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Superando as Aparências: uma problematização analítica da comparação entre Habermas e Paulo Freire

RESUMO

Ultimamente alguns trabalhos têm apontado uma estreita conexão analítica entre o pensador alemão Jürgen Habermas e o educador brasileiro Paulo Freire, descrevendo-se, por exemplo, o “diálogo” como uma categoria que adensa a relação teórica entre ambos. Este artigo procura averiguar a existência de efetivas convergências entre Habermas e Freire. Para tanto, metodologicamente, são revisadas as suas principais produções. Como resultado desse escrutínio, o presente artigo discrepa das perspectivas que realçam a referida conexão. Embora seja possível identificar algumas convergências entre Habermas e Freire, elas são genéricas. Assim, o que é concebido como aproximações entre os dois autores tem, muitas vezes, o status de lugares-comuns.

Palavras-chave
Jürgen Habermas; Paulo Freire; Diálogo; Modernidade

ABSTRACT

In recent times, some works have pointed out a close analytical connection between Jürgen Habermas and Paulo Freire, describing, for example, “dialogue” as a category that theoretically brings them together. This article aims to verify the existence of effective convergences between Habermas and Freire. In this sense, methodologically, their main productions are reviewed. As a result of this scrutiny, present article differs from the perspectives that highlight such an analytical connection. Although it is possible to identify some convergences involving them, these convergences are general. Thus, what is conceived as approximations between Habermasian and Freirean works often have the status of commonplaces.

Keywords
Jürgen Habermas; Paulo Freire; Dialogue; Modernity

Introdução

Procuro, neste trabalho, desenvolver uma abordagem estabelecendo um comparativo entre o pensador alemão Jürgen Habermas e o educador brasileiro Paulo Freire, no percurso do processo de discussão da aventada possibilidade de convergência entre as suas obras1 1 Como representativa das perspectivas que enfatizam a conexão analítica entre Habermas e Freire, tenho em conta a abordagem de Morrow e Torres (2002; 1998). . Dada a empreitada analítica que isso representa, e considerando os limites de extensão deste texto, empreenderei um esforço de síntese que primará sobretudo por se manter no nível da formulação conceitual, em vez de descer ao patamar dos lugares-comuns que muitas vezes têm alimentado as discussões, no contexto educativo, a respeito da suposta sintonia entre Habermas e Paulo Freire.

Penso que uma abordagem como a que aqui tenho em vista requer um tour de force que se conecta a alguns postulados na forma própria de fazer ciência social2 2 Tais postulados são tributários do enfoque teórico-metodológico que, do ponto de vista das ciências histórico-sociais, norteou o destacado e heterogêneo grupo de intelectuais que colocou em xeque o “enfoque enviesado” da teoria da modernização na explicação da relação entre desenvolvimento e subdesenvolvimento. Com a contribuição, sobretudo, de latino-americanos, veio a lume então a teoria da dependência. Ver dos Santos (2003) e Cardoso (1984). . Refiro quatro:

a) em muitas situações, as abordagens e conceitos manejados pelas ciências histórico-sociais podem remontar a autores que, por razões diversas, podem ser considerados clássicos. Contudo, é destituído de sentido celebrar ideias e abordagens por elas serem oriundas de autores tradicionalmente conhecidos. Não vale o argumentum magister dixit;

b) o que conta para avaliar a vitalidade intelectual de abordagens e conceitos passados é a recolocação que deles é possível fazer sempre que uma incursão intelectual vigorosa trata de (re)pensar processos sociais antigos ou emergentes;

c) por mais que se queira enquadrar a realidade em ideias pré-concebidas de autores e escolas teóricas, ela nos torna, a cada momento, dupes de nous-mêmes, e nos surpreende com desdobramentos imprevistos;

d) afirmações lastreadas em lugares-comuns têm as limitações do óbvio, até podem possuir grãos de verdade, mas esses se encontram perdidos no amálgama confuso da inestruturação teórica.

Posto isto, parece-me que é preciso começar tratando dos dois autores aqui em foco a partir da base material em que cada um está situado, pois daí resultam implicações contextuais para os seus enfoques. Afinal, embora a superficialidade nutrida por pedaços de citações possa evidenciar uma perspectiva distinta, a verdade é que os conceitos e abordagens não resultam tão somente do deslizamento de um imaginário desejado, bastando perspectivar ideias e estabelecer relações com o que se deseja para então se ter uma formulação analítica. Há que se ter em conta a imanência sócio-histórica de abordagens e conceitos, considerando que eles derivam de conjunturas e da ação de agentes socialmente situados em espaços e tempos específicos. Entendamo-nos.

Habermas: base material, implicações contextuais e abordagens

Nascido na Renânia em 1929, Habermas viveu os seus anos de formação eu um contexto muito diferente daquele que marcou a primeira geração da Escola de Frankfurt. Enquanto os primeiros frankfurtianos foram testemunhas vivas dos tumultuosos tempos da República de Weimar e da ascensão nazista, Habermas chegou à meia-idade na Alemanha Ocidental, no dizer de José Guilherme Merquior, “sem esquerda” da guerra fria (Merquior, 1986MERQUIOR, José. Western Marxism. Londres: Palandin Books, 1986.).

De certo modo, a fagulha que inicialmente acendeu o seu pensamento foi uma conferência proferida por Marcuse, em 1956, sobre Freud, ano do centenário deste e de admissão de Habermas ao Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt. Para o jovem calouro, Marcuse dava nova vida à antiga flama política Frankfurt. A profecia de Eros e Civilização (Marcuse, 1962MARCUSE, Herbert. Eros and Civilization: a philosophical inquiry into Freud. New York: Vintage Books, 1962.) parecia varrer o opressivo estado de impotência que se difundiu a partir da denúncia da razão instrumental feita por Adorno e Horkheimer: kulturpessimismus (pessimismo cultural). Não, claro está, que Habermas tenha sido jamais um marcusiano. Pouco lhe importava o tema de Eros e Civilização, a “natureza humana”, o que lhe interessava, sim, era a questão do devir humano.

O seu primeiro trabalho de notória relevância foi Transformação Estrutural da Esfera Pública, de 1962, que, inspirado em Hannah Arendt, primava por um ethos muito diferente do ressentido hedonismo dos críticos culturais de Frankfurt (Habermas, 1989HABERMAS, Jürgen. The Structural Transformation of the Public Sphere: an inquiry into a category of bourgeois society. Cambridge: MIT Press, 1989.). Combinava a tese da indústria cultural, cara à primeira geração do Institut für Sozialforschung, com a problemática cívica de Arendt. Realçava o espaço público da fala e da ação como meio próprio para a liberdade e dignidade humanas. Mas, por outro lado, via a esfera pública sendo ameaçada pelo tecnocratismo, pelas ações dos grupos de interesses e por uma realidade estruturalmente administrada. Aliás, por essa via, chegamos ao Habermas da obra Problemas de Legitimação do Capitalismo Tardio, de 1973, conforme a tradução brasileira, sendo vertida em inglês como Legitimation Crisis (Habermas, 1975HABERMAS, Jürgen. Legitimation CRISIS. Tradução: Thomas McCarthy. Boston: Beacon, 1975.).

