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A Atuação do Instituto Mises Brasil no Ensino Superior Brasileiro

RESUMO

Objetiva-se discutir a atuação das think tanks liberais (ou “fábrica de ideias”, em tradução livre) no campo do ensino superior e da academia a partir do estudo de caso do Instituto Mises Brasil (IMB). De forma geral, tais think tanks objetivam cultivar e disseminar o pensamento de matriz neoliberal. Principalmente nos últimos quinze anos, vêm intensificando sua atuação na arena na educação superior e na academia. O estudo mapeou como estas desenvolvem iniciativas direcionadas a estes campos, discutindo o caso do Instituto Mises Brasil. O IMB vem criando uma comunidade de pesquisa em torno da Escola Austríaca de Economia e tentando influenciar o ensino, pesquisa e extensão.

Palavras-chave
Think Tanks Liberais; Ensino Superior; Privatização; Academia

ABSTRACT

The paper aims to discuss neoliberal think tanks’ role in higher education from the case study of the Mises Brasil Institute (IMB). In general, think tanks aim to cultivate and disseminate neoliberal thought. In the last fifteen years, they have been intensifying their performance in higher education and academia. The study mapped how these think tanks act in these fields, discussing the case of the Mises Brasil Institute. The IMB has been creating a research community around the Austrian School of Economics and trying to influence the teaching, research, and extension.

Keywords
Neoliberal Think Tanks; Higher Education; Privatization; Academy

Introdução

Sobretudo nos últimos 10 anos, com o fortalecimento de pautas liberais e conservadoras no país – em outros termos, neoliberais –, constatou-se o crescimento e o fortalecimento de organizações chamadas de think tanks liberais. Figurando como atores políticos que almejam disputar a “guerra das ideias” e influenciar direta e indiretamente as políticas públicas, tais organizações produzem e disseminam conteúdos diversos em defesa de pautas ultraliberais, bem como apresentam uma agenda de atuação anti-esquerda – na visão destas organizações, atuam principalmente contra o mainstream keynesianismo e marxista na cultura, política e economia, exemplificado pelo slogan “Menos Marx, Mais Mises” observado em diversos protestos antipetismo ao longo dos anos (Rocha, 2018ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54.; Baggio, 2016BAGGIO, Kátia Gerab. Conexões ultraliberais nas Américas: o think tank norte-americano Atlas Network e suas vinculações com organizações latino-americanas. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DA ANPHLAC, 12., Mariana, 2016. Anais […]. Mariana: ANPHLAC, 2016.). Não obstante, um dos espaços elencados como estratégicos às think tanks liberais é o ensino superior e, particularmente, as universidades.

À vista disso, o artigo objetiva descrever e debater a atuação do Instituto Mises Brasil (IMB) no campo do ensino superior e da academia. Duas perguntas guiam o estudo: como e por que as think tanks liberais vêm atuando no campo do ensino superior e da academia no Brasil? Como essas organizações liberais contribuem para o processo de mercantilização e privatização desses campos? A partir dessas duas perguntas gerais, o artigo1 1 O artigo traz parte dos resultados de uma tese de doutorado com o objetivo de mapear e analisar a atuação das think tanks neoliberais brasileiras no campo do ensino superior e da ciência (Cristofoletti, 2021). Assim, o artigo traz um recorte do estudo, focado no IMB (um dos estudos de caso conduzidos apresentados na tese). visa apresentar elementos empíricos relacionados à atuação dessas organizações no Brasil, como foco no caso do IMB.

Metodologicamente, o estudo baseou-se em três procedimentos metodológicos: em primeiro lugar, uma revisão de literatura sobre a origem, expansão e atuação destas organizações, com foco nos seus epicentros mundiais (Reino Unido e Estados Unidos da América) e no Brasil. Nessa revisão, buscou-se identificar questões (argumentos, visões, propostas, projetos, iniciativas e ações) relacionadas à educação superior e ciência. Em segundo lugar, a pesquisa empreendeu um mapeamento empírico das think tanks liberais brasileiras, rastreando-as a partir da Rede Liberdade. Esse mapeamento permitiu selecionar, a partir de pesquisa documental, as organizações com maior foco e intensidade de atuação no ensino superior e na academia. A partir disso, foi possível traçar um panorama geral dessa atuação, e selecionar o estudo de caso. O terceiro passo metodológico, justamente, foi empreender o estudo de caso relatado neste artigo. Para além de uma caracterização geral do IMB, a pesquisa buscou por materiais produzidos pela think tank (artigos, vídeos, posts em redes sociais, dentre outros) e por seus especialistas sobre educação, universidade, ciência e temas correlatos, com o objetivo de identificar a visão/opinião desta organização sobre os temas. Além disso, caracterizou-se e analisou as iniciativas e projetos acadêmicos do IMB, buscando debater como e por quais motivos a organização vem buscando formar uma intelectualidade alinhada à Escola Austríaca de economia e suas correntes.

Assim, o artigo foi dividido em três seções, para além da introdução e da conclusão. A primeira seção do artigo tem por objetivo contextualizar e caracterizar, de maneira geral, o que são as think tanks liberais, com foco no contexto brasileiro. Posteriormente, o artigo apresentará um panorama mais amplo sobre a atuação das think tanks liberais brasileiras no campo do ensino superior e da academia, visto que estudantes, docentes e IES configuram-se como público-alvo importantes para estas organizações. Por fim, o artigo dedica uma seção para debater o caso do Instituto Mises Brasil, think tank liberal dedicado à produção e disseminação da chamada Escola Austríaca de economia no Brasil e que busca atuar no campo acadêmico. Cabe ressaltar que o foco do estudo se encontra, justamente, na interlocução entre estas organizações neoliberais e o campo do ensino superior e acadêmico brasileiro. Nesse sentido, torna-se necessário centrar o debate nas próprias think tanks liberais, abordando um estudo de caso relevante às perguntas do estudo, visto que o IMB se constitui uma das lideranças da Rede Liberdade2 2 Grosso modo, as think tanks podem ser caracterizadas como organizações que mobilizam conhecimentos acadêmicos (ou que se dizem acadêmicos) para a proposição de políticas públicas ou para influenciar a opinião pública (Hauck, 2017; Medvetz, 2008; Pautz, 2012). . Na conclusão, de forma exploratória, visa-se pontuar algumas reflexões sobre a relação entre o contexto de fortalecimento do conservadorismo e do liberalismo e o campo do ensino superior e acadêmico no país. No limite, o estudo busca levantar um debate ainda incipiente sobre a atuação destas organizações liberais, seja no interior das Instituições de Ensino Superior (IES) e de ciência, nas políticas de educação e no debate público relacionado a estes campos no país.

Contextualizando os think tanks neoliberais

A abordagem utilizada no estudo localiza historicamente um “tipo” determinado de think tank, qual seja, as organizações neoliberais3 3 Neste artigo, não buscaremos debater o que é o neoliberalismo. Para mais, ver: Fine; Saad-Filho (2017), Plehwe, Slobodian e Mirowski (2020), Dardot e Laval (2016), Harvey (2005) e Andrade (2019). , cuja trajetória histórica enquadra-se em um movimento intelectual organizado, com raízes no Lippermman Colloquium (1938) e Mont Pelerin Society (1947), pontos importantes no movimento de revitalização e renovação do pensamento liberal (Plehwe; Slobodian; Mirowski, 2020PLEHWE, Dieter; SLOBODIAN, Quinn; MIROWSKI, Philip (Ed.). Nine lives of neoliberalism. Rio de Janeiro: Editora Verso, 2020.; Mirowski; Plehwe, 2009MIROWSKI, Philip; PLEHWE, Dieter (Ed.). The road from Mont Pèlerin: The making of the neoliberal thought collective, with a new preface. Cambridge: Harvard University Press, 2009.; Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo Editorial, 2016.; Turner, 2008TURNER, Rachel S. Neo-liberal ideology: history, concepts and policies: history, concepts and policies. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2008.; Onofre, 2018ONOFRE, Gabriel da Fonseca. A Nova Direita no Brasil: o caso dos Institutos Liberais brasileiros. 2018. 368 f. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 2018.). Na argumentação de Friedrich August von Hayek, o liberalismo não estava sendo capaz de atuar com eficiência na batalha de ideias (Hayek, 2010HAYEK, Friedrich August. O caminho da servidão. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 2010.). Mais do que isso, os ambientes de produção e circulação de conhecimento eram dominados pelo pensamento esquerdista, geralmente identificado com o “socialismo” e o “coletivismo”. Segundo Butler e Hartwell (2012)BUTLER, Eamonn; HARTWELL, Ronald Max. A short History of the Mont Pelerin society. Mont Pelerin Society, 2012., cofundador do think tank liberal britânico Adam Smith Institute (ASI), os liberais reunidos na primeira reunião do MPS pretendiam atuar na construção de um novo ambiente intelectual que pudesse minar os projetos socialistas. Em um contexto de descrédito acadêmico e político – levando em conta o fortalecimento das políticas de Welfare State, do keynesianismo e do socialismo – acadêmicos, jornalistas e empresários começaram a se organizar através da Sociedade Mont Pelerin (SMP) com o intuito de articulação intelectual e política, desde 1947, de um corpo não homogêneo de teorias, concepções e ideias que possam contribuir à defesa de uma ordem social de livre mercado dentro dos valores do individualismo e da competitividade.

