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A utilização da técnica do inventário como instrumento de pesquisa: uma contribuição metodológica à história da educação na Amazônia

Use of the inventory technique as a research tool: a methodological contribution to the history of education in the Amazon

RESUMO

O presente artigo objetiva analisar o inventário como instrumento técnico-metodológico para análise de dados documentais caros às pesquisas realizadas no campo da História da Educação, a partir de produções acadêmicas no contexto amazônico, em particular, no estado do Pará. O estudo é caracterizado como uma pesquisa bibliográfica, que apresenta 19 trabalhos encontrados nos repositórios de dissertações e teses dos Programas em Educação da Universidade do Estado do Pará (UEPA), da Universidade Federal do Pará (UFPA) e do Programa em Currículo e Gestão da Escola Básica da UFPA, que assumiram a utilização da técnica do inventário na elaboração dos seus estudos ou apresentaram abordagens aproximativas. A análise das dissertações e teses suscitam a significativa contribuição da técnica do inventário ao processo de organização e sistematização das fontes, bem como ao processo analítico de documentos de diferentes tipos que compuseram estudos que se debruçaram em dar visibilidade para a história de instituições, de práticas e de sujeitos na Amazônia. O inventário se mostrou, ainda, um instrumento que contribui para uma política de preservação do patrimônio histórico-educacional e pedagógico, por sua capacidade de agrupar documentos que, geralmente, estão dispersos em acervos e arquivos nem sempre bem-organizados e acessíveis à sociedade.

Palavras-chave:
História da Educação na Amazônia; Inventário; Patrimônio Educativo

ABSTRACT

This paper aims to analyze the inventory as a technical-methodological instrument for analyzing documentary data that is important to research carried out in the field of History of Education, based on academic productions in the Amazon context in the state of Pará. The study is characterized as bibliographic research, which presents nineteen (19) works found in the repositories of dissertations and theses from Postgraduate Programs in Education at UEPA and UFPA and in the Program in Curriculum and Management of the Basic School of UFPA, which assumed the use of the inventory technique in the elaboration of their studies or presented approximate approaches. The analysis of dissertations and theses raises the significant contribution of the inventory technique to the process of organization and systematization of sources, as well as to the analytical process of documents of different types that composed studies that focused on giving visibility to the history of institutions, practices, and subjects in the Amazon. The inventory also proved to be an instrument that contributes to a policy of preservation of historical-educational and pedagogical patrimony, due to its ability to group documents that are generally dispersed in collections and archives that are not always well organized and accessible to society.

Keywords:
History of Education in the Amazon; Inventory; Educational Patrimony

RESUMEN

El presente artículo tiene como objetivo analizar el inventario como instrumento técnico-metodológico para el análisis de datos documentales caros a las investigaciones realizadas en el campo de la Historia de la Educación, a partir de producciones académicas en el contexto amazónico, en particular, en el estado de Pará. El estudio se caracteriza como una investigación bibliográfica, que presenta 19 trabajos encontrados en los repositorios de disertaciones y tesis de los Programas en Educación de la Universidad del Estado de Pará (UEPA), de la Universidad Federal de Pará (UFPA) y del Programa en Currículo y Gestión de la Escuela Básica de la UFPA, que asumieron la utilización de la técnica del inventario en la elaboración de sus estudios o presentaron abordajes aproximativos. El análisis de las disertaciones y tesis suscitan la significativa contribución de la técnica del inventario al proceso de organización y sistematización de las fuentes, así como al proceso analítico de documentos de diferentes tipos que compusieron estudios que se enfocaron en dar visibilidad a la historia de instituciones, de prácticas y de sujetos en la Amazonia. El inventario se mostró, aún, un instrumento que contribuye para una política de preservación del patrimonio histórico-educativo y pedagógico, por su capacidad de agrupar documentos que, generalmente, están dispersos en colecciones y archivos no siempre bien-organizados y accesibles a la sociedad.

Palabras-clave:
Historia de la Educación en Amazonia; Inventario; Patrimonio Educativo

Introdução

A área da História da Educação na Amazônia vem crescendo nos últimos anos, o que contribui para dar visibilidade às produções acadêmicas que se debruçam na investigação de tempos, espaços, contextos, práticas e dos múltiplos sujeitos que compõem a realidade amazônica. O crescimento de estudos nesse campo é fruto de investimento e de esforços de pesquisadores, de grupos e de programas de Pós-graduação que se mobilizam para compreender os processos históricos que constituíram a trajetória da educação na região amazônica.

A maior visibilidade para a área da História da Educação evidencia lacunas a serem preenchidas, e se amplia o quantitativo de pesquisadores em formação para enveredar nos meandros da pesquisa historiográfica em interseção com a educação, o que implica reconhecer a necessidade de se produzir conhecimento que assuma uma dimensão didático-pedagógica e teórico-metodológica capaz de apresentar alguns caminhos a serem percorridos no desenvolvimento de uma pesquisa dessa natureza.

Nossa principal inquietação para a proposição deste texto depreende da experiência na orientação de discentes na Pós-Graduação, que, por vezes, mesmo no contexto do Doutorado, ainda apresentam fragilidades teórico-metodológicas no trabalho de pesquisa com fontes documentais. Nesse sentido, vê-se com frequência a inexperiência para o levantamento dessas fontes, em quais lugares procurá-las, qual manejo e organização necessários podem ser conferidos a potencializar as análises.

É oportuno salientar que as dificuldades nem sempre se atém à inexperiência do pesquisador, posto que, na busca por fontes históricas, há desafios outros como acesso e condições de conservação, como manusear, organizar, e proceder análise ao ter em mãos uma profusão de dados ― documentos, imagens, jornais, testemunhos etc. ― “[...] para dá-las a conhecer e criar as condições para que sejam tornadas acessíveis à investigação”, como sugere Felgueiras (2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação história. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 67-92, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38507. Acesso em: 21 ago. 2022.
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, p. 78).

