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O mito da crise de hegemonia e a formação do poder global estadunidense* * Agradecimentos à professora Vera Lúcia Lemos Rodrigues pela revisão do texto e ao professor doutor Fernando Henrique Lemos Rodrigues pelas críticas e sugestões.

The myth of hegemony crisis and the making of US global power

Resumo

Este artigo tem por objetivo avaliar os limites do debate acerca da crise de hegemonia dos Estados Unidos na década de 1970. Nossa hipótese é que a crise daquele período não correspondeu à crise de hegemonia - à revelia dos questionamentos a ela. Argumentaremos que, ao longo do pós-guerra, os EUA construíram as bases de um poder global que se consolidaram no decorrer daquela quadra e da seguinte, mediante o alicerçamento dos parâmetros formatadores do sistema interestatal - segurança, moeda/finanças, produção/tecnologia. A crise da década corresponde, por conseguinte, não à crise de hegemonia, mas ao antagonismo entre os limites da autonomia dos Estados Nacionais e a ascensão de uma ordem econômica transnacional, em cujo vértice se situa o poder global estadunidense.

JEL: F40, F62, P16, N12.

Palavras-chave
Estados Unidos; Hegemonia; Poder global

Abstract

This article aims to assess the limits of the debate on the crisis of hegemony in the United States in the 1970s. We raise the thesis that the crisis of this decade did not correspond to the supposed crisis of hegemony - despite the questions raised against it. We will argue that during the post-war period, the USA built the foundations of a global power that were consolidated during this and the following decade, through the foundation of the formatters parameters of the interstate system - security, currency/finance, production/technology. The crisis of the decade corresponds, therefore, not to a crisis of hegemony, but to the antagonism between the limits of the autonomy of National States and to the rise of a transnational economic order, whose vertex situated the American global power.

Keywords
United States; Hegemony; Global power

Introdução

Em sua origem etimológica, a palavra “crise” pode ser entendida como um momento decisivo, uma possibilidade de mudança súbita, uma quebra de rotina ou uma fase de desarmonia que pode alterar determinada relação ou objeto1 * Agradecimentos à professora Vera Lúcia Lemos Rodrigues pela revisão do texto e ao professor doutor Fernando Henrique Lemos Rodrigues pelas críticas e sugestões. . Em termos socioeconômicos, a palavra crise é geralmente usada para realçar os descompassos no ritmo de atividade econômica em direção a uma situação de estagnação ou de depressão, ou para reforçar determinados conflitos geopolíticos derivados de interesses antagônicos.

A década de 1970 foi propícia ao uso do termo, geralmente empregado para analisar, compreender e avaliar as nuances e as características socioeconômicas observadas no período. Após aproximadamente vinte e cinco anos de elevado crescimento econômico, a economia mundial passou por sérios distúrbios macroeconômicos e geopolíticos. A taxa média de crescimento mundial, que, entre 1950-1973, esteve em um patamar aproximado de 5% a.a., caiu para algo próximo de 3% a.a. nos vinte e cinco anos sucessivos - 2,1% a.a. na Europa Ocidental (Maddison, 2001MADDISON, A. World Economy - A Millennial Perspective. Development Centre Seminars - OECD, 2001., p. 126). A taxa de inflação, que não chegou a atingir o patamar de 3%, em 1967, nos Estados Unidos e nos principais países da Europa Ocidental (Inglaterra, França, Alemanha e Itália), ultrapassou a marca dos dois dígitos em 1979. A taxa média de desemprego, que na Europa Ocidental ficou abaixo dos 2,5% e nos Estados Unidos esteve abaixo dos 5%, durante as décadas de 1950 e 1960, superou os dois dígitos em diversos países do continente e ficou muito próximo dos 7% nos Estados Unidos (Cairnicross; Cairnicross, 1992CAIRNCROSS, F.; CAIRNCROSS, A. (Org). The legacy of the golden age. London: Routledge, 1992., p. 160, 33).

A crise de acumulação e as instabilidades relacionadas às variáveis-chave da economia - preço, câmbio, juros, lucro e salário - foram diretamente associadas por boa parte da literatura à crise de hegemonia do estabilizador econômico global do período: os Estados Unidos. Como veremos, entre os argumentos levantados pela literatura tradicional para defender tal hipótese, destacam-se o elevado crescimento econômico do Japão e dos países da Europa Ocidental e sua maior participação nas exportações e no PIB mundial, os ataques especulativos contra o dólar e o acirramento daquilo que ficou conhecido como a Segunda Guerra Fria2 (1) Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2009). .

Este trabalho objetiva questionar a tese de que teria existido um período em que o poder global estadunidense entrou em crise, no sentido da possibilidade iminente de ruptura com os parâmetros estruturais construídos no imediato pós-guerra e consolidados a partir da crise da década de 1970. Outrossim, argumentaremos que essa crise foi uma das formas de manifestação da consolidação do poder global3 estadunidense, apoiado no fortalecimento do seu poder estrutural4: moeda, finanças, tecnologia, modo de vida e poder militar - expressão do antagonismo entre Estados Nacionais e a transnacionalização econômica. Essa transnacionalização foi uma das consequências do alicerçamento de uma ordem econômica multilateral, seletivamente liberal e integrada - cultural, comercial, produtiva e financeiramente - ao redor de sua supremacia estrutural.

Na primeira seção deste trabalho, faremos uma crítica ao debate sobre a crise de hegemonia, apresentando as insuficiências das principais teses sobre o tema. Na segunda seção, associaremos a política externa estadunidense ao início da construção do seu poder global. Na terceira, questionaremos a tese da crise de hegemonia e relacionaremos a consolidação do poder global estadunidense à ascensão da transnacionalização econômica e ao enfraquecimento dos Estados Nacionais. Nas considerações finais, sintetizaremos os argumentos apresentados neste artigo.

