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Entre a colonialidade e a decolonialidade: Memórias docentes na educação básica da Amazônia brasileira

Between coloniality and decoloniality: Teaching memories in basic education in the brazilian Amazon

RESUMO

Neste artigo analisamos as memórias profissionais de docentes da educação básica que em sua prática pedagógica relacionam conhecimento escolar e cultura popular no contexto da complexidade sociocultural da Amazônia brasileira. Além de exercerem o magistério, os sujeitos da pesquisa são produtores de cultura popular, engajados em manifestações artísticas de minorias sociais da região amazônica. Metodologicamente, as memórias narradas pelos/as professores/as foram apreendidas com base nas orientações da história oral e a análise se fundamenta no pensamento decolonial. A pesquisa concluiu que a escola é atravessada pelo fenômeno da colonialidade e, consequentemente, regida por uma epistemologia monocultural que marginaliza os conhecimentos produzidos pelas populações que foram vítimas do colonialismo. Entretanto, contraditoriamente, os protagonistas da pesquisa, com suas vivências no âmbito da cultura popular, colocam em questão os conhecimentos socializados nesta instituição e, mediatizados pelo diálogo com os saberes produzidos no território amazônico, ampliam os conceitos de arte e estética, denunciam práticas racistas e patriarcais e criticam a exploração do trabalho humano e da natureza no capitalismo.

Palavras-chave:
Cultura Popular; Memória; Pedagogias Decoloniais; Amazônia

ABSTRACT

In this article we analyze the professional memories of basic education teachers who, in their pedagogical practice, relate school knowledge and popular culture in the context of the sociocultural complexity of the Brazilian Amazon. In addition to teaching, the research subjects are producers of popular culture, engaged in artistic manifestations of social minorities in the Amazon region. Methodologically, the memories narrated by the teachers were apprehended based on the guidelines of oral history and the analysis is based on decolonial thinking. The research concluded that the school is crossed by the phenomenon of coloniality and, consequently, governed by a monocultural epistemology that marginalizes the knowledge produced by populations that were victims of colonialism. However, contradictorily, the protagonists of the research, with their experiences in the scope of popular culture, question the knowledge socialized in this institution and, mediated by the dialogue with the knowledge produced in the Amazonian territory, expand the concepts of art and aesthetics, denounce racist and patriarchal practices and criticize the exploitation of human labor and nature in capitalism.

Keywords:
Culture; Memory; Decolonial Pedagogies; Amazon

Introdução

Este texto aborda parte de um relatório de pesquisa, cuja tese foi defendida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Pará, em 2021, e que tem como objeto de investigação a relação escola-cultura popular na Amazônia. Temos o objetivo de analisar as memórias de experiências vividas por professoras e professores da educação básica ao relacionarem conhecimento escolar e cultura popular no contexto da complexidade sociocultural da Amazônia brasileira.

A pesquisa concluiu que a educação escolar, na vivência dos interlocutores da pesquisa, é atravessada pelo fenômeno da colonialidade, padrão de poder global que se desenvolve a partir do colonialismo europeu e faz com que a instituição de ensino seja regida por uma epistemologia monocultural que marginaliza os conhecimentos produzidos pelas populações que foram vítimas do colonialismo.

Entretanto, contraditoriamente, os protagonistas da pesquisa, com suas vivências no âmbito da cultura popular, colocam em questão os conhecimentos socializados nesta instituição e, mediatizados pelo diálogo com os saberes produzidos no território amazônico, ampliam os conceitos de arte e estética, denunciam práticas racistas e patriarcais e criticam a exploração do trabalho humano e da natureza no capitalismo.

O trabalho teve como corpus de análise memórias narradas por docentes que atuam na rede pública de educação básica de três estados da região amazônica: Amapá, Amazonas e Pará. Além de exercerem o magistério, estes docentes são produtores de cultura popular, engajados em manifestações artísticas de minorias sociais.

A fim de preservar o anonimato de nossas/os narradoras/es nos referiremos a eles e elas por meio de pseudônimos: a) Letícia, professora de Língua Portuguesa e treinel1 1 Aluna/o de capoeira angola com muitos anos de prática, a ponto de receber a autorização do/a mestre/a para ensinar a novos alunos/as. de capoeira Angola; b) Lucas, professor de Sociologia, Rapper e M.C.; d) Débora, pedagoga, professora dos anos iniciais do ensino fundamental em Manaus, professora de Dança e ativista da cultura popular em diversas manifestações, passando pelo Hip Hop, tambor de crioula, boi-bumbá, entre outras; e) Alder, professor de Artes e integrante de grupos de carimbó na capital paraense.

Do ponto de vista metodológico, suas memórias foram apreendidas por meio de narrativas coletadas e analisadas com base nas orientações da história oral. Especificamente, trata-se de um trabalho no campo da história oral temática, ou seja, vinculado à abordagem sobre um assunto específico, sendo um recorte da experiência individual como um todo, abordando questões externas, objetivas, factuais (MEIHY; RIBEIRO, 2011MEIHY, José Carlos; RIBEIRO, Suzana Salgado. Guia prático de história oral. São Paulo: Contexto, 2011.).

A escolha pela história oral se dá por entendermos, a partir de Cunsicanqui (1987), se tratar de um método capaz de auxiliar na descolonização das relações sociais e nas formas de produção de conhecimento, não sendo somente uma metodologia participativa, mas um exercício coletivo de “desalienação”, tanto para o pesquisador quanto para o pesquisado.

Na história oral, diz a autora, ao se recuperar o estado cognitivo da experiência humana, o processo de sistematização assume a forma de uma síntese dialética entre dois (ou mais) polos ativos de reflexão e conceituação, não mais entre um “ego conhecedor” e um “outro passivo”, mas entre dois sujeitos que refletem juntos sobre suas experiências e visões de um sobre o outro (CUNSICANQUI, 1987).

A escolha de trabalho com as memórias se deu por compreendermos, conforme defende Catherine Walsh (2013WALSH, Catherine. Pedagogias decoloniais: práticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir. Quito: Ediciones Abya Yala, 2013.), que a memória coletiva dos povos latinoamericanos reafirmam práticas pedagógicas de ação capazes de vincular o pedagógico e o descolonial.

A autora afirma que a invasão colonial-imperial do continente foi responsável por uma memória estabelecida por estratégias, práticas e metodologias pedagógicas de luta, rebelião, insurgência, organização e ação dos povos originários, e, posteriormente, da população africana escravizada, usadas para resistir, transgredir e subverter a dominação, para continuar a ser, sentir, fazer, pensar e viver, apesar do poder colonial (WALSH, 2013WALSH, Catherine. Pedagogias decoloniais: práticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir. Quito: Ediciones Abya Yala, 2013.).