Pode-se afirmar que dois espaços foram considerados particularmente importantes: a mídia e o ensino superior/academia. As think tanks neoliberais possuem interlocução com esse processo, constituindo-se como organizações privadas de pesquisa, normalmente financiadas por empresários e por partidos/grupos políticos conservadores, voltadas para a disseminação das correntes teóricas do neoliberalismo, para a formação de novos quadros intelectuais e de especialistas e para a proposição de políticas públicas (Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Plehwe; Slobodian; Mirowski, 2020; Mirowski; Plehwe, 2009MIROWSKI, Philip; PLEHWE, Dieter (Ed.). The road from Mont Pèlerin: The making of the neoliberal thought collective, with a new preface. Cambridge: Harvard University Press, 2009.; Gros, 2008GROS, Denise Barbosa. Considerações sobre o neoliberalismo como movimento ideológico internacional. Ensaios FEE, Porto Alegre, Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, v. 29, n. 2, p. 565-590, 2008.; Turner, 2008TURNER, Rachel S. Neo-liberal ideology: history, concepts and policies: history, concepts and policies. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2008.). Vale citar que o conjunto de think tanks neoliberais abarca uma complexidade de perspectivas teóricas (diferentes entre si), como a Escola Austríaca de Economia, o Ordoliberalismo, a Escola de Chicago e de Virgínia, a Teoria da Escolha Pública, perspectivas alinhadas ao anarco-capitalismo e ao libertarianismo, dentre outras. Outra característica das think tanks neoliberais reside no fato de que elas se articulam em redes coordenadas em âmbito global, regional e nacional, principalmente a partir da década de 1970.

Em âmbito global, uma das think tanks mais relevantes denomina-se Atlas Network (traduzida em Rede Atlas), fundada em 1981 nos Estados Unidos da América por um empresário chamado Antony Fisher, membro da MPS, e que havia participado da fundação de uma série de outras organizações com peso político relevante, como o Institute of Economic Affairs (1955) no Reino Unido. Sob a influência direta de Hayek, o empresário criou uma organização com o objetivo de estimular e apoiar (treinamento e financiamento) a criação de think tanks neoliberais em todo o mundo. Segundo Djelic e Mousavi (2020)DJELIC, Marie-Laure; MOUSAVI, Reza. How the Neoliberal Think Tank Went Global: The Atlas Network, 1981 to the Present. In: PLEHWE, Dieter (Org.). Nine lives of neoliberalism. London: Editora Verso, 2020. P. 257-282., a Rede Atlas foi a principal responsável pela globalização do modelo de think tanks neoliberais no mundo, oferecendo suporte para a disseminação deste tipo de organização em todas as regiões do planeta. Em 2020, a Rede Atlas alcançou o número de 502 parceiros oficialmente vinculados, com a seguinte distribuição geográfica, com 97 organizações filiadas na AL e 13 no Brasil4 4 As organizações diretamente ligadas à Atlas Network são: Instituto Atlantos, Instituto de Estudos Empresariais, Instituto de Formação de Líderes (Minas Gerais, São Paulo e Santa Catarina), Instituto Liberal (RJ), Instituto Liberal de São Paulo; Instituto Liberdade, Instituto von Mises Brasil, Instituto Millenium, Líderes do Amanhã, Livres, Mackenzie for Economic Freedom e Students for Liberty Brasil. . Em âmbito latino-americano, pode-se citar a Red Liberal de América Latina (RELIAL), criada em 2004. A RELIAL realiza conferências e congressos na América Latina, mantém uma biblioteca, desenvolve atividade editorial, bem como coordena atividades de divulgação das ideias neoliberais a nível regional.

Com efeito, o panorama brasileiro tem uma ligação direta com essas redes (Gros, 2008GROS, Denise Barbosa. Considerações sobre o neoliberalismo como movimento ideológico internacional. Ensaios FEE, Porto Alegre, Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, v. 29, n. 2, p. 565-590, 2008.; Vidal; Lopez; Brum, 2020; Rocha, 2018ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54.; 2019ROCHA, Camila. Passando o bastão: a nova geração de liberais brasileiros. Nuevo Mundo Mundo Nuevos, França, 2017. Disponível em: https://journals.openedition.org/nuevomundo/71327. Acesso em: 1 jan. 2023.
https://journals.openedition.org/nuevomu...
; Fischer; Plehwe, 2017FISCHER, Karin; PLEHWE, Dieter. Neoliberal think tank networks in Latin America and Europe: Strategic replication and cross-national organizing. In: SALAS-PORRAS, Alejandra; MURRAY, Georgina (Orgs.). Think tanks and global politics: Key spaces in the structure of power. New York: Palgrave Macmillan US, p. 159-186.; Baggio, 2016BAGGIO, Kátia Gerab. Conexões ultraliberais nas Américas: o think tank norte-americano Atlas Network e suas vinculações com organizações latino-americanas. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DA ANPHLAC, 12., Mariana, 2016. Anais […]. Mariana: ANPHLAC, 2016.). Já em âmbito nacional, nos últimos 10 anos, esse tipo de organização vem se expandindo, acompanhando o crescimento do movimento de grupos liberais e conservadores, por vezes chamada de “Nova Direita”5 5 Utiliza-se esse termo para denotar, de forma mais pragmática, uma série de atores políticos, classificados no campo da direita e da extrema-direita, que ganharam força e protagonismo político-ideológico ao longo dos últimos dez anos. Para mais, ver Rocha (2018) e Casimiro (2018) – ambos partem de leituras e interpretações diferentes dos fenômenos. no país (Baggio, 2016BAGGIO, Kátia Gerab. Conexões ultraliberais nas Américas: o think tank norte-americano Atlas Network e suas vinculações com organizações latino-americanas. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DA ANPHLAC, 12., Mariana, 2016. Anais […]. Mariana: ANPHLAC, 2016.; Ladi; Lazarou; Hauck, 2017HAUCK, Juliana Cristina Rosa. What are ‘Think Tanks’? Revisiting the Dilemma of the Definition. Brazilian Political Science Review, São Paulo, v. 11, n. 2, 2017.; Cruz; Kaysel; Codas; Cruz, 2015; Barbosa, 2016BARBOSA, Jefferson. Protestos da direita no Brasil contemporâneo: think tanks, grupos empresariais, intelectuais e aparelhos orgânicos da burguesia. Lutas Sociais, São Paulo, v. 20, n. 36, p. 151-165, 2016.; Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Cepêda, 2018; Santos; Tanscheit, 2019SANTOS, Fabiano; TANSCHEIT, Talita. Quando velhos atores saem de cena: a ascensão da nova direita política no Brasil. Colombia Internacional, Colômbia, Universidade de los Andes, n. 99, p. 151-186, 2019.; Chaloub; Perlatto, 2016CHALOUB, Jorge; PERLATTO, Fernando. A nova direita brasileira: ideias, retórica e prática política. Insight Inteligência, v. 72, p. 24-41, 2016.). Em 2016, devido à intensa articulação entre os principais think tanks neoliberais brasileiras, foi criada uma rede nacional denominada Rede Liberdade, com o objetivo de coordenar e fortalecer o ativismo liberal e conservador no Brasil, bem como propor políticas de privatização – em um primeiro momento, a rede focou-se em debater a privatização dos serviços de correio no Brasil, realizando inclusive concursos de artigos acadêmicos sobre o tema.

Nossa pesquisa empírica identificou cerca de 45 think tanks neoliberais ativas no Brasil (considerando o ano de 2020). Em termos de importância, seguindo com a abordagem panorâmica, poder-se-ia destacar algumas: Instituto Liberal do Rio de Janeiro (1983), Instituto de Estudos Empresariais (1984), Instituto Atlântico (1992), Instituto Liberdade (2004), Instituto Ordem Livre (2007), Instituto Millenium (2006), Instituto Mises Brasil (2008), Students For Liberty Brasil (2012), Instituto Liberal do Nordeste (2013), Instituto Liberal de São Paulo (2014), Mackenzie Center for Economic Freedom (2016), Instituto Borborema (2015), Livres (2016), Instituto Tropeiros (2016), Burke Instituto Conservador (2017), entre outros.