1 Crítica ao debate

A teoria do estabilizador hegemônico5 (4) Escorados em Strange (1987) compreendemos poder estrutural como a capacidade de um país de exercer este poder global mediante os parâmetros militares, tecnológicos, produtivos, culturais, monetários e financeiros. foi uma das principais contribuições analíticas no campo da economia política internacional, no século XX. Ela nos permite compreender mais a fundo a dinâmica das relações geopolíticas e econômicas internacionais. Autores como Arrighi (1995)ARRIGHI, G. O longo século XX: dinheiro, poder e as origens de nosso tempo. Rio de Janeiro: Unesp, 1995., Cox (1981)COX, R. Social forces, states, and world orders: beyond international relations theory. Journal of International Studies, v. 10, n. 2, p. 125-155, 1981., Gilpin (1987)GILPIN, R. The political economy of international relations. New Jersey: Princeton University Press, 1987. e Kindleberger (2013)KINDLEBERGER, C. The World in Depression: 1919-1939. 40th Anniversary ed.; California: University of California Press, 2013. contribuíram para consolidar a tese da importância da hegemonia de um país na ordem econômica internacional, haja vista seus impactos sobre a estabilidade geopolítica e sobre o crescimento econômico.

Ainda que o conceito de hegemonia tenha nuances de definições segundo cada autor, parece consensual entre os autores supracitados que o conceito de hegemonia carrega dois elementos característicos6 (5) Uma definição plausível do conceito de estabilizador hegemônico é encontrada em Keohane (1980). Segundo o autor, “it holds that hegemonic structures of power, dominated by a single country, are most conductive to the development of strong international regimes whose rules are relatively precise and well obeyed. (...) The decline of hegemonic structures of power can be expected to presage a decline in the strength of corresponding international regimes” (p. 132). . Por um lado, um país hegemônico é forte o suficiente para não ter seu projeto geoeconômico e geopolítico ameaçado por outros países. Por outro, este projeto consegue - em muitos casos, precisa - incorporar em seu bojo determinadas demandas e anseios geopolíticos e socioeconômicos de outros países (Fiori, 2005FIORI, J. L. Sobre o poder global. Novos Estudos Cebrap, São Paulo, v. 73, 2005., p. 61-65).

No plano econômico, o país hegemônico seria fundamental para a desenvolvimento do sistema monetário e financeiro internacional, dinamizando os fluxos comerciais e de capitais - produtivos e financeiros -, ao redor do mundo. Em uma das mãos, o país hegemônico atuaria como banqueiro do mundo, gerando liquidez internacional mediante os fluxos internacionais de capitais - empréstimos e financiamentos. Em outra, ele seria o gastador de última instância, gerador do gasto autônomo global, estimulando a produção e o comércio internacional por meio de déficits comerciais.

As observações das relações econômicas internacionais desde o século XIX - desde a Idade Moderna, no caso de Arrighi (1994) - corroborariam tal hipótese. É inegável o papel hegemônico da Inglaterra para o dinamismo econômico internacional entre1830 e 1870. Também é fato inquestionável a relevância dos gastos, ajudas, empréstimos e investimentos externos estadunidenses entre o final da década de 1940 e o ano de 1974. Nestes períodos se observaram as maiores taxas de crescimento da história do capitalismo moderno, tanto em termos de PIB quanto em termos de comércio internacional (Maddison, OECD, 2001).

Se o crescimento econômico e a estabilidade geopolítica nesses períodos foram associados à existência do hegemon, as instabilidades observadas nos momentos sucessivos - por exemplo, entre a grande depressão do século XIX e as grandes guerras do século XX e durante a década de 1970 - foram relacionadas à sua crise.

A correlação entre crise econômica sistêmica e crise do hegemon está presente em boa parte das interpretações sobre as instabilidades da década de 19707. A ideia geral que norteia a maioria das narrativas deste período é a de que os desequilíbrios econômicos e geopolíticos derivavam do fortalecimento dos países capitalistas avançados - Europa Ocidental e Japão - e do enfraquecimento da economia estadunidense.

Por um lado, o crescimento econômico desses países e o consequente aumento de suas exportações no comércio mundial (via catching up) teriam reduzido a proeminência da economia estadunidense na economia mundial. Por outro, o fardo de sustentar quase que exclusivamente o polo capitalista da ordem mundial teria esfacelado seu poder aglutinador. Para autores como Armstrong et al. (1990); Boltho et al. (1982)BOLTHO, A. (Org). The European Economy: growth and crisis. New York: Oxford University Press, 1982.; Epstein e Schor (1990)EPSTEIN, A.; SCHOR, J. B. Macropolicy in the rise and fall of the golden age. In: MARGLIN, S. A.; SCHOR, J. B. The golden age of capitalism: reinterpreting the postwar experience. Oxford: Claredon Press, 1990.; Gilpin (1975)GILPIN, R. U.S. Power and the multinational corporation: the political economy of foreign direct investment. Basic Books, 1975.; Glyn et al. (1990)GLYN, A.; HUGUES, A.; LIPIETZ, A.; SINGH, A. The rise and fall of the golden age. In: MARGLIN, S. A.; SCHOR, J. B. The golden age of capitalism: reinterpreting the postwar experience. Oxford: Claredon Press, 1990.; Hobsbawm (1995)HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914 - 1989). Tradução de Marcos Santarrita; Revisão técnica de Marica Cecília Paoli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.; Kidron (1971)KIDRON, M. El capitalismo occidental de la posguerra. Madrid: Ediciones Guadarrama/Lope Rueda 13, 1971.; Mandel (1982)MANDEL, E. O capitalismo tardio. São Paulo: Abril Cultural, 1982.; Mattick (2009)MATTICK, P. Marx y Keynes: los limites de la economía mixta. Círculo Internacional de Comunistas Antibolcheviques, 2009. Disponível em: cica_web@yahoo.com.br http://cai.xtreemhost.com.
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; Mazzuchelli (2011)MAZZUCCHIELLI, F. Os dias de sol: a formação da idade de ouro do capitalismo. Mimeo, 2011.; Tavares (1985)TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985. e Van Der Wee (1986)VAN DER WEE, H. Prosperity and upheaval: the world economy: 1945-1980. New York: Penguin Books, 1986., a intensificação da concorrência intercapitalista seria o resultado deste antagonismo. Nas palavras de Hobsbawm (1995)HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914 - 1989). Tradução de Marcos Santarrita; Revisão técnica de Marica Cecília Paoli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995., entre 1950 e 1975 os Estados Unidos

(...) cresceram mais devagar que qualquer outro país, com exceção da Grã-Bretanha (...). Na verdade, para os Estados Unidos, essa [a ‘Era Dourada’] foi, econômica e tecnologicamente, uma época mais de relativo retardo que de avanço. A distância entre eles e outros países, medida em produtividade por homem-hora diminuiu, e se em 1950 desfrutavam de uma riqueza nacional per capita que era o dobro da França e Alemanha, mais de cinco vezes a do Japão, e mais da metade maior que a da Grã-Bretanha, os outros Estados se aproximavam rapidamente e continuavam a fazê-lo nas décadas de 1970 e 1980 (Hobsbawm, 1995HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914 - 1989). Tradução de Marcos Santarrita; Revisão técnica de Marica Cecília Paoli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995., p. 254).