Nessa direção, o presente estudo objetiva analisar o inventário como instrumento técnico-metodológico para análise de dados documentais caros às pesquisas realizadas no campo da História da Educação, a partir de produções acadêmicas no contexto amazônico, em particular, no estado do Pará. O inventário, aqui entendido como um instrumento de considerável relevância para organização, manejo, arquivo e classificação de dados, se bem realizado já se configura como material de análise prévia ao possibilitar uma melhor visualização das fontes conforme determinadas categorias de organização.

Metodologicamente, foi realizado um levantamento bibliográfico nos bancos de dados do Programa de Pós-Graduação da Universidade do Estado do Pará (PPGED/UEPA), do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará (PPGED/UFPA) e do Programa de Pós-graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica (PPEB) da UFPA, no período de 2012 a 2021. Dentre esses trabalhos, foram selecionados os que denotassem a utilização do inventário nas pesquisas da área da História da Educação.

O artigo se estrutura em dois momentos principais, a contar a partir deste Introdução. O primeiro momento apresenta o inventário enquanto instrumento para as pesquisas históricas, em especial, no campo da História da Educação, destacando conceitos, procedimentos e contribuições do inventário. O segundo, traz a caracterização da produção acadêmica e as contribuições do inventário nas Dissertações e Teses analisadas.

O inventário como instrumento de pesquisa: conceitos, procedimentos e contribuições

O inventário é um dos tipos de instrumento de pesquisa de arquivos e/ou de pesquisa arquivística que, na sua construção, envolve atitudes de classificação e descrição do material selecionado. Além disso, podemos compreendê-lo enquanto um instrumento de pesquisa que traz a possibilidade de ser analítico quando bem sistematizado (LOPEZ, 2002LOPEZ, André Porto Ancona. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial, 2002.).

Para a tradição da arquivologia, o inventário caracteriza-se por “[...] um quadro sumário de um ou mais fundos ou coleções [...] conjuntos documentais com algum nível de organização [...] conjuntos documentais classificados [...] um instrumento para a pesquisa especializada” (LOPEZ, 2002LOPEZ, André Porto Ancona. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial, 2002., p. 29-30). Dessa forma, o inventário é entendido enquanto possibilidade de organização de um corpus de pesquisa de maneira orientada, por uma classificação dada, ou uma lógica organizativa sob a qual resida princípios de seleção e organização pré-estabelecidos, e até orientadas por uma teoria ou um problema de pesquisa fundante.

Observamos que há pelo menos dois tipos de inventários ― um arquivístico, que se caracteriza mais descritivo (LOPEZ, 2002LOPEZ, André Porto Ancona. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial, 2002.), e outro analítico ― os quais podem ser complementares. No tocante à organização de arquivos, há uma norma internacional que busca padronização “[...] a partir de uma estruturação multinível, isto é, do geral ao particular” que considera: identificação, contexto, conteúdo e estrutura, acesso e utilização e documentação associada, segundo Lopez (2002LOPEZ, André Porto Ancona. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial, 2002., p. 15).

Sob a perspectiva analítica, que sobrelevamos do próprio campo da História da Educação, o inventário passa a ser tomado como um instrumento de pesquisa flexível a fim de atender às necessidades de organização, classificação e sistematização provenientes de cada estudo (SAAVEDRA; MENEZES, 2011SAAVEDRA, Vicente. Peña; MENEZES, Maria Cristina. Apresentação. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11 n. 1, p. 11-18, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38504/20035. Acesso em: 22 ago. 2022
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). Isto implica que, embora haja uma diretriz e um modelo de inventário proposto, esse pode e deve ser ressignificado conforme as demandas de pesquisa, o que permite destacar que ele não é imutável, podendo ser aproveitado em sua multimodalidade.

Moraes et al. (2011MORAES, Carmen Sylvia Vidigal; RIGHI, Daniel; SANTOS; Luciana; CALSAVARA, Tatiana. Inventário de fontes das escolas dirigidas pelo educador anarquista João Penteado (1912-1961): dimensão pedagógica e contribuição para a história da relação trabalho e educação no Brasil. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n.1, p. 117-142, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38509. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 119) assumem o inventário como “[...] instrumento facilitador do uso pedagógico do arquivo”. Essa característica se mostra interessante e útil, já que atribui ao inventário uma importância e/ou dimensão didática, posto que favorece o manuseio fácil do conjunto das fontes quanto à localização rápida e orientada por critérios.

Quanto ao modo de fazer o inventário, Silva e Petry (2011SILVA, Vera Lucia Gaspar da; PETRY, Marília Gabriela. A aventura de inventariar: uma experiência no Museu da Escola Catarinense. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 19-42, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38505. Acesso em: 22 ago. 2022.
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) propõem que a atitude de inventariar deve se dar tal e qual uma aventura e um desafio. Uma aventura se nos permitirmos percorrer caminhos de descobertas, “[...] para que se avive a riqueza de práticas inscritas nessa materialidade” (SILVA; PETRY, 2011SILVA, Vera Lucia Gaspar da; PETRY, Marília Gabriela. A aventura de inventariar: uma experiência no Museu da Escola Catarinense. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 19-42, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38505. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 121); e um desafio já que nos exige mobilizar uma série de competências, quer sejam éticas, estéticas, interdisciplinares; essas atitudes nos impedem de engessá-lo em uma organização burocratizada para que, dessa forma, garanta-se a conservação da fonte, não só no que diz respeito a sua condição física, mas também sobre o que ela comunica. Inventariar, portanto, é uma forma de “[...] ‘descobrir’ o objeto, descrevê-lo, registrá-lo, dar contornos à informação que será socializada”, mas compreendendo que “[...] a subjetividade sempre estará presente” (SILVA; PETRY, 2011, p. 121).

Quais seriam esses dois componentes do inventário segundo a teoria arquivista? Um primeiro componente seria uma espécie de introdução, que visa a apresentar de maneira geral e sumária as fontes inventariadas. Nessa fase introdutória da constituição de um inventário, dever-se-ia destacar a importância dos artefatos inventariados para a pesquisa desenvolvida; esclarecer os princípios e critérios utilizados para a sistematização empreendida, que, de maneira geral, irão se apresentar a partir de um “plano de classificação”, e situar as categorias conceituais que subsidiam o levante e a organização das fontes inventariadas (LOPEZ, 2002LOPEZ, André Porto Ancona. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial, 2002.). Em uma segunda parte, é que se especifica um pouco mais o conteúdo das fontes. Em arquivologia, destaca-se que data-limite, ordenação e localização são imprescindíveis.