Em suma, pode-se dizer que os institutos liberais no Brasil atuam em duas grandes frentes: tentam influenciar ideologicamente “elites intelectuais”, sobretudo os segmentos importantes na formação da opinião pública e de conhecimento, como universidades (estudantes e docentes), mídia (jornalistas, influenciadores em redes sociais), políticos (partidos e movimentos), militares, juízes e advogados, entre outros – além, claro, do empresariado; e formulam propostas de políticas públicas de caráter liberal, bem como produzem conteúdo para influenciar a opinião pública na mídia e em redes sociais. Adiciona-se que essas organizações geralmente são compostas por empresários, políticos, “intelectuais” (filósofos, cientistas políticos, economistas) e profissionais liberais em geral (jornalistas, advogados etc.); obtêm recursos de doações – se declaram sem fins lucrativos – de pessoas físicas e jurídicas. Suas principais atividades são: tradução e divulgação de obras liberais; produção de artigos e estudos relacionados ao pensamento liberal e a temáticas econômicas e políticas contemporâneas; atuação em redes sociais diversas, bem como em rádio e televisão; realização de cursos e treinamentos para docentes e estudantes dentro e fora de universidades; criação de prêmios de jornalismo; elaboração de projetos propostas de políticas públicas; publicações mensais de revistas, cadernos e cartilhas; realização de eventos, conferências e seminários; e interações diversas com partidos, grupos políticos mídia e associações de classe.

É possível afirmar que as think tanks liberais brasileiras vêm buscando estreitar sua atuação no interior das IES em geral e das universidades em especial. Em primeiro lugar, buscam por expertise e por potenciais lideranças políticas (nesse caso, principalmente no meio estudantil), fator importante para embasar e legitimar suas atividades. Para a formação da Rede Liberdade no Brasil, foi necessário criar e aglutinar, dentro da rede, um corpo de especialistas nas áreas de economia, direito, ciência política, história, filosofia, sociologia, entre outros. Além disso, dado o contexto econômico e político, as IES e as universidades públicas passaram a ser instituições alvo de questionamento através de críticas e acusações que perpassam desde a questão de um suposto gasto público excessivo em educação superior, e a consequente necessidade de privatização do segmento, ao argumento de que as universidades são dominadas intelectualmente pelo pensamento de esquerda ou pelo marxismo.

Do ponto de vista histórico, a primeira think tank neoliberal brasileira foi criada em 1983 na cidade do Rio de Janeiro, denominado de Instituto Liberal – nos anos seguintes, o instituto foi se expandindo, através de filiais, em outras regiões do país, ainda que posteriormente muitas delas tenham fechado ao longo do tempo (Gros, 2002GROS, Denise Barbosa. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.). A iniciativa contou com a presença de alguns empresários brasileiros que também atuaram como ativistas neoliberais e possuíam ligação direta com membros do MPS, notadamente com o fundador da Rede Atlas, Antony Fisher, que os aconselhou no processo de fundação do IL (Gros, 2002GROS, Denise Barbosa. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.; Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Onofre, 2018ONOFRE, Gabriel da Fonseca. A Nova Direita no Brasil: o caso dos Institutos Liberais brasileiros. 2018. 368 f. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, 2018.). A ideia inicial era criar, no Brasil, uma organização semelhante ao britânico Institute of Economic Affairs. Para os fundadores do Instituto Liberal, seria necessário educar segmentos estratégicos da sociedade brasileira nos princípios de uma sociedade de livre mercado, tais como: estudantes e professores, jornalistas, empresários, políticos, advogados, entre outros grupos considerados formadores de opinião.

O Instituto Liberal desenvolveu iniciativas específicas voltadas ao ensino superior e ao público acadêmico. Segundo Gros (2002)GROS, Denise Barbosa. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002., os ILs em geral argumentavam que a educação – e, particularmente, o ensino de economia – no Brasil era dominado pelo marxismo e pelo keynesianismo. Junto a isso, dizia-se que a educação, desatualizada, não formava profissionais capacitados ao mercado de trabalho, pois era ideologizada. No âmbito do ensino superior, as filiais do IL divulgavam cursos e iniciativas acadêmicas alinhadas ao pensamento neoliberal, além de atuar junto a cursos de pós-graduação que se alinhavam com as perspectivas do instituto, realizando eventos em conjunto (Gros, 2002GROS, Denise Barbosa. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.). Ainda segundo a autora, o IL-RJ tentou criar um periódico acadêmico, em 1993, junto ao Foro Latino e a Fundação Francisco Marroquín (ambos da Guatemala). Além disso, o IL-RJ contribuiu à formação de um Núcleo Liberal fundado na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Já o Instituto Liberal de São Paulo definiu como prioridade a atuação no campo da educação no ano de 1989. Desenvolveu-se programas que pudessem auxiliar a aproximação entre universidade e empresa, com realizações de palestras, convênios, pesquisas, concursos de monografia, dentre outros. Como exemplo, pode-se citar o Prêmio Alfred Marshall – Concurso IL/Nestlé de monografias. O prêmio, datado de 1989 a 1997, foi patrocinado pela Nestlé; neste, premiavam-se as três melhores monografias feitas por estudantes universitários sobre temas pré-delimitados da economia liberal, julgados por uma comissão de docentes universitários. Gros (2002)GROS, Denise Barbosa. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002. também registrou convênios de pesquisa entre o IL-SP, a Unicamp e a USP; com a Universidade Presbiteriana Mackenzie, o IL-SP desenvolveu os programas Empresa na Escola e Escola na Empresa, nos quais palestras de empresários eram promovidas na universidade, bem como a visita de estudantes a empresas; na PUC-SP, desenvolveu-se o Curso de Integração Empresa-Escola, ministrado por docentes e empresários.

Além disso, Casimiro (2018)CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018. e Gros (2002)GROS, Denise Barbosa. Institutos liberais e neoliberalismo no Brasil da Nova República. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002. ressaltam que o IL elaborou algumas propostas de política pública voltadas à educação. No geral, defendia-se que a educação no Brasil, supostamente atrasada e corporativa, deveria passar por processos de privatização. Nesse aspecto, os autores mencionam que os ILs desenvolveram críticas a Lei de Diretrizes Bases da Educação (LDB) de 1996, argumentando que o Brasil não poderia basear um sistema de educação nacional em escolas públicas, bem como os investimentos governamentais deveriam ser direcionados ao ensino básico, defendendo a cobrança de mensalidades nas universidades públicas e a privatização do segmento. Defendia-se a ideia de voucher escolares, ou seja, determinado valor repassado às famílias, para utilização na educação básica, que optarem por serviços educativos privatizados e competitivos. Tal argumentação, bom salientar, já era defendida e disseminada por diversas organizações multilaterais, como Banco Mundial e FMI, característica do fenômeno da mercantilização pós neoliberalismo.

Além do IL, o Instituto de Estudos Empresariais (IEE) e o Instituto Liberdade (fundado em 2004 a partir do IL-RS) também buscaram estreitar relações com o mundo acadêmico (Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Gros, 2008GROS, Denise Barbosa. Considerações sobre o neoliberalismo como movimento ideológico internacional. Ensaios FEE, Porto Alegre, Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, v. 29, n. 2, p. 565-590, 2008.). Localizados na cidade de Porto Alegre (RS), ambos buscaram conexão com a PUC-RS, realizando eventos naquele espaço. Nota-se, especialmente, que o Instituto Liberdade mudou sua sede para o Tecnopuc (Parque Científico e Tecnológico da PUC-RS) em 2008, desenvolvendo, a partir daí, o Colóquio Instituto Liberdade 2008/2009, em articulação com a Faculdade de Administração, Contabilidade, Economia, Hotelaria e Turismo da PUC-RS. Além disso, o IEE organizava, no final dos anos 1990, o Fórum Universidade-Empresa na PUC-RS, buscando conectar empresários e universitários. Posteriormente, em 2004, o IEE transferiu a realização do próprio Fórum da Liberdade6 6 Desde 1988, o IEE organiza o Fórum da Liberdade, considerado um dos maiores eventos liberais do Brasil e da América Latina. O evento destina-se a debates sobre liberalismo e sobre temas relacionados às questões econômicas, políticas e sociais do país e do continente. para a mesma universidade.

A Atuação das think tanks Liberais no Campo do Ensino Superior e da Academia no Brasil

A partir da Rede Liberdade e das organizações parceiras, identificou-se uma série de iniciativas e projetos, por parte das think tanks liberais, especificamente voltados ao público acadêmico, buscando influenciar os campos do ensino, pesquisa, extensão e política universitária.

