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Enfrentamento da morte fetal pela enfermagem na abordagem disposicional e na Teoria Motivacional do Coping

Coping with fetal death by nursery professionals on the dispositional approach and Motivacional Theory of Coping

Resumos

O enfrentamento (coping) tem sido entendido como uma ação autorregulatória de ajuste ao desequilíbrio provocado pelo estressor, sempre com função adaptativa, ainda que a estratégia de enfrentamento não seja resolutiva. Duas abordagens têm esta definição em comum - a Abordagem Disposicional e a Teoria Motivacional do Coping. Visando a estudar o coping da morte fetal, 36 profissionais de enfermagem de dois hospitais públicos responderam, individualmente, o Inventário COPE com 60 itens e uma Entrevista de Coping Motivacional, com 12 categorias de coping. Esses profissionais lidam com a morte fetal utilizando preferencialmente as seguintes estratégias de enfrentamento: Negociação, Busca de Informação, Autoconfiança e Busca de Suporte (Entrevista), e pela Religiosidade, Reinterpretação positiva e Planejamento (COPE). Discute-se a possibilidade de estudar o coping com base em enfoque multiteórico, a fim de ampliar a compreensão do processo de enfrentamento de condições adversas, como a morte fetal.

Coping; Autorregulação; Equipe de Enfermagem


Coping has been understood as a self-regulatory action adjustment to the imbalance caused by the stressor, always with adaptive function, even if the coping strategy is not solving. Two approaches have this definition in common - Dispositional Approach and the Motivational Theory of Coping. In order to assess the coping of the fetal death, 36 nursing professionals from two public hospitals answered individually COPE Inventory, with 60 items and the "Motivational Coping" Guide Interview, with 12 categories of coping. These professionals coping with fetal death through adaptive ways of coping, such as Negotiation, Information Seeking, Self-reliance and Support Seeking (Interview), and by the Religiosity, Positive Reinterpretation and Planning (COPE). It is necessary discuss the possibility of studying the coping based on various approaches to broaden the understanding of the coping process in adverse conditions such as fetal death.

Coping; Self-regulation; Nursery


A temática do coping (enfrentamento) tem sido considerada de grande relevância para o campo da Psicologia há pelo menos 40 anos. Desde as décadas de 1960 e 1970, o coping tem sido estudado, inicialmente, pela abordagem psicodinâmica, como sendo um atributo estável, da ordem do inconsciente individual, e relacionado aos mecanismos de defesa (Vaillant, 1994Vaillant, G. E. (1994). Ego mechanisms of defense and personality psychopathology. Journal of Abnormal Psychology, 103, 44-50. http://dx.doi.org/10.1037//0021-843X.103.1.44.
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). A limitação dessa concepção, que não permitia compreender mais amplamente esse fenômeno uma vez que o relacionava apenas a aspectos individuais, fez surgir outra perspectiva teórica, a abordagem cognitiva, na qual o conceito de copingpassou a ser entendido como um processo transacional entre a pessoa e o ambiente (Lazarus & Folkman, 1984Lazarus, R. S., & Folkman, S. (1984). Stress, appraisal and coping. New York: Springer Publishing Company.), ressaltando-se tanto o processo quanto os traços de personalidade (Carver & Connor-Smith, 2010Carver, C. S., & Connor-Smith, J. (2010). Personality and coping. Annual Review of Psychology, 61, 679-704. http://dx.doi.org/10.1146/annurev.psych.093 008.100352.
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).

Na perspectiva cognitivista, o coping pode ser definido como "... esforços cognitivos e comportamentais empregados para lidar com demandas específicas externas e/ou internas, que são avaliadas como excedendo os recursos do indivíduo" (Lazarus & Folkman, 1984, p.141). É compreendido com base em duas amplas categorias: (a) coping focado na emoção; e b) coping focado no problema, sendo que a primeira diz respeito a um esforço para regular o estado emocional e a segunda se refere a um esforço para solucionar o problema que deu origem ao evento estressor.

Contudo, esta divisão em duas classes de coping tem sido criticada por propor categorias muito abrangentes, que integram muitos tipos de coping; além disso, uma única Estratégia de Enfrentamento (EE) pode estar direcionada para o problema e para a emoção, simultaneamente (Compas, Connor-Smith, Saltzman, Thomsen, & Wadsworth, 2001Compas, B. E., Connor-Smith, J. K., Saltzman, H., Thomsen, A. H., & Wadsworth, M. E. (2001). Coping with stress during childhood and adolescence: Problems, progress, and potential in theory and research. Psychological Bulletin, 127(1), 87-127. http://dx.doi.org/10.1037//0033-2909.127.1.87.
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; Skinner, Edge, Altman, & Sherwood, 2003Skinner, E. A. (1992). Perceived control: Motivation, coping and development. In R. Schwarzer (Ed.), Self-efficacy: Thought control of action (pp.91-106). Washington, DC: Hemisphere Publishing. ). Assim, na década de 1990, surgiu uma nova tendência de estudo e investigação sobre o coping, considerada como a terceira geração de pesquisadores da área, que, ainda com base na abordagem cognitiva, têm centrado seus estudos na análise da convergência entre coping e personalidade (Carver & Connor-Smith, 2010).