Menezes (2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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), por exemplo, orienta como etapa inicial a identificação. Ao inventariar espólios da Escola Normal de Campinas, ensina-nos que a simples tarefa inicial de identificar a tipologia, o período ou datação de cada fonte, já permite um primeiro panorama de compreensão do que se chama de “massa documental”. A partir dessa primeira identificação, pela aproximação ao conteúdo, ainda que preliminar, é possível construir categorias de classificação mais específicas aos objetivos da pesquisa a ser empreendida, o que supera, assim, o processo de mera catalogação.

A instrumentalização a partir da mobilização de procedimentos próprios do campo arquivístico é uma recomendação de Menezes (2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 96) como possibilidade de utilização do inventário para “[...] a constituição de fontes históricas como uma via de fertilização da pesquisa em história da educação”. Dessa forma, encaminha-nos para um segundo passo importante na laboração de um inventário, que é a descrição dos artefatos históricos.

A partir dos procedimentos de como fazer um inventário, conforme Menezes (2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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), percebemos que na etapa de identificação tem-se um quadro geral preliminar, mas que é no processo de descrição que nos debruçamos aos pormenores, aos detalhes, às peculiaridades do acervo, o que nos permite reaver o quadro anterior genérico, além de possibilitar ao pesquisador transitar “[...] com maior propriedade e entendimento de sua composição” (MENEZES, 2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 97). O processo de descrição ocasiona a percepção de particularidades que começam a organizar-se em grupos e/ou categorias.

Na tessitura de um inventário, Menezes (2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 97-98) também chama nossa atenção a respeito da importância de um plano de organização. Este deve cuidar de duas dimensões: do inventário com uma perspectiva epistemológica e como um instrumento de controle. Na primeira dimensão, há que se compor uma sistemática de arranjo fundamentada em critérios teórico-metodológicos da pesquisa. Essa, contudo, é uma etapa que se dá no processo de conhecimento das fontes e do diálogo possível e/ou necessário das fontes para com certa pesquisa. Para tanto, devemos seguir uma das principais recomendações de Menezes (2011): devemos “ouvir as fontes”.

O que significa para o pesquisador “ouvir as fontes”? Geralmente, quando partimos para o levantamento de dados em uma pesquisa, já possuímos pressupostos, um problema delimitado, hipóteses, objetivos e muitas vezes até um arcabouço de análise delineado. E, ao ter alguma experiência com inventário, quase sempre, já vamos com critérios pré-estabelecidos para classificar determinadas informações que precisamos colher já orientadas de antemão, o que pode limitar o conhecimento de todas as riquezas que as fontes possam ter a expressar.

Silva e Petry (2011SILVA, Vera Lucia Gaspar da; PETRY, Marília Gabriela. A aventura de inventariar: uma experiência no Museu da Escola Catarinense. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 19-42, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38505. Acesso em: 22 ago. 2022.
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) colaboram com essa discussão ao propor a compreensão das fontes históricas enquanto socioculturais. Dito isso, na composição de um inventário, faz-se necessário mais que indicações intrínsecas à fonte; quer dizer, o processo de Identificação para os historiadores da educação é só o começo para uma maior aproximação de compreensão do artefato estudado. Dessa forma, buscar identificar elementos extrínsecos às fontes inventariadas também é aconselhável, o que resulta que ao inventariar estamos estabelecendo um diálogo, uma interlocução com a fonte enquanto artefato produzido em sociedade e que expressa elementos de cultura. “Aqui percebemos a importância de educar para sensibilizar: a comunicação entre fonte e receptor [...]” (SILVA; PETRY, 2011SILVA, Vera Lucia Gaspar da; PETRY, Marília Gabriela. A aventura de inventariar: uma experiência no Museu da Escola Catarinense. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 19-42, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38505. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 22). Por conseguinte, mesmo uma descrição minuciosa não evita a necessidade do processo de revisão.

Uma outra dimensão do trabalho com inventário seria a de instrumento de controle que se relaciona diretamente com suas contribuições à preservação e publicização do patrimônio educativo. Ao ter o inventário por objetivo a organização em si, o manuseio adequado, a descrição para melhor orientar buscas ao material, facilitar o acesso, criar critérios para o arquivamento, pressupor os canais de publicização, e a guarda e ou acondicionamento. Ou seja, para preservação e difusão de um patrimônio histórico-educacional e pedagógico.

Mas, há uma questão ainda muito pertinente no âmbito do inventário como instrumento de controle, e que deve ser planejada com atenção, que são as formas de publicizar os inventários. Para tanto, há desafios. Um primeiro desafio diz respeito ao que Felgueiras (2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação história. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 67-92, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38507. Acesso em: 21 ago. 2022.
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, p. 77) chama de “perda da tradição de arquivamento nas instituições”, quer dizer, do fato de as instituições em seu processo de modernização terem se desfeito de muitos documentos e/ou artefatos históricos, doando, destruindo ou distribuindo.

A esse respeito, Saviani (2017SAVIANI, Demerval. Breves considerações sobre fontes para a história da educação. In: LOMBARDI, José Claudinei; NASCIMENTO, Maria Isabel Moura (orgs.). Fontes, história e historiografia da educação [livro eletrônico]. Campinas, SP: Autores Associados, 2017. Disponível em: https://pt.scribd.com/read/405692981/Fontes-historia-e-historiografia-da-educacao#. Acesso em: 3 out. 2023.
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) destaca dois aspectos nucleares na preservação de fontes histórico-educacionais, um diz respeito à constituição coletiva e intencional de critérios de salvaguarda e descarte de materiais. Revelando outro desafio, qual seja, a preocupação não só com a salvaguarda de documentos físicos, mas também com os virtuais, tendo em vista que, com as transformações das novas tecnologias digitais, mais se tem avançado no processo de digitalização de muitos documentos, e isso tem facilitado organizar e conservar diferentes acervos.