À vista disso, dois projetos foram criados para levar, em todas as regiões do Brasil, palestras e seminários dedicados à discussão de economia, política e empreendedorismo, sobretudo ao público estudantil (Ferreira, 2018FERREIRA, Eduardo Carvalho. Think tanks da nova direita e suas estratégias de cooptação: o caso do programa Imil (Instituto Millenium) na sala de aula (Think tanks of the new right and its cooptation strategies: the case of the program Imil (Instituto Millenium) in the classroom). Crítica Educativa, São Carlos, UFSCAR, v. 4, n. 2, p. 24-40, 2018.; Rocha, 2018ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54.): o projeto Liberdade na Estrada, criado em 2009 pelo think tank Instituto Ordem Livre; e o projeto denominado IMIL na Sala de Aula, criado pelo Instituto Millenium em 2011. A dinâmica de ambas as iniciativas é parecida: as organizações liberais enviam seus especialistas para IES a fim de organizar eventos e palestras dedicadas à disseminação do pensamento neoliberal, principalmente para alunos de graduação. Segundo Rocha (2018)ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54., tais projetos funcionam também como vínculo entre alunos, professores e os membros das think tanks que se identificam com as perspectivas teóricas e ideológicas do neoliberalismo; em muitos casos, os vínculos possibilitados pelos encontros estimulam a criação de grupos de estudo entre estudantes. A literatura consultada estima que o projeto Liberdade na Estrada atingiu, nos seus primeiros anos, cerca de 50 instituições de ensino superior no Brasil; e o projeto IMIL na Sala de Aula registrou a organização de 147 eventos acadêmicos até 2018. Tais iniciativas incluem instituições de ensino superior públicas e privadas em todas as regiões do país. Vale notar que o Instituto Millenium sempre visou o público acadêmico em seus eventos (Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.). Em termos de cursos contemplados pelo projeto, percebe-se a predominância das áreas da Economia, Administração (pública e privada), Contabilidade, Relações Internacionais e Direito, Engenharia, Marketing, entre outros.

Dando prosseguimento, identificou-se uma think tank liberal com vínculo institucional com uma universidade privada: criada em 2016, o Centro Mackenzie de Liberdade Econômica. Vinculado à Universidade Presbiteriana Mackenzie, o instituto se autodenomina como “Um Centro de Pesquisa Econômica Aplicada e think-tank liberal clássico brasileiro voltado para o debate em torno do papel do mercado e das características e consequências dos diferentes tipos de intervenção e regulação na economia brasileira” (CMLE, 2023CMLE, Centro Mackenzie de Liberdade Econômica. O que é o Centro Mackenzie de Liberdade Econômica? Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2023. Disponível em: https://www.mackenzie.br/liberdade-economica/quem-somos. Acesso em: 12 out. 2020.
https://www.mackenzie.br/liberdade-econo...
), atuando no ensino, pesquisa e extensão. Diferente dos projetos anteriormente citados, o CMLE realiza ações institucionalizadas no âmbito do ensino, pesquisa e extensão. O CMLE também é afiliado da Rede Atlas e um dos principais parceiros do Instituto Mises Brasil. Nesse sentido, a think tank busca trabalhar algumas perspectivas do liberalismo, especialmente a Escola Austríaca, a Economia Institucional e a Escola de Chicago. O centro é composto por pesquisadores vinculados à Universidade Mackenzie, em grande maioria com pós-graduação (mestrado e doutorado acadêmico e profissional), com expertise, principalmente, nas áreas de economia, finanças, administração e negócios. Destacadamente, o CMLE tenta realizar os projetos chamados de “índices” de liberdade econômica. Além disso, o CMLE vem tentando influenciar políticas públicas.

Outro exemplo importante dentro do debate sobre a atuação das think tanks liberais no campo acadêmico é o Students For Liberty Brasil (SFLB). Fundada em 2012, com o apoio das think tanks liberais existentes – como o Instituto Liberal, Instituto Millenium, Instituto de Estudos Empresariais, Instituto Liberdade (Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.) –, a organização constitui-se como uma filial da think tank norte-americana Students For Liberty, importando o modus operandi da matriz no Brasil. Já a organização norte-americana foi fundada em 2008 por estudantes universitários – segundo Gamber-Thompson (2016)GAMBER-THOMPSON, Liana. Bypassing the Ballot Box: How Libertarian Youth Are Reimagining the Political. In: JENKINS, Henry et al. By Any Media Necessary: The New Youth Activism. New York: New York University Press, 2016. P. 219-252., com apoio de megaempresários da indústria do petróleo, como os Irmãos Koch. De forma resumida, o Students For Liberty é uma organização que dá suporte material e treinamento para estudantes, principalmente de graduação, para que eles formem grupos de estudo e ativismo liberal no interior das IES. Esse treinamento de lideranças se dá em dois sentidos: os estudantes selecionados para participar da organização podem acessar treinamentos básicos sobre diversas vertentes e temáticas relacionadas ao liberalismo e libertarianismo; e, de forma mais significativa, podem realizar treinamentos de habilidades de gestão, comunicação e liderança.

Nessa linha, a SFLB emula as ações de sua matriz norte-americana: a organização brasileira desenvolve programas de formação de lideranças estudantis em nível nacional, regional e local; realiza diversos eventos, como congressos, palestras e seminários; desenvolve grupos de estudo liberais em IES; mantém blogs e redes sociais com postagens sobre liberalismo e sobre os malefícios da atuação estatal; dentre outras. Segundo Rocha (2018)ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54., desde a fundação da SFLB, já foram realizados mais de 650 eventos em instituições de ensino superior públicas e privadas, bem como a criação de cerca de 200 grupos de estudos liberais entre alunos de graduação. Assim, a partir das lideranças centrais do SFLB, a think tank neoliberal se ramifica em todo o país por meio de seus coordenadores, que levam as atividades do SFLB para IES de todo o país. O SFLB tem atuado como uma das principais think tanks neoliberais no Brasil, servindo de ponte entre a Rede Liberdade, Rede Atlas e SFL e o ensino superior no Brasil. Nota-se que o SFLB esteve ligado à origem e treinamento do próprio Movimento Brasil Livre (Rocha, 2018ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54.; Baggio, 2016BAGGIO, Kátia Gerab. Conexões ultraliberais nas Américas: o think tank norte-americano Atlas Network e suas vinculações com organizações latino-americanas. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DA ANPHLAC, 12., Mariana, 2016. Anais […]. Mariana: ANPHLAC, 2016.; Davis; Straubhaar, 2020DAVIS, Stuart; STRAUBHAAR, Joe. Producing Antipetismo: Media activism and the rise of the radical, nationalist right in contemporary Brazil. United Kingdom, International Communication Gazette, v. 82, n. 1, p. 82-100, 2020.; Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.).

Por fim, cabe comentar uma série de movimentos cujo objetivo central é disputar a política universitária. Em 2018, o MBL criou um projeto denominado MBL Estudantil (o projeto parece ter sido abandonado no ano seguinte), com o objetivo de combater o que consideram como “doutrinação esquerdista” na educação e, no campo do ensino superior, oferecer suporte à estudantes para que disputam eleições e grêmios estudantis – em âmbito nacional, questionar a legitimidade da União Nacional dos Estudantes. Assim, o MBL Estudantil foi criado para oferecer formação política a alunos que desejam formar grupos ativistas em instituições de ensino, oferecendo cursos e materiais didáticos para tal. Além desses treinamentos, foi criada uma plataforma em que os alunos podem expor professores que, a seu ver, estão praticando “doutrinação esquerdista” em escolas e universidades. Com propósito parecido, também é possível mencionar o Movimento Universidades Livres (UniLivres), criado em 2017, como uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos. Com o propósito de contestar a União Nacional dos Estudantes, o movimento alega propor uma alternativa à política estudantil que cultiva a verdadeira liberdade de ideias, partindo do diagnóstico de que a educação é um espaço dominado pelo pensamento de esquerda. A nosso ver, o MBL e o UniLivres potencializaram um fenômeno recorrente no Brasil: a perseguição a professores e professoras em todos os níveis de ensino, acusados de difundir o “marxismo cultural” – reforçando, por exemplo, pautas como o Escola Sem Partido.

A Atuação Acadêmica do Instituto Mises Brasil

O destaque ao Instituto Mises Brasil se deve pela gama diversificada de atividades desenvolvidas pelo instituto, pelo seu papel de liderança dentro da Rede Liberal e pelo volume de especialistas e membros reunidos e empregados pela organização. O IMB se destaca por se engajar na construção de uma agenda acadêmica de ensino, pesquisa e extensão que toma Escola Austríaca de Economia como baluarte teórico. Segundo as próprias lideranças do instituto, um dos maiores objetivos da organização é construir o que chamam de “Universidade Mises Brasil”, um centro acadêmico de referência nacional e internacional ao pensamento liberal de corte austríaco. Para isso, tentam influenciar estudantes e docentes, congregando-os na criação de estruturas de formação e de pesquisa próprios.

