; SEIXAS, 2019SEIXAS, R. A retórica da pós-verdade: o problema das convicções. Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, v. 18, n. 1, p. 122-138, 2019. DOI: 10.17648/eidea-18-2197. Disponível em: <https://periodicos.uesc.br/index.php/eidea/article/view/2197/1747>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://periodicos.uesc.br/index.php/eid...
), interditando argumentos divergentes.

Desse modo, conforme Dunker (2017, p. 29)DUNKER, C. Subjetividade em tempos de pós-verdade. In: DUNKER, C. Ética e pós-verdade. Dublinense: Porto Alegre, 2017. 128 p., “a pós-verdade exige uma alteração generalizada do humor, sim, com a emergência de dois afetos fundamentais: o ódio e a vergonha” Por este motivo, Hannah Arendt (1967, p. 26)ARENDT, H. Verdade e política. Trad. Manuel Alberto. [Nova York: The New Yorker], 1967. Disponível em: <http://abdet.com.br/site/wp-content/uploads/2014/11/Verdade-e-pol%C3%ADtica.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2023.
http://abdet.com.br/site/wp-content/uplo...
pondera que “a mentira, além de dizer o que o interlocutor deseja ouvir, aquilo que apetece o seu repertório axiomático, possui também inúmeras possibilidades de combinação [...]”.

Assim, reflete Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., como a estrutura do ambiente virtual está calcada no engajamento, independentemente da validade do conteúdo, os usuários estão mais suscetíveis às informações falsas, cujo intento é gerar dividendos políticos e econômicos (BUCCI, 2019b______. News não são fake – e fake news não são news. In BARBOSA, M. (org.). Pós-verdade e fake news: reflexões sobre a guerra de narrativas. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019b.). Por esta razão, a autora (2022) indica que as plataformas não são neutras, ensejando uma adesão política à direita do espectro ideológico, a teorias da conspiração e outras vertentes antiestruturais (CESARINO, 2022______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022.).

Dentre os discursos que ganham força na lógica das redes, é possível identificar o conspiracionismo, o negacionismo e o populismo, conforme reflexão proposta por Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022.. Para Laclau (2001)LACLAU, E. La Razón Populista. Tradução: Soledad Laclau. Buenos Aires: FCE, 2001. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4664084/mod_resource/content/1/1%20Laclau-Ernesto-La-Razon-Populista.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.p...
, o líder populista consegue catalisar as demandas heterogêneas da sociedade, gerando, em meio a um cenário de insatisfação, uma cadeia de equivalências. Por essa razão, Canovan (1999)CANOVAN, M. Trust the people! Populism and the two faces of democracy. Political Studies, n. 47 i. 1, p. 2-16, 1999. Disponível em: https://doi.org/10.1111/1467-9248.00184. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://doi.org/10.1111/1467-9248.00184...
define que o populismo é uma espécie de resposta convergente com a revolta, em nome do povo, rivalizando com as instâncias de poder correntes e dominantes na sociedade.

Considerando que não é possível compreender o populismo desconectado da sua comunicação, como sugerem Vreese et alii (2018)VREESE, C. H. de; et alii. Populism as an Expression of Political Communication Content and Style: A New Perspective. The International Journal of Press/Politics, v. 23, i. 4, p. 423-438, 2018. DOI: 10.1177/1940161218790035. Disponível em: <https://doi.org/10.1177/1940161218790035>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://doi.org/10.1177/1940161218790035...
e Mazzoleni e Bracciale (2018)MAZZOLENI, G.; BRACCIALE, R. Socially mediated populism: the communicative strategies of political leaders on Facebook. Palgrave Commun v. 4, i. 50, p. 1-10, 2018. DOI: 10.1057/s41599-018-0104-x. Disponível em: <https://www.nature.com/articles/s41599-018-0104-x#citeas>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.nature.com/articles/s41599-0...
, a atuação da liderança populista está calcada não apenas na retórica, mas nos instrumentos por meio dos quais a ordem discursiva chegará ao público. Mazzoleni e Bracciale (2018)MAZZOLENI, G.; BRACCIALE, R. Socially mediated populism: the communicative strategies of political leaders on Facebook. Palgrave Commun v. 4, i. 50, p. 1-10, 2018. DOI: 10.1057/s41599-018-0104-x. Disponível em: <https://www.nature.com/articles/s41599-018-0104-x#citeas>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.nature.com/articles/s41599-0...
anotam, em pesquisa desenvolvida com base no cenário eleitoral italiano, que o Facebook intensifica a lógica populista, definida em três categorias: apelo à ideia de povo; ataque às elites; e ostracização dos outros.

A primeira delas diz respeito ao povo enquanto uma expressão genérica, um esforço de retórica que prioriza as pessoas e suas causas, cujo objetivo é unir o eleitorado em torno de uma personalidade política, independentemente de sua filiação partidária. A segunda sintetiza posturas anti elitismo e anti establishment, por meio das quais é criado o cenário do nós x eles, sendo o nós o cidadão comum e o eles a elite dominante, representada por políticos, meios de comunicação e agentes econômicos. Por fim, a terceira categoria enseja a criação do outro perigoso, o inimigo comum ao povo, apresentado como bode expiatório por atores populistas (MAZZOLENI, BRACCIALE, 2018MAZZOLENI, G.; BRACCIALE, R. Socially mediated populism: the communicative strategies of political leaders on Facebook. Palgrave Commun v. 4, i. 50, p. 1-10, 2018. DOI: 10.1057/s41599-018-0104-x. Disponível em: <https://www.nature.com/articles/s41599-018-0104-x#citeas>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.nature.com/articles/s41599-0...
).