Segundo Mazzucchelli, F. (2011)MAZZUCCHIELLI, F. Os dias de sol: a formação da idade de ouro do capitalismo. Mimeo, 2011.,

a Europa Ocidental e, sobretudo, o Japão, por mais de duas décadas conheceram taxas extraordinárias de crescimento. Os grandes capitais europeus e japoneses não só alcançaram o patamar do padrão norte-americano (catching up) como se converteram em concorrentes poderosos dos Estados Unidos em escala global. Após um longo período de expansão e internacionalização, era previsível que as oportunidades de investimento se estreitassem (Mazzucchelli, p. 87).

A abordagem cataclísmica é perceptível nas interpretações marxistas. Kidron (1971)KIDRON, M. El capitalismo occidental de la posguerra. Madrid: Ediciones Guadarrama/Lope Rueda 13, 1971. argumentara que a “competição oligopolista entre economias inteiras é uma perspectiva alarmante, especialmente quando um número crescente delas estão armadas com armas nucleares” (p. 52). Nos termos de Mattick (2009)MATTICK, P. Marx y Keynes: los limites de la economía mixta. Círculo Internacional de Comunistas Antibolcheviques, 2009. Disponível em: cica_web@yahoo.com.br http://cai.xtreemhost.com.
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,

la expansión europea está conectada por absoluta necesidad al mercado mundial, la continuación de su rentabilidad depende de una afortunada penetración de los mercados norteamericanos y extra-norteamericanos. El capital europeo debe competir con el capital norteamericano y con el bloque de poder del Este, cuya existencia pone nuevos límites a la expansión externa del capitalismo tanto europeo como norteamericano. Con una competencia creciente por parte de Europa y del Este, la excepcional posición norteamericana durante la primera mitad del siglo XX parece estar llegando a su fin (Mattick, 2009MATTICK, P. Marx y Keynes: los limites de la economía mixta. Círculo Internacional de Comunistas Antibolcheviques, 2009. Disponível em: cica_web@yahoo.com.br http://cai.xtreemhost.com.
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, p. 133).

A consequência seria o esfacelamento do sistema monetário e financeiro internacional - amplificador da crise internacional da década de 1970 -, uma vez que se atrelava ao poder hegemônico. Parte significativa dos autores relacionaram o fardo da administração da ordem internacional ao enfraquecimento do poder estadunidense e à consequente crise de Bretton Woods. Os autores supracitados estabeleceram uma relação íntima entre a necessidade do déficit externo, o excesso de liquidez internacional, os fluxos especulativos, as instabilidades monetárias e cambiais, a fuga do dólar e a crise da hegemonia estadunidense. As passagens abaixo são elucidativas:

In our view the system was flawed for more fundamental reasons, namely the decline in US dominance due to the uneven development of the productive potential, and hence, the economic and political power of the leading industrial countries (Glyn et al., 1990GLYN, A.; HUGUES, A.; LIPIETZ, A.; SINGH, A. The rise and fall of the golden age. In: MARGLIN, S. A.; SCHOR, J. B. The golden age of capitalism: reinterpreting the postwar experience. Oxford: Claredon Press, 1990., p. 102).

The second structural change involve the erosion of US hegemony and the subsequent collapse of Bretton Woods fixed exchange rate. (…). In most countries, the freedom of flexible rates was undermined by a high level of speculation international capital flows, which drove depreciation currencies into a vicious cycle of depreciation and inflation (Epstain; Schor, 1990, p. 140).

A presente crise monetária consiste no fato de que a influência de todos os mecanismos que controlavam o longo boom do pós-guerra aumentou necessariamente as dificuldades de venda e de valorização do capital nos mercados internos, e daí a intensificação da rivalidade internacional. (...). A insegurança da economia capitalista expressa-se hoje na concorrência internacional intensificada, que por sua vez corresponde ao declínio relativo da preponderância dos Estados Unidos (Mandel, 1982MANDEL, E. O capitalismo tardio. São Paulo: Abril Cultural, 1982., p. 327)8 (7) Críticas ao conceito de estabilizador hegemônico podem ser identificadas em Fiori (2005); Scandiucci Filho (2000) e Pereira (2018). Segundo Fiori (2005), a teoria do estabilizador hegemônico e dos ciclos sistêmicos “parecem excessivamente associados a uma visão funcionalista do ‘sistema mundial’”. (p. 64). Para Sandiucci Filho (2000) as abordagens neorealistas e neoliberais da teoria da hegemonia e do estabilizador hegemônico desconsideram o papel das relações entre autoridade política e mercado e a luta entre diferentes frações de classe como elementos pertinentes à constituição da ordem internacional (p. 7-8). Nos termos de Pereira (2018), as abordagens tradicionais da teoria do estabilizador hegemônico e dos ciclos sistêmicos ignoram a possibilidade de crises e desajustes econômicos internacionais decorrentes, não necessariamente de uma suposta crise de hegemonia, mas de mudanças históricas observadas no grau de desenvolvimento das forças produtivas do capital, em suas transformações tecnológicas e organizacionais e no padrão de acumulação e valorização daí decorrentes (p. 248). .

A crise do dólar seria o clímax da crise de hegemonia. Os ataques especulativos, a saída de capitais dos Estados Unidos, a desvalorização de sua moeda, a fortalecimento de outras praças financeiras pelo mundo, as críticas dos países desenvolvidos ao privilégio exorbitante e as conversações referentes à adoção de uma outra moeda de curso internacional foram vistos como possibilidade iminente de uma ruptura da ordem econômica internacional.