Walsh (2013WALSH, Catherine. Pedagogias decoloniais: práticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir. Quito: Ediciones Abya Yala, 2013.) entende ser a partir desse horizonte histórico de longo prazo que o pedagógico e o descolonial adquirem sua razão e senso político, social, cultural e existencial, pois, a ação educativa encontra-se fortemente enraizada na própria vida e, portanto, nas memórias coletivas dos povos indígenas e afrodescendentes, mantidas como parte de sua existência e ser.

Deste modo, apresentamos aqui, a partir da análise das memórias sobre a atuação profissional de nossos/as interlocutores/as, como as vivências dos/das docentes com a cultura popular repercutem em sua prática pedagógica, como a comunidade escolar recebe os diálogos interepistemicos protagonizados por estas pessoas; quais as repercussões dessas práticas pedagógicas no aprendizado discente e, de modo geral, como estes sujeitos protagonizam ações que auxiliam na descolonização da escola.

O texto conta, além desta introdução, como uma seção teórica em que apresentamos as categorias centrais do trabalho, a partir do pensamento decolonial, discutindo como o colonialismo criou um padrão de poder que constitui o capitalismo global e chega até a escola, promovendo hierarquias epistemológicas que estão por trás da desvalorização da cultura popular nos âmbitos oficiais de ensino; em seguida, discutimos os resultados da pesquisa, mostrando como nossos interlocutores, a partir de suas vivências com a cultura popular, desenvolvem práticas pedagógicas que combatem este padrão de poder, ações educativas que, como veremos, são chamadas de pedagogias decoloniais.

Colonialidade pedagógica e cultura popular

A premissa fundamental que orienta as reflexões das/os intelectuais que compõem a rede modernidade/colonialidade é que o mundo não foi completamente descolonizado. A descolonização iniciada no século XIX foi incompleta, restringiu-se à independência jurídico política das periferias. As assimetrias presentes nas múltiplas relações raciais, étnicas, econômicas, sexuais, epistêmicas permaneceram intactas pós século XIX (CASTRO-GÓMEZ; GROSFOGUEL, 2007CASTRO-GÓMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramón. Prólogo. Giro decolonial, teoría crítica y pensamiento heterárquico. In: CASTRO-GÓMEZ, Santiago; GROSFOGUEL, Ramón. El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá: Siglo del Hombre Editores; Universidad Central, Instituto de Estudios Sociales Contemporáneos y Pontificia Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007.).

O colonialismo produziu um novo padrão de poder que sobreviveu e se fortificou, mesmo após os processos de independência, e que referendou uma economia orientada para a acumulação de capital em escala global, a supremacia de uma classe, de um grupo etnicorracial, de um gênero, de um padrão de sexualidade, além de um tipo particular de organização estatal, de uma espiritualidade, de uma epistemologia. Também disseminou um tipo de produção de conhecimento, popularizou algumas línguas e uma pedagogia (GROSFOGUEL, 2012GROSFOGUEL, Ramon. Descolonizar as esquerdas ocidentalizadas: para além das esquerdas eurocêntricas rumo a uma esquerda transmoderna descolonial. Contemporânea, v. 2, n. 2 p. 337-362, 2012. Disponível em: https://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/view/86. Acesso em: 11 mar. 2022.
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).

A esse padrão de poder Quijano (2000QUIJANO, Aníbal. ¡Qué tal raza! Revista. Venez. de Economía y Ciencias Sociales. v. 6, n.1, p. 37-45, 2000.) chamou de Colonialidade, pedra fundamental do poder mundial capitalista, colonial/moderno e eurocentrado que se provou mais profundo e duradouro do que o colonialismo em que foi engendrado e ao qual ajudou a se impor em todo o mundo.

Maldonado-Torres (2019, p. 36) nos diz que a colonialidade é a “lógica global de desumanização que é capaz de existir até mesmo na ausência de colônias formais”. De acordo com o intelectual latino-americano, a colonialidade é um paradigma de guerra que normaliza a violência e que tem como seus alvos diletos os sujeitos colonizados.

Além da catástrofe demográfica, o colonialismo no passado e a colonialidade no presente produzem um epistemicídio, ou seja, a repressão sistemática às crenças, ideias, imagens, símbolos ou conhecimentos específicos que não serviram para a dominação colonial global, é o que denuncia Anibal Quijano (1992QUIJANO, Aníbal. Colonialidad y Modernidad/Racionalidad. Revista Perú Indígena. v. 13, n. 29, p. 11-20, 1992.). Para o intelectual peruano, a repressão recai, sobretudo, nos modos de conhecer, de produzir conhecimento, de produzir perspectivas, imagens e sistemas de imagens, símbolos, modos de significação, sobre recursos, padrões e instrumentos de expressão formalizada e objetiva, intelectual ou visual.

O que se segue, diz o sociólogo, é a imposição dos próprios padrões de expressão dos dominantes, bem como de suas crenças e imagens relacionadas ao sobrenatural, que serviam não apenas para impedir a produção cultural dos dominados, mas também como eficazes formas de controle social e cultural, quando a repressão imediata deixou de ser constante e sistemática.

Neste sentido, a violência colonial instituiu o que o filósofo colombiano Santiago Castro-Gómez (2005) denomina de “ponto zero do conhecimento”. Neste fenômeno, a Europa se autoproclama como o começo epistemológico absoluto do mundo, fazendo “tábula rasa” de todos os saberes procedentes de outras partes do globo, o que lhe concede o poder de instituir, de representar, de construir uma visão sobre o mundo social e natural reconhecida como a única legítima. Em síntese, a violência epistemológica é constituinte da violência colonial.

El imaginario del mundo moderno/colonial surgió de la compleja articulación de fuerzas, de voces oídas o apagadas, de memorias compactas o fracturadas, de historias contadas desde un solo lado que suprimieron otras memorias y de historias que se contaron y la colonialidad a lo largo y lo ancho: el hemisferio occidental en el horizonte colonial cuentan desde la doble conciencia que genera la diferencia colonial (MIGNOLO, 2015MIGNOLO, Walter. Trayectorias de re-existencia: ensayos en torno a la colonialidad/decolonialidad del saber, el sentir y el creer. Bogotá: Universidad Distrital Francisco José de Caldas, 2015.).

Para Brandão (2008BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Viver de criar cultura, cultura popular, arte e educação. In: SILVA, René Marc da Costa (org). Cultura popular e educação: salto para o futuro. Brasília: SEED/MEC, 2008.), a dominância do pensamento ocidental moderno sobre a educação, além de implementar modelos utilitários e instrumentais nas escolas seriadas, deixou ‘quebras’ dramáticas nos sistemas de ensino. Uma delas é a “desqualificação de outras culturas e, sobretudo, as culturas populares, em nome de formas únicas e pretensamente civilizadas e eruditas do saber e do viver” (BRANDÃO, 2008BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Viver de criar cultura, cultura popular, arte e educação. In: SILVA, René Marc da Costa (org). Cultura popular e educação: salto para o futuro. Brasília: SEED/MEC, 2008., p. 36).