Moraes et al. (2011MORAES, Carmen Sylvia Vidigal; RIGHI, Daniel; SANTOS; Luciana; CALSAVARA, Tatiana. Inventário de fontes das escolas dirigidas pelo educador anarquista João Penteado (1912-1961): dimensão pedagógica e contribuição para a história da relação trabalho e educação no Brasil. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n.1, p. 117-142, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38509. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, p. 120) apontam possibilidades de fomento e publicização de “[...] conjunto documental inédito, de interesse substantivo para a reconstrução histórica das práticas educativas” e de “arquivos pessoais” como o faz ao inventariar o Arquivo Escolar João Penteado, o que contribui para suprir “[...] lacunas de informação causadas pela ausência de fontes e/ ou dificuldade de se reunirem séries documentais completas” e abertura de novas perspectivas de pesquisa a partir desses inventários socializados amplamente.

Para Felgueiras (2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação história. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 67-92, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38507. Acesso em: 21 ago. 2022.
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, p. 76), “[...] conservar e tornar acessíveis as fontes são indispensáveis à verificação dos trabalhos e interpretações efetuadas, à continuidade de outras análises assim como à manutenção do registro desses testemunhos, como alicerces da memória”. Sob essa perspectiva, a conservação de arquivos possíveis pelo ato de inventariar representa também transparência nas pesquisas porque disponibilizar as fontes investigadas possibilita a contiguidade às pesquisas e faz avançar mais facilmente os limites da área, e ainda nos resguarda “alicerces de memória”, um patrimônio subsidiário do que nos constituiu como sociedade e como campo educacional.

Por fim, salientamos que, pela natureza diversa de fontes, não é possível estabelecer um modelo único de inventário para não correr o risco de prejuízo às necessidades de nossos estudos, de um inventário que convirja para determinados objetivos, mas não os das nossas pesquisas; e em prejuízo a descobertas interessantes, criatividade e contribuições aos nossos itinerários analíticos aos quais vimos ser o inventário um tributário. Até mesmo diferentes tipos de fontes não se encaixam em um único molde. Um plano de organização em uma perspectiva epistemológica precisa ser pensado conforme a natureza da fonte, e os objetivos pretendidos. Por isso, ao tratar de modelos, preferimos nos referir a “inventários” no plural. Que se constitui a partir de um itinerário comum - identificação, descrição, plano de organização e revisão - mas que pode vir a se compor em diferentes planos estéticos e conceituais.

Levantando dados sobre pesquisa com inventário na área da história da educação

Para o levantamento de Teses e Dissertações na área da História da Educação que foram produzidas no seio do PPGED-UEPA de 2007 a 2018, e no PPGED-UFPA de 2005 a 2018, tomamos por base o estudo de Alves, Nery e Silva (2019ALVES, Laura Maria Silva Araújo; NERY, Vitor Sousa Cunha; SILVA, Lívia Sousa da. Cartografia das produções em História da Educação nos Programas de Pós-Graduação em Educação no Pará (2005-2018). Revista Brasileira de História da Educação, v. 19, p. 1-27, 2019. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/47252. Acesso em: 15 jun. 2022.
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). De forma a complementar, realizamos o levantamento nessas mesmas bases de dados no período subsequente (2019 a 20221 1 Não há disponíveis ainda no site do PPGED/UEPA as dissertações defendidas em 2021/2022. ); e o levantamento no site do PPEB/UFPA, a partir dos descritores História da Educação + inventário. A partir desse levantamento, encontramos os seguintes resultados que sintetizamos na tabela a seguir:

TABELA 1
SÍNTESE DO LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO EM ESTUDOS DO CAMPO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO (HE) EM COMPARAÇÃO À UTILIZAÇÃO DA TÉCNICA DO INVENTÁRIO

Em síntese, foram encontrados um total de 19 achados referentes ao descritor “inventário” e oito com desenvolvimento de metodologia aproximativa. Do total de 19, seis são Teses no PPGED/UFPA e 13 são Dissertações, sendo cinco no PPGED/UEPA, seis no PPGED/UFPA, e dois achados referentes ao PPEB/UFPA.

Achados dos Programas de Pós-Graduação em Educação da Cidade de Belém

No que concerne aos achados do PPGE/UEPA, encontramos dois registros que citam o ato de inventariar no resumo: Miranda (2015MIRANDA, Julia Cleide. O ritual da Festa do Moqueado: educação, cultura e identidade na sociedade indígena Tembé Tenetehara. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2015.) e Saldanha (2017SALDANHA, Monise Campos. Saberes afro-amazônidas: as narrativas iorubá sobre a orisá oxum como fonte educativa. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2017.); e três que não indicam diretamente, mas que realizam ensaios aproximativos da técnica: Buecke (2019BUECKE, Jane Elisa Otomar. Infância e práticas educativas na Amazônia seiscentista. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.); Brabo (2019BRABO, Sylvia Eleny Calandrini. A letra nacional: análise discursiva do ensino de leitura na 1ª República (1889-1930) no Pará na obra Selecta Litteraria, de Francisco Ferreira de Vilhena Alves. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.) e Conceição (2020CONCEIÇÃO, Evellin Natasha Figueiredo da. A chama da estrela que pulsa e arde: educação sensível na prosa poética de Abguar Bastos. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2020.), o que se pode melhor observar no Quadro 1.

QUADRO 1
ACHADOS DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - UFPA

Miranda (2015MIRANDA, Julia Cleide. O ritual da Festa do Moqueado: educação, cultura e identidade na sociedade indígena Tembé Tenetehara. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2015.) propõe o “inventariar saberes” e/ou “mapear saberes” sem, contudo, desenvolver como instrumento metodológico. O termo Inventário/Inventariar é citado duas vezes no texto, uma no resumo e outra na introdução do trabalho intitulado “As primeiras teias da pesquisa”, ao indicar como um dos objetivos específicos: “Inventariar os principais saberes presentes no Ritual da Festa do Moqueado” (MIRANDA, 2015MIRANDA, Julia Cleide. O ritual da Festa do Moqueado: educação, cultura e identidade na sociedade indígena Tembé Tenetehara. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2015., p. 18).