Dessa forma, segundo Carver e Connor-Smith (2010), o coping pode ter um caráter disposicional, envolvendo mecanismos de autorregulação pautados em características de temperamento e de personalidade. Nesta perspectiva, as EE focalizadas no problema e na emoção se relacionam e se complementam, dando origem a dois tipos de coping: (a) coping engajado (engagement coping), no qual há compromisso e envolvimento da pessoa com seu processo de enfrentamento por meio do uso de estratégias ativas de enfrentamento, como busca de apoio, regulação emocional, aceitação, por exemplo; e (b) coping desengajado (disengagement coping) baseado em esforços no sentido de ignorar o estressor, incluindo o uso de EE, como a evitação, a negação e a ilusão.

A abordagem disposicional do coping de Carver e Connor-Smith (2010), Carver e Scheier (2011), Carver, Scheier e Weintraub (1989), aceita ainda o conceito de "estilos de coping". Diferentemente das EE, que são ações cognitivas e comportamentais adotadas em uma situação específica de estresse, os estilos de coping representam as formas habituais ou tendências individuais para lidar com estresse e que podem influenciar reações futuras. Assim, os estilos de coping se relacionam às características de personalidade e às capacidades autor-regulatórias, que definem uma tendência particular de responder a uma situação específica, ou seja, adotar EE específicas usando a autorregulação diante da condição de estresse.

Para sustentar tais pressupostos, Carver e Connor-Smith (2010) relacionam as respostas de coping com características individuais de personalidade, adotando como base o Modelo dos Cinco Grandes Fatores (Big Five) (McCrae, 2006McCrae, R. R. (2006). O que é personalidade? In C. Flores-Mendonza & R. Colom (Orgs.), Introdução à Psicologia das diferenças individuais (pp.203-218). Porto Alegre: Artmed.). Este modelo define cinco grandes fatores latentes ou domínios nas respostas das pessoas: extroversão, neuroticismo, socialização, realização e abertura à experiência. As pessoas tendem a adotar determinado perfil de coping, de maneira frequente ou não, de acordo com suas características de personalidade, desenvolvendo, assim, estilos de coping para lidar com o estresse (Carver & Connor-Smith, 2010; Carver et al., 1989). Por sua vez, o estilo de coping adotado se relaciona com duas formas básicas de funcionamento autorregulatório: uma de caráter racional e outra, vivencial/experiencial (Carver & Scheier, 2011).

O sistema racional opera frequentemente de forma consciente, utiliza regras lógicas, é verbal, deliberativo e relativamente lento. O sistema vivencial/experiencial é intuitivo e associativo, funciona automaticamente, de modo não verbal, rápido e até impulsivo. Ambos os sistemas estão sempre em atuação e o comportamento de autorregulação dependerá do tipo de sistema dominante, o que pode ser influenciado tanto pelas limitações situacionais quanto pelas diferenças individuais (Carver & Scheier, 2011).

Dessa forma, considerando a autorregulação como um processo de controle e manejo do comportamento e emoções, que ocorre conjuntamente, Carver e Connor-Smith (2010) consideram que a natureza do coping se relaciona à reação das pessoas frente ao estresse. Essa reação pode ser interpretada com base em dois modelos: modelo baseado em metas e modelo biológico. Tais modelos representam visões sobre a organização funcional da natureza humana e, consequentemente, sobre as propriedades básicas da autorregulação relacionada às respostas de coping. Mais especificamente, a capacidade de autorregulação ajudaria o indivíduo a coordenar intencionalmente ações, com interesses e objetivos diferentes, em direção a metas de longo prazo, na tentativa de agir para alcançar determinados objetivos ou retrair-se diante de perturbações ou situações de estresse (Carver & Scheier, 2011).

No caso do modelo baseado em metas, o coping é considerado como um comportamento orientado para atingir uma meta. Esta pode ser percebida, ora como um incentivo positivo, ora com valor negativo (a dor, por exemplo), o que define se o comportamento será de aproximação ou de evitação. Além disso, nesse modelo, os esforços pessoais podem ser determinados parcialmente por expectativas de obter sucesso ou de falhar, sendo importante para a compreensão do significado dos estressores. A relação do engajamento (engagment) e do desengajamento (disengagment) com as metas é importante para a compreensão da estrutura do coping nessa perspectiva, já que envolvem expectativas positivas e negativas sobre o futuro.