Para o filósofo Enrique Dussel (1997DUSSEL, Enrique. Oito Ensaios sobre Cultura Latino-Americana e Libertação. São Paulo: Paulinas, 1997.) a desvalorização da cultura popular e o favorecimento de um referencial cultural eurocentrado constituem o que ele chama de Pedagogia da Dominação, que tem também o objetivo de inviabilizar processos de resistência à própria dominação, já que a cultura do povo carrega enorme potencial contestador.

O popular para Dussel (1997DUSSEL, Enrique. Oito Ensaios sobre Cultura Latino-Americana e Libertação. São Paulo: Paulinas, 1997.) seria um setor social de explorados ou oprimidos de uma nação, mas que guardaria também certa “externalidade”. Os oprimidos do sistema estatal mantêm uma alteridade livre nesses momentos culturais - desprezados pelos dominantes apenas como folclore - música, comida, roupas, festivais, a memória de seus heróis, os feitos emancipatórios, as organizações sociais e políticas etc.

Deste modo, a cultura popular, longe de ser uma cultura menor, “é o centro menos contaminado e radiante da resistência do oprimido contra o opressor”. Dussel entende que “para criar algo de novo, há de se ter uma palavra nova que irrompa a partir da exterioridade. Esta exterioridade é o próprio povo que, embora oprimido pelo sistema, é o mais distante em relação a este” (DUSSEL, 1997DUSSEL, Enrique. Oito Ensaios sobre Cultura Latino-Americana e Libertação. São Paulo: Paulinas, 1997., p. 147). Defendendo o potencial revolucionário da cultura popular, Dussel afirma:

A cultura popular latino-americana - escrevíamos no artigo de 1984 - apenas fica clara, decanta, se autentifica no processo de libertação (da libertação econômica do capitalismo, da libertação política da opressão), instaurando um novo modelo democrático, sendo assim libertação cultural, dando um passo criativo na linha da tradição histórico-cultural do povo oprimido e agora protagonista da revolução (DUSSEL, 1997DUSSEL, Enrique. Oito Ensaios sobre Cultura Latino-Americana e Libertação. São Paulo: Paulinas, 1997., p. 220-221).

Conforme Edgardo Lander (2005LANDER, Edgardo. Ciências sociais: saberes coloniais e eurocêntricos. In: LANDER, Edgardo (org). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires, Argentina: CLACSO, 2005., p. 24), dada a naturalização das relações sociais e dos saberes modernos, acaba sendo difícil a compreensão do caráter histórico, cultural específico das relações sociais estabelecidas na modernidade. Precisamos “recorrer a outras perspectivas culturais, que nos permitam desfamiliarizar-nos e, portanto, desnaturalizar a objetividade universal destas formas de conceber a realidade”.

Neste sentido, os interlocutores desta pesquisa, ao promoverem interfaces entre os conhecimentos oriundos de suas vivências com cultura popular, com sua prática pedagógica na educação básica, podem contribuir com a construção de processos educativos que auxiliem na superação da colonialidade, apresentando novas referências culturais que se distinguem dos parâmetros estabelecidos pela matriz colonial de poder.

Pedagogias decoloniais e cultura popular na amazônia

Para Walsh (2010WALSH, Catherine. Estudios (inter)culturales en clave decolonial. Tabula Rasa, n. 12, p. 209-227, 2010. DIsponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=39617422012. Acesso em: 13 mai. 2022.
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), Nuestra America, em toda a sua história, seguiu construindo processos educativos que enfrentam a questão racial e a prevalência da razão ocidental. São pedagogias que se esforçam para “transgredir, deslocar e incidir na negação ontológica, epistêmica e cosmogônico-espiritual que foi, e é, estratégia, fim e resultado do poder da colonialidade” (WALSH, 2013WALSH, Catherine. Pedagogias decoloniais: práticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir. Quito: Ediciones Abya Yala, 2013., p 27).

A estas ações, Walsh (2013WALSH, Catherine. Pedagogias decoloniais: práticas insurgentes de resistir, (re)existir, y (re)vivir. Quito: Ediciones Abya Yala, 2013.) chama de pedagogias decoloniais, pois promovem e provocam fissuras na ordem moderna/colonial, as quais tornam possíveis e dão sustento e força a um modo distinto, inteiramente outro, de estar no e com o mundo. Conforme diz Maldonado-Torres (2020, p. 10):

Enquanto o mito da Modernidade/colonialidade encobre e assassina, a pedagogia de(s)colonial ajuda a construir o amor e a raiva necessárias para que sejam feitas perguntas desafiantes, para se unir aos outros em tarefa de criar um mundo à altura das relações humanas, onde os genocídios terminem e já não haja espaço para a superioridade e a inferioridade.

Para Mota-Neto, pedagogia decolonial refere-se às teorias-práticas de formação humana que capacitam os “grupos subalternos para a luta contra a lógica opressiva da modernidade/colonialidade, tendo como horizonte a formação de um ser humano e de uma sociedade livres, amorosos, justos e solidários” (MOTA-NETO, 2016MOTA-NETO, João Colares da. Por uma pedagogia decolonial da América Latina: Reflexões em torno do pensamento de Paulo Freire e Orlando Fals Borda. Coritiba: CRV, 2016., p. 318).

Portanto, sem perder de vista a possibilidade da construção de pedagogias decoloniais a partir da cultura popular, iniciamos agora as análises das memórias de nossos/as interlocutores/as enquanto trabalhadores/as da educação, iniciando com a narrativa da professora manauara Débora.

Após graduar-se em Dança na Universidade Federal da Bahia, aprofundando-se nas danças de matriz africana, Débora retorna a Manaus e começa a lecionar em uma organização não governamental voltada ao ensino desta expressão artística a crianças, adolescentes e jovens manauaras.

Aí fui trabalhar no [nome da instituição], desenvolvia o Cidadão do Mundo, que é aquele espetáculo que eu tinha desenvolvido lá na Bahia. Aí eu consegui dar seguimento nas pesquisas dentro desse espetáculo. Aí fui pesquisar e trabalhar também com os ritmos daqui de Manaus, tipo o boi bumbá, depois trabalhei também... montei outro espetáculo também “Manaus Cabocla”. Fui desenvolvendo as pesquisas que eu gosto de fazer, os ritmos que eu queria, que eram os ritmos daqui, os regionais e os ritmos do Nordeste (Débora, trecho de entrevista, 2020).

Após um período de trabalho, Débora constatou algo importante sobre as alunas:

Eu percebia que precisava trabalhar com elas desde pequena, porque quando eu cheguei, fui trabalhar com as maiores e elas já tinham rejeição em questão a cultura afro-brasileira “ih, isso é macumba”, “ih, isso é coisa de preto”, “ih, isso é coisa de índio”. Isso já vinha culturalmente colocado na cabeça deles de que não era algo bom, diziam que batuque era coisa de demônio, era macumba (Débora, trecho de entrevista, 2020).