Vivendo eu uma região situada no seio do sistema-mundo – estruturado por um centro, uma periferia e uma semiperiferia3 3 A categorização levada a cabo por Immanuel Wallerstein a propósito do sistema-mundo estruturado por países centrais, semiperiféricos e periféricos parece-me bem mais pertinente analiticamente do que a tradicional classificação dicotômica entre centro e periferia. Ver Wallerstein (2011a; 2011b; 1996). –, sendo a Alemanha um típico exemplo de país central e do abastado capitalismo avançado, Habermas debruçou-se sobre a morfologia desse, dito “capitalismo estatalmente administrado” ou tardio, assinalando o deslocamento das contradições e da crise do sistema do lócus da economia para o Estado, do campo econômico para o campo político. Repiso o básico: Habermas aponta a obsolescência da teoria do valor de Marx na era da alta tecnologia e da economia keynesiana. Alega que a crítica da economia política apreendeu o sentido da sociedade do século XIX porque, no capitalismo de então, a integração – tanto social como sistêmica – se fundava na economia. Tendo-se a separação entre Estado e sociedade civil, as relações de classe tornavam-se institucionalizadas por meio do mercado – mercado tal que, impessoal, era posto a responder as demandas oriundas das necessidades sociais. Daí que as crises econômicas ecoavam como crises de legitimidade. Problemas no sistema reverberavam no âmbito da integração social. Porém, compreende o nosso autor, nas sociedades modernas, dirigidas pelo Estado, se passa o contrário. Isto é, a integração social e a sistêmica ficaram desacopladas. Nesse quadro, há de se entender a questão da legitimidade como uma dimensão central de possíveis crises na esfera política, visto que, enquanto a população confia no Estado, as crises de racionalidades, por si próprias, não causam grandes agravos, mas, quando o déficit é de legitimação, os danos são grandes.

Infere-se dessa démarche, então, que a esfera econômica já não sustenta o princípio do intercâmbio e também já não é a regra norteadora da integração. De resto, a regulação estatal e a politização das relações de classe apagam os antigos contornos da estrutura classista. Daí que, segundo Habermas, uma teoria crítica da sociedade não pode mais assumir a forma de uma crítica do pensamento econômico, tendo-se que, dessa forma, determinadas categorias de Marx tornam-se deslocadas.

Para Habermas, sob o capitalismo contemporâneo, diversas afirmações do materialismo histórico, em sua forma clássica, devem ser superadas, tendo em vista, enfatiza, fatores como: i) desde a Segunda Revolução Industrial, a ciência se tornou uma força de produção; ii) contemporaneamente, a economia obedece a um conjunto de regulamentos estatais; iii) o conflito de classes foi regulado, e mesmo “desarmado”, pela institucionalização (Habermas, 1970HABERMAS, Jürgen. Technology and Science as ‘Ideology’. In: HABERMAS, Jürgen. Toward a Rational Society: student protest, science, and politics. Tradução: Jeremy Shapiro. Boston: Beacon Press, 1970.). O que significa, neste último caso, a perda de centralidade da luta de classes, colocando em causa, portanto, uma tese central da interpretação materialista da história levada a cabo por Marx, qual seja, a de que a luta de classes é o motor da história. O frankfurtiano até admite que há que conservar a premissa materialista relativa à relação entre ação teleológica e realidade histórica, mas, em seu entendimento, impõe-se uma reconstrução do materialismo histórico que, por exemplo, assuma as normas da ação como sendo validadas pela moral e juridicamente legitimadas pelo Direito.

Claro está que tal perspectiva está imbricada com a compreensão segundo a qual, substantivamente, já não há que se falar em sujeitos históricos ao modo de outrora, com a significação classista tipificada por burgueses e proletários. Em vez disso, há que se ter presente uma arena de seres humanos em sua dimensão cognitiva de compreensão da realidade e de comunicação com o seu meio social, ou seja, o que temos, ao invés dos antigos sujeitos históricos, são, digamos, agentes comunicativos.

Assim, chegamos à beira do caminho do – como diz Merquior (1986)MERQUIOR, José. Western Marxism. Londres: Palandin Books, 1986.Santo Graal habermasiano: o diálogo (Habermas, 1981aHABERMAS, Jürgen. Theory of Communicative Action: reason and rationalization of society (Volume 1). Tradução: Thomas McCarthy. Boston: Beacon Press, 1981a.; 1981bHABERMAS, Jürgen. Theory of Communicative Action: lifeworld and system: a critique of functionalist reason (Volume 2). Boston: Beacon Press, 1981b.). É por ele que Habermas propõe assertivamente a passagem do paradigma da consciência para o paradigma da linguagem. Essa transição é fundamente para que, a partir do seu diagnóstico da Modernidade, ele a realce como um projeto incompleto no cumprimento das suas promessas emancipatórias, à raiz da herança iluminista. O que se passou, entende o nosso autor, foi que o sistema colonizou o lebenswelt (mundo da vida), impactando as suas dimensões, isto é, a cultura, sociedade e personalidade – dimensões estas de onde são extraídas interpretações, regras para vivência intersubjetiva e habilidades para falar/agir. É evidente que, para levar avante o seu tour de force por essa via, Habermas precisou acertar contas com a teoria sociológica de Max Weber, no que diz respeito ao mundo moderno e à crescente racionalização. Fez isso com uma penada onde afirmou que Weber errou ao nivelar crescimento diferencial institucional e racionalização crescente.

Trata-se de uma asserção de alto calibre, e, no curso dela, ele realça a sua distinção entre ciências empírico-analíticas, histórico-hermenêuticas e críticas, com incidência respectivamente em interesses técnico, prático e emancipatório. Avistamos o terreno da epistemologia de ciência social habermasiana, representada por cinco fases, cada qual significando uma superação teórica de uma escola consagrada.