A perspectiva cataclísmica desta possibilidade tem sua versão mais notável no artigo da professora Tavares (1985)TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985.. Em suas palavras,

àquela altura, os interesses em jogo eram tão visivelmente contraditórios que as tendências mundiais eram policêntricas e parecia impossível aos EUA conseguirem reafirmar sua hegemonia, embora continuassem a ser potência dominante (...). Em síntese, a existência de uma economia mundial sem polo hegemônico estava levando à desestruturação da ordem vigente no pós-guerra e à descentralização dos interesses privados e regionais (p. 5-6)9 (8) “A hegemonia dos Estados Unidos declinou e, enquanto caía, o sistema monetário com base no dólar-ouro desabou” (Hobsbawm, 1995, p. 279). “A década de 1970 foi o momento histórico de transição da hegemonia ‘partilhada e contestada’ dos EUA para a hegemonia ‘absoluta’ que se reinaugurou com Reagan. Foi o período em que se estilhaçaram as normas e consensos estabelecidos em Bretton Woods” (Mazzucchelli, 2011, p. 83). .

A ênfase na política monetária estadunidense, no final da década de 1970, como resposta à crise e principal ação para a retomada de sua hegemonia é, por sua vez, o aspecto mais suntuoso no trabalho da mestra10 (9) Parece-nos claro que Tavares (1985) relaciona a crise internacional, não apenas ao aparente desmoronamento do polo hegemônico - tal como os autores neorealistas e neoliberais de Economia Política Internacional -, mas à iminência da constituição de uma ordem policêntrica e assíncrona de poder. A crise de hegemonia é interpretada, portanto, como a possibilidade, não apenas aparente, de retração do poder e liderança do hegemon - os Estados Unidos. . A relação entre a elevação das taxas de juros, o enxugamento da liquidez, a recessão econômica mundial, a expressiva entrada de capitais em Wall Street, o aumento do papel da dívida pública estadunidense como lastro do dólar e de outros ativos financeiros e o realinhamento sincrônico de todos os países à política econômica estadunidense foi brilhantemente realçada11 (10) Tavares (1985) usa de forma aparentemente semelhante, e sem definição prévia, os termos retomada e reafirmação, criando certa ambiguidade conceitual. . Nesta perspectiva, a crise de hegemonia fora superada pela reafirmação do seu poder mediante política monetária contracionista, à revelia do bem-estar econômico global12.

Se Tavares (1985)TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985., Armstrong et al. (1991)ARMSTRONG, P.; GLYN, A.; HARRISON, J. Capitalism since 1945. Oxford, UK: Basil Blackwell, 1991., Glyn et al. (1990)GLYN, A.; HUGUES, A.; LIPIETZ, A.; SINGH, A. The rise and fall of the golden age. In: MARGLIN, S. A.; SCHOR, J. B. The golden age of capitalism: reinterpreting the postwar experience. Oxford: Claredon Press, 1990. e Mazzucchelli (2011)MAZZUCCHIELLI, F. Os dias de sol: a formação da idade de ouro do capitalismo. Mimeo, 2011. realçaram assertivamente o papel da elevação dos juros estadunidenses para o surgimento da recessão mundial entre 1979-81, a tese da reafirmação de sua hegemonia por este caminho esbarra em dois questionamentos centrais. Primeiro: se surgiram, de fato, forças econômicas parelhas aos Estados Unidos a ponto de tornarem a economia global autonomamente policêntrica, por que a política monetária agressivamente contracionista foi suficiente para colocar o mundo de joelhos? Em outros termos, por que não houve outras ações mais agressivas, como ameaças militares, embargos econômicos, retaliações comerciais, restrições aos fluxos de capitais e desinvestimentos arbitrários? Segundo: uma vez que a “solução” se deu pelos mecanismos formais de política econômica, será que a crise da década de 1970 correspondeu de fato à própria crise do poder estadunidense a ponto de imaginarmos a possibilidade de uma solução disruptiva?

Caso estes questionamentos se sustentem, o trabalho que nos cabe é fazer emergirem as faltas, os “esquecimentos” e os problemas de temporalidade que as narrativas supracitadas eventualmente contêm, assim como abrir margens para novas análises e interpretações13 (12) “Há algum tempo atrás, tudo levava a crer que os EUA tinham perdido a capacidade de liderar o mundo de uma maneira benéfica. Isso continua a ser verdade. Mas por outro lado os americanos, indiscutivelmente, deram, de 1979 a 1983, uma demonstração de sua capacidade maléfica de exercer sua hegemonia e de ajustar todos os países, através da recessão, ao seu desideratum. E o fizeram, está, claro, com uma arrogância e com uma violência sem precedentes” (Tavares, 1985, p. 8). Ver também, Armstrong (1991); Glyn et al. (1990) e Mazzucchelli (2011). .

2 Política externa e a formação do poder global estadunidense

Contraditoriamente às teses supracitadas, vemos a crise sistêmica de acumulação da década de 1970 não como o resultado da crise de hegemonia estadunidense, mas como um sinal da consolidação de seu poder global, haja vista o robustecimento do seu poder estrutural. A autonomia dos Estados Nacionais entrara em rota de colisão com a ascensão de uma ordem transnacional, em cujo vértice se encontrava a consolidação do poder global estadunidense.

Os Estados Unidos conseguiram superar os questionamentos à sua hegemonia porque, desde o pós-guerra, costuraram uma ordem internacional multilateral, paulatinamente integrada e seletivamente liberal, ao redor do seu poder bélico, da sua moeda e do seu padrão cultural, tecnológico e produtivo (Pereira, 2018PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018., p. 264-280).

Ainda que muitos sustentem que o pós-guerra fora o período em que os Estados Nacionais tiveram a maior autonomia possível para a realização de políticas econômicas expansionistas e de políticas sociais distributivas - a “Era de Ouro” do capitalismo -, também é correto afirmar que se observou no período, paulatinamente, a universalização do modo de vida estadunidense, em consequência da gradual integração comercial mediada pelo dólar, a diplomacia ideológica-militar do “mundo livre” e a internacionalização de suas corporações multinacionais - firmas e bancos (Furtado, 1987FURTADO, C. Transformação e crise na economia mundial. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra S/A, 1987.; Strange,1987STRANGE, S. The persistent myth of lost hegemony. International Organization, v. 41, n. 4, 1987.; Wood, 2005WOOD, E. M. Empire of capital. New York: Ed. Verso, 2005.; Panitch; Gindin, 2012PANITCH, L.; GINDIN, S. The making of global capitalism. London; New York: Verso, 2012.; Meszáros, 2002MESZÁROS, I. Para além do capital. São Paulo: Editora Boitempo, 2002.).