Numa sociedade marcada pela colonialidade, somos “educados” a desvalorizar o legado cultural dos povos indígenas e das populações afro-brasileiras. A colonialidade cumpre seu papel fazendo com que jovens amazônidas rejeitem todo um acervo cultural que faz parte da região e que evidenciam nossa ancestralidade.

Isso acontece porque, como afirma Quijano (2005QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, Edgardo (Org.). A colonialidade do Saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005.), a partir do colonialismo europeu do séc. XVI a codificação das diferenças entre conquistadores e conquistados foi sendo estruturada na ideia de raça, ou seja, distinções na estrutura biológica que situava a uns em situação natural de inferioridade em relação a outros. Essa ideia foi assumida pelos conquistadores como o principal elemento constitutivo, fundacional, das relações de dominação que a conquista exigia. Nos séculos seguintes, a racialização foi imposta a toda população do planeta como parte do domínio colonial da Europa. Assim, raça tornou-se um caminho e um resultado da dominação colonial moderna que invadiu todas as áreas do poder mundial capitalista.

Débora identifica que este fenômeno se faz presente contemporaneamente, ao perceber a marginalização que a cultura e as artes indígenas e afro-brasileiras sofrem em seu estado:

Aqui no Amazonas tudo que tem essa referência ao negro e ao indígena tem um receio. Agora nem tanto. Têm vários movimentos de pessoas negras com essa questão das pessoas afirmarem isso, de fincar, de trabalhar o legado do povo negro, a gente consegue mais, mas naquela época não tinha mesmo, a gente tentava e as pessoas diziam que isso era dança de índio, era dança de preto, sabe? Existia muito isso, tudo que era relacionado com a cultura do negro e do indígena era resistência pro Estado (Débora, trecho de entrevista, 2020).

A professora, todavia, não desiste, insiste em desenvolver seu trabalho de pesquisa e ensino das danças afro-brasileiras e chega à seguinte conclusão:

Então tinha que trabalhar com a base, com crianças de 7 a 8 anos, pra poder trabalhar a autoestima, dizer que aquilo era cultura popular, dizendo que era lindo, dizendo que as pessoas sambavam lindo, dizendo que éramos lindos dançando e cantando capoeira. Aí pronto, depois dos 8 anos que elas vão tendo essa formação, vão chegando na adolescência e já vão trabalhando lá as questões mais temáticas e sociais mesmo, espetáculos de dança, temáticas de questões mais sociais e isso com formação. Tinham danças populares, improvisação, balé clássico, dança contemporânea, jazz, hip-hop e eu ficava mais nessa parte de formação com elas, tanto o corporal, tanto o social (Débora, trecho de entrevista, 2020).

Analisando as estratégias adotadas pela professora Débora para continuar desenvolvendo seu trabalho, concluímos que sua prática de ensino se traduziu numa pedagogia decolonial, pois entendemos que estas pedagogias ajudam a desconstruir a colonialidade, promovendo: a valorização dos legados culturais, sejam eles epistemológicos, artísticos, religiosos etc. das populações vítimas do colonialismo, os quais o eurocentrismo tenta encobrir; promovem o empoderamento e elevação da autoestima das populações racializadas, que viram suas heranças étnicas desprezadas, vilipendiadas pela colonialidade.

Além do mais, ainda tendo como referência o trabalho de Débora, a valorização cultural não pode ser um fim em si mesma, pois esta, ao perder o horizonte utópico da descolonização radical da sociedade, apenas recai numa interculturalidade funcional, como denuncia Walsh (2010WALSH, Catherine. Estudios (inter)culturales en clave decolonial. Tabula Rasa, n. 12, p. 209-227, 2010. DIsponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=39617422012. Acesso em: 13 mai. 2022.
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), em que a suposta valorização cultural não gera transformações estruturantes, apenas uma espécie de “fetichização” das culturas que seguem reificadas.

O trabalho pedagógico que visa a valorização da cultura popular na perspectiva decolonial, como o de Débora, situa o encobrimento cultural como parte integrante de um sistema de poder originado com o colonialismo e que promoveu, dentre outras mazelas, o genocídio das populações indígenas, africanas e afro-brasileiras, constituindo o capitalismo global que mantém marginalizados estes mesmos grupos, juntamente com sua cultura.

Com relação ao seu trabalho como professora da educação infantil na Secretaria Municipal de Educação de Manaus, Débora narrou suas iniciativas de vincular a cultura popular às atividades regulares desenvolvidas pela escola. Rememorou todos os desafios e resistências que encontrou por parte da comunidade escolar, ao desenvolver estes trabalhos.

Lá eu trabalho com crianças de 6 e 7 anos, porque agora eles já fizeram sete, mas no início eu conseguia trabalhar com eles, eu fiz um carnaval com eles, já foi uma quebra. Muitas crianças os pais são evangélicos, eu digo “carnaval” os pais já falam que é coisa do demônio, os pais ainda tem muito essa mentalidade, infelizmente. Mas, eu consegui. Só umas duas crianças não foram por causa da religião e eu venho batendo nessa tecla. As pessoas dizem que ninguém discrimina as religiões de matrizes africanas, mas quando você leva um atabaque pra sala todo mundo fica estranho, mas em breve eu pretendo levar o maracatu, só pra mostrar como é, ano que vem, esse é meu projeto pra um futuro bem próximo (Débora, trecho de entrevista, 2020).

Dentro do ensino regular, a professora Débora permaneceu com sua postura descolonizadora, tratando a cultura popular como um instrumento indispensável à superação da colonialidade e, apesar de ter descrito o espaço escolar onde atua como um ambiente favorável e receptivo às reflexões propostas por sua prática pedagógica, chamou atenção para alguns casos onde constatou resistência às suas iniciativas e discussões, ao vivenciar situações em que era questionada. Ela explica que enfrentou colegas que diziam:

“Por que você ainda fica falando sobre isso? Sobre racismo? Vamos esquecer isso.” Aí eu: “Não, não pode esquecer, nunca, jamais, é a memória da formação brasileira”. Então, a maioria tenta esquecer isso, então desde pequeno a gente já é conduzido pra esse apagamento histórico, apagamento das nossas ancestralidades, porque tudo que se refere a essa cultura eles tentam marginalizar, oprimir, dizer que é feio. Criança com três anos na creche e já discriminava, onde ela aprendeu isso? (Débora, trecho de entrevista, 2020).