Diferentemente, o modelo biológico considera a autorregulação em termos de comportamentos baseados em traços de temperamento, que sustentam sistemas funcionais de aproximação/ativação e/ou de evitação/inibição, suportados parcialmente por áreas distintas do cérebro. Cada sistema varia de pessoa para pessoa, e influencia o comportamento de resposta frente a um evento estressor, considerado como desafio, ameaça ou ainda como perda (Carver & Connor-Smith, 2010). Logo, na Abordagem Disposicional do Coping, as formas habituais de resposta de coping se baseiam em características psicológicas relativamente estáveis, que definem formas de pensar, sentir e agir, com possibilidades de mudança resultante das interações do indivíduo com seus contextos ecológicos.

Para avaliação do coping sob essa abordagem, existem instrumentos para identificar as EE associadas aos traços de personalidade. Um exemplo é o Inventário COPE (Carver et al., 1989), instrumento utilizado nesta pesquisa, e que tem servido para avaliar o coping em diferentes populações, tais como adolescentes (Phelps & Jarvis, 1994Phelps, S. B., & Jarvis, P. A. (1994). Coping in adolescence: Empirical evidence for a theoretically based approach to assessing coping. Journal of Youth and Adolescence, 23(3), 359-371. http://dx.doi.org/10.1007/BF01536724.
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), professores de escolas públicas (Zaffari, Peres, Carlotto, & Câmara, 2009Zaffari, N. T., Peres, V. L., Carlotto, M. S., & Câmara, S. G. (2009). Síndrome de burnout e estratégias de coping em professores: diferença entre gêneros. Psicologia IESB, 1(2), 112.), profissionais de enfermagem (Colossi, Calesso-Moreira, & Pizzinato, 2011Colossi, E. G., Calesso-Moreira, M., & Pizzinato, A. (2011). Estratégias de enfrentamento utilizadas pela equipe de enfermagem de um CTI adulto perante situações de estresse. Revista Ciência & Saúde, 4(1), 14-21.) e mulheres vítimas ou não de violência conjugal (Cunha & Pinho, 2011Cunha, D., & Pinho, M. S. (2011). Sugestionabilidade interrogativa em mulheres vítimas de violência conjugal. Ex Aequo, 23, 133-147.). Estudos internacionais sobre análise psicométrica do Inventário COPE foram conduzidos para adaptação desse instrumento para diferentes contextos socioculturais, como, por exemplo, para a população da Estônia (Kallasmaa & Pulver, 2000Kallasmaa, T., & Pulver, A. (2000). The structure and properties of Estonian COPE inventory. Personality and Individual Differences, 29(5), 881-894.), Estados Unidos (Greer, 2007Greer, T. M. (2007). Measuring coping strategies among African Americans: An exploration of the latent structure of the COPE Inventory. Journal of Black Psychology, 33(3), 260-277.), Turquia (Agargün, Be iro lu, K ran, Ozer, & Kara, 2005) e Colômbia (Morán, Landero, & González, 2010).

Igualmente com ênfase no conceito de autorregulação, apresenta-se outra perspectiva teórica-conceitual para o estudo e pesquisa sobre o coping: a Teoria Motivacional do Coping (TMC) de Skinner e Edge (2002) e Skinner e Wellborn (1994). Nessa abordagem, o coping é compreendido como um mecanismo de autorregulação diante de um evento estressor (Compas et al., 2001; Skinner, 1999) e descreve "... como a pessoa mobiliza, modula, maneja e coordena seu comportamento, emoção e atenção sob condições de estresse" (Skinner & Wellborn, 1994, p.112).

Dada a complexidade do processo de coping e a infinidade de categorias, pesquisadores da abordagem motivacional têm investido esforços para construção de sistemas de categorias para conceituá-lo e mensurá-lo (Skinner et al., 2003; Skinner & Zimmer-Gembeck, 2009). Com base em revisão crítica sobre a estrutura das escalas de coping, feita por Skinner et al. (2003), foram encontradas mais de 400 categorias diferentes. Pro-puseram sua organização em uma estrutura hierárquica de três níveis, considerando as funções adaptativas das categorias de enfrentamento: 1) nível superior, contendo as famílias de enfrentamento (family of coping); 2) nível médio, com diferentes estratégias de enfrentamento (ways of coping); e 3) nível inferior, com as instâncias ou comportamentos de enfrentamento (instance of coping).

A análise empírica e conceitual do coping sob essa perspectiva tem convergido para um número menor de "famílias de enfrentamento", que podem ser utilizadas para classificar a maioria, se não todas as EE. Nesse sentido, foram propostas por Skinner et al. (2003) 12 categorias de alta ordem ou famílias de coping: 1) Autoconfiança; 2) Busca por suporte; 3) Resolução de Problemas; 4) Busca por Informação; 5) Acomodação; 6) Negociação; 7) Delegação; 8) Isolamento; 9) Desamparo; 10) Fuga; 11) Submissão; e 12) Oposição. Tais categorias são analisadas a partir do contexto e do evento vivenciado, sendo também classificadas de acordo com três necessidades psicológicas básicas de: a) relacionamento, que é a necessidade de manter um relacionamento próximo com outras pessoas; b) competência, relacionada com a necessidade de alcançar os objetivos nas interações com o ambiente, no sentido de se conseguir o que se almeja; e c) autonomia, que é a necessidade de ter liberdade para realizar suas próprias escolhas (Skinner, 1999; Skinner & Wellborn, 1994).