Se a pós-verdade é a circunstância na qual uma decisão é menos pautada em fatos do que em emoções e afetos, a comunicação viabilizada pelas redes digitais, estabelecendo um elo direto entre liderança e população, contribui “para dramatizar a comunicação populista porque são plataformas adequadas para produzir conteúdos emocionais, controversos e até violentos, típicos de muito ativismo populista” (MAZZOLENI, BRACCIALE, 2018MAZZOLENI, G.; BRACCIALE, R. Socially mediated populism: the communicative strategies of political leaders on Facebook. Palgrave Commun v. 4, i. 50, p. 1-10, 2018. DOI: 10.1057/s41599-018-0104-x. Disponível em: <https://www.nature.com/articles/s41599-018-0104-x#citeas>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.nature.com/articles/s41599-0...
, p. 3 – tradução do autor). Conforme Waisbord (2018)WAISBORD, S. The elective affinity between post-truth communication and populist politics. Communication Research and Practice, v.4, i.1, p.1-18, 2018. DOI: 10.1080/22041451.2018.1428928. Arquivo em PDF.
https://doi.org/10.1080/22041451.2018.14...
, o populismo desloca a política para o escopo da pós-verdade como expressão comunicacional, território no qual a verdade está fraturada e a comunicação, cindida.

As mídias sociais fornecem acesso direto ao público sem interferência jornalística (mas sujeitas a novas formas de gatekeeping algorítmico), oferecem a possibilidade de estabelecer uma conexão próxima e direta com as pessoas, fomentam o potencial para formas personalizadas de comunicação e podem criar um sentimento de comunidade, pertencimento e reconhecimento entre grupos dispersos

(VREESE et alii, 2018VREESE, C. H. de; et alii. Populism as an Expression of Political Communication Content and Style: A New Perspective. The International Journal of Press/Politics, v. 23, i. 4, p. 423-438, 2018. DOI: 10.1177/1940161218790035. Disponível em: <https://doi.org/10.1177/1940161218790035>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://doi.org/10.1177/1940161218790035...
, p. 428 – tradução do autor).

Em um estudo sobre o papel do WhatsApp no pleito eleitoral de 2018, durante dez meses de pesquisa em redes bolsonaristas, Cesarino (2019)CESARINO, L. Como vencer uma eleição sem sair de casa: a ascensão do populismo digital no Brasil. Internet & Sociedade, v. 1, n. 1, p. 92-120, 2019. Disponível em: <https://revista.internetlab.org.br/serifcomo-vencer-uma-eleicao-sem-sair-de-casa-serif-a-ascensao-do-populismo-digital-no-brasil/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://revista.internetlab.org.br/serif...
detectou cinco funções metalinguísticas que perpassam o conteúdo analisado, quais sejam: fronteira antagonística amigo-inimigo; equivalência líder-povo; mobilização permanente por meio de ameaça e crise; espelhamento do inimigo e inversão de acusações; e produção de um canal midiático exclusivo. Com base na categorização, identificou-se a circulação de “notícias falsas, teorias da conspiração, material ofensivo e calunioso contra certas pessoas ou grupos, avisos urgentes e alarmistas, enunciados distorcidos ou retirados de contexto” (CESARINO, 2019CESARINO, L. Como vencer uma eleição sem sair de casa: a ascensão do populismo digital no Brasil. Internet & Sociedade, v. 1, n. 1, p. 92-120, 2019. Disponível em: <https://revista.internetlab.org.br/serifcomo-vencer-uma-eleicao-sem-sair-de-casa-serif-a-ascensao-do-populismo-digital-no-brasil/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://revista.internetlab.org.br/serif...
, p. 96). Como notou Mounk (2019, p. 183)MOUNK, Y. O povo contra a democracia: por que a nossa liberdade corre perigo e como salvá-la. Tradução: Cássio de Arantes Leite e Débora Landsberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2019., “foram os populistas que exploraram melhor a nova tecnologia para solapar os elementos básicos da democracia liberal”.

Como forma de enfrentar o espalhamento de narrativas fraudulentas, observamos a atuação das agências de checagem de fatos. Sacramento e Paiva (2020, p. 100)SACRAMENTO, I.; PAIVA, R. Fake news, WhatsApp e a vacinação contra febre amarela no Brasil. Matrizes, [S. l.], v. 14, n. 1, p. 79-106, 2020. DOI: 10.11606/issn.1982-8160.v14i1p79-106. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/matrizes/article/view/160081. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.revistas.usp.br/matrizes/art...
propõem que “as empresas jornalísticas criaram inúmeras iniciativas para combater a desinformação e melhorar a alfabetização midiática, por exemplo, recursos de verificação de fatos, controles de qualidade colaborativos, maior transparência e assim por diante”.

Como instituições jornalísticas, em parte vinculadas a empresas consagradas, fazem o trabalho de aferição baseando-se em fontes de informação. Para Lage (2008)LAGE, N. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. São Paulo: Record, 2008., elas são, genericamente, de três procedências: documentais, pessoais e institucionais. Mais especificamente, podem variar entre: a) oficiais, oficiosas e independentes; b) primárias e secundárias; e c) testemunhas e experts.