Nas memórias dos demais docentes, sujeitos da pesquisa, também identificamos esta dialética entre a colonialidade no âmbito pedagógico e a construção de pedagogias decoloniais a partir do diálogo com a cultura popular. Emblemática é a experiência profissional do professor de sociologia, rapper e M.C.2 2 Mestre de Cerimônia na cultura hip-hop é um artista ou cantor que normalmente compõe e canta seu material próprio e original. É o porta-voz que relata, através de rimas, os problemas, carências e experiências em geral dos guetos. Não só descreve, mas também lança mensagens de alerta e orientação. Lucas. Formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Pará, nosso interlocutor rememorou seus primeiros anos de magistério, onde lecionou em uma escola pública de um dos bairros mais populosos da periferia de Belém-PA, a Terra Firme.

Agora que eu sou mais tio, mas naquela época eu era novo como professor e tal, aquele cara que ainda era próximo dessa realidade juvenil e periférica pelo hip-hop e antropólogo. Então alguém que tava formado pra saber o que era a cultura do outro, entender a cultura do outro. Então eu comecei a perceber que aquilo era o professor [Lucas], Entendeu? Era o MC. que tinha a sala de aula como desculpa pra poder criar conhecimento crítico com a juventude (Lucas, trecho de entrevista, 2020).

Para Lucas é importante que sua prática pedagógica aconteça a partir do diálogo entre a cultura popular, principalmente o hip-hop, e sua formação acadêmica. Mostra-nos, assim, que as pedagogias decoloniais estabelecem diálogos interepistêmicos com os conhecimentos encobertos pela modernidade/colonialidade e que o legado intelectual europeu apreendido na academia deve ser ressignificado e tratado na sua real dimensão, despido de seu mito universalista.

Neste sentido, o professor se aproxima do que Walter Mignolo (2003MIGNOLO, Walter. Histórias locais/projetos globais: Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2003.) chama de Pensamento de Fronteira: uma resposta epistêmica dos/as subalternos/as ao projeto eurocêntrico da modernidade. Neste, ao invés de rejeitarem os legados da modernidade, as populações vítimas do colonialismo/colonialidade redefinem a sua retórica emancipatória a partir de suas cosmologias e epistemologias próprias, tendo sempre em vista a luta de libertação decolonial e a superação da modernidade eurocentrada.

Aquilo que o pensamento de fronteira produz é uma redefinição/subsunção da cidadania e da democracia, dos direitos humanos, da humanidade e das relações econômicas para lá das definições impostas pela modernidade europeia. O pensamento de fronteira não é um fundamentalismo antimoderno. É uma resposta transmoderna descolonial do subalterno perante a modernidade eurocêntrica (GROSFOGUEL, 2008GROSFOGUEL, Ramon. Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos pós-coloniais: Transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global. Revista Crítica de Ciências Sociais, n 80, p. 115-147, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.4000/rccs.697. Acesso em: 15 mar. 2022.
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, p. 138).

Sob tais lógicas, as pedagogias decoloniais atuam na perspectiva do pensamento de fronteira ao reconhecerem a importância da instituição de ensino, em especial da escola, mas na perspectiva da sua refundação, a ocorrer a partir dos marcos epistêmicos próprios das populações do Sul global e do estabelecimento do diálogo intercultural com os demais acervos culturais produzidos no planeta.

E aí a gente começa uma coisa que talvez também seja importante pra ti entender. O ponto de... a argamassa desse processo é a música. Porque era mágico, era só dizer que eu era M.C. na sala, tudo mudava, mano. Entendeu? Tudo, tudo, tudo, toda ideia e eu nem era tanto tatuado na época ainda, as minhas tatuagens nem apareciam, mas eu já andava de cabeça raspada, roupa diferente dos outros colegas e tal. Então era só dizer que era M.C. que já criava esse contrato entre nós: “Eu vou confiar em vocês e vocês vão confiar em mim e a gente vai tentar fazer desses 50 minutos o mais prazeroso possível nessa …escola que tem ventilador quebrado, que a merenda é…, enfim…” (Lucas, trecho de entrevista, 2020).

Ao se apresentar à turma como M.C., Lucas construía com os/as alunos/as um sentimento de identificação, pois, mesmo que as vertentes críticas e antissistema do rap não estejam, digamos, na linha de frente da indústria cultural do mercado da música, elas estão pelas ruas e guetos das periferias. Isso foi fundamental para que o professor estreitasse sua relação com os alunos. A partir disso, ele descreveu alguns aspectos de sua prática pedagógica que foram sendo desenvolvidos ao longo do seu período de trabalho nesta escola, como a mudança na distribuição das carteiras em sala, organizando-as em formato circular:

...a disposição dos atores na sala, professor passa, não necessariamente a ser igual, mas compartilhar coisas e construir conhecimento juntos. Porque como rapper, como M.C. que me reunia na Terra Firme, sabia que aqueles alunos tinham muito conhecimento pra compartilhar comigo. Então eu acho que isso é importante, sabe, porque são coisas que parecem que pra quem vê de fora não há nenhuma mudança: “Ah, que grande [porcaria], ele fez um círculo na sala”. Mas isso muda a epistemologia, muda a autoestima de aluno, muda uma série de coisas que só depois de muitos anos eu fui ver esses resultados (Lucas, trecho de entrevista, 2020).

Ele também rememorou como a sociologia prescrita nos livros didáticos ainda tratava os conceitos produzidos ao longo de sua história situados exclusivamente em seus contextos de origem: a Europa dos séculos XVIII, XIX e XX. Não havia nenhum tipo de contextualização às respectivas realidades regionais ou locais dos/as estudantes, que pudesse auxiliá-los na identificação ou análise dos fenômenos sociais.

Além disso, não havia espaço para a produção sociológica latino-americana, que já conta com um acervo teórico e categórico que pensa sociologicamente as realidades do continente a partir de suas especificidades na geopolítica global.

Então, tipo, eu não ia conseguir ser só mais um professor de sociologia que entra e diz que a sociologia começou com a Revolução Industrial, depois diz o ano em que o Durkheim nasceu, que ele morreu, o que ele escreveu. Não tinha lógica pra mim isso, não tinha nem lógica pra mim o conteúdo, mano, de sociologia, que é proposto pro ensino médio. Tipo… quem é Durkheim. Tá ligado? Você tem que entender o que é instituição social. Saca? O que que é socialização (Lucas, trecho de entrevista, 2020).

Para Andrade (2017ANDRADE, Rafael. O ensino de sociologia e a razão descolonial: reflexões para uma nova concepção didático pedagógica. Revista Três Pontos, Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 32-37, 2017.) o ensino de sociologia deve ocorrer a partir do diálogo com autores que produzem saber à margem dos considerados grandes centros acadêmicos globais, para pensar os saberes e existências subalternizadas na construção da história do Brasil, sem abrir mão da chamada sociologia clássica.