Nessa perspectiva, todas as EE devem ser consideradas como adaptativas, uma vez que se trata de uma ação regulatória em que a estratégia utilizada diz respeito à maneira que a pessoa encontra para lidar com a adversidade ou com o evento estressor (Skinner & Zimmer-Gembeck, 2009). Assim como na Abordagem Disposicional, instrumentos de avaliação do coping baseados na TMC para uso com adultos têm sido encontrados, principalmente para pais e professores (Skinner, Johnson, & Snyder, 2005; Skinner & Belmont, 1993); no entanto, não especificamente para profissionais de saúde, com exceção do estudo de Martins (2014) Martins, S. W. (2014). Manejo de dor neonatal: contexto organizacional, estresse e coping dos profissionais de saúde (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória.. Para estudo do coping em crianças, Lees (2007) Lees, D. C. (2007). An empirical investigation of the motivational theory of coping in middle to late childhood (Unpublished doctoral thesis). School of Psychology, Brisbane, Austrália .propôs a Motivational Theory of Coping Scale - 12 (MTC - 12), que foi usada para subsidiar a proposta de avaliação elaborada para esta pesquisa.

Com base em pesquisas sobre a percepção de controle no processo de estresse e coping (Skinner, 1992) e sobre a relação entre autorregulação e coping (Skinner, 1999), pesquisadores nacionais têm aplicado essa teoria em diferentes contextos, como o enfrentamento da hospitalização em crianças com câncer (Motta & Enumo, 2010Motta, A. B., & Enumo, S. R. F. (2010). Intervenção psicológica lúdica para o enfrentamento da hospitalização em crianças com câncer. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 26(3), 445-454. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-37722010000300007.
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); o enfrentamento materno da internação de bebês prematuros e com baixo peso internados em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) (Ramos, 2012 Ramos, F. P. (2012). Uma proposta de análise do coping de grupo de mães de bebês prematuros com baixo peso na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória.) e de bebês com malformações congênitas (Vicente, 2013 Vicente, S. R. C. R. M. (2013). O impacto do diagnóstico de Anomalia Congênita: Coping e indicadores emocionais maternos (Dissertação de mestrado não-publicada). Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória .); o coping de cuidadores de crianças com anemia falciforme (Dias, Oliveira, Enumo, & Paula, 2013Dias, T. L., Oliveira, C. G. T., Enumo, S. R. F., & Paula, K. M. P. (2013). A dor no cotidiano de cuidadores e crianças com anemia falciforme. Psicologia USP, 24(3), 391-411. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-65642013000300003.
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) o engajamento de professores de educação inclusiva (Silveira, 2014 Silveira, K. A. (2014). A promoção do engajamento discente por professoras de classe inclusiva e suas relações com processos de estresse e coping docente (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória.); e o coping da dor neonatal em médicos e equipe de enfermagem em UTIN (Martins, 2014).

Importante ressaltar que, quando comparada à abordagem cognitiva, e mesmo à conceituação do coping como autorregulação (Compas et al., 2001), a TMC difere no que diz respeito ao caráter voluntário do coping, afirmando que as respostas involuntárias ou automáticas também são consideradas respostas de coping(Eisenberg, Valiente, & Sulik, 2009Eisenberg, N., Valiente, C., &. Sulik, M. J. (2009). How the study of regulation can inform the study of coping. In E. A. Skinner & M. J. Zimmer-Gembeck (Eds.), Coping and the development of regulation: New directions for child and adolescent development (pp.75-86). San Francisco: Jossey-Bass. ; Lees, 2007; Skinner et al., 2003; Skinner & Wellborn, 1994). Nesse sentido, a Teoria Motivacional do Coping se aproxima da Abordagem Disposicional doCoping, uma vez que ambas consideram o coping como uma ação autorregulatória de resposta do indivíduo para se ajustar ao desequilíbrio provocado pelo evento estressor. Para ambas as abordagens, o coping terá sempre uma função adaptativa, ainda que a EE ou o processo de coping adotado não seja necessariamente resolutivo na solução imediata do problema fonte de estresse e resulte apenas na adaptação ou readaptação às demandas frente ao estressor.

Nessa direção, considera-se o coping como um processo complexo e multidimensional e que os estilos de coping constituem as formas habituais ou tendências individuais para lidar com o estresse (Carver & Connor-Smith, 2010). As respostas de coping devem ser analisadas no contexto específico em que ocorrem, com base na compreensão de como o indivíduo maneja, modula e coordena seu comportamento, suas emoções e sua atenção sob a condição de estresse (Skinner & Zimmer-Gembeck, 2009).