Na primeira fase, Habermas jogou o princípio da análise reflexiva contra o estrutural-funcionalismo de Parsons, enfatizando que o postulado deste a respeito de uma harmonia básica entre os motivos da ação social e os valores institucionais do sistema social implica eu uma perda teórica, na medida em que não se admitia espaço para o complexo papel da intersubjetividade na sociedade. Daí, em uma segunda fase, ele volta-se à teoria social fenomenológica de Alfred Schültz. Contudo, Schültz havia relevado a dimensão linguística da comunicação social, o que leva o frankfurtiano ao terceiro momento, isto é, a complementar a sociologia fenomenológica com a filosofia linguística do último Wittgenstein. Ocorre, no entanto, que os jogos linguísticos wittgensteinianos constituem modos de vida fechados sobre si próprios. Como se deve considerar que um sentido integral de intersubjetividade in actu implica contatos frequentes e abertos entre universos linguísticos diferentes, em um quarto momento, Habermas articula a teorização de Wittgenstein com a hermenêutica de Gadamer, tendo em conta designadamente a sua ênfase na tradição como tradução viva de diferentes horizontes socioculturais. Porém, a hermenêutica igualmente exige retificação, uma vez que a teoria da tradução transcultural tem propensão a esquecer que linguagem e cultura também podem servir de instrumento de repressão. A epistemologia de ciência social habermasiana chega, assim, à sua última fase: a complementação de Gadamer com a perspectiva freudiana e com a crítica marxista da ideologia, devendo-se registrar que o que atrai Habermas na psicanálise não é a metapsicologia, que inspirou Marcuse em Eros e Civilização, mas, sim, o potencial emancipatório da autorreflexão.

A obra habermasiana é, de fato, sofisticadamente imponente, colocando-se a ousada atribuição de revisar todo o pensamento ocidental. Apesar da sua imponência, não têm deixado de ser, contudo, objeto de questionamentos, em muitos casos não necessariamente colocando-a em xeque, mas, eu uma perspectiva de – convergindo com ela – discutir retificações. Não tenho como me deter extensivamente nisso aqui; refiro apenas, en passant, alguns enfoques. O próprio Axel Honneth, talvez o membro mais destacado da terceira geração da Escola de Frankfurt, e inclusive antigo assistente de Habermas (1984-1990), tem apontado o que ele chama de “déficit sociológico” na abordagem habermasiana, déficit este inscrito eu uma tendência a subestimar nas ordens sociais o seu caráter determinado por conflitos e negociações (Honneth, 1996HONNETH, Axel. The Struggle for Recognition: the moral grammar of social conflicts. Cambridge: MIT Press, 1996.). A crítica mais ácida a Habermas provavelmente seja a feita pelo historiador britânico Quentin Skinner. Diz-nos ele:

Ler Habermas é como ler Lutero, só que este último escrevia uma prosa admirável. Ambos insistem em que a nossa vontade está escravizada pela nossa maneira pecaminosa de ver… Ambos prometem que uma conversão nos libertará da atual servidão e nos levará a um estado de liberdade. Acima de tudo, ambos põem sua confiança no ‘poder redentor da reflexão’ [a frase é de Habermas], daí nossa capacidade de nos salvarmos através das propriedades redentoras da Palavra ou do Verbo (que Habermas prefere chamar discurso). Mas…francamente, temos o direito de esperar dos nossos filósofos sociais algo mais do que uma continuação do protestantismo por outros meios

(Skinner, 1982SKINNER, Quentin. Habermas’ Reformulation. The New York Review, 7 out. 1982., p. 38).

Salvo a ironia entrecortada de erudição, a assertiva de Quentin Skinner parece excessivamente ácida. Mais sentido possivelmente poderá ter o escrutínio por via da incidência sociológica, seja como a assinalou Axel Honneth, seja como Anthony Giddens a enfatizou, isto é, destacando que Habermas parece ter reduzido a interação à comunicação espontânea, esquecendo irrealisticamente as imbricações entre interação e poder (Giddens, 1982GIDDENS, Anthony. Labour and Interaction, in John B. Thompson and David Held (Ed.). Habermas: critical debates, London: Macmillan, 1982.).

De todo modo, a imponência do edifício teórico-conceitual habermasiano é marcante. Representa uma lufada no dilema em que Adorno envolveu a teoria crítica, com a análise da razão instrumental, da qual resultava que a única saída que restava à agência humana, nas sociedades administradas, era a estética. Perfilo ao lado daqueles que entendem que o esforço filosófico de Habermas é um dos mais ousados projetos no sentido de oferecer uma base de legitimidade à democracia, designadamente por via das práticas sociais da comunicação e do entendimento. No contexto atual, em que totalitarismos populistas querem fazer retroceder a roda da história do pacto civilizatório, é algo que se reveste de mais importância ainda.

De resto, ao assinalar que as patologias da nossa época não decorrem do excesso de razão, mas, sim, de sua falta, urgindo então ampliar o próprio conceito de razão de uma forma que contemple – além da esfera cognitivo-instrumental – as dimensões prático-normativa e estético-expressional, o nosso autor resgata em bases reconfiguradas a herança iluminista e ressignifica a Modernidade, com os seus propósitos emancipatórios, como um projeto incompleto. É, por certo, um aporte vigoroso diante da onda relativista e irracionalista que, no contexto acadêmico, tem feito moda, e no plano da intervenção cidadã, tanto à esquerda como à direita, tem limitado a ação social a circularidades micros e fragmentárias, ignorando os seus condicionamentos e desconsiderando o significado do agenciamento humano lastreado em valores universalmente referenciados, que, ao fim e ao cabo, foram responsáveis pela estruturação do pacto societal que nos permitiu a chegada ao patamar civilizacional no qual vivemos.

Paulo Freire: base material, implicações contextuais e abordagens

Por óbvio, o contexto a partir do qual Paulo Freire desenvolveu as suas abordagens é inteiramente diferente do de Habermas. Enquanto este situa-se na esfera material do capitalismo avançado, com todas as consequências que isso tem para a sua obra, a incursão freireana é feita a partir da periferia do capitalismo – ou, nas condições de hoje, diríamos da semiperiferia –, embebida de uma perspectiva terceiro-mundista que tem como fonte Fanon (2002)FANON, Frantz. Les Damnés de la Terre. Paris: La Découverte, 2002..

Dispenso-me de tratar das vicissitudes e incongruências que estiveram na origem da démarche de Freire – pelo menos aqui, o que não significa dizer que recuso o debate. Mas não é esse o meu propósito por agora. Ademais, essa questão já foi tratada por Flávio Brayner de forma consistente analiticamente, pelo que então remeto o interesse pelo assunto ao seu ensaio sugestivamente intitulado “Paulofreirianismo”: instituindo uma teologia laica? (Brayner, 2017BRAYNER, Flávio. Paulofreirianismo: instituindo uma teologia laica? Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 22, n. 70, jul.-set. 2017.).