O IMB foi criado oficialmente em 2007, na cidade de São Paulo, localizando-se em um prédio comercial da cidade. Os sócios-proprietários e principais fundadores são Hélio Coutinho Beltrão, Ubiratan Jorge Iorio de Souza, Fernando Fiori Chiocca, e Cristiano Fiori Chiocca. Destes, apenas os dois primeiros7 7 Hélio Coutinho Beltrão é filho de Hélio Marcos Penna Beltrão, ministro da ditadura civil-militar, nas pastas de Planejamento (1967-1969) e Desburocratização (1973-1983). O presidente do IMB também é um empresário e acionista de diversos grupos, como do Grupo Ultra, Artesia Investimentos (mercado financeiro), Sextante Investimentos (mercado imobiliário), entre outros. Já Ubiratan Jorge Iorio, de perfil mais acadêmico, possui graduação em economia pela Uiversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestrado e doutorado em economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Atuou como docente em diversas universidades e faculdades, notadamente a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) – atualmente aposentado, é professor Associado do Departamento de Análise Econômica –, onde exerceu as funções de Diretor e Vice-diretor da Faculdade de Ciências Econômicas no final dos anos noventa e início dos anos 2000. prosseguiram no IMB, figurando enquanto as duas principais lideranças do instituto; os outros dois, após atritos e discordâncias sobre os rumos da organização em meados de 2014 e 2015, acabaram por sair e fundar o Instituto Rothbard Brasil. Outro nome importante, na ocasião da fundação e dos primeiros anos do instituto, foi Rodrigo Constantino, ex-jornalista da revista Veja e atualmente presidente do Instituto Liberal (Dal Pai, 2018DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018.). O objetivo declarado do instituto é

Em suas ações o IMB busca: I – promover os ensinamentos da escola econômica conhecida como Escola Austríaca; II – restaurar o crucial papel da teoria, tanto nas ciências econômicas quanto nas ciências sociais, em contraposição ao empirismo; III – defender a economia de mercado, a propriedade privada, e a paz nas relações interpessoais, e opor-se às intervenções estatais nos mercados e na sociedade. O IMB acredita que nossa visão de uma sociedade livre deve ser alcançada pelo respeito à propriedade privada, às trocas voluntárias entre indivíduos, e à ordem natural dos mercados, sem interferência governamental. Portanto, esperamos que nossas ações influenciem a opinião pública e os meios acadêmicos de tal forma que tais princípios sejam mais aceitos

(IMB, 2023IMB. Instituto Ludwig von Mises Brasil. Quem Somos. Mises Brasil, São Paulo, 2023. Disponível em: https://www.mises.org.br/About.aspx. Acesso em: 20 de out. 2018.
https://www.mises.org.br/About.aspx...
).

Como é possível notar, o IMB valoriza a produção e disseminação das ideias e teorias que defendem o livre mercado, dentro das vertentes político-ideológicas do instituto, buscando introduzi-las no debate político, na opinião pública e na academia.

Para isso, atualmente, o IMB conta com uma gama extensa de atividades tidas como acadêmicas e não acadêmicas: publicação de artigos de opinião escritos por especialistas vinculados ou não aos instituto; mantém um blog e realiza o Podcast Mises Brasil – em que, especialmente, entrevistam atores do campo conservador e liberal do país; atuação em redes sociais diversas, divulgando o pensamento austríaco e difamando o que consideram como pensamento coletivista/esquerda; e, em sua ala mais acadêmica, o instituto mantém atividade editorial, realiza conferências, seminários, cursos, edita uma revista acadêmica e organiza um curso de pós-graduação lato sensu em Escola Austríaca. Evidentemente, o IMB também se articula politicamente, principalmente através da Rede Liberdade8 8 Por exemplo, vale mencionar que alguns de seus membros ou ex-membros ocupam posições no executivo federal e no congresso nacional, como o caso de Geanluca Lorenzon, que assumiu a Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade do Ministério da Economia no governo de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes. , exercendo papel de liderança (Dal Pai, 2018DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018.). Das organizações estrangeiras, vale destacar a norte-americana Mises Institute, considerada pelo IMB como a sua principal referência. Assim, o instituto atua em três frentes, aliando um flanco acadêmico ao flanco do ativismo, dentro do seguinte tripé estratégico: divulgação e disseminação de conteúdo; articulação política e intelectual; e atividade editorial/acadêmica. Para realizar essas atividades, o instituto conta com um quadro de 34 especialistas, bem como uma lista de 450 autores que já publicaram artigos no site do IMB.

Em âmbito organizacional, o Instituto Mises Brasil é presidido por Hélio Coutinho Beltrão (fundador e presidente do instituto desde então). Retomando Dal Pai (2018)DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018., além da presidência, o IMB conta com postos de diretorias e vice-diretorias de edição e acadêmica, possui tradutores, bem como responsáveis pela realização dos projetos do instituto. Para financiar tais projetos, o instituto alega trabalhar com doações, contando também com um programa de associados. De forma geral, o perfil da maioria dos principais especialistas do IMB é acadêmico – representado por docentes e pós-graduandos de instituições de educação superior públicas ou privadas – e profissionais liberais. Em termos de expertise, nota-se a presença de cientistas políticos, advogados, economistas, entre outros.

Uma análise da atuação intelectual (artigos, textos, palestras, etc.) desses membros do IMB revela uma gama ampla de temáticas abordadas: princípios, história e fundamentos da teoria austríaca de economia, debate sobre ciclos econômicos, epistemologia e filosofia da ciência (aplicada à escola austríaca); mas também assuntos “aplicados”, como economia brasileira, políticas públicas, desregulamentação e privatização, cenário político nacional, mobilidade urbana, educação, debate sobre bitcoins, entre outros. Através dessa expertise, os especialistas atuam, individualmente e pelo IMB, dentro da Nova Direita, sobretudo através da realização de palestras, cursos, escrita para jornais e revistas (atualmente, por exemplo, Hélio Beltrão é colunista na Folha de São Paulo), entre outras ações.

Quanto ao histórico de surgimento, vale destacar alguns pontos. Retomando Casimiro (2018)CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018., o IMB foi lançado de forma pública em 2010, no XXIII Fórum da Liberdade. Em termos contextuais, segundo Dal Pai (2018)DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018. e Rocha (2018)ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54., dois fatores geraram estímulos à criação da organização: a necessidade de se fazer oposição ao governo do Partido dos Trabalhadores – considerado como coletivista e socialista; e o panorama de crise econômica global escancarada em 2008, exigindo-se atuar na “guerra das ideias” para propor saídas ainda mais liberalizantes. Além disso, presenciava-se também o fortalecimento de grupos de direita e extrema-direita a nível global, dos quais as próprias think tanks liberais podem ser enquadradas (Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Dal Pai, 2018DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018.). Não obstante, o movimento liberal que ganhava força nessa época buscou construir a ideia de que, no Brasil, o liberalismo verdadeiro nunca havia sido implementado de fato. Nesse sentido, tanto os fundadores do IMB quanto as outras think tanks liberais colocavam-se como uma “resistência liberal ao status quo intervencionista e socialista” que prevaleceria no Brasil e na América Latina. Nesse sentido, tais organizações centraram ataque a governos progressistas, disseminando alternativas que caminham à forte redução da atuação do Estado na economia (Baggio, 2016BAGGIO, Kátia Gerab. Conexões ultraliberais nas Américas: o think tank norte-americano Atlas Network e suas vinculações com organizações latino-americanas. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DA ANPHLAC, 12., Mariana, 2016. Anais […]. Mariana: ANPHLAC, 2016.; Ladi; Lazarou; Hauck, 2018LADI, Stella; LAZAROU, Elena; HAUCK, Juliana. Brazilian think tanks and the rise of austerity discourse. Policy and Society, United Kingdom, v. 37, n. 2, p. 222-242, 2018.; Kaysel; Codas; Cruz, 2015KAYSEL, André; CODAS, Gustavo. Direita, Volver! O retorno da direita e o ciclo político brasileiro. São Paulo: Fundação Perseu Àbramo, 2016.; Barbosa, 2016BARBOSA, Jefferson. Protestos da direita no Brasil contemporâneo: think tanks, grupos empresariais, intelectuais e aparelhos orgânicos da burguesia. Lutas Sociais, São Paulo, v. 20, n. 36, p. 151-165, 2016.; Casimiro, 2018CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Cepêda, 2018CEPÊDA, Vera Alves. A Nova Direita no Brasil: contexto e matrizes conceituais. Mediações –Revista de Ciências Sociais, Londrina, v. 23, n. 2, p. 40-74, 2018.).

Por fim, é interessante destacar um episódio importante na história do IMB: a cisão entre alguns dos fundadores do instituto, aparentemente ocorrida em 2015, que resultou na expulsão de Cristiano e Fernando Chiocca do IMB (Dal Pai, 2018DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018.). Entre os diversos pontos de divergências entre os fundadores, pode-se destacar dois: a acusação, por parte dos irmãos Chiocca, de que o IMB estava fugindo à ortodoxia do liberalismo de corte austríaco e, ligado a isso, estaria se aproximando demasiadamente de grupos políticos (como por exemplo, o Partido Novo) e da academia. Na nota dos próprios fundadores do Instituto Rothbard (Chiocca, 2015CHIOCCA, Cristiano Fiori. IMB sob nova direção. Instituto Rothbard, 2015. Disponível em: https://rothbardbrasil.com/imb-sob-nova-direcao/. Acesso em: 17 de jul. 2022.
https://rothbardbrasil.com/imb-sob-nova-...
, p. 1):

O IMB não pode, não deve e não será ligado a nenhum grupo empresarial ou de institutos empresariais; O IMB não terá ligações com entidades estudantis de nenhuma natureza; O IMB não terá nenhuma ligação com partidos políticos de nenhuma vertente ou linha ideológica; O IMB não é uma instituição acadêmica e o nosso campo de atuação é muito mais abrangente, não cabendo nas limitações de instituições dessa natureza […] Ele [Hélio Beltrão] insistiu na criação da Revista Mises, com o objetivo de fazer parte do mundo acadêmico e tentar influenciá-lo.