Com este embasamento, foi proposto este estudo do enfrentamento das demandas ocupacionais específicas do trabalho de profissionais de enfermagem, sob um enfoque multidimensional e contextual de análise do coping, o qual tem sido pouco investigado (Rodrigues & Chaves, 2008Rodrigues, A. B., & Chaves, E. C. (2008). Fatores estressantes e estratégias de coping dos enfermeiros atuantes em oncologia. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 16(1), 24-28.; Murta & Tróccoli, 2009Murta, S. G., & Tróccoli, B. T (2009). Intervenções psi-coeducativas para o manejo de estresse ocupacional: um estudo comparativo. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 11(1), 25-42.). As poucas pesquisas sobre o tema têm abordado as estratégias individuais e organizacionais presentes no enfrentamento das demandas ocupacionais do ambiente hospitalar em geral (Araújo, Santo, & Servo, 2009; Martins, 2014), sem considerar especificamente o coping ocupacional diante da situação de morte fetal, por exemplo.

No enfrentamento da morte no contexto hospitalar, em geral, os profissionais de saúde utilizam EE de distanciamento ou de negação, pelo fato de não saberem como lidar com a dor da morte (Montero et al., 2011Montero, S. M. P., Sanchez, J. M. R., Montoro, C. H., Crespo, M. L., Jaén, A. G. V., & Tirado, M. B. R. (2011). A experiência da perda perinatal a partir da perspectiva dos profissionais de saúde. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 19(6), 1-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692011000600018.
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; Stayt, 2007Stayt, L. (2007). Nurses experiences of caring for families with relatives in intensive care units. Journal of Advanced Nursing, 57(6), 623-630.; Yam, Rossiter, & Cheung, 2001Yam, B., Rossiter, J., & Cheung, K. (2001). Caring for dying infants: Experiences of neonatal intensive care nurses in Hong Kong. Journal of Clinical Nursing, 10(5), 651-659. http://dx.doi.org/10.1046/j.1365-2702.2001.00532.
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). Os enfermeiros valorizam o suporte emocional às mães em situação de óbito fetal, mas delegam suas tarefas a outros profissionais, por não se julgarem preparados para lidar com essa demanda. Além disso, eles enfatizam apenas os aspectos biológicos no cuidado às mães, indicando o resultado do despreparo desses profissionais camuflado por estratégias, como negação e esquiva frente à morte fetal (Santos et al., 2012Santos, C. S., Marques, J. F., Carvalho, F. H. C., Fernandes, F. C. Henriques, A. C. P. T., & Moreira, K. A. P. (2012). Percepções de enfermeiras sobre a assistência prestada a mulheres diante do óbito fetal. Escola Anna Nery, 16(2), 277-284. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452012000200010.
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).

Diante do exposto, neste estudo foram adotadas as duas perspectivas de estudo do coping apresentadas - a Abordagem Disposicional e a Teoria Motivacional do Coping -, para analisar o enfrentamento da morte fetal por enfermeiros de centros obstétricos de duas maternidades. Pretendeu-se, assim, discutir a possibilidade de se estudar o coping sob uma perspectiva multiteórica e metodológica, justificado também pela pequena produção bibliográfica na literatura nacional e internacional sobre essa temática no contexto hospitalar (Mander, 2009Mander, R. (2009). Good staff: Responses to childbearing loss. Nurse Education Today, 29(1), 117-123. http://dx.doi.org/10.1016/j.nedt.2008.07.005.
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; Martins, 2014; Santos et al., 2012), principalmente com este referencial teórico.

Método

Participantes

Participaram da pesquisa 36 profissionais de equipes de Enfermagem de duas maternidades públicas na região Sudeste (20 profissionais do município da Serra [ES] e 16 do Rio de Janeiro [RJ]), compondo uma amostra de conveniência, de acordo com os seguintes critérios de inclusão: (a) ter prestado assistência em situações de morte fetal (intrauterina) no seu ambiente de trabalho, mais especificamente no contexto hospitalar; (b) ter no mínimo um ano de experiência profissional na assistência hospitalar; sendo este último critério escolhido com base na literatura, que considera um maior tempo de experiência como fator que capacitaria lidar melhor com situações de morte (Umann, 2011Umann, J. (2011). Estresse, coping e presenteísmo em enfermeiros hospitalares (Dissertação de mestrado não-publicada). Universidade de Santa Maria.).

Dos 36 participantes, 19 eram técnicos de enfermagem, 7 auxiliares de enfermagem e 10 enfermeiros, com idade entre 25 a 68 anos (M = 43,7; ± 11,2), sendo 86,11% do sexo feminino; 19 profissionais eram casados (52,8%), 12 solteiros (33,4%) e cinco divorciados (13,9%). Tinham tempo médio de experiência profissional de 14,9 anos. A maior parte da amostra (89,2%) declarou adotar alguma religião, como, por exemplo, a católica.