A abordagem de Freire é desenvolvida tendo presente várias influências, e mesmo apropriando-se integralmente de formulações já encetadas. Por exemplo, entre outras influências, além do já referido Frantz Fanon, a fenomenologia de Husserl, o personalismo de Mounier, Eric Fromm, Lucien Goldmann, Karl Mannheim, o escolanovismo, o marxismo hegelianizado mediante a leitura do Lukács de História e Consciência de Classe, a teologia da libertação, o diálogo em Martin Buber e o pensamento gestado no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) – nomeadamente a obra de Álvaro Vieira Pinto. Uma encruzilhada de muitas tendências e inspirações. Como avaliar isso? O primeiro juízo a ser emitido é que se trata de uma obra de difícil classificação, o que lhe garante um substrato com fecundidade interpretativa, mas também, contraproducentemente, pode ser usada para os mais diversos tipos de inferências, até mesmo contraditórias.

Das influências que nortearam a abordagem freireana, duas, entre outras, merecem uma atenção particular: o pensamento gestado no ISEB e a formulação de Martin Buber sobre diálogo. No primeiro caso, falamos especificamente do filósofo Álvaro Vieira Pinto, a quem Paulo Freire chamava “meu mestre”, e com razão, dado que o pensamento de Vieira Pinto, principalmente na obra Consciência e Realidade Nacional (Vieira Pinto, 2020aVIEIRA PINTO, Álvaro. Consciência e Realidade Nacional. Volumes 1 e 2. Rio de Janeiro: ISEB, 1960.; 2020bVIEIRA PINTO, Álvaro. Sete Lições sobre Educação de Adultos. São Paulo: Cortez, 1993.), não só inspirou Freire como ofereceu mesmo categorias relativamente às quais ele se apropriou e incorporou em seus trabalhos. Esse é o caso do conceito de conscientização.

Em significativa proporção, a obra de Vieira Pinto foi produzida eu um período marcado pelos signos da construção do novo e da mudança no Brasil – pontos fundamentais do período que emergiu com a eleição de Juscelino Kubistchek, 1955, e que vai até 1964, encerrado pelo golpe de estado civil-militar, e que levou Vieira Pinto ao exílio. Em tal contexto de busca pela construção da mudança, o ISEB foi um ativo centro difusor de ideias.

Na primeira parte do extenso livro Consciência e Realidade Nacional, de 1960, Álvaro Vieira Pinto (1960)VIEIRA PINTO, Álvaro. Consciência e Realidade Nacional. Volumes 1 e 2. Rio de Janeiro: ISEB, 1960. defende a base material, física e social da consciência. De forma preliminar, já aí adianta a conceituação das formas polarizadas de “consciência da realidade nacional”, que, de modo geral, representariam dois modos de pensar, quais sejam: i) a consciência ingênua, como aquela que, por essência, não tem noção dos fatores e condições que a determinam; ii) a consciência crítica, que, ao contrário da primeira, seria aquela que tem clara percepção dos fatores e condições que a determinam. Na segunda parte, voltada à consciência ingênua, ele realça diversas dimensões, atitudes e características dessa forma de consciência. Afirma, por exemplo, que a consciência ingênua é marcada pelo caráter sensitivo, pela incoerência lógica, pela incapacidade de dialogar, pelo moralismo, pelo culto a heróis, pelo messianismo, pelo ufanismo etc. Ou seja, atributos que ele considerava nocivos. Afirma: “O pensar ingênuo não merece ser somente aquilatado como mal para o indivíduo, mais grave ainda é o dano causado à comunidade, que nele enfrenta um obstáculo realmente prejudicial ao processo de desenvolvimento” (Vieira Pinto, 1960VIEIRA PINTO, Álvaro. Consciência e Realidade Nacional. Volumes 1 e 2. Rio de Janeiro: ISEB, 1960., p. 161).

Nas cerca de 600 páginas da terceira parte, correspondente ao livro dois, Vieira Pinto trata da consciência crítica conceituando-a como um sistema de sete categorias relacionadas, quais sejam: objetividade, historicidade, racionalidade, totalidade, atividade, liberdade e nacionalidade. De forma direta, enfatiza:

A consciência crítica é um sistema, ao contrário da modalidade ingênua, que, em razão de não se julgar condicionada pela realidade, não exibe tal caráter, nem mesmo o deseja ter, sendo, ao invés, um aglomerado de atitudes desconexas, ditadas por circunstâncias ocasionais, presas a interesses momentâneos, sem vínculos com o sentido do processo coletivo. Ao considerar a consciência crítica como sistema não devemos dar a este vocábulo o sentido dogmático que quase sempre possui em filosofia. Aqui, significa apenas o repertório de ideias mais gerais que permitem apreender a realidade, e cujo conhecimento não resulta da meditação abstrata, mas da prática social, transformadora do mundo objetivo, e da vivência da etapa histórica do desenvolvimento em que se encontra a comunidade

(Vieira Pinto, 1961VIEIRA PINTO, Álvaro. Consciência e Realidade Nacional. Volumes 1 e 2. Rio de Janeiro: ISEB, 1960., p. 520).

A divisão de Consciência e Realidade Nacional em três partes evidencia um rigoroso e cuidadoso procedimento analítico adotado pelo autor. Ou seja, amparado em um consistente aporte teórico-metodológico inicial, primeiro trata da definição das categorias (a polaridade das consciências), em seguida tem em conta a negação, isto é, a problematização das atitudes ingênuas, e, por fim, em forma de superação, apresenta a sua formulação em torno da consciência crítica.

Paulo Freire assume inteiramente a base conceitual de Vieira Pinto sobre consciência/conscientização, embora muitas pessoas imaginem que essa conceituação é do próprio Freire. Não é, e ele próprio chegou a admitir isso:

Acredita-se geralmente que sou o autor deste estranho vocábulo ‘conscientização’, por ser este o conceito central de minhas ideias sobre a educação. Na realidade, foi criado por uma equipe de professores do INSTITUTO SUPERIOR DE ESTUDOS BRASILEIROS por volta de 1964. Pode-se citar entre eles o filósofo Álvaro Pinto

(Freire, 1980FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação – uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Moraes, 1980., p. 25)4 4 A referência cronológica de Freire, mencionando “em volta de 1964”, está equivocada. A publicação de Consciência e Realidade Nacional ocorre em 1960. .

Mais ainda, no que se refere ao seu Educação como Prática da Liberdade (Freire, 1999FREIRE, Paulo. Educação como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999.), ele afirmou:

Bem, a Educação como Prática da Liberdade foi uma revisão ampliada da minha tese, que defendi para uma cátedra na Universidade de Pernambuco […]. No Chile, revi tudo e, inclusive, percebi uma série de incongruências. Mas, antes de fechar o livro para publicação […], eu tive a felicidade de ter o Álvaro Vieira Pinto por perto, que fez uma leitura crítica dos originais

(Freire; Guimarães, 2000FREIRE, Paulo; GUIMARÃES, Sérgio. Aprendendo com a Própria História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000., p. 176).