Quando avança para a seção metodológica, então o termo inventário desaparece, e possíveis especificações a respeito da organização dos dados são inexistentes. O desenvolvimento da seção privilegia a apresentação da “observação direta, observação participante, conversas informais, entrevistas, gravações em áudio e notas de campo técnicas” (MIRANDA, 2015MIRANDA, Julia Cleide. O ritual da Festa do Moqueado: educação, cultura e identidade na sociedade indígena Tembé Tenetehara. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2015., p. 28) como as técnicas de coleta de dados utilizadas.

Somente lá nas Considerações Finais é que novamente a autora menciona um certo “plano de classificação e organização” dos dados ao salientar que categorizou os saberes presentes no ritual identificando-os enquanto objetos de conhecimento do processo educativo, e procurou “[...] organizá-los de forma que cada um deles correspondesse a uma categoria de educação, que, integradas e conectadas se configuram em um processo educativo amplo, organizado, intencional e eficaz” (MIRANDA, 2015MIRANDA, Julia Cleide. O ritual da Festa do Moqueado: educação, cultura e identidade na sociedade indígena Tembé Tenetehara. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2015., p. 98).

Da mesma forma, o trabalho de Saldanha (2017SALDANHA, Monise Campos. Saberes afro-amazônidas: as narrativas iorubá sobre a orisá oxum como fonte educativa. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2017.), que parece compreender a captação de entrevistas como o próprio inventário “Venho utilizando como instrumentos de pesquisa, a observação participativa e a entrevista semiestruturada que serviram para a catalogação de dados” (SALDANHA, 2017SALDANHA, Monise Campos. Saberes afro-amazônidas: as narrativas iorubá sobre a orisá oxum como fonte educativa. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2017., p. 9). Importante ressaltar que tais técnicas servem à coleta de dados, e por si só não são suficientes para empreender “catalogação”, que foi interesse mencionado da autora. E, desse modo, não avança em especificações metodológicas, de construção e/ou modelo. O ato de inventariar é mencionado uma única vez no texto, na seção metodológica, com sentido de catalogação de dados e como etapa metodológica.

Em sua dissertação, Buecke (2019BUECKE, Jane Elisa Otomar. Infância e práticas educativas na Amazônia seiscentista. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.), apesar de não mencionar explicitamente a utilização do inventário, indica em seu resumo que “[...] nos documentos foram esmiuçados os relatos [...] capturando-se situações identificadas como práticas educativas”; aponta, ainda, na seção metodológica, que após a seleção das fontes, realizou a leitura e o fichamento dos textos “[...] a fim de compreender que práticas eram essas nas quais as crianças estavam, de algum modo, envolvidas” (BUECKE, 2019BUECKE, Jane Elisa Otomar. Infância e práticas educativas na Amazônia seiscentista. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019., p. 36). E, que opta por “[...] utilizar categorias temáticas conceituadas como elementos do fato ou situação em estudo”, que são classificados e reunidos em eixos ou unidades temáticas a partir e com os dados coletados (OLIVEIRA; MOTA NETO, 2011, p. 164 apud BUECKE, 2019, p. 37).

Buecke (2019BUECKE, Jane Elisa Otomar. Infância e práticas educativas na Amazônia seiscentista. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.), além disso, apresenta em seu estudo o Quadro 3 - Descrição da crônica de Bettendorff (1990), que se aproxima da primeira etapa do ato de inventariar que seria o processo de identificação, porém não avança para as etapas seguintes, as quais são consideradas necessárias para a caracterização da técnica ― plano de classificação, plano de organização, revisão e controle.

Brabo (2019BRABO, Sylvia Eleny Calandrini. A letra nacional: análise discursiva do ensino de leitura na 1ª República (1889-1930) no Pará na obra Selecta Litteraria, de Francisco Ferreira de Vilhena Alves. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.), em sua dissertação, constrói dois quadros complementares entre si, o primeiro que apresenta a identificação das fontes por título, autor e número de páginas correspondentes; e o segundo que organiza por título, tipologia e gênero/conteúdo. Embora não mencionando o inventário como técnica, a autora acaba por demonstrar um ensaio de construção de inventário do tipo arquivístico, que priorizou aspectos mais descritivos. De maneira semelhante, é realizado por Conceição (2020CONCEIÇÃO, Evellin Natasha Figueiredo da. A chama da estrela que pulsa e arde: educação sensível na prosa poética de Abguar Bastos. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2020.), quando apresenta o quadro descritivo nas páginas 41 e 42, indicando os títulos e a tipologia das fontes históricas que encarnam a poética e a militância do autor estudado ―Abguar Bastos.

Percebemos, dessa forma, que a atitude de organizar, catalogar, mapear, fichar, esmiuçar e sistematizar em quadros indicam a necessidade que esses estudiosos/as sentiram de dar sentido a fontes/dados de pesquisa em uma organicidade. Por outro lado, indiciam um sentido de atividade dada, que não necessita de pormenorização de explicações quanto às suas decisões. Quer dizer, organizar é importante, foi realizado como condição sine qua non, então será compreensível mesmo estando ausente no texto.

Como vimos com os/as autores/as supracitados/as (FELGUEIRAS, 2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação história. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 67-92, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38507. Acesso em: 21 ago. 2022.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
; GALVÃO et al., 2012GALVÃO, Ana Maria; MORAES, Dislane Zerbinatti; GONDRA, José Gonçalves; BICCAS, Maurilane de Souza. Difusão, apropriação e produção do saber histórico: a Revista Brasileira de História da Educação (2001-2007). Revista Brasileira de História da Educação, v. 8, n. 1, p. 171-234, 2012. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38592. Acesso em: 21 ago. 2023.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
; MELONI, 2012MELONI, Reginaldo Alberto. A experiência de constituição de uma fonte documental a partir dos instrumentos de ensino de química e física do Colégio Culto à Ciência de Campinas/SP. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 43-66, 2012. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38506. Acesso em: 21 ago. 2023.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
; MENEZES, 2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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; SILVA; PETRY, 2011SILVA, Vera Lucia Gaspar da; PETRY, Marília Gabriela. A aventura de inventariar: uma experiência no Museu da Escola Catarinense. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 19-42, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38505. Acesso em: 22 ago. 2022.
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), inventariar é uma ação consciente de planejamento ético, estético, social e epistemológico de organização e apresentação de conjuntos de dados, e que, a despeito dessa intencionalidade de escolhas, irá expressar sentidos próprios desse planejamento organizativo.