Após assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, aprovados pelos Comitês de Ética de ambos os hospitais (CAEE nº 248.750 de 04/03/2013; CAEE nº 91.838 de 06/09/2012), os participantes responderam, individualmente, no próprio local de trabalho e em horário disponível, dois instrumentos descritos a seguir.

Instrumentos

Para identificar, analisar e comparar as EE dos profissionais de Enfermagem frente ao contexto de morte fetal, foram aplicados:

a) Inventário COPE (Carver et al., 1989), na versão adaptada para a realidade brasileira de Mazon, Carlotto e Câmara (2008)Mazon, V., Carlotto, M. S., & Câmara, S. (2008). Síndrome de Burnout e estratégias de enfrentamento em professores. Arquivo Brasileiro Psicologia, 60(1), 55-66., e baseado na Abordagem Disposicional do Coping, usado para avaliar as EE em contextos gerais. É uma escala autoaplicável, com 60 itens, usando uma pontuação de 1 a 4, sendo 1 para "não costumo fazer isso nunca" e 4 para "costumo fazer isso muito". A escala total se subdivide em 15 fatores, com 4 itens cada: 1) Coping ativo (itens 5, 25, 47, 58); 2) Planejamento (19, 32, 39, 56); 3) Supressão de atividades concomitantes (15, 33, 42, 55); 4) Coping moderado (10, 22, 41, 49); 5) Busca de Suporte Social por razões instrumentais (4, 14, 30, 45); 6) Busca de Suporte Social por razões emocionais (11, 23, 34, 52); 7) Reinterpretação positiva e crescimento (1, 29, 38, 59); 8) Aceitação (13, 21, 44, 54); 9) Religiosidade (7, 18, 48, 60); 10) Foco na expressão de emoções (3, 17, 28, 46); 11) Negação (6, 27, 40, 57); 12) Desligamento comportamental (9, 24, 37, 51); 13) Desligamento mental (2, 16, 31, 43); 14) Humor (8, 20, 36, 50); e 15) Uso de substâncias (12, 26, 35, 53) (Carver et al., 1989; Mazon et al., 2008);

b) Roteiro de Entrevista Coping Motivacional: uma adaptação da Motivational Theory of Coping Scale-12 (MCT-12) de Lees (2007), que se baseia na Teoria Motivacional do Coping de Skinner e colaboradores (Skinner et al., 2003; Skinner & Wellborn, 1994). Contém um roteiro semiestruturado com 12 perguntas principais relacionadas às 12 famílias de coping da TMC, a saber: 1) Autoconfiança; 2) Busca por Suporte; 3) Resolução de Problemas; 4) Busca por Informação; 5) Acomodação; 6) Negociação; 7) Delegação; 8) Isolamento; 9) Desamparo; 10) Fuga; 11) Submissão; e 12) Oposição. O roteiro foi elaborado com questões que previam respostas do tipo "Sim" e "Não" e perguntas auxiliares ("Como" e "Por que") que tinham por objetivo solicitar ao participante a justificativa para a resposta anterior.

Os dados do COPE foram corrigidos e processados de acordo com a orientação dos autores e analisados por estatística descritiva (frequências, médias, medianas e desvio-padrão). Os dados da Entrevista Coping Motivacional foram analisados em termos de frequência de ocorrência das respostas do tipo "Sim" e "Não", além de análise do discurso pela metodologia de Bardin (2002)Bardin, L. (2002). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70. do relato dos participantes às perguntas auxiliares.

Resultados e Discussão

As Estratégias de Enfrentamento mais utili-zadas pelos profissionais de ambas as instituições, pelo COPE, foram a Religiosidade (Md = 13,5), seguida da Reinterpretação Positiva e crescimento (Md = 13), Planejamento (Md = 12), Coping Ativo (Md = 11) e Aceitação (Md = 11). As EE menos utilizadas foram a Negação (Md = 5), o Desligamento Comportamental (Md = 5), o Humor (Md = 4) e Uso de Substâncias (Md = 4) (Figura 1).

Figura 1.
Valores (medianas) das estratégias de enfrentamento da morte fetal por profissionais de Enfermagem pelo COPE (N = 36).

Segundo o roteiro de entrevista de Coping Motivacional, as famílias de coping mais utilizadas pelos profissionais foram Negociação (N = 35), seguida de Busca por Informação (N = 33), Auto-confiança (N = 25) e Busca por Suporte (N = 23). As famílias de coping menos indicadas foram: Oposição (N = 7), Fuga (N = 6) e Isolamento (N = 6) (Tabela 1).