Por sua parte, nos anos 1980, ao avaliar os rumos da obra de Paulo Freire e o comportamento de freireanos, Vieira Pinto demonstrou um certo ceticismo ao afirmar o seguinte:

É preciso que o êxito de uma determinada atitude pedagógica não se transforme em obstáculo ao prosseguimento do curso da própria educação. Os métodos bem sucedidos, como o do Paulo Freire, podem acabar se tornando um quisto, uma coisa que impede o prosseguimento do seu próprio desenvolvimento

(Vieira Pinto, 1993VIEIRA PINTO, Álvaro. Sete Lições sobre Educação de Adultos. São Paulo: Cortez, 1993., p. 26).

Por trás dessa assertiva de Vieira Pinto está, por exemplo, a constatação das crescentes manifestações laudatórias em torno de Freire – gerando o paulofrerianismo –, em detrimento da problematização teórico-prática. Ou seja, o mestre que aportou o conceito de conscientização parece ter visto ele sendo embotado pelo desprezo à reflexão analítica.

Dediquemos alguma atenção agora à segunda formulação que, ainda há pouco, fiz menção como merecedora de particular realce no modo como Freire a assimila: o conceito de diálogo de Martin Buber5 5 Tratarei do conceito de diálogo em Martin Buber a partir de quarto fontes: o próprio Buber (1970), no seu I and Thou; a tese doutoral de Charles Scott (2011), apresentada à University of British Columbia, sobre o diálogo em Buber voltado à educação; a cuidadosa recensão feita por Flávio Brayner (2009) acerca de Buber, no texto Homens e mulheres de palavra: diálogo e educação popular; e o paper Martin Buber: Father of the philosophy of dialogue, de Sylwia Górzna (2014). .

Filósofo e pedagogo de origem judaica, tendo chegado a ser professor da Universidade de Frankfurt – demitindo-se após a ascensão do nazismo em 1933 –, Martin Buber (1878-1965) enfatizou que não havia existência sem comunicação e diálogo. Para ele, as palavras-princípio Eu-Tu (relação) e Eu-Isso (experiência) evidenciam as duas dimensões da filosofia do diálogo que dizem respeito à própria existência. Segundo a compreensão buberiana, as pessoas nascem com capacidade de inter-relacionamento, isto é, de intersubjetividade (Buber, 1970BUBER, Martin. I and Thou. New Yok: Charles Scribner’s Soon, 1970.).

Conforme Buber (1970)BUBER, Martin. I and Thou. New Yok: Charles Scribner’s Soon, 1970., o ser humano nunca está sozinho, pois ele se define em uma dupla relação, seja com o Tu, seja com o Isto. O universo do Tu é constituído de relações ativas, vivas e enriquecedoras, não importando se elas se estabelecem para o Eu com a natureza, com o outro ou com as essências espirituais. De forma inversa, o universo do Isto é um universo degradado, no oposto do universo da pessoa que deriva das relações entre o Eu e o Tu, o mundo da objetividade em que aquilo que importa não é mais a relação, mas a experiência. Sendo tais universos imbricados, há o risco de as relações entre eles se deteriorarem e se converterem em relações de Eu em Isto.

Uma sociedade estruturada conforme o princípio da dialogicidade demanda, segundo Buber (1970)BUBER, Martin. I and Thou. New Yok: Charles Scribner’s Soon, 1970., uma organização política baseada em pequenas comunidades, com o diálogo desempenhando nelas um papel vital. Encontramos, assim, em Buber (1970)BUBER, Martin. I and Thou. New Yok: Charles Scribner’s Soon, 1970., uma espécie de socialismo utópico em que o Estado é concebido como um agregador de comunidades.

Para Buber, o diálogo está para além de um mero encontro, sendo o próprio comportamento humano, e visto nas ações intersubjetivas de um-para-com-o-outro, cuja dimensão essencial é a reciprocidade do agir interior, em que o diálogo espiritual é tão essencial quanto o terreno. Sim, é isso: o diálogo espiritual buberiano significa relação com as “coisas divinas”, embora Buber tenha repelido enfaticamente as críticas segundo as quais a sua teoria do diálogo se convertia em uma relação mística do ser humano com o mundo e com a ideia de divindade.

A sua menção à relação entre diálogo e amor é emblemática. Refere a importância do amor para o dialogante, mas não como regra para que os seres humanos se encontrem em situação de diálogo tão somente porque amam, e sim como algo que deve existir no indivíduo espiritualizado como fé no nosso estar presente e perceber. Desse modo, a dialogicidade não pode ser equiparada a amor, afinal, compreende Buber (1970)BUBER, Martin. I and Thou. New Yok: Charles Scribner’s Soon, 1970., não há notícia, em tempo algum, de alguém que tenha amado todos os seres humanos que encontrou.

Fundamentalmente, em Buber, o Tu inato de cada ser humano só pode realizar-se ou aperfeiçoar-se na relação individual e singular entre Tu e Eu, e na medida em que o Tu não se degrade em Isto. A forma como Buber influencia Paulo Freire, e mais do que isso, a maneira como ele, Paulo Freire, se apropria da abordagem buberiana é tão direta que, francamente, é difícil entender como determinados freireanos não percebem isso, e continuam atribuindo a Freire enfoques sobre diálogo que a ele não pertencem. A propósito, vejamos a seguinte passagem de Pedagogia do Oprimido:

Enquanto na teoria da ação antidialógica a conquista, como primeira característica, implica um sujeito que, conquistando o outro, o transforma em quase coisa, na teoria dialógica da ação, os sujeitos se encontram para a transformação do mundo em colaboração. O eu antidialógico, dominador, transforma o tu dominado, conquistado, em um mero isto. O eu dialógico, pelo contrário, sabe que é exatamente o tu que o constitui. Sabe também que, constituído por um tu – um não-eu –, esse tu que o constitui se constitui, por sua vez, como eu, ao ter no seu em um tu. Desta forma, o eu e o tu passam a ser, na dialética destas relações constitutivas, dois tu que se fazem dois eu. Não há, portanto, na teoria dialógica da ação, um sujeito que domina pela conquista e um objeto dominado

(Freire, 1987FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987., p. 165-166, grifos do autor).