O déficit externo, os gastos bélicos, as ajudas externas, as transferências tecnológicas, os investimentos diretos externos, o excesso de liquidez global, a diplomacia do dólar, a atração dos países do Terceiro Mundo à sua área de influência, a estratégia de contenção da URSS e a construção de política de segurança estadunidense, apoiada no Complexo Científico-Industrial-Militar e na disponibilidade de recursos naturais fundamentais à acumulação foram imprescindíveis ao crescimento econômico observado no pós-guerra, uma vez que geraram relativa estabilidade geopolítica e demanda efetiva global14. Mas, se, por um lado, essas características criaram os parâmetros para a adoção de políticas econômicas autônomas e expansionistas pelos países capitalistas - em especial, os avançados -, por outro, elas se ancoraram nos alicerces que sustentavam o poder estrutural estadunidense.

O pós-guerra pode ser considerado como o início da construção do poder global dos Estados Unidos. Ainda que fossem superavitários em transações correntes, acumulassem aproximadamente ¾ de todo o ouro disponível e seu PIB - assim como suas exportações - representasse a maior fatia do produto mundial no final da Segunda Guerra - quando comparados à década de 1970 -, sua participação nas relações econômicas e geopolíticas mundiais restringia-se quase que exclusivamente ao continente americano e ao sudeste asiático (Lens, 2003). A superestrutura política e a economia estadunidense tinham uma dinâmica relativamente autônoma à conjuntura econômica e geopolítica das relações internacionais. Não detinham, por conseguinte, o poder estrutural das relações interestatais.

Se, após a Primeira Guerra, o congresso estadunidense vetou a possibilidade de participação de seu país nos assuntos de ordem mundial - via Liga das Nações -, em meados da Segunda Guerra, os Estados Unidos emergiram como a principal força de reorganização do sistema interestatal. Existia maior clareza entre os estrategistas de política externa na década de 1940 quanto à importância de uma ordem internacional apoiada no multilateralismo e na “livre iniciativa”, para a sustentação e o “florescimento do sistema americano”, do que nas primeiras décadas do século XX (Block, 1980BLOCK, F. Los orígenes del desorden económico internacional: la política monetaria de los Estados Unidos desde la Segunda Guerra Mundial hasta nuestros días. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1980., p. 74; Hudson, 2003HUDSON, M. Super-imperialism: the origin and fundamentals of U.S. world dominance. LondonSterling-Virginia: Pluto Press, 2003., p. 27; US National Security Concil, 1950)15 (14) Para uma avaliação mais detalhada destas políticas externas, ver Pereira (2018). .

A ascensão de movimentos nacionalistas ou anticapitalistas, o fortalecimento da União Soviética e a necessidade compulsiva de expansão do modo estadunidense de produção para além de suas fronteiras foram algumas das justificativas para a sua proeminência no plano internacional. Mas, diferentemente das teses que sustentam a adoção de uma espécie de hegemonia benevolente por parte dos Estados Unidos - haja vista os desafios da Guerra Fria -, vemos em suas estratégias e ações um movimento de formação de uma ordem internacional atrelada - direta e indiretamente - à sua economia e aos seus interesses estratégicos. Ainda que os custos econômicos, o fortalecimento das economias capitalistas avançadas e o fardo geopolítico da Guerra Fria possam sugerir a adoção de um padrão hegemônico complacente e condescendente, uma perspectiva analítica de temporalidade mais longa permite-nos associar a política externa estadunidense a um projeto de construção do poder global (Pereira, 2018PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018., p. 192-195).

Sua política externa pode ser dividida, em termos analíticos, em dois eixos interseccionados e interdependentes: o econômico e o de segurança nacional. O sistema de Bretton Woods consolidara o dólar como a moeda reserva de valor mundial, referência das transações comerciais e financeiras internacionais. Também colocara os Estados Unidos no epicentro das decisões monetárias e financeiras globais, como o principal cotista e direcionador das decisões políticas e econômicas das instituições criadas na conferência: Banco Mundial e FMI. Não obstante, o sistema de pagamentos mundial decolou somente a partir da década de 1950, haja vista os desajustes cambiais, os gargalos econômicos decorrentes dos estragos da guerra, a relutância na internacionalização dos capitais estadunidenses e a baixa liquidez em dólar no período (Hudson, 2003HUDSON, M. Super-imperialism: the origin and fundamentals of U.S. world dominance. LondonSterling-Virginia: Pluto Press, 2003., p. 27; Block, 1980BLOCK, F. Los orígenes del desorden económico internacional: la política monetaria de los Estados Unidos desde la Segunda Guerra Mundial hasta nuestros días. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1980., p. 88-91; Moffit, 1985, p. 23-24).

A política de segurança nacional foi fundamental para reverter esse quadro. Seu desenrolar manifestou-se em um emaranhado de fatos geopolíticos, observados entre os últimos anos da Segunda Guerra e o fim da Guerra da Coreia. Os acirramentos geopolíticos nas conferências de Yalta, Potsdan e Teerã, a morte de Roosevelt, a expansão geográfica soviética em direção ao leste europeu, o crescimento dos partidos comunistas na Europa Ocidental, as convulsões revolucionárias na Turquia e na Grécia, a ascensão da Doutrina Truman e suas consequências ideológicas, a Revolução Chinesa, o sucesso na criação da bomba atômica pelos soviéticos e a própria Guerra da Coreia foram alguns eventos marcantes do período. A postura de enfrentamento direto e de combate à “ameaça comunista” chegou ao seu clímax, com possibilidade de guerra aberta entre soviéticos, chineses e estadunidenses, no início da década de 1950 (Block, 1980BLOCK, F. Los orígenes del desorden económico internacional: la política monetaria de los Estados Unidos desde la Segunda Guerra Mundial hasta nuestros días. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1980., p. 120-18; p. 139-141; Holsti, 1991HOLSTI, K. J. Peace and war: armed conflicts and international order 1648-1989. Cambridge; New York: Cambridge University Press, 1991., p. 255-260; Ribas, 2001RIBAS, V. T. Hegemonia e império: trajetória dos Estados Unidos na segunda metade do século XX. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2001., p. 55-59; 66; Kiernan, 2009KIERNAN, V. G. Estados Unidos: o novo imperialismo. Rio de Janeiro: Ed. Record, 2009., p. 311-313; Lens, 2006LENS, S. A fabricação do império americano/ Da revolução ao Vietnã: uma história do imperialismo dos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006., p. 528). Tal quadro embasou as mudanças de rumo da política externa estadunidense, desde a crise que engendrou a demissão do General Marshall.