Como é possível notar, uma das divergências ocorridas entre os fundadores do IMB consistia na atuação do instituto no meio acadêmico. Em primeiro lugar, atuar na academia representaria um desvio das verdadeiras correntes do austrolibertarianismo, reconhecidamente pouco presente nos âmbitos de produção de conhecimento acadêmico no mundo e no Brasil; além disso, a aproximação com a academia prejudicaria a ação livre do instituto enquanto organização destinada a cultivar determinada doutrina pura que, segundo os fundadores do Instituto Rothbard, estaria se expandindo cada vez mais no questionamento do mainstream (seja ele político, acadêmico, cultural, etc.), não podendo ser “contaminada” por ele.

No final das contas, a partir de 2015, o IMB começou a fortalecer seus projetos que visavam “academizar” a produção de conhecimento em Escola Austríaca, editando uma revista acadêmica, realizando conferências, seminários, cursos, bem como atuando em IES com vistas a influenciar a agenda de pesquisa, ensinos e extensão destas. Através desses projetos, a organização mira, principalmente, o público acadêmico, como estudantes de graduação e pós-graduação, pesquisadores e docentes nas ciências humanas e sociais. Na visão das lideranças do IMB, a aproximação com o meio acadêmico teria duas funções primordiais: compor e renovar seu quadro de especialistas, formando mão de obra capacitada para levar a cabo seus projetos mais ambiciosos; e, por outro lado, constituir nichos de atuação dentro das próprias IES, influenciando o ensino, pesquisa e extensão destas à divulgação da Escola Austríaca no meio acadêmico, sobretudo através da atuação de seus membros e da conexão que possui com outras think tanks liberais, como o próprio CMLE, o SFLB e o Instituto Liberal do Nordeste. No limite, o instituto considera que, ao aproximar-se da academia, ganha mais credibilidade e legitimidade em sua atuação e na proposição de políticas públicas.

Os Projetos Acadêmicos do IMB

Desde sua fundação, o IMB possui projetos no campo editorial, bem como realiza eventos autodenominados de acadêmicos. Através de uma série de livros traduzidos e disponibilizados, o instituto oferece um guia de estudos sobre a Escola Austríaca. No acervo do IMB, encontram-se temáticas relacionadas à teoria liberal, ao Estado, ao combate ao socialismo, bem como à exposição dos princípios da Escola Austríaca. Dentre os autores publicados, destacam-se as principais referências: Bastiat, Ludwig von Mises e Friedrich A. Hayek. Figuram, também, nomes como Hans Hermann Hoppe, filósofo e economista alemão, membro sênior do Mises Institute; Ron Paul, político liberal-conservador estadunidense; Jesús Huerta de Soto, economista da Universidade Rey Juan Carlos de Madri e membro da Sociedade Mont Pelerin; e Murray N. Rothbard, um dos maiores expoentes intelectuais do libertarianismo e anarcocapitalismo. O acervo também conta com autores do próprio IMB ou de outras think tanks liberais brasileiras ou estrangeiras. Cabe notar que alguns desses livros são disponibilizados gratuitamente para download (total de 54 obras). Além disso, o instituto disponibiliza e divulga uma coletânea de trabalhos acadêmicos que se utilizaram do arcabouço conceitual da Escola Austríaca.

Além disso, Hélio Beltrão e Alex Catharino (membro do IMB) encabeçaram a criação de uma editora, chamada Liberdade, Valores e Mercado (LVM Editora), fundada em 2017, a qual se dedica à publicação de autores liberais e conservadores. As lideranças do IMB identificaram demandas relacionadas à debates mais específicos sobre direito, filosofia e política, principalmente ligadas ao pensamento conservador. Bom mencionar que a editora do IMB se junta ao mercado editorial da Nova Direita no Brasil, que expandiu suas publicações de cunho conservador e liberal ao longo dos últimos (Silva, 2018SILVA, Leonardo Nóbrega. O mercado editorial e a nova direita brasileira. Teoria e Cultura, Juiz de Fora, v. 13, n. 2, 2018.).

Além da atividade editorial, o IMB vem buscando se aproximar do campo acadêmico através de eventos e cursos. Por exemplo, umas das primeiras iniciativas de destaque consistiu em um curso de extensão, com sessenta horas-aula de duração, chamado Curso de Iniciação de Escola Austríaca, realizado em 2011, na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Na chamada do evento, no site do IMB, dizia-se que o principal objetivo do curso era introduzir de forma teórica e sistemática os princípios da Escola Austríaca. No entanto, o IMB também costuma promover conferências acadêmicas com a finalidade de debater o “estado da arte” da Escola Austríaca de Economia, bem como assuntos políticos e econômicos contemporâneos. Esses eventos, inicialmente, foram chamados de Seminários de Escola Austríaca (2010 e 2011), mas, a partir de 2012, foram renomeados como Conferência de Escola Austríaca, ocorrendo a cada dois anos. Até 2019, realizaram-se seis eventos, nos anos de 2010, 2011, 2012, 2014, 2017 e 2019. De forma resumida, tais conferências, com o apoio de outras organizações liberais e patrocínio de empresas (como Standart Bank, Banco UBS, Localiza e Gerdau), caracterizam-se pela reunião de uma série de especialistas e intelectuais de referência em Escola Austríaca, nacionais e estrangeiros, com destaque à participação de membros do Mises Institute e do próprio IMB. Nestas, também são lançados trabalhos e livros, realiza-se concursos de artigos, dentre outras atividades.

Além dos eventos, o IMB tem a intenção de criar uma “comunidade” de pesquisa libertária, estimulando a publicação de estudos nesta linha ideológica. Para isso, foi criada a Revista MISES: Interdisciplinary Journal of Philosophy, Law and Economics, periódico acadêmico do Instituto Mises Brasil, iniciado em 2013, com a gerência do próprio IMB e apoio da Atlas Network. O instituto se esforça para divulgar o periódico para um público amplo, com canais e perfis próprios nas redes sociais. Atualmente, a Revista Mises tem os seguintes objetivos:

Garantir a publicação intelectual de professores e pesquisadores, brasileiros e de outros países, estudiosos da Escola Austríaca de Economia e temas relacionados. A revista é publicada em inglês, espanhol e português. […].

Objetivos e Políticas Editoriais:

• Estimular estudantes, profissionais e pesquisadores sobre os temas da Escola Austríaca de Economia;

• Possibilitar o intercâmbio entre instituições de ensino, institutos e think-tanks;

• Promover a divulgação da abordagem interdisciplinar da Escola Austríaca;

• Servir como veículo de educação continuada e permanente em princípios de livre mercado e de uma sociedade livre

(Mises, 2022MISES, MISES: Interdisciplinary Journal of Philosophy, Law and Economics. About: Scope and Editorial Policy. Mises, São Paulo, 2022. Disponível em: https://revistamises.org.br/misesjournal/scope. Acesso em: 3 out. 2022.
https://revistamises.org.br/misesjournal...
, s.p., tradução livre9 9 Do original: “Its purpose to ensure the intellectual publication of professors and researchers, Brazilian and from other countries, scholars of the Austrian School of Economics and related topics. The journal is published in English, Spanish and Portuguese. […]. Goals and Editorial Policy: • Stimulate the interest of students, professionals, and researchers in the Austrian Economics School; • Enable the exchange of information between educational institutions, institutes and think-tanks; • Promote the dissemination of Austrian Economics interdisciplinary approaches; • Serve as a vehicle for continuing and permanent education in principles of free market and of a free society. ).

Percebe-se que o periódico é colocado como uma ferramenta de defesa do “livre mercado e de uma sociedade livre” através da promoção de uma “educação continuada e permanente” dentro da doutrina. Através deste, com efeito, criar-se-ia um canal de comunicação e de estímulo intelectual à produção acadêmica em Escola Austríaca no Brasil. Outro ponto de destaque é a ponte – “intercâmbio” – que o periódico pretende realizar entre think tanks e a academia, servindo como uma espécie de elo de mediação entre as organizações liberais e as universidades. É bom ressaltar que a Revista Mises busca operar dentro das regras que regem os periódicos acadêmicos brasileiros, sobretudo aos critérios estabelecidos pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), contando com revisão por pares (ad hoc, avaliação cega) e indexação em bases acadêmicas (Diadorim, PKP Index, Google Schoolar, DOAJ – Directory of Open Access Journals, OASIS). Assim como as outras atividades acadêmicas do IMB, a revista tentou estabelecer um rol de temáticas nas áreas de economia, direito, ciência política e filosofia. Dentro destas publicações, encontram-se cerca de 15 textos do próprio Ludwig von Mises, 13 textos de Murray Rothbard, 7 textos de Hayek, além de artigos de Carl Menger, Hermann-Hoppe e Jesús Huerta de Soto. O periódico conta com a publicação de artigos de pesquisa, ensaios e insights, resenha de livro, e resumo de teses e dissertações. Destaca-se que muitos artigos publicados pertencem ao próprio corpo de especialistas do IMB e do Mises Institute.