Essa relação de diálogo no ensino de sociologia se torna fundamental ao pensarmos que os indivíduos considerados “fora” do processo civilizatório são, cotidianamente no Brasil e na Amazônia, considerados “incapazes ou preguiçosos” de/para aprender ou produzir conhecimentos. Logo, pensar a existência do outro e o processo de humanização daqueles que não são considerados humanos e por este motivo não podem produzir conhecimento de “bom uso” em sala de aula torna-se uma reviravolta pedagógica no ensino de sociologia (ANDRADE, 2017ANDRADE, Rafael. O ensino de sociologia e a razão descolonial: reflexões para uma nova concepção didático pedagógica. Revista Três Pontos, Belo Horizonte, v. 14, n. 2, p. 32-37, 2017., p. 35).

Para mitigar parte desses limites envolvendo o currículo e o ensino de sociologia, Lucas também precisou desenvolver estratégias, tornando o conteúdo mais próximo da realidade dos educandos:

Na Terra Firme, eu utilizava muito na sala de aula, hoje no IF eu tento equilibrar um pouco mais, mas na Terra Firme, mano, praticamente a aula inteira falando gíria. Primeira coisa, linguagem, entendimento, né? Então, eu tentava transformar aquele conteúdo numa perspectiva mais acessível a partir da linguagem que era comum a nós. Uma outra coisa era a utilização das letras de rap, isso sempre foi um grande sonho, eu acho que todo cara que canta rap, que vira professor, acho que a grande ideia é um dia poder usar as letras, né? (Lucas, trecho de entrevista, 2020).

De acordo com Baptista (2019BAPTISTA, Lívia. (De)Colonialidade da linguagem, lócus enunciativo e constituição identitária em Gloria Anzaldúa: uma “new mestiza”. Polifonia, Cuiabá-MT, v. 26, n. 44, p. 01-163, 2019.), a linguagem sempre foi um alvo da colonialidade do poder, pois, através dela, há a negação ou afirmação de múltiplas identidades. As práticas de linguagem enfatizam as relações assimétricas de poder estabelecidas na vida social. Para a autora, a disputa pela linguagem é uma disputa pelo direito de uma identidade social. Muito próximo desta compreensão, Lucas percebe que o conteúdo a ser ensinado, além de exógeno à vida do alunado e descontextualizado de sua realidade social imediata, era abordado a partir de uma construção narrativa que ignorava completamente o universo linguístico daquelas/es jovens de periferia. Mas, se o conteúdo e a linguagem escolar são alienígenas, a cultura popular, por ser produto da ação do próprio povo, está fincada no chão da sua história.

Nesta direção, as memórias docentes do professor Alder nos oferecem elementos valiosos para compreendermos outras estratégias de ensino a partir do diálogo com a cultura popular, só que dessa vez voltadas à disciplina de Artes. O referido professor, ao ingressar no magistério, vinculou-se ao Sistema de Organização Modular de Ensino (SOME) da SEDUC/PA, política pública destinada à oferta de escolarização a comunidades camponesas e ribeirinhas.

Alder foi designado para lecionar em uma comunidade ribeirinha do município de Abaetetuba-PA e destacou o profundo choque que teve ao receber os livros didáticos que seriam usados como subsídios para as suas aulas:

Os livros de arte que se mandam para a escola, meu parceiro, aquilo é a morte da Arte, tu é doido, é? Aquela galera já passa lá sentado o dia inteiro vendo livro, escrevendo, aí quando chega na aula de artes abre o livro lá, vê a foto da pintura da Tarsila Amaral, do Abaporu, “Responda as questões”. Tem coisa mais desafiadora que isso? Aquilo ali é subjugar as crianças, é subestimar, na verdade é subestimar a inteligência daquela molecada; o cara tá ali é para ser desafiado (Alder, trecho de entrevista, 2020).

Néstor Garcia Canclini, ao analisar as políticas culturais de regimes conservadores, afirma que estas tentam reduzir o “povo” a “público”, para isso, lançam mão do que ele chama de teatralização do patrimônio, no qual a escola tem um papel fundamental. A escola tende a transmitir através de cursos sistemáticos o saber que supostamente representa o patrimônio legítimo, sagrado e, com este corte fundador, o programa escolar separa os fatos históricos que estabeleceram as ditas maneiras corretas de se ocupar o espaço nacional, excluindo a população originária do território (CANCLINI, 1998CANCLINI, Nestor Garcia. Culturas híbridas. São Paulo: EDUSP, 1998.).

Irrequieto, Alder rememorou: “Mano, imagina eu ter que ir lá pra essa ilha pra ficar ensinando história de Roma, história da Grécia pra esses moleques, sabe? Sem identificação nenhuma, os moleques dormiam na aula lá”.

Eu falei: “Isso não tá certo, não, bicho. Como é que eu vou falar de arte pra essa galera nesse universo aqui, né, mano? Como é que eu vou fazer isso?”. E aí, eu tentava fazer nas escolas um laboratório de artes, né? Eu fazia uns cavaletes, comprava uns compensados. E aí fazia um estudo de desenho e tudo, né? Estudo dos elementos básicos do desenho, sabe? Linha, formas e tudo, uma coisa bem espontânea mesmo. E desenvolvi vários exercícios de escultura com miriti, essas coisas com tala. Então comecei a desenvolver uma metodologia que fortalecesse a identidade deles. Então eu falava muito sobre cultura indígena, via o que que era fazer uma referência pra eles, assim (Alder, trecho de entrevista, 2020).

A escolha de Alder pelo trabalho com o miriti, palmeira nativa de áreas alagadiças, não foi aleatória. O município de Abaetetuba é reconhecido pela tradição da produção de arte que usa esse recurso natural como matéria prima. Ele contou que tinha o intuito de mostrar aos seus alunos como a sua localidade era produtora de arte, rompendo com aquele imaginário da arte como um elemento pertencente às galerias e aos museus das metrópoles, e não àqueles homens e mulheres das margens dos rios da Amazônia.

Muitos trabalhos já se debruçaram sobre essa pujante relação artística que o povo abaetetubense estabeleceu com o miriti. Santos e Silva (2012SANTOS, Ivamilton; SILVA, Maria de Fátima. Saberes da tradição na produção de brinquedos de miriti - patrimônio cultural. Revista Educação Cultura e Sociedade, Mato Grosso, v. 2, n. 2, p. 63-77, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.30681/ecs.v2i2.673. Acesso em: 15 mar. 2022.
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), após realizarem trabalho de cunho etnográfico no município, afirmam que as representações construídas pela população local, envolvendo a produção com o miriti, são constitutivas de processos históricos e de formação cultural que ressignificam os valores daquele povo frente ao cenário local, regional e transnacional.

Alder entendeu, a partir da conflituosa relação estabelecida entre sua formação acadêmica e sua vida como artista popular, que os discursos que reduzem a produção estética do povo ao folclorismo e ao artesanato não passam de expressões do eurocentrismo. Ao atingir a condição de docente da educação básica em uma escola ribeirinha, fez questão de enfatizar a produção artística local e, a partir dela, apresentar outros referenciais.