Nesse sentido, por um lado esses trabalhos em si concentram um certo compêndio de saberes advindos da experiência; a importância de práticas educativas advindas de espaços sociais não escolares, os quais nos formam a própria identidade amazônida ao considerar os saberes afro-amazônidas, os rituais festivos indígenas; o reconhecimento das incursões coloniais por meio das práticas educativas para a infância no período seiscentista; o estudo de obras e intelectuais importantes para a História da Educação na Amazônia; e que estejam esses saberes e conhecimentos acessíveis na leitura de suas mais de cem laudas. Contudo, faz falta a síntese didática dessas narrativas organizadas em um quadro, e as especificações acerca de um plano de Identificação e Organização desses dados, que sabemos ter influenciado na própria abordagem analítica. Sobretudo porque poderia contribuir em muito para sobrelevá-los enquanto patrimônio educativo amazônida, datado, circunstanciado e reiterado.

Tanto o PPGED-UEPA como o PPGED-UFPA são programas praticamente contemporâneos em seus marcos de criação, ainda nos primeiros anos do século XXI, e já contam com vultuoso número de trabalhos defendidos de maneira geral, mas também no que se refere àqueles situados no campo da História da Educação, como se demonstra na Tabela 1. E, por isso, imaginamos encontrar um maior número de achados de estudos que utilizassem a técnica do inventário.

Mas, contrário às nossas expectativas, no PPGED-UFPA encontramos apenas seis Dissertações e seis Teses ao todo. Desse total de 12 trabalhos, somente nove demarcam explicitamente a utilização do Inventário como recurso metodológico, os outros três são esforços aproximativos (Quadro 2).

QUADRO 2
ACHADOS DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO - UFPA

Percebemos, nesses estudos, que, quanto à compreensão da utilização do inventário como instrumento de pesquisa, são esboçadas algumas aproximações, tais como “mapeamento”, “organização das informações”, “catalogação”, “agrupamento”; mas, em nenhum deles aparece uma fundamentação teórica que embase a utilização dessa ferramenta.

Quanto à percepção de modelos de inventário utilizados por esses autores (as) que possam vir a colaborar, vimos em Silva (2012SILVA, Livia Sousa da. Os discursos do jornal impresso O Liberal sobre violência escolar em Belém (2001-2010). Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2012.) que há um modelo de inventário disponível nos apêndices, que está divido por ano, com descritores definidos de forma geral e específica para os objetivos de análise. Moraes (2013MORAES, Bárbara Danielle Damasceno. Vilas, “logares” e cidades: a história da educação rural do Pará na primeira República - 1889 a 1897. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2013.) apresenta um esquema que teria sido resultado de um inventário. Em Pinheiro (2013PINHEIRO, Welington da Costa. A infância nas páginas de jornal: discursos (re)produzidos pela imprensa paraense na primeira década do século XX. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2013.), não há um modelo expresso, mas a indicação da realização de um inventário manuscrito, que consta no decorrer do texto, como quadros com a apresentação dos dados, que poderiam ser tomados por uma sistematização.

Em Nascimento (2018NASCIMENTO, Cibele Braga Ferreira. História da Fundação Pestalozzi do Pará (1953-1975): os discursos político-social e educacional na assistência à criança excepcional. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2018.), há diferentes configurações para cada tipo de fonte inventariada: matérias de jornal, atas, mensagens de governo e fotografias. E, por sua vez Oliveira (2018OLIVEIRA, Michelle de Araújo. Concepções de infância e educação nos discursos do periódico a escola - Revista Oficial de Ensino do Pará (1900 a 1905). Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2018.) também possui em apêndices o seu inventário na íntegra. Em Viana (2019VIANA, Carmeci Reis. Discursos sobre violência contra a criança nas notícias do jornal “Folha do Norte” em Belém do Pará: perspectiva de educação no início do século XX. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2019., p. 110), há uma breve indicação da realização do inventário na seção metodológica, e depois, ao final, a autora o apresenta. Trata-se de um inventário que apresenta aspectos do processo de identificação e plano de classificação e organização, porque se organiza por mês/ano, notícia/ título, categoria, acusado, vítima, local do delito, descrição da matéria.

Freitas (2019FREITAS, Léia Gonçalves. Políticas de assistência, proteção e educação à infância pobre, abandonada e órfã e as ações da prelazia do Xingu no município de Altamira - Pará (1970-1979). Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2019., p. 59), por sua vez, contribui com a produção de dois quadros representativos de um inventário do tipo analítico, que organiza Relatórios Presidenciais Brasileiros: 1970-1979, por ano, presidente, eixo, ação, e o Quadro 4 mais do tipo descritivo que apresenta a relação das congregações estudadas: Prelazia do Xingu, Missionários do Sangue de Cristo, Instituto Maria de Mattias, Adorados do Sangue de Cristo, Casa Divina Providência Irmã Serafina Cinque, e os documentos referentes.

Sousa (2019SOUSA, Marlucy do Socorro Aragão de. O mobiliário escolar na instrução pública primária do Pará na primeira república: entre as “vitrines do progresso” e o “estado de ruínas”. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2019.) também apresenta inventário constituído acerca do mobiliário escolar na instrução primária do Pará (1889-1930), nos apêndices de sua Tese, do tipo arquivístico/descritivo, organizado por tipo de fonte, origem, título, assunto, tipo de mobília e data.

Maciel (2019MACIEL, Rogério Andrade. Cultura material escolar e as representações de educação no sistema radiofônico para os caboclos “ingênuos” na prelazia do Guamá (1957-1980). Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2019., p. 90) apresenta dois quadros de inventário analítico, referentes às fotografias, documentos e falas dos sujeitos sobre os objetos de comunicação e escolares no Sistema Educativo Radiofônico de Bragança e um “[...] Inventário de figuras e documentos sobre os objetos de comunicação e escolares no (prelazia do Guamá) (análise ancorada nos três eixos de representação proposto por Roger Chartier (1990) e a problematização dos objetos escolares em Paulo Freire (1987)”.