Por fim, pode-se retomar outro projeto acadêmico do IMB, a Pós-Graduação em Escola Austríaca (PGEA). Criada em 2016, constitui-se enquanto um curso de especialização presencial, na modalidade Lato Sensu. É realizada na UniÍtalo, na cidade de São Paulo (a instituição educacional, em parceria com o IMB, hospeda o curso e auxilia no gerenciamento), possuindo duração de dezoito meses e uma carga horária de aproximadamente 400 horas-aula. Para ingresso, os candidatos precisam passar por um processo seletivo que envolve análise de currículo e entrevista. Corroborando com Dal Pai (2018)DAL PAI, Raphael Almeida. Instituto Ludwig Von Mises Brasil: os arautos do anarcocapitalismo. 2018. 228 f. Dissertação (Mestrado em História) – Programa de Pós-Graduação Mestrado em História, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Marechal Cândito Rondon, 2018., a intenção do IMB foi de potencializar a formação de quadros acadêmicos austríacos, impulsionando intelectualmente o movimento libertário. Na descrição da própria página oficial da PGEA, justificando a importância da pós-graduação (PGEA, 2019PGEA. Pós-Graduação em Escola Austríaca. Sobre Nós. Mises Brasil, São Paulo, 2019. Disponível em: https://www.pgea.com.br/sobre_nos/. Acesso em: 20 de set. de 2019.
https://www.pgea.com.br/sobre_nos/...
, s.p.):

É cada vez maior, no mundo todo, o crescimento da chamada Escola Austríaca de Economia, cujas ideias centrais fundamentam-se na defesa do liberalismo e na demonstração de sua superioridade em relação a outros sistemas político-econômicos, como o socialismo e o intervencionismo. Apesar de ainda não fazer parte do mainstream acadêmico, a Escola Austríaca não é mais uma completa desconhecida.

De forma mais específica, o curso é composto por vinte disciplinas (dezenove temáticas e uma disciplina de metodologia de pesquisa científica). Tais disciplinas perpassam uma gama variada de conteúdo, abordando desde as origens e fundamentos da escola austríaca, metodologia, debates sobre mercado, capital, os problemas do socialismo, intervencionismo, direito e economia, liberalismo, ciclos econômicos, políticas públicas, democracia e liberdade. No que se refere ao corpo docente da PGEA, destaca-se os próprios especialistas do IMB.

A Visão do IMB sobre Educação Superior

Há uma série de artigos, vinculados pelo site do IMB, que versam sobre temáticas relacionadas à educação, universidade, ciência, entre outros10 10 Para encontrar os artigos, utilizou-se os filtros de pesquisa: educação; educação superior; ciência; doutrinação; conhecimento; universidade; academia; intelectual. Selecionou-se cerca de 35 artigos. . De forma geral, o IMB dissemina a ideia de que, idealmente, a educação e a ciência não poderiam ficar sob jugo e controle do Estado, tanto no que se refere à existência de instituições públicas quanto à própria regulação do setor privado. Em outras palavras, dentro do pensamento austrolibertário, a educação e a ciência não podem ser consideradas direitos, nem bens públicos, mas mercadorias, pois a propriedade privada e o processo de mercado tratariam de melhor regular os serviços educativos e científicos. O controle do Estado, para além da ineficiência, também traria consigo o problema da “doutrinação ideológica”, visto que o ensino público visaria padronizações curriculares e temáticas, bem como vinculação, por se tratar de aparelhos estatais, a ideologias “estatistas” ou, em casos de guerra cultural, das ideologias marxistas e esquerdistas. Vale destacar que o IMB trabalha com a ideia de que as universidades e os intelectuais e acadêmicos têm alta predisposição ao “marxismo cultural”, lançando mão da ideia de doutrinação de esquerda, bem como a noção, cultivada pelo movimento neoliberal, de que os intelectuais em sua maioria têm predisposição para o socialismo.

Em outras palavras, seguindo a corrente do austroliberalismo, argumenta-se que a educação não é um direito social, mas uma mercadoria e que, por conta disso, será mais bem provida, em termos de qualidade e eficiência de recursos, se entregue à iniciativa privada, com a mínima regulação possível. O problema da educação estatal, por sua vez, reside na utilização coercitiva de recursos proveniente de impostos (lembra-se do jargão “imposto é roubo”) para financiar, sempre de forma ineficiente, uma educação pública que, no limite, doutrina os estudantes principalmente com ideologias estatistas e coletivistas. Nesse sentido, o IMB também argumenta que, especialmente no campo do ensino superior, os cursos e formações não estão alinhadas às reais demandas do mercado.

Isso culmina, grosso modo, em duas propostas políticas: na privatização ampla do sistema educacional e científico; e na necessidade de se defender o chamado “homeschooling” – ou seja, o “direito” de que as famílias optem por não se submeter à educação estatal e nem à educação privada convencional, visto que ela está regulada pelo Estado. Em termos mais pragmáticos, reconhecendo-se a impossibilidade de atingir completamente tais propostas em curto e médio prazo, o IMB defende que a educação deveria, nesse sentido, ser desregulamentada e privatizada o máximo possível – no campo da educação superior, ratificando os argumentos de cobrança de mensalidades em IES públicas, aplicações de vouchers, estímulo ao financiamento privado e a parceria universidade-empresa, dentre outros.

Para além da privatização das universidades públicas, pode-se dizer que o IMB defende a agenda de privatização da própria ciência. Em artigo veiculado no site do Instituto Rothbard chamado Ciência Financiada pelo Livre Mercado versus Ciência Estatal (Reisman, 2010REISMAN, George. Ciência financiada pelo livre mercado versus ciência estatal. Instituto Rothbard, 2010. Disponível em: https://rothbardbrasil.com/ciencia-financiada-pelo-livre-mercado-versus-ciencia-estatal/. Acesso em: 2 out. 2022.
https://rothbardbrasil.com/ciencia-finan...
), cujo autor é professor emérito da economia da Pepperdine University, nos EUA, argumenta-se o seguinte:

Em um livre mercado, a ciência se origina na mente de cada cientista em particular, que estudou e pensou sobre os problemas que lhe interessam. Agindo desta maneira, esses cientistas podem, de tempos em tempos, chegar a novas descobertas, as quais eles desenvolvem em maior profundidade, sempre verificando os resultados. No decurso de seu trabalho e na disseminação dos resultados, eles frequentemente precisam de mais financiamento, os quais eles próprios podem obter. Nesse caso, inspirados pelo valor que veem em seu trabalho, eles recorrem a outros indivíduos para tentar obter os fundos necessários, persuadindo-os a compreender a essência do seu trabalho e do seu valor. Em um livre mercado, a principal fonte de financiamento seriam empresários ricos e herdeiros abastados

(Reisman, 2010REISMAN, George. Ciência financiada pelo livre mercado versus ciência estatal. Instituto Rothbard, 2010. Disponível em: https://rothbardbrasil.com/ciencia-financiada-pelo-livre-mercado-versus-ciencia-estatal/. Acesso em: 2 out. 2022.
https://rothbardbrasil.com/ciencia-finan...
).

Em outras palavras, o hipotético livre mercado defendido pelo artigo daria vazão ao cientista realmente criativo, conectado ao empresário interessado em financiar suas pesquisas. Este cientista, além disso, deveria desenvolver a habilidade de convencimento e persuasão para que consiga financiamento na iniciativa privada. Em outras palavras, a ciência é resumida à figura do “cientista criativo”, ignorando-se todo o processo de descoberta institucionalizada que envolve, em uma sociedade capitalista, o Estado, o setor privado, organizações públicas de educação e pesquisa, dentre outros. Em contraste, a ciência estatal mataria o suposto “ethos” científico da criatividade e da inovação.

No entanto, como todo o artigo buscou demonstrar, apesar de rechaçar o ensino superior enquanto instituição pública, os institutos liberais, e o IMB em especial, dão grande importância para a atuação nas IES e nas universidades públicas. Isso porque reconhecem a importância, em termos de legitimidade (expertise, formação da opinião pública, produção de conhecimento, formação de lideranças e de intelectuais etc.) dos aparelhos educativos e de pesquisa, concentrando uma “massa intelectual” importante que não pode deixar de ser mobilizada. Além disso, a disputa por hegemonia nestes espaços, justamente, visaria alterar ou amenizar uma suposta correlação de forças político-ideológicas que fazem com que as IES sejam dominadas pelo “esquerdismo” e pelo “marxismo cultural”.