Para tanto, a escolha e a seleção de fontes podem estar relacionadas à pauta e/ou a interesse por parte de quem apura a informação, buscando uma fonte que chancele uma posição do veículo. Vaz Chagas (2020, p. 1244)VAZ CHAGAS, L. J. Selección de fuente y tercerización en la construcción de noticias: dependencia y pasividad en la CBN Ponta Grossa. Estudios sobre el Mensaje Periodístico, v. 26, n. 3, p. 1243 -1253, 2020. DOI: 10.5209/esmp.65576. Disponível em: <https://revistas.ucm.es/index.php/ESMP/article/view/65576/4564456553787>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://revistas.ucm.es/index.php/ESMP/a...
reflete que esse processo “carrega uma singularidade fundamental nas escolhas dos repórteres e na identificação dos argumentos em disputa na sociedade”, variando entre a possibilidade de forjar cenários diversos ou silenciar alguns agentes.

Articuladas as bases epistemológicas do estudo, é momento de estabelecermos as balizas metodológicas desta pesquisa.

Aspectos metodológicos da investigação

Para responder aos problemas de pesquisa e no anseio de atingirmos os objetivos deste estudo, aderimos a uma abordagem multimétodo, tendo como parâmetros o estudo de caso, sob os preceitos de Yin (2001)YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e método. 2.ed. Porto Alegre-RS: Bookman, 2001., e a análise de conteúdo, em consonância com a proposta de Bardin (2002)BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2002..

Para Yin (2001)YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e método. 2.ed. Porto Alegre-RS: Bookman, 2001., o estudo de caso pode ser estimulado pelas perguntas como e por que. A escolha se justifica para compreendermos o modo como os elementos de pós-verdade e do populismo operam nos conteúdos falsos checados por Aos Fatos sobre os atentados de 8 de janeiro de 2023 e por que a seleção de fontes poderia ocorrer de outra maneira, tendo em vista o próprio contexto da pós-verdade e a obtenção de resultados melhores, razão pela qual propomos aqui um “estudo de caso único” (YIN, 2001YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e método. 2.ed. Porto Alegre-RS: Bookman, 2001., p. 35).

No escopo na análise de conteúdo, de perspectiva quali-quantitativa, Bardin (2002, p. 38)BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2002. define o método como “um conjunto de técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”. Neste caso, partimos de alguns pressupostos, como a pré-análise, a constituição do corpus, a exploração do material, o tratamento dos resultados por meio de inferências e as interpretações (BARDIN, 2002BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2002.).

Para proceder à análise dos dados, estabelecemos três categorias (Quadro 1), as quais figuram na bibliografia consultada, ou seja, são baseadas nas balizas teórico-conceituais, além de serem verificadas como padrões em boa parte do corpus, por meio de um movimento inicial exploratório.

Quadro 1
Definição das categorias analíticas do estudo. Fonte: O autor.

Para tanto, levamos em consideração todas as aferições realizadas por Aos Fatos entre 8 de janeiro e 6 de abril de 2023 sobre a tentativa de golpe de Estado impetrada em Brasília por extremistas de direita, descontentes com a derrota de Jair Bolsonaro no escrutínio eleitoral de outubro de 2022. Dessa forma, com base no caso selecionado (Aos Fatos), integram o corpus da pesquisa 25 unidades de análise (YIN, 2001YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e método. 2.ed. Porto Alegre-RS: Bookman, 2001.), apresentadas na Tabela a seguir:

Tabela 1
As unidades de análise do caso estudado, coletadas entre 8 de janeiro e 6 de abril de 2023. Fonte: O autor.

Apresentados as bases teórico-metodológicas, a categorização da pesquisa e o corpus com as 25 unidades de análise, na sequência, faremos a exposição dos resultados e as inferências.

Apresentação dos resultados e discussões

Em relação à primeira categoria analítica, pós-verdade, a tônica das informações classificadas como falsas por Aos Fatos atesta um dos principais desafios do fenômeno da desinformação: a dificuldade de se distinguir, sem que haja uma verificação mais detalhada por parte do usuário, o elemento que desvirtua o fato. Isso ocorre porque a pós-verdade não atua no campo da mentira integral, mas, como afirma Dunker (2017)DUNKER, C. Subjetividade em tempos de pós-verdade. In: DUNKER, C. Ética e pós-verdade. Dublinense: Porto Alegre, 2017. 128 p., apropria-se de frações de verdade, que, em seu todo, geram uma narrativa falsa.

Dessa forma, o que se observa nas 25 unidades de análise é a prevalência de imagens (foto ou vídeo) que retratam pessoas, espaços ou tempos pertinentes ao 8 de janeiro, mas que, na irregularidade de uma ou duas das três instâncias do fato, ficam descontextualizadas e, com isso, geram um conteúdo falacioso. Além disso, é possível afirmar que o movimento de tirar do contexto é dado, em boa medida, pelas legendas das postagens. Para Seixas (2019, p. 129)SEIXAS, R. A retórica da pós-verdade: o problema das convicções. Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, v. 18, n. 1, p. 122-138, 2019. DOI: 10.17648/eidea-18-2197. Disponível em: <https://periodicos.uesc.br/index.php/eidea/article/view/2197/1747>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://periodicos.uesc.br/index.php/eid...
, sobre a pós-verdade, “há nesses discursos, por assim dizer, enunciados comprovadamente verdadeiros, relação a fatos efetivamente comprovados, interpretações plausíveis, induções verossímeis [...]”.