O enfrentamento direto ao comunismo fora substituído pela estratégia conhecida como política de contenção, minuciosamente detalhada no famoso documento que circulou entre o staff estadunidense na década de 1950, o NSC-68. Ainda que o Plano Marshall e as ajudas financeiras prévias tenham mitigado a crise do imediato pós-guerra, elas não foram suficientes para criar a liquidez e a segurança necessárias à ascensão do comércio e dos investimentos internacionais. As estratégias levantadas pelo documento projetaram aquilo que, de fato, se observou desde então: o bloqueio - e não o enfrentamento direto - à expansão soviética, mediante um cordão de isolamento econômico e militar ao redor de seu território, o fortalecimento moral e econômico estadunidense, a expansão significativa dos gastos militares, as políticas de ajuda e de assistência aos países pobres, os estímulos à integração regional, comercial e financeira, as políticas de internacionalização das empresas estadunidenses, o refortalecimento e a intensificação da integração econômica entre os Estados Unidos e as antigas potências e países aliados - Europa Ocidental e Japão -, mediante acordos preferenciais e transferência de pacotes tecnológicos e a garantia, pela diplomacia militar e do dólar, da oferta de recursos naturais e de matérias-primas estratégicos à economia estadunidense e global (Pereira, 2018PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018., p. 149-153; NSC-68, US National Security Council, 1950US NATIONAL SECURITY COUNCIL. NSC 68: United States Objectives and Programs for National Security. A Report to the President Pursuant to the to the President’s Directive of January 31, 1950 - Top Secret - Washington, Apr. 7, 1950. Available at: http://www.citizensource.com/History/20thCen/NSC68.PDF.
http://www.citizensource.com/History/20t...
).

Autores como Block (1980)BLOCK, F. Los orígenes del desorden económico internacional: la política monetaria de los Estados Unidos desde la Segunda Guerra Mundial hasta nuestros días. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1980. e Hudson (2003)HUDSON, M. Super-imperialism: the origin and fundamentals of U.S. world dominance. LondonSterling-Virginia: Pluto Press, 2003. enfatizaram a importância dos gastos bélicos estadunidenses, desde a Guerra da Coreia, vistos como condição sine qua non à expansão do comércio e da liquidez internacional. Os sucessivos déficits externos daí decorrentes tiveram impactos virtuosos sobre as reservas e sobre a balança de pagamentos do Japão e da maioria dos países da Europa Ocidental. Por seu turno, a ascensão do Complexo Científico-Industrial-Militar, além de dinamizar a economia estadunidense e mundial e impulsionar novos paradigmas tecnológicos, permitiu aos Estados Unidos criarem uma superestrutura de segurança internacional formidável - com elevado potencial bélico e de intervenção, assegurando as condições geopolíticas necessárias à internacionalização do capital estadunidense e o acesso a matérias-primas e a recursos naturais imprescindíveis ao crescimento da economia global. As guerras e os conflitos internacionais - Coreia (1950), Cuba (1961), República Dominicana (1965), Vietnã (1965) e Líbano (1985) -, o financiamento de golpes e de regimes autoritários, as assistências financeiras, acordos e as ajudas econômicas e militares, a diplomacia do dólar, os tratados bilaterais e os acordos de assistência recíproca foram os instrumentos de pressão e de negociação fundamentais para a integração dos países do terceiro mundo aos parâmetros econômicos e geopolíticos do “mundo livre”16 (15) Ver também, Gray (1950). (Holsti, 1991HOLSTI, K. J. Peace and war: armed conflicts and international order 1648-1989. Cambridge; New York: Cambridge University Press, 1991., p. 271-293; Hobsbawm, 1995HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914 - 1989). Tradução de Marcos Santarrita; Revisão técnica de Marica Cecília Paoli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995., p. 439; Lens, 2006LENS, S. A fabricação do império americano/ Da revolução ao Vietnã: uma história do imperialismo dos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006., p. 496-498, 523; Arrighi, 1994, p. 279-30; Hudson, 2003HUDSON, M. Super-imperialism: the origin and fundamentals of U.S. world dominance. LondonSterling-Virginia: Pluto Press, 2003., p. 122-263; Kolko, 1972KOLKO, G. Raíces de la política exterior norteamericana. Colombia: Ed. La Oveja Negra, 1972., p. 116-144; Magdoff, 1969MAGDOFF, H. The age of imperialism: the economics of U.S. Foreign Policy. New York; London: Modern Reader Paperbacks, 1969., p. 117-118; Block, 1980BLOCK, F. Los orígenes del desorden económico internacional: la política monetaria de los Estados Unidos desde la Segunda Guerra Mundial hasta nuestros días. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1980., p. 234; Schiller; Phillips, 1972SCHILLER, I. H.; PHILLIPS, J. D. Super state: readings in the military-industrial complex. Illinois: University of Illinois Press, 1972., p. 2-9; Perlo, 1969PERLO, V. Militarismo e indústria: armamentos e lucros na era dos projéteis. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1969., p. 28-29).