Conclusão

Ao longo do artigo, vimos como as think tanks liberais, a partir de redes organizadas, atuam na ‘guerra das ideias’, mobilizando seus especialistas para tal. Nesse sentido, atuar no campo do ensino superior e acadêmico torna-se algo importante. Em primeiro lugar, para disputar o ambiente intelectual – seguindo a tese de Hayek de que a longo prazo, o ambiente intelectual intervencionista havia dominado os circuitos culturais, midiáticos e de produção de conhecimento; em segundo lugar, para recrutar seus especialistas e expertise, visto que a busca por legitimidade acadêmica é importante para algumas think tanks liberais. No Brasil, desde a fundação do Instituto Liberal em 1983, essas organizações vêm buscando aproximação com o ambiente acadêmico. Questionando o ensino e a pesquisa realizadas nas IES quanto a validade do conhecimento produzido ao mercado e à guinada à doutrinação de esquerda, defendendo a privatização das instituições públicas e a desregulamentação do setor, a cobrança de mensalidades e os vouchers, as think tanks liberais vem buscando articular projetos e iniciativas particularmente voltadas ao campo do ensino superior e acadêmico.

No caso do Instituto Mises Brasil, observou-se que a organização objetiva constituir um centro de pensamento acadêmico em Escola Austríaca no Brasil. Para isso, vem tentando fortalecer seu quadro de especialistas, aumentando sua atuação em ambientes acadêmicos, pois avalia-se que a credibilidade do conteúdo produzido pela organização passa pela necessidade de legitimação científica – não à toa, argumentam à neutralidade do pensamento liberal. Assim, o IMB vem construindo aparelhos de formação e de produção de conhecimento próprios, articulando uma comunidade de pesquisa em Escola Austríaca. Destaca-se que, junto ao Students For Liberty Brasil, o instituto vem fazendo a ponte entre a Rede Liberdade e o campo do ensino superior – de forma agregada, a atuação das think tanks liberais vem criando nichos no interior de diversas IES no país. Reforçando argumentos privatistas à educação, bem como endossando a tese da doutrinação esquerdista nas instituições educativas e de ciências, o IMB também contribui para o reforço de pautas como o Escola Sem Partido.

Assumindo que, junto à Nova Direita, as think tanks liberais vem aumentando sua atuação no ensino superior e na academia, seria possível postular que essas organizações vêm constituindo-se como atores relevantes nos processos históricos de mercantilização e privatização do ensino superior e da universidade, considerando a conjuntura política dos últimos dez anos. Influenciando a opinião pública, atuando significativamente em redes sociais e buscando influenciar políticas públicas, tais organizações contribuem diretamente à contestação – via direta e neoliberalismo – das IES públicas no país; em reforço, desenvolvem estratégias de atuação no ensino, na pesquisa, na extensão e na política universitária, buscando disputar o campo educacional.

Notas

  • 1
    O artigo traz parte dos resultados de uma tese de doutorado com o objetivo de mapear e analisar a atuação das think tanks neoliberais brasileiras no campo do ensino superior e da ciência (Cristofoletti, 2021CRISTOFOLETTI, Evandro Coggo. Disputando hegemonia no ensino superior e na universidade: a atuação das think tanks liberais brasileiras na academia. Campinas: Unicamp, 2021. 398 p. Tese (Doutorado em Política Científica e Tecnológica) – Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica, Instituto de Geociências, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2021. ). Assim, o artigo traz um recorte do estudo, focado no IMB (um dos estudos de caso conduzidos apresentados na tese).
  • 2
    Grosso modo, as think tanks podem ser caracterizadas como organizações que mobilizam conhecimentos acadêmicos (ou que se dizem acadêmicos) para a proposição de políticas públicas ou para influenciar a opinião pública (Hauck, 2017HAUCK, Juliana Cristina Rosa. What are ‘Think Tanks’? Revisiting the Dilemma of the Definition. Brazilian Political Science Review, São Paulo, v. 11, n. 2, 2017.; Medvetz, 2008MEDVETZ, Thomas. Think tanks as an emergent field. New York: Social Science Research Council, 2008.; Pautz, 2012PAUTZ, Hartwig. Revisiting the think-tank phenomenon. Public Policy and Administration, v. 26, n. 4, p. 419-435, 2012.).
  • 3
    Neste artigo, não buscaremos debater o que é o neoliberalismo. Para mais, ver: Fine; Saad-Filho (2017)FINE, Ben; SAAD-FILHO, Alfredo. Thirteen things you need to know about neoliberalism. Critical Sociology, v. 43, n. 4-5, p. 685-706, 2017., Plehwe, Slobodian e Mirowski (2020)PLEHWE, Dieter; SLOBODIAN, Quinn; MIROWSKI, Philip (Ed.). Nine lives of neoliberalism. Rio de Janeiro: Editora Verso, 2020., Dardot e Laval (2016)DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo Editorial, 2016., Harvey (2005)HARVEY, David. O Neoliberalismo: História e Implicações. São Paulo: Edição Loyola, 2005. e Andrade (2019)ANDRADE, Daniel Pereira. O que é o neoliberalismo? A renovação do debate nas ciências sociais. Sociedade e Estado, Brasília, v. 34, n. 1, p. 211-239, 2019..
  • 4
    As organizações diretamente ligadas à Atlas Network são: Instituto Atlantos, Instituto de Estudos Empresariais, Instituto de Formação de Líderes (Minas Gerais, São Paulo e Santa Catarina), Instituto Liberal (RJ), Instituto Liberal de São Paulo; Instituto Liberdade, Instituto von Mises Brasil, Instituto Millenium, Líderes do Amanhã, Livres, Mackenzie for Economic Freedom e Students for Liberty Brasil.
  • 5
    Utiliza-se esse termo para denotar, de forma mais pragmática, uma série de atores políticos, classificados no campo da direita e da extrema-direita, que ganharam força e protagonismo político-ideológico ao longo dos últimos dez anos. Para mais, ver Rocha (2018)ROCHA, Camila. O boom das novas direitas brasileiras: financiamento ou militância. In: SOLANO, Esther et al. (Org.). O ódio como política: a reinvenção das direitas no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018. P. 48-54. e Casimiro (2018)CASIMIRO, Flávio Henrique Calheiros. Nova Direita, aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018. – ambos partem de leituras e interpretações diferentes dos fenômenos.
  • 6
    Desde 1988, o IEE organiza o Fórum da Liberdade, considerado um dos maiores eventos liberais do Brasil e da América Latina. O evento destina-se a debates sobre liberalismo e sobre temas relacionados às questões econômicas, políticas e sociais do país e do continente.
  • 7
    Hélio Coutinho Beltrão é filho de Hélio Marcos Penna Beltrão, ministro da ditadura civil-militar, nas pastas de Planejamento (1967-1969) e Desburocratização (1973-1983). O presidente do IMB também é um empresário e acionista de diversos grupos, como do Grupo Ultra, Artesia Investimentos (mercado financeiro), Sextante Investimentos (mercado imobiliário), entre outros. Já Ubiratan Jorge Iorio, de perfil mais acadêmico, possui graduação em economia pela Uiversidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestrado e doutorado em economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Atuou como docente em diversas universidades e faculdades, notadamente a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) – atualmente aposentado, é professor Associado do Departamento de Análise Econômica –, onde exerceu as funções de Diretor e Vice-diretor da Faculdade de Ciências Econômicas no final dos anos noventa e início dos anos 2000.
  • 8
    Por exemplo, vale mencionar que alguns de seus membros ou ex-membros ocupam posições no executivo federal e no congresso nacional, como o caso de Geanluca Lorenzon, que assumiu a Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade do Ministério da Economia no governo de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes.
  • 9
    Do original: “Its purpose to ensure the intellectual publication of professors and researchers, Brazilian and from other countries, scholars of the Austrian School of Economics and related topics. The journal is published in English, Spanish and Portuguese. […]. Goals and Editorial Policy: • Stimulate the interest of students, professionals, and researchers in the Austrian Economics School; • Enable the exchange of information between educational institutions, institutes and think-tanks; • Promote the dissemination of Austrian Economics interdisciplinary approaches; • Serve as a vehicle for continuing and permanent education in principles of free market and of a free society.
  • 10
    Para encontrar os artigos, utilizou-se os filtros de pesquisa: educação; educação superior; ciência; doutrinação; conhecimento; universidade; academia; intelectual. Selecionou-se cerca de 35 artigos.

Disponibilidade dos dados da pesquisa

o conjunto de dados de apoio aos resultados deste estudo está publicado no próprio artigo.

Referências

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Editado por

Editor responsável: Luís Armando Gandin

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Jul 2021
  • Aceito
    31 Maio 2023
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