Tabela 1
Estratégias de enfrentamento da morte fetal por profissionais de Enfermagem, pela Teoria Motivacional do Coping (N = 36)

Nas justificativas para o enfrentamento da morte fetal por meio da Negociação, os profissionais explicaram ser melhor lidar com a situação de morte fetal seguindo o que outros colegas de trabalho já faziam (Tabela 1). O relato a seguir ilustra esta EE: "Sozinho é difícil, com outras pessoas, mais cabeças pensando, é melhor" (E1).

A busca de informação incluiu relatos, como:

A gente sempre faz contato com a psicóloga, com assistente social e pergunta sobre a questão do enfrentamento, e aí, esta própria dinâmica do dia a dia vai fazer com que você vai (sic) melhorando o atendimento (E17).

As fontes de informação incluíam a internet, livros ou mesmo com outros colegas de profissão. A maioria dos profissionais se sentia confiante o suficiente para lidar com essa situação, o que pode ser observado no seguinte relato: "Acho que eu já estou mais preparada prá isso. No início, não. No início, foi meio complicado; mas, vai passando o tempo e a gente vai se acostumando mais" (E14).

A Busca por Suporte ficou evidenciada pelos relatos de que necessitavam procurar alguém (os próprios enfermeiros ou médicos) ou algo (assistência psicológica) para lidar com a morte fetal, como no exemplo a seguir:

Por ser enfermeira voluntária, eu preciso saber melhor sobre a prática, o que fazer naquela situação; então, eu pergunto a equipe, ao médico, a enfermeira responsável, para saber qual a melhor conduta (E17).

As Estratégias de Enfrentamento mais identificadas pelos dois instrumentos tinham caráter resolutivo e potencial adaptativo positivo frente ao estressor, sendo as mais frequentes: a Religiosidade, a Reinterpretação Positiva e Crescimento, e o Planejamento, pelo COPE (Figura 1); e, pela entrevista, a Negociação, a Busca por Informação e a Autoconfiança (Tabela 1). Esse enfrentamento mais adaptativo pode estar associado ao tempo de experiência profissional de aproximadamente 15 anos. Profissionais recém-formados costumam ter reações mais profundas e desorganizadoras psicologicamente frente à morte (Cavalheiro, Moura Junior, & Lopes, 2008Cavalheiro, A. M., Moura Junior, D. F., & Lopes, A. C. (2008). Estresse de enfermeiros com atuação em unidade de terapia intensiva. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 16(1), 29-35. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692008000100005.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692008...
), de forma que a experiência clínica profissional dos participantes pode ter promovido uma resposta emocional mais equilibrada diante da situação de morte fetal.

Analisando cada categoria individualmente, é possível inferir que a alta frequência do enfrentamento da morte fetal no COPE pela Religiosidade pode ser entendida em parte pelos dados sociodemográficos dos participantes, já que 89,2% declararam ter alguma religião. Outros estudos também indicam que a religião é uma das EE mais utilizadas pelos profissionais diante da morte (Colossi et al., 2011; Rockembach, Cassarin, & Siqueira, 2010Rockembach, J. V., Cassarin, S. T., & Siqueira, H. C. H. (2010). Morte pediátrica no cotidiano de trabalho do enfermeiro: sentimentos e estratégias de enfrentamento. Revista Rene, 11(2), 63-71.). Além dessa condição favorecedora da ocorrência desse comportamento, a religiosidade pode ter uma função de busca de suporte social (Pargament, 2011Pargament, K. I. (2011). Religion and coping: The current state of knowledge. In S. Folkman (Ed.), Oxford handbook of stress, health, and coping (pp.269-288). New York: Oxford University Press. ), quando a pessoa avalia os recursos sociais disponíveis procurando contato com as pessoas, ajuda instrumental, conselho, conforto e apoio espiritual. Para enfrentar o desconforto e aliviar a tensão provocada pela morte fetal, a religiosidade pode ser considerada como uma forma de suporte social, o que aproxima conceitualmente esta categoria com a busca de suporte (TMC).

A segunda Estratégia de Enfrentamento mais utilizada, segundo o COPE, foi a Reinterpretação Positiva e Crescimento (Md = 13), que equivale à Reestruturação Cognitiva, relacionada à família de coping de Acomodação (Skinner et al., 2003). Apesar de não se relacionar diretamente com a resolução de um problema, precede a ação, fazendo com que o sujeito consiga maior equilíbrio emocional (Carver et al., 1989). Logo, é possível afirmar que, para lidar com o evento da morte fetal em seu contexto de trabalho, os profissionais utilizavam essa EE, considerada como tendo uma função adaptativa no médio e longo prazo, por Carver e Connor-Smith (2010) e por Skinner et al. (2003). Tal dado também pode ser observado nos relatos dos profissionais quando declararam que interpretavam a morte como um evento natural, que faz parte da vida. Ou, ainda, a morte fetal foi entendida como um evento espiritual/religioso, podendo, inclusive, ser considerada como a passagem para outra vida. Tal discurso poderia, inclusive, se relacionar em última análise com a EE de Religiosidade observada pelo Inventário COPE, o que, mais uma vez, indica a consonância na análise do coping sob enfoque multimetodológico, que ampliaria a compreensão de fenômenos complexos.