Vimos, na relação entre a política de segurança nacional - Complexo Científico-IndustrialMilitar, gastos bélicos, acordos militares e diplomáticos, construção de bases militares ao redor do mundo e política externa de acesso a recursos naturais e a matériasprimas - e as estratégias econômicas internacionais - ativação, mediante déficit externo, do sistema de Bretton Woods, as políticas de fortalecimento das antigas potências, a criação do GATT, a intensificação do investimento externo direto desde a década de 1950, o fortalecimento das corporações multinacionais, a internacionalização do sistema bancário na década de 1960 e os mecanismos diplomáticos, econômicos e militares de integração da periferia no sistema comercial, monetário e financeiro internacional -, a base do poder global estadunidense. Representou a satelitização das economias capitalistas mundiais - comércio, investimentos e finanças - não apenas ao dólar, mas, também, aos parâmetros tecnológicos, produtivos, organizacionais e culturais estadunidenses.

Tabela 1
Taxa média de crescimento anual das exportações mundiais e do IDE Estadunidense (%)

Quanto mais a economia mundial crescia, mais se integrava e se assemelhava ao modo de vida americano, maior era a difusão do seu padrão tecnológico, suas corporações ficavam mais fortes o e o dólar consolidava-se como reserva de valor de última instância no plano internacional. Ascendia uma ordem econômica global, integrada, multilateral e seletivamente liberal ao redor do seu poder global.

3 Transnacionalização e consolidação do poder global estadunidense

A crise da década de 1970 e a consolidação do poder global estadunidense são eventos correlacionados, elos de um mesmo processo histórico. Muito distante de representar uma crise de hegemonia, a crise da década de 1970 é sistêmica, uma vez que repousa sobre transformações das condições e dos padrões de acumulação, envolvendo a dimensão das corporações, a escala dos negócios e as capacidades do Estados Nacionais em direcionar o crescimento econômico segundo desígnios sociais. As forças centrífugas correlacionadas à transnacionalização, à mundialização financeira e à ascensão do “Shopping Center Global”17 (16) Até o final da década de 1960, havia 8 grandes acordos de defesa mútua entre os Estados Unidos e 48 países, além da assinatura de garantias de investimento privada com mais de 70 países subdesenvolvidos (Schiller; Phillips, 1972, p. 22; Shoup, 1972, p. 94; Magdoff, 1969, p. 126-127). “Dentre os tratados militares, ressaltamos a OTAN (entre os Estados Unidos, Canadá e a maioria da Europa Ocidental), o Tratado Internacional de Assistência Recíproca (Entre os Estados Unidos e a maioria dos países do continente americano), o Pacto de Bagdá (entre os Estados Unidos, Iraque, Turquia, Grã Bretanha, Paquistão e Irã), o acordo de cooperação militar com a Libéria, o Tratado de Cooperação e Segurança Mútua entre os Estados Unidos e o Japão, o Tratado de Defesa Mútua entre os Estados Unidos e a Coreia do Sul e entre os Estados Unidos e a China, o SEATO (entre os Estados Unidos, Austrália, França, Nova Zelândia, Paquistão, Filipinas, Tailândia e Grã-Bretanha) e o ANZUS (entre os Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia)” (Pereira, 2018, p. 211). se entrelaçaram às forças centrípetas ligadas à universalização do modo de vida estadunidense e à internacionalização de sua superestrutura de comando, apoiada nos parâmetros formatadores do seu poder estrutural: moeda/finanças, produção/tecnologia, cultura/consumo, superioridade militar/segurança.

As instabilidades interestatais, macroeconômicas e cambiais observadas na década de 1970 foram as manifestações mais aparentes das mudanças estruturais supracitadas. Não foi a crise de Bretton Woods que desestabilizou a ordem econômica internacional. Foi o aprofundamento da ordem econômica multilateral, integrada e seletivamente liberal, apoiada na internacionalização produtiva e financeira que esfacelou os parâmetros do sistema de pagamentos - lastreado no câmbio fixo e no controle de capitais. A demora dos países em adotar a conversibilidade monetária, a queda das reservas de ouro estadunidense, o excesso de liquidez a partir da década de 1960, a construção de estruturas institucionais estadunidenses para supervisionar o sistema bancário e financeiro internacional - Quadriad, por exemplo -, as estratégias conjuntas entre bancos centrais para estabilizar as taxas de câmbio - Gold Pool, Bond Roosa, swaps restritos aos Bancos Centrais, DES - e os controles de capitais revelaram a natureza contraditória e nada estável do sistema de Bretton Woods - reforçada pelo crescente déficit estadunidense, pelo Dilema de Triffin e pela ascensão do Euromercado (Block, 1980BLOCK, F. Los orígenes del desorden económico internacional: la política monetaria de los Estados Unidos desde la Segunda Guerra Mundial hasta nuestros días. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1980., p. 204, 244-265; Serrano, 2002SERRANO, F. Do ouro imóvel ao dólar flexível. Economia e Sociedade, Campinas, v. 11, n. 2, 2002., p. 248-249; Panitch; Gindin, 2012PANITCH, L.; GINDIN, S. The making of global capitalism. London; New York: Verso, 2012., p. 123-125; Moffit, 1984MOFFITT, M. O dinheiro no mundo - De Bretton Woods à beira da insolvência. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984., p. 30-40; Hudson, 2003HUDSON, M. Super-imperialism: the origin and fundamentals of U.S. world dominance. LondonSterling-Virginia: Pluto Press, 2003., p. 298-307).

Se, por um lado, a espiral especulativa decorrente da emergência do Eurodólar desestabilizou as taxas de câmbios e de juros - assim como o horizonte de cálculo dos investimentos -, por outro, a forte internacionalização das corporações estadunidenses durante a “Era Dourada”, a internacionalização do seu sistema bancário, a partir da década de 1960, e a difusão do dólar em operações financeiras de natureza variada permitiram a universalização do modo de vida estadunidense e disseminaram as características institucionais atreladas à validação e à valorização da riqueza abstrata em dólar.