Conforme Leandro e Kinamboji (2019), graças ao eurocentrismo, ocorre uma classificação de nossas manifestações estético-religiosas como símbolos de um mundo pré-moderno, primitivo, exótico e fetichista, comumente estigmatizado e interdito junto à modernidade e desvalorizados perante movimentos artísticos, acadêmicos ou não, recaindo sobre o erro da visão folclorizante do exotismo.

E essa perspectiva, mano, de que, se tu não entender qual o teu lugar na história, que tipo de arte tu vai produzir, mano? Tá lá o moleque caboclo, descendente de tupinambá lá, descendente de africano, dessas comunidades, se ele não entender que ele é descendente de tupinambá, de africano, que arte ele vai produzir, mano? Uma arte morta, que não tem nada a ver com ele, sabe? Vai no máximo dominar uma técnica de pintura, dominar, mas sabe, mas não vai transformar ele, transformar o pensamento, transformar (Alder, trecho de entrevista, 2020).

Disto podemos tirar mais uma lição: pedagogias decoloniais são produzidas em estreita relação com o território onde os indivíduos estão situados e onde constroem a sua história, promovendo a afirmação de suas identidades. Aqui fica bem definida a concepção de Alder quanto ao papel social da arte na escola. Para além do conhecimento das técnicas, o ensino de arte deve auxiliar no processo de formação de identidades e na compreensão do nosso lugar na história e na sociedade.

Maldonado-Torres (2020) nos diz que as lições da pedagogia de(s)colonial não se limitam à prática explícita do ensino, pois, mais que responder à necessidade de transmitir conteúdos específicos, é preciso prover a indignação contra a colonização. Alder, conhecedor desta história de violência e dos modos como ela influenciou na concepção de arte, estética e educação que carregamos, se nega a ser um reprodutor desse sistema de valores. Ele desobedece aos cânones do sistema mundo capitalista moderno colonial dentro da escola.

Na relação direta com o território em que o ensino ocorre, Alder fez questão de expressar seu encantamento com o universo de conhecimentos os quais pode presenciar em sua estada com as/os ribeirinhas/os de Abaetetuba. Memórias que o emocionam:

Mano, a gente conhecia senhores nessas comunidades que nunca tinham pisado em escola e construíam embarcações enormes. Como eles construíram um barco daquele, cara? Imagina os cálculos matemáticos, físicos e não sei o quê, saber a densidade da madeira e o cacete. Conhecimento de um cara desse que nunca pisou na escola, não sabe nem assinar o nome. Mas constrói casa, constrói barco, constrói canoa, sabe? Então, discutir, né, o conhecimento. Qual o conhecimento que é importante? Fazer eles refletirem sobre isso, mas, principalmente, entender qual o nosso lugar na história, né? De povos e comunidades que viviam sabe, em harmonia com o meio ambiente, né? Sendo dominado por pessoas, por povos que vem pra cá subjugando os nativos, explorando, destruindo, então, perpassa por toda essa história (Alder, trecho de entrevista, 2020).

Esta fala do professor Alder nos ensina que as pedagogias decoloniais partem da compreensão de que todas as pessoas são sujeitos do conhecimento, mas que, devido às históricas relações de poder que foram sendo instituídas ao longo da construção do sistema mundo capitalista moderno colonial, além das hierarquias econômicas, hierarquias epistemológicas afirmam que alguns não são portadores de capacidades para produzi-lo, o que corrobora para a manutenção de um modelo civilizatório brutal e insustentável.

Como afirma Buchholz (2015BUCHHOLZ, João Paulo. A longa crise da educação: um problema de colonialidade. Cadernos do Aplicação, Porto Alegre, v. 27/28, p. 55-61, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.22456/2595-4377.50544. Acesso em: 13 mar. 2022.
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, p. 59), a “Escola moderna nasce para homogeneizar a população de um determinado território, atribuindo ao território nacional uma única territorialidade”. Como pudemos perceber até aqui, nossas/os interlocutoras/es se negam a ser reprodutoras/es desta educação homogeneizante, fortemente presente nas capitais e nos interiores da Amazônia.

A prática pedagógica da professora Letícia também expressa esta tendência descolonizante. Professora de língua portuguesa efetiva da Secretaria Municipal de Educação de Belém desde 2012, ela disse que sempre procurou estabelecer um diálogo com a Capoeira Angola em sua prática pedagógica.

Desde quando eu comecei a trabalhar, eu sempre fiz essa relação com as minhas outras práticas populares [...] Eu particularmente atribuo muito do que eu aprendi, nos meus processos de desenvoltura, desenrolamento ao aprendizado da vida, dos movimentos sociais e culturais, então eu sempre busquei, né? Nesse sentido, eu acho que a língua portuguesa nos deixa muito livre, quando você trabalha com a textualidade, o texto te dá várias possibilidades, várias abordagens, as cantigas de capoeira podem ser um gênero textual pra trabalhar em sala de aula, né? Então eu sempre busquei trabalhar isso com eles (Letícia, trecho de entrevista, 2020).

Após sua admissão no serviço público, Letícia foi lotada para lecionar numa escola de ensino fundamental também localizada no bairro da Terra Firme, Belém-PA. Quando começou, ela diz:

Tinha uma coisa que eu sentia muito aqui. Eu via muito os próprios alunos menosprezando... as narrativas que eram de menosprezo do bairro: “Ah, quando eu digo que moro na Terra Firme dizem “me rouba logo””. Só que ao mesmo tempo que eles se sentiam ofendidos com isso, eles se atacavam com essa mesma narrativa, então eu sempre buscava muito essa questão do sentimento de pertencimento, o quanto ele era importante você conhecer o que tinha de bom no bairro para que você se sentisse com orgulho de pertencer a esse bairro (Letícia, trecho de entrevista, 2020).

A desigualdade social no capitalismo é tão cruel que criminaliza a própria população que é vítima. A professora Letícia entende que essas identidades negativas, construídas através de discursos de criminalização da pobreza, precisam ser superadas e a escola é um ponto estratégico para isso. Coube a ela, na condição de professora, apresentar estes outros referenciais aos seus alunos e alunas, mostrando toda a beleza artística e a história de luta que envolve o referido bairro.

Então eu sempre buscava muito essa questão do sentimento de pertencimento, o quanto era importante você conhecer o que tinha de bom no bairro para que você se sentisse com orgulho de pertencer a esse bairro. “O bairro da Terra Firme é um bairro com histórico de lutas, de movimentos culturais”. Ah, pode até parecer que eles estão nem aí pro que tu tá falando, mas uma sementinha tá ali plantada e vai ter uma hora, em um momento da vida que vai germinar, aí eu sempre ia criando possibilidades para que os alunos fossem percebendo isso (Letícia, trecho de entrevista, 2020).