A imagem checada na unidade 1 (FAUSTINO, 2023aFAUSTINO, M. Vídeo mostra manifestação no 7 de setembro de 2021, não ato golpista recente. Aos fatos, 2023a. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/video-mostra-manifestacao-7-setembro-2021-nao-ato-golpista-recente/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/video-...
), de 9 de janeiro de 2023, retrata uma manifestação que, de fato, aconteceu, mas não condizente com o tempo correto. O seu conteúdo não foi manipulado, tampouco criado, mas, ao ser apresentado como vinculado a determinada ocasião (sem sê-lo), pode enganar o internauta. Pela velocidade que pauta a atuação nas redes, não há a verificação, e a pessoa que compartilha a desinformação empresta a esta sua credibilidade, tornando o material confiável.

A desinformação também pode ser gerada mesclando frações verdadeiras da realidade com inserções fabricadas, como na unidade 6 (FAUSTINO, 2023e______. Funcionário do Banco do Brasil é falsamente associado a homem que teria defecado no STF. Aos fatos, 2023e. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/funcionario-banco-brasil-falsamente-associado-homem-defecado-stf/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/funcio...
). Em uma publicação realizada no Facebook e no Instagram, é produzida uma montagem entre duas imagens: a foto de alguém possivelmente defecando sobre um móvel do Supremo Tribunal Federal (STF) atrelada à foto de um funcionário do Banco do Brasil. Trata-se, na definição de Ferreira (2018)FERREIRA, R. R. Rede de mentiras: a propagação de fake news na pré-campanha presidencial brasileira. Observatório (OBS*), [S. l.], v. 12, n. 5, 2018. DOI: 10.15847/obsOBS12520181272. Disponível em: <https://obs.obercom.pt/index.php/obs/article/view/1272>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://obs.obercom.pt/index.php/obs/art...
, de conteúdo manipulado, quando informações ou imagens genuínas são utilizadas para enganar.

Outro elemento das narrativas que dificulta a compreensão correta das informações que circulam é que elas se fazem valer por meio da captação de preconceitos que habitam os próprios usuários. “Não se trata de pedir ao interlocutor que acredite em premissas extraordinárias ou contraintuitivas, mas de explorar preconceitos que o destinatário cultiva e que, gradualmente, nos levam a confirmar conclusões tendenciosas” (DUNKER, 2017DUNKER, C. Subjetividade em tempos de pós-verdade. In: DUNKER, C. Ética e pós-verdade. Dublinense: Porto Alegre, 2017. 128 p., p. 34).

Assim, como se vê na unidade 2 (FAUSTINO, 2023b______. É mentira que sobrinho de Zeca do PT atuou como ‘infiltrado’ em atos terroristas em Brasília. Aos fatos, 2023b. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/falso-sobrinho-zeca-do-pt-atos-terroristas-brasilia/>. Acesso em 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/falso-...
), aferição de 9 de janeiro de 2023, o contexto da pós-verdade, que atua no âmbito das crenças, convicções e emoções (SEIXAS, 2019SEIXAS, R. A retórica da pós-verdade: o problema das convicções. Revista Eletrônica de Estudos Integrados em Discurso e Argumentação, v. 18, n. 1, p. 122-138, 2019. DOI: 10.17648/eidea-18-2197. Disponível em: <https://periodicos.uesc.br/index.php/eidea/article/view/2197/1747>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://periodicos.uesc.br/index.php/eid...
; SANTAELLA, 2019SANTAELLA, L. A pós-verdade é verdadeira ou falsa? Barueri-SP: Estação das Letras e Cores, 2019.; BRUNO, ROQUE, 2019BRUNO, F.; ROQUE, T. A ponta de um iceberg de desconfiança. In: BARBOSA, M. (org.). Pós- verdade e fake news: reflexões sobre a guerra de narrativas. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.), apresenta-se como terreno aos antagonismos, fundamentos da comunicação digital corrente, como observaram Alexander (2018)ALEXANDER, J. C. Vociferando contra o Iluminismo: a ideologia de Steve Bannon. Trad. Maurício Hoelz. Sociologia & Antropologia, v. 8, p. 1009-1023, set./dez. 2018. Disponível em: <https://revistappgsa.ifcs.ufrj.br/wp-content/uploads/2019/02/9_v08n03_Jeffrey-Alexander.pdf>. Acesso em: 09 out. 2023.
https://revistappgsa.ifcs.ufrj.br/wp-con...
e Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., bem como da comunicação populista, nos dizeres de Mazzoleni e Bracciale (2018)MAZZOLENI, G.; BRACCIALE, R. Socially mediated populism: the communicative strategies of political leaders on Facebook. Palgrave Commun v. 4, i. 50, p. 1-10, 2018. DOI: 10.1057/s41599-018-0104-x. Disponível em: <https://www.nature.com/articles/s41599-018-0104-x#citeas>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.nature.com/articles/s41599-0...
e Vreese et alii (2018)VREESE, C. H. de; et alii. Populism as an Expression of Political Communication Content and Style: A New Perspective. The International Journal of Press/Politics, v. 23, i. 4, p. 423-438, 2018. DOI: 10.1177/1940161218790035. Disponível em: <https://doi.org/10.1177/1940161218790035>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://doi.org/10.1177/1940161218790035...
.