Não é necessário um grande exercício hermenêutico para perceber que a abordagem dialógica de Freire deita raízes em Martin Buber, que, de resto, é citado em Pedagogia do Oprimido. Poderá ser dito, em contrapartida, que a obra de Freire é mais do que a Pedagogia do Oprimido, o que, por certo, procede, visto que ele fez vir a lume outras produções. Contudo, a tentativa de negar o fato de que, em Pedagogia do Oprimido, se encontra a matriz de pensamento que perpassa o conjunto das suas abordagens pode ser descontruída com uma só penada. Por uma razão óbvia: os seus demais escritos, direta ou diretamente, têm incidência remetida a esse livro, e a esse respeito é paradigmático que uma das suas últimas produções seja denominada Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido (Freire, 1992FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: reencontro com a Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.). Também é revelador, a propósito, que, na justificativa da Pedagogia do Oprimido, ele relacione a obra com o seu principal trabalho antecedente, ao enfatizar a pretensão de “[…] aprofundar alguns pontos discutidos em nosso trabalho anterior, Educação como Prática da Liberdade” (Freire, 1987FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987., p. 29). Enfim, como acertadamente diz Brayner, “[…] a Suma Pedagogica de Freire é ‘Pedagogia do Oprimido’: é aqui onde se concentra o essencial de seu pensamento educativo e para onde todos os seus escritos anteriores e posteriores apontam ou remetem” (Brayner, 2009BRAYNER, Flávio. Homens e Mulheres de Palavra: diálogo e educação popular. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 22, n. 1, p. 207-224, 2009., p. 217).

Foi a partir de Paulo Freire que o estatuto pedagógico do oprimido ganhou relevância, sendo ele concebido como objeto/sujeito de uma pedagogia que, pela conscientização, almeja a sua libertação. Embora o oprimido seja concebido de forma ampla, é central no enfoque freireano o paradigma de classe social. Encontramos em Freire expressões como “pensar certo” e “significação verdadeira”, o que significa dizer que, indo-se de uma educação bancária para uma educação problematizadora, pode-se desmistificar um mundo velado que atende aos interesses do opressor. Trata-se de uma consigna com forte apelo emocional e político-ideológico, principalmente em contextos marcados por diferentes formas de opressão, embora nem sempre as premissas de tal consigna estejam lastreadas pelo rigor necessário em termos de embasamento conceitual.

Educação, diálogo, conscientização, libertação constituem uma senda, traçada por Freire, que é acalentadora de esperança e sensibilidade progressista. E também é chamativa a passos de um certo caminhar teológico, de um modo que talvez até, em determinadas circunstâncias, coloque em questão o sentido laico da esfera educativa e da conscientização – a boa nova é anunciada aos homens (la bonne nouvelle est-elle annoncé aux hommes)?

Saindo do plano da proclamação e pensando na praxeologia, ficam dúvidas em relação à efetividade do propósito abrigado na solicitação pedagógica para que cada educando diga a sua palavra no intercâmbio com outras palavras que pronunciam o mundo, visto que esse dizer, o mundo, é expressado por consciências que se encontram submersas em formas “alienadas” (ou “ingênuas”) de representação de tal mundo (Brayner, 2009BRAYNER, Flávio. Homens e Mulheres de Palavra: diálogo e educação popular. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 22, n. 1, p. 207-224, 2009.). Trata-se de uma problemática de peso, mas não apreciada, afinal, inexiste na abordagem freireana uma teoria compreensiva da sociedade e dos seus dispositivos de ação social. A primazia da sua abordagem diz respeito, sim, ao educativo e ao pedagógico.

De resto, como a amostra aqui exposta evidenciou, é de se assinalar que a centralidade do conteúdo da obra de Paulo Freire se inscreve, substancialmente, no ideário difundido pelo projeto da Modernidade.

Tensões Analíticas entre Habermas e Freire

O cotejamento sistemático entre as obras de Habermas e Paulo Freire, realizado com coerência lógica, e não sob o impulso de imperativos de vontade, revela tensões analíticas – ou mesmo paradoxos – que não deveriam ser ignoradas pelo projeto acadêmico que anseia por uma articulação paradigmática entre ambos, sob risco de perda de credibilidade. Nesses casos, no máximo, produz-se um arrazoado nonsense e/ou são alimentadas plateias passivas, conforme os lucrativos jogos de interesses do “campo científico” (Bourdieu, 1976BOURDIEU, Pierre. Le Champ Scientifique. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, v. 2, n. 2-3, p. 88-104, 1976.) e do mercado dos bens cognitivos, impulsionado, este último, pela indústria editorial.

A propósito, é bastante sugestivo que o próprio Paulo Freire não tenha buscado uma articulação analítica estruturada com a obra de Habermas – ao patamar de interconexão de paradigmas. E não se pode dizer que ele desconhecia a teoria social alemã e, em particular, a produção da Escola de Frankfurt, principalmente quando consideramos que, no âmbito desta, ele tem em Eric Fromm e Herbert Marcuse duas referências para as suas abordagens. É nitidamente em Marcuse que desenvolvem um debate divergente com Habermas sobre tecnologia – que Freire (1987, p. 47)FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. se apoia para afirmar que “[…] os opressores matam a vida, daí que vão se apropriando, cada vez mais, da ciência também, como instrumento para suas finalidades. Da tecnologia, que usam como força indiscutível de manutenção da ‘ordem’ opressora”.

Refiro apenas algumas das mencionadas tensões analíticas, sendo possível inferir parte delas da incursão anteriormente posta em relevo.

Uma primeira diz respeito aos próprios contextos a partir dos quais Habermas e Freire desenvolvem os seus enfoques. A diferença é significativa. As perspectivas habermasianas são consubstanciadas tendo como substrato o capitalismo avançado, a Alemanha reconstruída do pós-Segunda Guerra, em que as demandas da população estão razoavelmente equacionadas, não existindo, por exemplo, o problema do analfabetismo tal qual a realidade latino-americana. Ou seja, estamos a falar das sociedades de bem-estar europeias, sociedades em que a questão social foi pactuada e os pleitos materiais assimilados pelo establishment, de modo que as reivindicações e mobilizações, salvo exceções, passaram a ser desenvolvidas fortemente em torno de questões pós-materiais. Não surpreende, assim, que Habermas aponte a perda de centralidade do trabalho e a defasagem da tese da luta de classes, embora, por certo, essas sejam posições discutíveis.

É desnecessário gastar muita tinta para assinalar que o contexto do qual vem à luz a obra de Freire é inteiramente diferente do de Habermas. O Brasil da segunda metade do século XX, uma sociedade em trânsito para o mundo urbano-industrial, com imensas parcelas de analfabetos, e a América Latina em geral – aprisionada pelas correntes da dependência do capitalismo (semi)periférico – constituem realidades muito diferentes, sob diversos pontos de vista, das realidades prevalecentes no seio do capitalismo avançando. Dessa forma, não encontra abrigo em Paulo Freire posições que advogam o deslocamento do conceito de classes sociais e de perda de significado dos conflitos nos quais elas estão implicadas.