São trabalhos que melhor representam a execução da técnica do inventário proposta pelas autoras (FELGUEIRAS, 2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação história. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 67-92, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38507. Acesso em: 21 ago. 2022.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
; GALVÃO et al., 2012GALVÃO, Ana Maria; MORAES, Dislane Zerbinatti; GONDRA, José Gonçalves; BICCAS, Maurilane de Souza. Difusão, apropriação e produção do saber histórico: a Revista Brasileira de História da Educação (2001-2007). Revista Brasileira de História da Educação, v. 8, n. 1, p. 171-234, 2012. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38592. Acesso em: 21 ago. 2023.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
; MELONI, 2012MELONI, Reginaldo Alberto. A experiência de constituição de uma fonte documental a partir dos instrumentos de ensino de química e física do Colégio Culto à Ciência de Campinas/SP. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 43-66, 2012. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38506. Acesso em: 21 ago. 2023.
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; MENEZES, 2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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; SILVA; PETRY, 2011SILVA, Vera Lucia Gaspar da; PETRY, Marília Gabriela. A aventura de inventariar: uma experiência no Museu da Escola Catarinense. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 19-42, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38505. Acesso em: 22 ago. 2022.
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); ainda que não os realizem com a rigidez dos diferentes passos mencionados ― Identificação, Classificação, Organização e Revisão ― é possível observar claramente a intencionalidade de planos de classificação e organização ao propor categorias organizativas e de análise.

Rodrigues (2019RODRIGUES, Uisllei Uillem Costa. O que você veio fazer na sala de aula? Intelectuais indígenas brasileiros e a educação. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2019.), Nery (2021NERY, Vitor Sousa Cunha. Colonialidade pedagógica na instrução pública primária da comarca de Macapá (1840-1889). Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2021.) e Silva (2021SILVA, Cilene Maria Valente da. Representações do movimento escola nova no Pará: uma análise da revista escola (1930 -1935). Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2021.) apresentam aproximações do inventário tipo arquivístico, o que se percebe pela produção de quadros descritivos das fontes; e, no caso de Silva (2019), inclusive com caráter analítico.

Configuraria uma iniciativa robusta de inventário organizar todas as fontes levantadas e que serviram ao estudo e outras que por vezes captamos, mas ao cabo não colaboram para os nossos objetivos, ainda que em conjunto possam expressar uma “massa documental”, como concebe Menezes (2011MENEZES, Maria Cristina. Descrever os documentos - construir o inventário - preservar a cultura material. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 1, p. 93-116, 2011. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38508/20039. Acesso em: 22 ago. 2022.
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).

Importante ressaltar que os que apresentam modelos mais definidos têm em comum a utilização de quadros para apresentação; há de certa forma uma identificação e descrição que é feita, quase sempre no decorrer dos seus textos de dissertação e tese, e na construção dos inventários a preocupação maior é em estabelecer descritores que colaborem com a análise de seus objetos em particular. Dessa forma, percebemos duas coisas: a) o inventário tem servido mais objetivos de pesquisa e não de constituição e preservação de patrimônio educacional e ou pedagógico; e b) a construção dos inventários nos estudos do PPGED-UFPA estão intimamente relacionados aos procedimentos de análise, até mesmo como uma premissa analítica.

A preocupação em apresentar um inventário mais geral, para além das premissas próprias de seu trabalho, e que demonstra de certa forma, uma preocupação com a possível utilização de seu inventário para estudos posteriores aparece somente em Silva (2012SILVA, Livia Sousa da. Os discursos do jornal impresso O Liberal sobre violência escolar em Belém (2001-2010). Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2012., p. 54), ao pontuar que em seu estudo empreende-se

[...] uma descrição em linhas gerais do que se tem exposto nas matérias do jornal [...] que se supõe virem a ser úteis noutros empreendimentos de pesquisa com documentos [...] a complementar-se e refinar-se enquanto método de abordagem e captação de informações em estudos similares.

No mais, é a centralidade nos objetivos de cada pesquisa que sobressai. Por outro lado, enquanto autocentrados esses inventários contribuem sobremaneira com o processo de análise em propriamente dita. O que se vê nitidamente em Ferreira (2018) ao indicar que o inventário não foi sua análise, mas colaborou para com esta, na aproximação inicial às fontes e seus conteúdos; já Oliveira (2018OLIVEIRA, Michelle de Araújo. Concepções de infância e educação nos discursos do periódico a escola - Revista Oficial de Ensino do Pará (1900 a 1905). Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2018.), quando aponta claramente que as categorias eleitas para organização das informações e ou “mapeamento” como a autora trata, está inteiramente relacionada com as suas análises e os objetivos próprios de seu estudo; e em Pinheiro (2013PINHEIRO, Welington da Costa. A infância nas páginas de jornal: discursos (re)produzidos pela imprensa paraense na primeira década do século XX. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Pará, Belém, 2013., p. 56) cujo excerto diz: “[...] a realização de tal agrupamento e da visualização do inventário construído [...] permitiu a criação de categorias analíticas [...]”. Evidenciando a íntima relação entre a construção do inventário e o processo de análise em si.

No site do PPEB/UFPA é possível ter acesso às dissertações defendidas no período de 2017-2021. O programa foi criado em 2015 e hoje possui uma Linha de Pesquisa no campo da História da Educação Básica. Ainda não conta com o Doutorado e por isso, não há achados de tese. Nesse interstício de cinco anos, encontramos 109 dissertações. Ao considerar os mesmos critérios propostos XXX2 2 “(a) identificar nos títulos das dissertações e teses o período histórico; (b) ler os resumos das dissertações e teses, mapeando objetivos, campo teórico e metodologia do trabalho; (c) destacar as linhas de pesquisa dos programas no qual o trabalho foi desenvolvido; (d) apontar, a partir do título e do resumo das dissertações e teses, em que eixos temáticos da Sociedade Brasileira de História da Educação os trabalhos se articulam” (ALVES; NERY; SILVA, 2019, p. 3-4). , apontamos um total de 12 trabalhos assentados no campo da História da Educação. Em nenhum desses estudos observou-se a indicação direta da utilização da técnica de inventário.