Figura 1
Print Screen do post checado por Aos Fatos, na aferição intitulada “É mentira que sobrinho de Zeca do PT atuou como ‘infiltrado’ em atos terroristas em Brasília”.

Ao abordarmos a segunda categoria de análise, antagonismo, notamos que a peça desinformativa se apropria de símbolos opostos aos dos extremistas, tendo como objetivo invocar a possibilidade de infiltrados que justifique o vandalismo ocorrido em 8 de janeiro, em Brasília. Ao contrário de duas unidades de análise, a narrativa acima e outras 22 aferidas por Aos Fatos não negam o acontecimento, mas estabelecem conexões, fora do bolsonarismo, que redundaram no cenário de destruição das sedes dos três poderes.

A desinformação checada na unidade 20 (RIBEIRO, 2023b______. Tribunal internacional não determinou soltura de golpistas presos por ataques de 8 de janeiro. Aos fatos, 2023b. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/tribunal-internacional-nao-soltou-golpistas-presos/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/tribun...
), por exemplo, produz embates com Alexandre de Moraes, Lula e a Polícia Federal (PF). Aqui, é possível verificar a intenção do conteúdo falso de rivalizar com instâncias e simbolismos da democracia liberal: Alexandre de Moraes era, à época das eleições, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do STF, duas instituições centrais de um dos poderes da República ostensivamente atacadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, inclusive despontando em Moraes as suas investidas pessoais, dando maior materialidade ao antagonismo; Lula foi o presidente eleito de forma legítima, e, ao defini-lo como usurpador, a narrativa falaciosa corrobora as acusações de Bolsonaro ao sistema eleitoral e, em específico, às urnas eletrônicas. Sendo a democracia um regime que demanda dos cidadãos sustentar suas decisões com informação, segundo reflete Bucci (2019c)______. Existe democracia sem verdade factual? Barueri-SP: Estação das Letras e Cores, 2019c., o conteúdo desinformativo parece ter a intenção de corroer as bases democráticas.

Ao longo das unidades, algumas pessoas e instituições aparecem como elementos de oposição das narrativas fraudulentas. Algumas delas são: Alexandre de Moraes, Lula, Partido dos Trabalhadores (PT), esquerda, Polícia Federal, TV Globo, Forças Armadas, black blocs, comunismo, Supremo Tribunal Federal (STF), Movimento Sem Terra (MST), que é atrelado a duas informações falsas, explorando a posição cristalizada de uma parte da população que enxerga os integrantes do MST como baderneiros e, portanto, capazes de realizar a depredação.

Figura 2
Print Screen do post checado por Aos Fatos, na aferição intitulada “É falso que vídeo mostra integrante do MST ‘infiltrado’ quebrando vidraças em Brasília”.

De acordo com a reflexão proposta por Waisbord (2018, p. 8) sobre o papel do preconceito, “vieses no processamento de informações, como percepção seletiva, viés de confirmação e inclinação para reforçar identidades de grupo, favorecem o consumo massivo e a distribuição de mentiras que se encaixam no preconceito e na desinformação existentes”. Lula, Alexandre de Moraes, esquerda, PT, STF, MST são expressões presentes em 17 dos 25 falseamentos difundidos entre janeiro e abril de 2023 e checados por Aos Fatos, quando não conjugadas em duas ou mais na mesma narrativa, o que indica um alinhamento ideológico da desinformação que circula nas plataformas, conforme ponderado por Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., sendo, nesses casos, anti esquerda e anti-institucional.

Esses elementos simbólicos, ao mesmo tempo que são inseridos nos conteúdos para deslocar os responsáveis pelo ocorrido, buscam apelar à lógica da rivalização, muito verificada nas redes sociais. Alexander (2018, p. 1014)ALEXANDER, J. C. Vociferando contra o Iluminismo: a ideologia de Steve Bannon. Trad. Maurício Hoelz. Sociologia & Antropologia, v. 8, p. 1009-1023, set./dez. 2018. Disponível em: <https://revistappgsa.ifcs.ufrj.br/wp-content/uploads/2019/02/9_v08n03_Jeffrey-Alexander.pdf>. Acesso em: 09 out. 2023.
https://revistappgsa.ifcs.ufrj.br/wp-con...
, em pesquisa sobre Steve Bannon, personagem importante da comunicação eleitoral de Trump e Bolsonaro, demonstra as bases do estrategista: “Bannon tece essas categorias binárias tensamente opostas numa narrativa apocalíptica que faz o bem lutar contra o mal em funesta e sangrenta batalha até a morte”.