Uma tensão analítica de difícil atenuação refere-se ao debate sobre o paradigma da linguagem e o paradigma da consciência. Mesmo distinguindo-se dos pós-modernos no tocante à chamada virada linguística, Habermas é categórico em enfatizar a superação do paradigma da consciência e em afirmar o paradigma da linguagem, significando isso a descentralização dos sujeitos cognoscentes, não havendo apoio para sustentação do entendimento que não seja nas regras do próprio discurso. Diferente do paradigma da consciência, não se coloca ênfase em uma dimensão interior do ser humano – uma consciência a priori, certa, conscientização do verdadeiro –, e nem tampouco se considera a existência de um sujeito que, na busca de conhecimento, baseia suas decisões em uma intencionalidade subjetiva soberana. Maior contraste não pode existir em relação à perspectiva freireana, principalmente quando ele afirma que defende um processo revolucionário que se prolongue em revolução cultural com a chegada ao poder, no qual deve ocorrer um “[…] esforço sério e profundo de conscientização, com que os homens, através de uma práxis verdadeira, superam o estado de objetos, como dominados, e assumem o de sujeito da História” (Freire, 1987FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987., p. 158, grifos do autor).

Contrastante também é, em mais uma tensão analítica, o estatuto dos agentes do diálogo em ambos. Em Habermas (1981aHABERMAS, Jürgen. Theory of Communicative Action: reason and rationalization of society (Volume 1). Tradução: Thomas McCarthy. Boston: Beacon Press, 1981a.; 1981b)HABERMAS, Jürgen. Theory of Communicative Action: lifeworld and system: a critique of functionalist reason (Volume 2). Boston: Beacon Press, 1981b., é “projetada uma comunidade de fala ideal”, compartilhada por agentes linguisticamente competentes, deliberando – livres de coação – sobre convenções polemizadas no devir histórico. Por óbvio, conforme está contido nessa formulação, até pela etimologia, comunidade ideal remete à uma dimensão prospectiva, ao vir-a-ser (devir histórico), não dizendo respeito evidentemente a uma realidade já existente, passível de escrutínio empírico-analítico. Muito diferente se passa em relação a Freire. Os agentes do seu diálogo são analfabetos e semianalfabetos, pessoas vivendo em situação de desigualdade social e submetidas a relações de opressão. Não é por outra razão que a sua Suma Pedagógica se chama Pedagogia do Oprimido. Poder-se-á dizer, e por certo há quem o diga, que Paulo Freire considera os seres humanos como seres de palavra, sendo então o escopo dos seus agentes do diálogo mais amplo, não se limitando apenas a analfabetos e semianalfabetos em situação de desigualdade e opressão. Há procedência nessa interpretação, mas o seu problema é que ela comete o equívoco da originalidade, ao atribuir a Freire a autoria da inscrição no ser humano de uma dimensão ontológica da linguagem, quando, na verdade, o que ele faz é incorporar e reproduzir o background de Martin Buber, consubstanciado, por exemplo, pelas palavras-princípio Eu-Tu (relação) e Eu-Isso (experiência), e que, na perspectiva buberiana, evidenciam as duas dimensões da filosofia do diálogo que, ontologicamente, constituem a própria existência humana.

Last but not least, há de se dizer que existem profundas diferenças em relação ao modo como Habermas e Freire concebem a mudança social. Claramente, a preocupação de Habermas é com a reforma do capitalismo avançado – ou o dito capitalismo administrado, tardio –, buscando focar as suas crises de legitimidade, de modo que as sociedades por ele engendradas não percam o seu rosto de bem-estar social. Trata-se de uma perspectiva nos marcos da clássica social-democracia europeia. E não é pouca coisa, reconheça-se. Por outro lado, contudo, a perspectiva de mudança social acalentada pelo conjunto da obra de Paulo Freire é bastante distinta disso. Em sentido figurado, poder-se-á dizer que a mudança social em Habermas está para reforma e, em Freire, para transformação. Mas tal fato, contemporaneamente, coloca desafios à obra freireana, na medida em que, grosso modo, a sua visão de transformação tem datação histórica e resulta de um tempo que é muito distinto dos dias de hoje. Menções dualistas e dicotômicas envolvendo, por exemplo, massas, lideranças revolucionárias, elites, guerra revolucionária etc., além de um elevado grau de simplismo, carregam um léxico da América Latina do período da Guerra Fria, e requerem um ajuste de natureza teórico-empírica.

Receio, no entanto, que determinados freireanos, extasiados pela retórica laudatória, não tenham propensão a fazer tal lição de casa, seja porque, sob uma espécie de hipnose da louvação, sequer dela tomam conhecimento, seja porque não dispõem de credenciais objetivas – do ponto de vista do conhecimento – para tanto. Lamentável, pois, assim, eles próprios, não os adversários, contribuem para que o legado de Paulo Freire – independente do julgamento que dele se faça e da perspectiva que cada um tenha a respeito das suas abordagens – adquira um caráter residual, colocado de costas voltadas às especificidades dos fenômenos sociais e educativos atuais.

Convergências Gerais entre Habermas e Paulo Freire

Poder-se-á indagar se, após o que foi realçado neste ensaio, existem pontos efetivos – concretos e específicos – de convergência entre Habermas e Paulo Freire. Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que provavelmente a resposta vai depender do modo como nos posicionamos perante uma perspectiva metodológica que se tem alastrado no âmbito dos estudos comparativos: a de ver nas entrelinhas o que expressamente é negado nas linhas. As razões para isso são diversas, mas penso que duas chamam a atenção: os imperativos de vontade, que consistem na busca desejosa de encontrar conexões entre âmbitos distintos, e as leituras de tipo skimming/scanning, expressões da língua inglesa repetidas pomposamente para se dizer que um texto não foi lido integralmente, e que, assim, podem ser entendidas como leitura na diagonal ou, convenhamos, trata-se de leitura malfeita mesmo.

Pois bem, retomando o nosso ponto, se é visto nas entrelinhas o que expressamente é negado nas linhas, desconsiderando, de resto, os contextos, é muito provável que abundem incontáveis pontos de convergência entre Habermas e Freire. Francamente, não vejo assim, além de caber assinalar que são autores situados em patamares intelectuais diferenciados: por um lado, um filósofo, sociólogo e teórico social que tem revisado toda a tradição do pensamento ocidental; por outro lado, um educador, humanista e criador de um método de alfabetização que lhe rendeu grande reconhecimento.

De todo modo, como assinalei a princípio, abordagens e conceitos manejados pelas ciências histórico-sociais, em geral, podem circular envolvendo autores diversos. De maneira aproximativa, principalmente quando esses autores compartilham quadros de referência analítica inscritos na tradição das teorias críticas. Penso que é por essa via que podemos encontrar uma certa convergência entre Habermas e Paulo Freire. Ou seja, no plano de determinadas teses gerais.