Por sinal, a desvalorização da cultura popular é também um elemento desse processo de inferiorização das classes populares. O povo é visto como bárbaro, violento, selvagem, logo, as expressões de sua cultura são expressões de sua selvageria ou, quando muito, folclore para ser apreciado em momentos festivos, não mais que isso. Contudo, a professora letícia teve a oportunidade de debater estes temas, contando com o auxílio de comunitários do bairro.

Entrei na escola em janeiro e mais ou menos em agosto eu fui chamada pra trabalhar nesse programa que é o “Mais educação”. Ele me deu um leque de possibilidades muito grande, para além da professora de Língua Portuguesa em sala de aula. Esse programa possibilitou não ser só eu [Letícia], mas, de ser um conjunto de manifestações culturais que eu queria que tivesse dentro da escola e o programa possibilitou estar. Então, existiam várias oficinas, né, que o programa proporcionava de rádio escola, de capoeira, de dança, de teatro. Então eu chamei toda a galera do movimento social que eu já tinha contato pra ficar trabalhando [...] Então a gente conseguiu fazer eventos muito ricos na escola (Letícia, trecho de entrevista, 2020).

O Programa Mais Educação foi instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e integrava as ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) como uma estratégia do Governo Federal para induzir a ampliação da jornada escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação Integral. (BRASIL, 2007).

Ao longo de sua existência, o Programa Mais Educação foi alvo de duras críticas. Denunciava-se que era uma implementação precária do princípio da educação integral nas escolas públicas. Para Leclerc e Moll (2012LECLERC, Gesuína; MOLL, Jaqueline. Programa Mais Educação: avanços e desafios para uma estratégia indutora da Educação Integral e em tempo integral. Educar em Revista, Curitiba, n. 45, p. 91-110, 2012. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/educar/article/view/30008. Acesso em: 13 mar. 2022.
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), o programa partia de uma concepção curricular limitada, pois no turno fixo prevaleciam as disciplinas tradicionais que constituem o núcleo central do currículo e nos contra-turnos flexíveis prevaleciam as atividades que tornavam o “tempo escolar agradável”.

Apesar dos limites presentes na referida política, Letícia rememorou muitas atividades que foram viabilizadas dentro da escola a partir da implementação do programa.

A capoeira também eu trouxe pra escola e a gente conseguiu fazer não só dentro daquele calendário festivo que a gente vê, tipo o dia da consciência negra. Na época teve uma parceria com a Casa Preta, que funcionava aqui na fronteira Terra Firme - Canudos, eles vinham com oficina de percussão. Nós produzimos também pelo Mais Educação junto com a disciplina de Língua Portuguesa, porque daí eu já não era mais professora só do sexto ano, era também do nono ano, então como os meninos já tão assim nessa fase da adolescência para juventude, eles com 14/15 anos já entendem uma linguagem, então nós produzimos um material documentário, foi um vídeo documentário que eles fizeram sobre as manifestações culturais afro aqui no bairro da Terra Firme. Então, eles fizeram um vídeo sobre a capoeira e sobre o tambor de crioula dos filhos e amigos do Cururupú [...] Foi uma experiência muito rica para os alunos (Letícia, trecho de entrevista, 2020).

Outra lição que podemos aprender a partir destas experiências é que as pedagogias decoloniais são construídas em estreita relação com as organizações de luta popular. São pedagogias que qualificam as pessoas para o enfrentamento das opressões da matriz colonial de poder, portanto, nascem vinculadas à luta e tem como horizonte a descolonização do mundo. Dizemos isso porque Letícia, como vimos, leva até à escola pessoas engajadas em diferentes lutas políticas: militantes do movimento negro, lideranças de partidos políticos anticapitalistas, integrantes do movimento feminista, e tantos outros.

Considerações finais

As memórias dos sujeitos da pesquisa nos revelam os mecanismos de aprisionamento do conhecimento escolar e a marginalidade da cultura popular no âmbito da escola, mas também descortinam as estratégias de subversão, contraposição, negociação em relação às lutas e conquistas em prol do estabelecimento de um diálogo intercultural por meio de sua prática pedagógica.

A escola está enredada e reproduz a colonialidade, deste modo, reforça e reproduz práticas legitimadas por padrões civilizatórios ocidentalizados. Neste contexto, tem sido operada para abordar outros referenciais culturais a partir da folclorização que estereotipa os produtos culturais populares e assegura sua presença esporádica e correntemente deturpada, esvaziada de sentido social e político.

No caso específico da cultura popular e sua relação com a escola, a colonialidade pulsa com significativa força quando emergem no nosso cotidiano os vínculos, os elos que nos ligam à negritude da África e ao indigenismo da América. Trata-se de uma relação que a escola faz questão de folclorizar, no caso do Brasil, no calendário da instituição por meio do 13 de maio e 21 de abril. Esvaziados de seu conteúdo político e social, esses elos são arrefecidos pela escola para que a colonialidade prevaleça e nossa ancestralidade tolerada como vestígio de um passado longínquo.

Entretanto, as memórias coletivas construídas na luta decolonial das populações latino-americanas continuam sendo cantadas nas rodas de capoeira angola, marabaixo, samba, carimbó, mas, também, estão presentes nos grafites e nas rimas dos MCs. que cantam/denunciam as agruras da população negra, pobre e periférica nos grandes centros urbanos. São memórias que continuam alimentando a indignação dos grupos sociais oprimidos pelos sistemas sociais alicerçados pela colonialidade.

Os/as professores/as entrevistados neste trabalho vivem o paradoxo de serem produtores/as de cultura popular e, ao mesmo tempo, atuarem no sistema de ensino que estruturalmente marginaliza a cultura que produzem. Lecionam os conteúdos orientados pelas mesmas composições curriculares que historicamente negligenciam as manifestações da cultura popular das quais são integrantes e agentes. Mas, também, atuam como insurgentes, contestando, polemizando, enfrentando o sistema de ensino dentro do cotidiano das escolas e, através da sua prática pedagógica, ressignificam e ampliam o saber escolar.

A busca por alternativas às formas estabelecidas pelo sistema-mundo exige o questionamento da suposta universalidade deste modelo civilizatório. Para tanto, dar ênfase às várias perspectivas culturais e, no âmbito deste trabalho, construir um elogio à força descolonizadora da cultura popular, auxiliam na construção de outros mundos possíveis.

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    Aluna/o de capoeira angola com muitos anos de prática, a ponto de receber a autorização do/a mestre/a para ensinar a novos alunos/as.
  • 2
    Mestre de Cerimônia na cultura hip-hop é um artista ou cantor que normalmente compõe e canta seu material próprio e original. É o porta-voz que relata, através de rimas, os problemas, carências e experiências em geral dos guetos. Não só descreve, mas também lança mensagens de alerta e orientação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    01 Maio 2022
  • Aceito
    08 Fev 2023
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