Ao se apropriar de características da pós-verdade, como a retórica de afetos, tem-se um estado permanente de guerra, de mobilização (CESARINO, 2022______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022.), por meio do esgarçamento do medo, da raiva, da repulsa e do nojo (VOSOUGHI, ROY, ARAL, 2018VOSOUGHI, S.; ROY, D.; ARAL, S. The spread of true and false news online. Science, v. 359, issue 6380, p. 1146-1151, 2018. Disponível em: <https://science.sciencemag.org/content/359/6380/1146/tab-pdf>. Acesso em 25 jul. 2023.
https://science.sciencemag.org/content/3...
; BRUNO, ROQUE, 2019BRUNO, F.; ROQUE, T. A ponta de um iceberg de desconfiança. In: BARBOSA, M. (org.). Pós- verdade e fake news: reflexões sobre a guerra de narrativas. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.). Essa lógica, como reflete Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., explora a arquitetura das plataformas, cuja propensão para fomentar discursos antiestruturais, como populistas, é elevada, razão pela qual as redes não são neutras.

Diferentemente das mídias disruptivas anteriores, as novas mídias são propriamente cibernéticas: seus loops rápidos, capilarizados e alinháveis com os processos primários da cognição humana estariam propiciando o desdobramento simultâneos de processos de desintermediação e reintermediação, reduzindo assim as chances de ruptura linear, mas prolongando e até rotinizando, seus efeitos não lineares de crise. É esse tipo de efeito contraditório que move os públicos populistas e conspiratórios

(CESARINO, 2022______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., p. 142).

Nessa atuação de retirar a mídia tradicional do processo de mediação, cuja tentativa final é estabelecer novas mediações (WAISBORD, 2018WAISBORD, S. The elective affinity between post-truth communication and populist politics. Communication Research and Practice, v.4, i.1, p.1-18, 2018. DOI: 10.1080/22041451.2018.1428928. Arquivo em PDF.
https://doi.org/10.1080/22041451.2018.14...
), verificamos movimento similar em alguns conteúdos desinformativos, como o exposto na unidade 4 (LEITE, 2023aLEITE, B. É falso que vídeo mostra integrante do MST ‘infiltrado’ quebrando vidraças em Brasília. Aos fatos, 2023a. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/falso-integrante-mst-infiltrado-brasilia/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/falso-...
) (Figura 2), aferição promovida em 10 de janeiro de 2023, em que se atribui à Globo uma “política sensacionalista e mentirosa” (LEITE, 2023aLEITE, B. É falso que vídeo mostra integrante do MST ‘infiltrado’ quebrando vidraças em Brasília. Aos fatos, 2023a. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/falso-integrante-mst-infiltrado-brasilia/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/falso-...
). Esta prática coaduna com as ponderações de Cruz (2019)CRUZ, F. B. Fake news definem uma eleição? BARBOSA, M. (org). Pós-verdade e fake news: reflexões sobre a guerra de narrativas. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. 128 p., para quem o rechaço à imprensa profissional, à ética jornalística e a protocolos de apuração é uma marca. “No seu cerne reside a ideia de que políticos estariam passando a se conectar diretamente com as suas bases” (p. 27).

Para além dos antagonismos com o jornalismo, que, segundo Roxo e Melo (2018, p. 14)ROXO, M. A.; MELO, S. Hiperjornalismo: Uma visada sobre fake news a partir da autoridade jornalística. Revista Famecos, [S. l.], v. 25, n. 3, p. ID30572, 2018. DOI: 10.15448/1980-3729.2018.3.30572. Disponível em: <https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/view/30572>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs...
, também se explicam pelas atuações reprováveis da própria imprensa, viabilizando o “enfraquecimento do pacto de credibilidade”, é preciso compreender que, em contradição, a desinformação também explora a confiança que ainda prevalece em relação às mídias e empresas tradicionais para emplacar o conteúdo falacioso, por meio da mimese jornalística (FERREIRA, 2018FERREIRA, R. R. Rede de mentiras: a propagação de fake news na pré-campanha presidencial brasileira. Observatório (OBS*), [S. l.], v. 12, n. 5, 2018. DOI: 10.15847/obsOBS12520181272. Disponível em: <https://obs.obercom.pt/index.php/obs/article/view/1272>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://obs.obercom.pt/index.php/obs/art...
; BUCCI, 2019). Aproveitando a dinâmica da economia da atenção na internet (CESARINO, 2022______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022.), “algumas fontes on-line de notícias falsas imitam o formato dos jornais tradicionais de qualidade para parecerem mais confiáveis” (RIDDER, 2021RIDDJ. What’s so bad about misinformation? Inquiry, 2021. DOI: 0.1080/0020174X.2021. 2002187. Disponível em: <https://www.tandfonline.com/doi/epdf/10.1080/0020174X.2021.2002187?needAccess=true&role=button>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.tandfonline.com/doi/epdf/10....
, p. 3).

Quando os produtores de desinformação não criam uma manchete/notícia emulando o layout de sites tradicionais, apropriam-se de conteúdos audiovisuais para adulterá-los. Neste caso, podem recorrer ao recurso da edição, juntando pedaços que darão um sentido diferente do original, ou suprimem informações gráficas, como o gerador de caracteres (GC), remetendo a um relato distinto do original, na medida em que a fala do apresentador é procedente, mas sem o complemento do GC parece se referir a um fato qualquer. Foi o que observamos em duas unidades de análise, uma delas checada por Aos Fatos em 19 de janeiro de 2023 (LEITE, 2023d______. É falso que desembargador mandou soltar presos por atos golpistas de 8 de janeiro. Aos fatos, 2023d. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/falso-desembargador-mandou-soltar-presos-8-de-janeiro/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/falso-...
), na qual a notícia se referia a outras solturas, de 2022, não à de extremistas de direita.