Uma delas se refere ao fato de que ambos inscrevem as suas contribuições na esfera do projeto da Modernidade, o que significa dizer no âmbito das suas intenções emancipatórias, embora de maneiras distintas. Tem pouca importância se o último Paulo Freire, aqui e acolá, faz menção à pós-modernidade, pois o conjunto da sua obra deita raízes no ideário incompleto do projeto moderno.

A partir dessa afiliação (moderna) de ambos, é de se inferir a possiblidade de extrair bases, em suas obras, para uma abordagem pedagógica não relativista, embora isso, por vezes, encontre bloqueios em alguns lugares-comuns repetidos a partir de Freire, como no tocante ao papel docente. Repiso o já dito sobre os lugares-comuns, isto é, têm as limitações do óbvio: até podem possuir grãos de verdade, mas estes se encontram perdidos no amálgama confuso da inestruturação teórica.

Poder-se-á dizer que no tocante à dialogicidade assumida por Freire – no curso dos aportes de Martin Buber – e em relação à racionalidade comunicativa habermasiana, a convergência possível incide, em grau restrito, sobre o reconhecimento geral da necessidade de competência comunicativa dos agentes, mas daí em diante os enfoques divergem. Enquanto Habermas conjectura uma comunidade de fala ideal que, em termos de heterogeneidade, se limita às diferenças do mundo da vida, visto que o conceito de classe social não lhe é central, Freire, por sua parte, tem presente a centralidade da classe social e das desigualdades que atravessam o universo dos oprimidos. Daí que a natureza do diálogo em ambos se diferencie, com a convergência circunscrevendo-se ao reconhecimento geral da necessidade de competência comunicativa.

À Guisa de Conclusão

Tive como objetivo, neste ensaio, desenvolver uma démarche estabelecendo um comparativo entre o pensador alemão Jürgen Habermas e o educador brasileiro Paulo Freire, como condição para discutir a aventada possibilidade de convergência entre as suas obras. A princípio, coloquei em realce um panorama de cada um, tratando em seguida do que os diferencia e, a partir de teses gerais, das tênues possibilidades de convergências entre ambos. Penso que o propósito do ensaio foi atingido.

Do que foi evidenciado, cabe uma ilação final. É preciso evitar o simplismo reducionista tão comum na análise social atual, sobretudo no campo da pesquisa educacional, e que mais parece coisa de colecionadores de borboletas que desfilam estabelecendo relações entre teorias, classificando abordagens e ajuntando autores em amontoados de citações, resultando isso em arrazoados que são apresentados como textos portadores de novidades dignas de Prêmio Nobel. Ao contrário, é preciso o rigor da análise sistemática que não se compraz com a repetição de generalidades e de formulações vazias. É nesta direção, penso, que os estudos comparativos (entre teóricos, situações, países etc.) podem encontrar legitimidade, evidenciando convergências, por exemplo, entre autores estudados, quando elas existirem, ou mostrando que, por vezes, as convergências detectadas resultam mais de um anseio pessoal de quem as identifica e da superficialidade do exame que permitiu a identificação.

Notas

  • 1
    Como representativa das perspectivas que enfatizam a conexão analítica entre Habermas e Freire, tenho em conta a abordagem de Morrow e Torres (2002MORROW, Raymond; TORRES, Carlos. Reading Freire and Habermas: critical pedagogy and transformative social change. New York: Columbia University, Teacher’s College Press, 2002.; 1998)MORROW, Raymond; TORRES, Carlos. Jürgen Habermas, Paulo Freire e a Pedagogia Crítica: novas orientações para a educação comparada. Educação, Sociedade e Cultura, Porto, n. 10, p. 123-155, 1998..
  • 2
    Tais postulados são tributários do enfoque teórico-metodológico que, do ponto de vista das ciências histórico-sociais, norteou o destacado e heterogêneo grupo de intelectuais que colocou em xeque o “enfoque enviesado” da teoria da modernização na explicação da relação entre desenvolvimento e subdesenvolvimento. Com a contribuição, sobretudo, de latino-americanos, veio a lume então a teoria da dependência. Ver dos Santos (2003)DOS SANTOS, Theotônio. La Teoría de la Dependencia: balance y perspectivas. Buenos Aires: Plaza & Janés, 2003. e Cardoso (1984)CARDOSO, Fernando Henrique. Les Idées à Leur Place: le concept de développement en Amérique Latine. Paris: A. A. Métailié, 1984..
  • 3
    A categorização levada a cabo por Immanuel Wallerstein a propósito do sistema-mundo estruturado por países centrais, semiperiféricos e periféricos parece-me bem mais pertinente analiticamente do que a tradicional classificação dicotômica entre centro e periferia. Ver Wallerstein (2011aWALLERSTEIN, Imannuel. The Modern World System I: capitalism, agriculture and the origins of the European world-economy in the sixteenth century. Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 2011a.; 2011bWALLERSTEIN, Imannuel. The Modern World System II: mercantilism and the consolidation of the European world-economy, 1600-1750. Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 2011b.; 1996)WALLERSTEIN, Imannuel. Historical Capitalism with Capitalist Civilization. Londres: Verso, 1996..
  • 4
    A referência cronológica de Freire, mencionando “em volta de 1964”, está equivocada. A publicação de Consciência e Realidade Nacional ocorre em 1960.
  • 5
    Tratarei do conceito de diálogo em Martin Buber a partir de quarto fontes: o próprio Buber (1970)BUBER, Martin. I and Thou. New Yok: Charles Scribner’s Soon, 1970., no seu I and Thou; a tese doutoral de Charles Scott (2011)SCOTT, Charles Farquhar. Becoming Dialogue: Martin Buber’s concept of turning to the other as educational praxis. 2011. 291 f. Tese (Doutorado em Filosofia) – Faculty of Education, University of British Columbia, Canadá, 2011., apresentada à University of British Columbia, sobre o diálogo em Buber voltado à educação; a cuidadosa recensão feita por Flávio Brayner (2009)BRAYNER, Flávio. Homens e Mulheres de Palavra: diálogo e educação popular. Revista Portuguesa de Educação, Braga, v. 22, n. 1, p. 207-224, 2009. acerca de Buber, no texto Homens e mulheres de palavra: diálogo e educação popular; e o paper Martin Buber: Father of the philosophy of dialogue, de Sylwia Górzna (2014)GÓRZNA, Sylwia. Martin Buber: father of the philosophy of dialogue. European Journal of Science and Theology, v. 10, n. 5, p. 45-53, 2014..

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Editado por

Editor responsável: Luís Henrique Sacchi dos Santos

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2022
  • Aceito
    22 Mar 2023
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