A terceira Estratégia de Enfrentamento mais identificada pelo Inventário COPE foi o Planejamento (Md =12), que representa a atividade de pensar sobre alternativas para lidar com o estressor por meio de estratégias de ação (Carver et al., 1989). Tal dado sugere que os profissionais se sentiam capazes de lidar com a morte utilizando uma estratégia voltada para a resolução do problema. Essa relação pode ser encontrada em outra categoria também frequente - o Coping Ativo (Md = 11). Este último consiste no processo de estabelecer passos sucessivos para remover, atenuar ou melhorar os efeitos do estressor (Carver et al., 1989). Tal definição se aproxima do conceito de Resolução de Problemas da TMC, uma vez que envolve ações instrumentais voltadas para solução de problemas, utilizando para tanto o estabelecimento de estratégias, planejamento, análise lógica, esforço persistência e determinação.

Em ambas as categorias, Coping Ativo e Resolução de Problemas, o que se espera é que o profissional de Enfermagem tenha um comportamento proativo diante do evento estressor. Esta orientação da EE faz com que ele apresente uma melhor percepção do seu trabalho se sentindo mais realizado, mesmo diante de situações de adversidade como a morte fetal.

Por fim, a Estratégia de Enfrentamento de Aceitação corresponde à percepção do estressor como um evento real, num primeiro momento, e à aceitação do estressor como algo natural, em um segundo momento (Carver et al.,1989). Esta EE pode se relacionar com a categoria Acomodação identificada na Entrevista Coping Motivacional já que 15 profissionais referiram adotar essa família de coping para enfrentar a morte fetal no trabalho. A família de coping de acomodação é definida como um ajustamento flexível das preferências do indivíduo através de EE como distração, reestruturação cognitiva, minimização, aceitação (Skinner et al., 2003), o que é exatamente o que a EE de Aceitação pela Abordagem Disposicional considera.

Analisando ainda as categorias de coping menos resolutivas ou de menor engajamento da pessoa no seu processo de enfrentamento, como a Delegação (N = 13), pela TMC, ou a Negação (Md = 5), pela Abordagem Disposicional, pode-se criar a hipótese de que, devido à baixa frequência de tais categorias, aqueles profissionais se envolviam em um processo de coping mais engajado (engagement coping). Logo, existiria naqueles profissionais um compromisso e envolvimento com o enfrentamento da situação de morte fetal, com utilização de estratégias ativas de enfrentamento, como Planejamento, Negociação, Busca de Informação e Coping ativo, por exemplo.

Isto sugere que, no geral, esse tipo de enfrentamento facilitaria aqueles profissionais lidar com situações de morte no contexto hospitalar e, consequentemente, vivenciar o luto decorrente dessa situação. Contudo, importante considerar como limitação do estudo não ter sido adotado outros instrumentos de coleta de dados, como a observação ou escalas de avaliação do luto, por exemplo, a fim de confirmar ou refutar tal hipótese. Dessa forma, sugerem-se futuras pesquisas que combinem a metodologia da observação com aplicação de escalas e entrevistas na tentativa de testar hipóteses como a descrita acima.

Ao se pretender analisar o conceito de coping sob um enfoque multiteórico e metodológico dessas duas perspectivas teóricas, que compreendem esse fenômeno com base na autorregulação emocional e comportamental, deve-se levar em conta suas limitações, dada a escassez de estudos baseados nas respectivas abordagens teóricas aplicadas ao estudo do coping de profissionais de enfermagem, a exemplo do estudo de Martins (2014), e por ter se baseado em dados de somente de dois instrumentos.

Diante do exposto, pode-se considerar o uso de um enfoque multiteórico e metodológico para analisar o enfrentamento do estresse em situação de adversidade. Tal proposta pode ampliar o estudo de fenômeno tão complexo como o coping, facilitando, assim, a proposição de ações de intervenção para promoção de estratégias de enfrentamento mais adaptativas que resultem em um processo de enfrentamento mais engajado e resolutivo.

Assim, ressalta-se a necessidade de futuras pesquisas na área do copingno campo da saúde com fins de produzir evidências cientificas aplicáveis ao contexto da assistência aos profissionais, sobretudo para aqueles que se encontram em condição de vulnerabilidade física e psicológica devido à vivência de situações adversas.

Agradecimentos: À Direção do Hospital e aos profissionais da equipe de enfermagem pela disponibilidade, receptividade e paciência para responder os questionários e entrevistas.

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  • Artigo elaborado a partir da dissertação de C.R.M. CRAVINHO, intitulada "O bebê que não nasceu: stress e coping da equipe de Enfermagem que lida com a morte fetal". Universidade Federal do Espírito Santo, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    15 Dez 2014
  • Aceito
    12 Jan 2015
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