Figura 3
Print Screen do post checado por Aos Fatos, na aferição intitulada “É falso que desembargador mandou soltar presos por atos golpistas de 8 de janeiro”.

A animosidade entre jornalismo e sociedade pode ser um caminho para entendermos as análises da terceira categoria, fontes utilizadas. Se para Lage (2008)LAGE, N. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. São Paulo: Record, 2008., as fontes variam entre pessoais, documentais e institucionais, Vaz Chagas (2020)VAZ CHAGAS, L. J. Selección de fuente y tercerización en la construcción de noticias: dependencia y pasividad en la CBN Ponta Grossa. Estudios sobre el Mensaje Periodístico, v. 26, n. 3, p. 1243 -1253, 2020. DOI: 10.5209/esmp.65576. Disponível em: <https://revistas.ucm.es/index.php/ESMP/article/view/65576/4564456553787>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://revistas.ucm.es/index.php/ESMP/a...
pondera que a inclusão ou a supressão delas pode representar a tentativa de evidenciar ou silenciar posições. Portanto, o uso de determinadas fontes pode até ser pautado por premissas legítimas, mas o resultado talvez não apresente os efeitos desejados.

Verificamos nas 25 unidades de análise a prevalência de fontes jornalísticas, ou seja, documentais, nas aferições da agência Aos Fatos, com o apoio de duas ou mais fontes dessa natureza em cada checagem. Em geral, elas são utilizadas com duas finalidades: trazer informações sobre os eventos ocorridos em 8 de janeiro e seus desdobramentos, ou obter depoimentos e registros de fontes institucionais, como Polícia Federal, Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Distrito Federal e Secretaria de Estado de Segurança Pública do Distrito Federal.

Figura 4
Print Screen do post checado por Aos Fatos, na aferição intitulada “Imagem de drone não prova tese de ‘infiltrados’ nos atos golpistas de 8 de janeiro”.

Se o sistema de peritos está em crise e há um movimento para substituir as mediações, como pontua Cesarino (2022)______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., é razoável que o trabalho do fact-checking possa se apoiar em fontes variadas. Desse modo, os dados demonstram que as entrevistas, enquanto recurso de apuração, são escassas no caso estudado, sendo vistas em apenas três unidades de análise.

Além disso, é possível pensar que as checagens poderiam ir além de desmentir a participação de pessoas ou um desfecho que não condiz com a vigência dos fatos. Nesse sentido, não se verificou a aparição de qualquer especialista que pudesse dar às manifestações o seu devido contexto: a tentativa de ruptura democrática. “São geralmente fontes secundárias, que se procuram em busca de versões ou interpretações de eventos” (LAGE, 2008LAGE, N. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. São Paulo: Record, 2008., p. 67). Isso seria plausível, na medida em que, como já observado aqui, as narrativas não têm a presunção de negar o vandalismo.

Pelo contrário, vemos incidências de um levante patriótico ou de sua aceitação como fruto da atuação de infiltrados, mas sem refletir sobre a posição das instituições de Estado que, concretamente, foram destruídas, convertendo a barbárie em símbolo de um movimento extremista, como notamos na aferição (unidade 7) realizada em 11 de janeiro de 2023 (FAUSTINO, 2023f______. É falso que mulher chamada Nilma Marson morreu em ginásio da PF em Brasília. Aos fatos, 2023f. Disponível em: <https://www.aosfatos.org/noticias/falso-nilma-marson-morreu-ginasio-pf-brasilia/>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.aosfatos.org/noticias/falso-...
) sobre a falsa informação de que uma mulher havia morrido quando estava sob os cuidados da polícia.

Além das fontes institucionais, como assessorias, que foram acessadas por meio de sites, contato via aplicativo de mensagem ou perfil em rede social, a agência Aos Fatos também recorreu, em duas checagens, a uma análise facial comparada, diante da tentativa de atribuir duas ações golpistas a pessoas vinculadas ao Partido dos Trabalhadores (PT). Nesses casos, a própria aferição apontou características físicas entre as pessoas que praticaram as ações e aquelas a quem o ato estava sendo imputado.

Trata-se de uma tentativa válida, pois trabalha com elementos concretos de fisionomia, mas que, no contexto da pós-verdade e da desinformação catapultada por antagonismos típicos da insurgência populista, pode não surtir o efeito desejado, na medida em que a algoritmização das redes vai aprisionando os usuários em bolhas. Como sugere Santaella (2019, p. 80)SANTAELLA, L. A pós-verdade é verdadeira ou falsa? Barueri-SP: Estação das Letras e Cores, 2019., “as bolhas e as fake news, em prol da disseminação de crenças enrijecidas por ideias fixas e inflexíveis, trabalham para minar a confiabilidade de quaisquer fontes de registros e transmissão da efetiva ocorrência dos fatos”.

Neste cenário, a realidade virtual é capaz de entregar aos internautas contextos customizados que não afrontam os sistemas de crença cristalizados, dado que o modelo de negócio das redes é baseado no engajamento, que pode ser recusado, caso a narrativa vigente disponibilize um relato divergente do esperado. “[...] Os algoritmos entregam aos usuários mundos personalizados que confirmam seus enquadramentos individuais” (CESARINO, 2022______. O mundo do avesso: verdade e política na era digital. São Paulo: Ubu Editora, 2022., p. 105).