As abordagens metodológicas variam entre pesquisas do tipo Documental (oito), de Campo (uma) e documental e de Campo (três). Os encaminhamentos de análise privilegiam, em ampla medida, os pressupostos da Análise de Conteúdo, o que observou em metade desses estudos (seis); outras abordagens epistemológicas identificadas são a História Local (uma); História Oral (uma) e o Materialismo Histórico-Dialético (uma). Outros trabalhos utilizam autores variados para implementar as discussões por categorias temáticas (dois).

Faz-se importante chamar a atenção para duas dissertações que, embora não demarquem a utilização do Inventário, destacam-se por aproximações à técnica de forma ensaística, conforme são apresentadas no Quadro 3.

QUADRO 3
ACHADOS APROXIMATIVOS DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CURRÍCULO E GESTÃO DA ESCOLA BÁSICA (PPEB/UFPA)

No trabalho de Maués (2020MAUÉS, Cleiton Ponciano Santos. A história do grupo escolar de Abaeté (1903-1923): entre as contradições na arquitetura e na organização pedagógica. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica, Universidade Federal do Pará, Belém, 2020.), há nítida intenção de proporcionar acesso facilitado a outros pesquisadores desse material que intitula “fontes para a História da Educação”; já os anexos listam diferentes tipologias documentais ― leis, decretos e fontes escolares do Grupo Escolar de Abaeté entre os anos de 1903-1923, inclusive com links de acesso. De outra forma, não deixa de mencionar a necessidade quanto à catalogação, à organização e à análise; nesse sentido, diz ter-se baseado na leitura de Margarita Victoria Rodríguez ― Pesquisa histórica: o trabalho com fontes documentais ― que não trata de ensinar a técnica do inventário, mas aponta o inventário de fontes como documento importante de pesquisa no campo da História da Educação.

E, na dissertação de Costa (2021COSTA, João Lúcio Mazzini da. O higienismo na instrução pública paraense entre 1890 e 1900. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica, Universidade Federal do Pará, Belém, 2021.) sobre o higienismo na instrução pública paraense entre 1890 e 1900, na apresentação de dois quadros: “Quadro 3 - Legislações educacionais” ― que se configura por uma listagem de Decretos do período do governo de Chermont e breve descrição das relações que guarda com reformas na instrução pública no Império ― e “Quadro 4 - Unidades de registro acerca do higienismo Encontros Com a Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, v. 11, p. 101-140, 1979. na legislação educacional paraense entre 1890 e 1899” ― que não tem indicação da fonte (quem elaborou), mas acredita-se ter sido o autor, ao considerar a tipologia de fontes documentais que anuncia ter levantado. O Quadro 4 se aproxima em muito do que estamos aqui tomando por inventário analítico, uma vez que o seu plano de organização se dá por categorias com finalidade de análise e não só descritivas, quais sejam: a identificação do documento e o que esse documento apresenta sobre alunos, professores, estrutura da escola e organização do ensino.

Considerações finais

Acreditamos que o inventário contribui para os estudos na área de História da Educação enquanto um instrumento de pesquisa e enquanto um instrumento de controle. Como instrumento de pesquisa, favorece a organização de documentos importantes à pesquisa em um acervo lógico, a partir de classificação, ordenação e descrição; dá ao/à pesquisador/a uma visão geral do corpus levantado, o que colabora como momento importante no processo de análise.

Como instrumento de controle, o ato de inventariar dados nos convida, principalmente, a assumir um compromisso cidadão, que deve não só ocupar-se de dialogar com as fontes para nossos intentos de pesquisa em específico, mas também cuidar para que deixemos nossa contribuição à preservação e à acessibilidade do patrimônio histórico-educacional e pedagógico de nosso Estado (Pará) e de nosso País.

É fato que a técnica, embora pertinente e justificada para colaborar com o campo de estudos da História da Educação, ainda não se vê muito difundida. Isso tem a ver tanto com o fato de não ser uma prática de pesquisa nativa desse campo como pelo número reduzido publicações que abordam em suas dimensões de desenvolvimento prático. O que em muito explica o fato de que, mesmo os trabalhos mais desenvoltos na sua execução não têm conseguido demarcá-la em seu escopo metodológico, assim como o fizeram para explicar escolhas outras como o tipo de pesquisa, instrumentos de coleta etc.

Esperamos poder, com este texto, suscitar uma maior recorrência de utilização da técnica, do conhecimento de sua importância e das contribuições para uma maior qualificação da produção de conhecimento científico no contexto amazônida, e que em tempo sejamos capazes de consubstanciar um robusto repositório de dados inventariados acerca de nossos saberes e conhecimentos, em um corpo sistemático de patrimônio educacional constituído.

REFERÊNCIAS

  • ALVES, Laura Maria Silva Araújo; NERY, Vitor Sousa Cunha; SILVA, Lívia Sousa da. Cartografia das produções em História da Educação nos Programas de Pós-Graduação em Educação no Pará (2005-2018). Revista Brasileira de História da Educação, v. 19, p. 1-27, 2019. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/47252. Acesso em: 15 jun. 2022.
    » https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/47252.
  • BRABO, Sylvia Eleny Calandrini. A letra nacional: análise discursiva do ensino de leitura na 1ª República (1889-1930) no Pará na obra Selecta Litteraria, de Francisco Ferreira de Vilhena Alves. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.
  • BUECKE, Jane Elisa Otomar. Infância e práticas educativas na Amazônia seiscentista. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade do Estado do Pará, Belém, 2019.
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  • 1
    Não há disponíveis ainda no site do PPGED/UEPA as dissertações defendidas em 2021/2022.
  • 2
    “(a) identificar nos títulos das dissertações e teses o período histórico; (b) ler os resumos das dissertações e teses, mapeando objetivos, campo teórico e metodologia do trabalho; (c) destacar as linhas de pesquisa dos programas no qual o trabalho foi desenvolvido; (d) apontar, a partir do título e do resumo das dissertações e teses, em que eixos temáticos da Sociedade Brasileira de História da Educação os trabalhos se articulam” (ALVES; NERY; SILVA, 2019, p. 3-4).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    07 Set 2022
  • Aceito
    20 Jul 2023
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