Considerações finais

No contexto da pós-verdade, a desinformação encontra lastro em um sistema de mídia que descentraliza a produção e a circulação de informações e privilegia os algoritmos, gerando “câmaras de eco” e o “viés de confirmação” (SUNSTEIN, QUATTROCIOCCHI, SCALA, 2016SUNSTEIN, C. R.; QUATTROCIOCCHI, W.; SCALA, A. Echo Chambers on Facebook. 2016. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/331936299_Echo_Chambers_on_Facebook/link/5c93b14b299bf111693e20f4/download>. Acesso em: 25 jul. 2023.
https://www.researchgate.net/publication...
). Como forma de mitigar os efeitos das informações falsas, as agências de checagem de fatos se configuram em coletivos que apuram relatos produzidos fora do escopo do jornalismo.

Sendo assim, a presente pesquisa delineou dois objetivos: [i] discutir as características da pós-verdade e do populismo nas aferições identificadas pela Aos Fatos sobre os atentados de 8 de janeiro; e [ii] identificar as fontes utilizadas pela agência e as suas incidências nas checagens realizadas.

Dessa forma, os dados indicam que a pós-verdade é explorada pelas narrativas falaciosas, criando antagonismos, gerando polarização e mobilizando seguidores não por argumentos, mas por reações emocionais. Outro item muito presente na desinformação sobre a tentativa de golpe de Estado é a apropriação de elementos de verdade, capazes de, no todo, gerar uma informação fraudulenta.

Isso fica ainda mais potencializado, na medida em que o discurso hegemônico não é o de negar os atos de vandalismo, mas, em regra, atribuí-lo a outros responsáveis que, historicamente, identificam-se mais à esquerda do espectro ideológico. Aqui, fica evidenciado o movimento de deslocar os artífices dos atos para símbolos opostos aos das pessoas que protagonizaram a destruição das sedes dos três poderes, sendo estes e os produtores e veiculadores da desinformação alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Assim, é possível ponderar que elementos do populismo, como ataque às elites e a ostracização dos outros, estiveram presentes por meio dos antagonismos delineados em algumas aferições, como o PT, o MST e a própria mídia hegemônica. Pelas inferências, os dados sugerem que o contexto da pós-verdade é fértil às investidas populistas, que encontram nas redes sociais um instrumento operacional. A lógica de plataformização viabiliza a circulação de conteúdo, a qual, por sua vez, prioriza o engajamento baseado em sentimentos radicalizados, como medo e ódio.

Em relação às fontes selecionadas nas aferições, nota-se uma prevalência de sites jornalísticos, o que pode, em boa medida, representar um problema na tentativa de convencer o público, posto que a queda na credibilidade da imprensa ajuda a explicar a proliferação e a aceitação das fraudes.

Por outro lado, um recurso de apuração que poderia dar mais materialidade às checagens, as entrevistas, é pouco utilizado, não havendo nenhuma aparição de experts, o que impediu as aferições de trazer, além de uma abordagem mais pontual da desinformação, o entendimento de que os atos foram antidemocráticos.

Considerando-se que não há a negação do que ocorreu, razão pela qual a incidência de narrativas a apontarem infiltrados ser elevada, propor a discussão por uma abordagem adicional pode se constituir em outra possibilidade de aferição. Os poucos movimentos de coletar depoimentos de pessoas envolvidas são provenientes de iniciativas escassas por parte da própria agência ou por meio da apuração de veículos jornalísticos.

Nesse sentido, concluímos que o trabalho dos coletivos de fact-checking é uma das alternativas válidas para atenuar os impactos da desinformação, em paralelo a outras ações de médio e longo prazo, como a educação midiática e a construção de um aparato regulador. Entretanto, a Aos Fatos e outras agências podem aprimorar os recursos de apuração, por meio da seleção de fontes mais diversas, cujo intuito é emplacar maior capilaridade adiante da sociedade.

As inferências e considerações propostas por este estudo não têm a pretensão de generalizar as apreciações sobre o combate à desinformação, mesmo no escopo dos atentados de 8 de janeiro. O nosso intuito foi discutir as incidências de pós-verdade e de antagonismos nas informações falsas do evento golpista, além de compreender as fontes utilizadas pela Aos Fatos em suas checagens, considerando todas as aferições feitas pela agência entre janeiro e abril de 2023. Se definíssemos como corpus da investigação checagens posteriores da Aos Fatos ou aferições de diferentes agências de fact-checking sobre a mesma ocorrência em qualquer outro recorte temporal, as inferências e as conclusões poderiam ser distintas.

Esperamos que o presente estudo possa contribuir para as discussões sobre desinformação, pós-verdade, comunicação populista e fact-checking, compreendendo que o problema é complexo e, portanto, demanda reflexões e respostas tão cuidadosas quanto perenes. Tendo em vista os riscos que correm as democracias contemporâneas, a imprensa e as pesquisas na área do jornalismo têm importância fundamental.

Referências

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    25 Jul 2023
  • Aceito
    01 Out 2023
Programa de Estudos Pós-graduados em Comunicação e Semiótica - PUC-SP Rua Ministro Godoi, 969, 4º andar, sala 4A8, 05015-000 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (55 11) 3670 8146 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: aidarprado@gmail.com