Não se pode, por conseguinte, confundir os questionamentos à hegemonia estadunidense e as especulações contra a paridade do dólar na década de 1970 com uma “suposta” crise de hegemonia, manifestada pela “suposta” crise do dólar. Pereira (2018)PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018. apresenta um conjunto de evidências que reforçam, não o enfraquecimento, mas a difusão e a consolidação do dólar durante a década de 1970. O Eurodólar cresceu significativamente durante o período, assim como o financiamento extraterritorial do capital privado estadunidense; a posse, por não residentes, de ações corporativas e de títulos públicos estadunidenses denominados em dólar também aumentou - tanto em termos absolutos quanto em termos relativos -; os haveres estrangeiros depositados em bancos estadunidenses cresceram entre 1970 e 1979 - apesar da ligeira queda entre 1976 e 1979 -; a proporção de ativos e passivos dos bancos europeus denominados em dólar manteve-se alta, com crescimento real positivo; os empréstimos em dólares para países subdesenvolvidos e socialistas cresceram substancialmente, reforçando os vínculos monetários e financeiros de subordinação do “Segundo Mundo” ao capital internacional18. O autor ressaltou, no plano estrutural, que os mercados financeiros estadunidenses - empréstimos e aplicações dos bancos comerciais e volume de títulos e notas negociáveis do governo - eram maiores que o do Eurodólar no período, assim como o estoque do seu investimento externo em relação ao seu passivo externo (p. 230-238)19 (18) Sobre o conceito de capital internacional, ver Prado Jr. (1957, cap. 7) e Sampaio Jr. (2012). .

O drástico aumento dos juros pelos Estados Unidos, em 1979, simbolizou, por conseguinte, não a retomada de uma hegemonia perdida, mas a demonstração de força via dissuasão financeira, haja vista as instabilidades monetárias e os questionamentos ao seu poder. Tal recurso foi suficiente para colocar o mundo de joelhos. Os impactos dessa ação revelaram, nos termos de Panitch e Gindin (2012)PANITCH, L.; GINDIN, S. The making of global capitalism. London; New York: Verso, 2012., a consolidação do seu poder global, com o fortalecimento, conforme Strange (1987)STRANGE, S. The persistent myth of lost hegemony. International Organization, v. 41, n. 4, 1987., dos parâmetros definidores de seu poder estrutural no plano internacional: produção, tecnologia, finanças, moeda, segurança, poder militar.

Os Estados Unidos consolidaram sua capacidade de criação de liquidez internacional, ratificando o seu poder de interferir sobre a taxa de expansão e de retração do crédito no âmbito global. Por meio da emissão de títulos governamentais, eles passaram a operar no sistema de pagamentos internacionais sem a necessidade de reservas. Impuseram o padrão monetário US Treasury Bill e construíram um poder financeiro do tipo debt-oriented, atraindo as poupanças externas ao seu mercado financeiro doméstico - hipertrofiando Wall Street (Strange, 1987STRANGE, S. The persistent myth of lost hegemony. International Organization, v. 41, n. 4, 1987., p. 35; Hudson, 2003HUDSON, M. Super-imperialism: the origin and fundamentals of U.S. world dominance. LondonSterling-Virginia: Pluto Press, 2003., p. 149).

Eles também se mantiveram, apesar da forte concorrência, como o centro criador e irradiador do padrão cultural-tecnológico, em função dos volumosos dispêndios, desde o pós-guerra, em defesa e P&D, na NASA, no Complexo da Saúde e no Complexo Científico-Industrial-Militar. A maturação de setores como os de tecnologia espacial, semicondutores, energia nuclear, biotecnologia, indústria farmacêutica, mineração oceânica, microcomputadores, telecomunicações, automação fabril e processamento de dados foram consequências destes financiamentos públicos (Strange, 1987STRANGE, S. The persistent myth of lost hegemony. International Organization, v. 41, n. 4, 1987., p. 570; Panitch; Gindin, 2012PANITCH, L.; GINDIN, S. The making of global capitalism. London; New York: Verso, 2012., p. 148).

O tamanho de sua economia ratificou seu mercado interno como o principal lócus de avaliação e de validação dos critérios de criação e de difusão da inovação tecnológica. Tendo como estrutura nuclear suas corporações transcontinentais, os Estados Unidos conseguiram, graças à internacionalização de padrões culturais e técnicos, impor seu estilo de vida ao mundo, uniformizando o padrão de consumo em escala planetária (Furtado, 1987FURTADO, C. Transformação e crise na economia mundial. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra S/A, 1987., p. 131, 268; Strange, 1987STRANGE, S. The persistent myth of lost hegemony. International Organization, v. 41, n. 4, 1987., p. 567).

Seu elevado orçamento em defesa, o desenvolvimento de diversas armas letais e de destruição em massa e a construção de centenas de bases militares ao redor do mundo não apenas ampliaram sua superioridade bélica ante outras nações, mas permitiram aos Estados Unidos exercer a gestão e segurança mundial, projetando sua superestrutura institucional para além de seus limites geográficos: aspectos legais e diplomáticos, padrões contábeis, marcos regulatórios (Wood, 2005WOOD, E. M. Empire of capital. New York: Ed. Verso, 2005., p. 14; Ribas, 2001RIBAS, V. T. Hegemonia e império: trajetória dos Estados Unidos na segunda metade do século XX. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2001., p. 45; Furtado, 1987FURTADO, C. Transformação e crise na economia mundial. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra S/A, 1987., p. 141; Fernandes, 1973FERNANDES, F. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina”. São Paulo: Ed. Zahar, 1973. (Biblioteca de Ciências Sociais)., p. 24).

A crise da década de 1970 não pode ser considerada, por conseguinte, uma crise de hegemonia. No plano analítico mais estrutural, ela foi a manifestação de transformações econômicas que revelaram a incompatibilidade entre a transnacionalização econômica e a autonomia dos Estados Nacionais. Por detrás da lenta e gradual ascensão da ordem econômica integrada, multilateral e seletivamente liberal, estabelecida desde o pós-guerra, está a uniformização da infraestrutura e dos padrões técnicos e culturais impulsionadores da transnacionalização econômica. O acentuado processo de concentração e de centralização do capital na “Era Dourada”, o aumento transcontinental das escalas de produção e o início da internacionalização produtiva transformaram as grandes corporações em gestoras e organizadoras da vida material no mundo. A integração tecnológica, cultural, institucional e comercial condicionou a emergência daquilo que Barnet e Muller (1974)BARNET, R.; MULLER, R. Global reach: the power of the multinational corporation. New York: Simon and Schuster, 1974. chamaram de “Shopping Center Global”: supermercados mundiais de recursos e de bens, 24 horas abertos, intermediados pelas corporações transnacionais, formadores da comunidade de consumo global - “um laço que transcende raça, geografia e tradições” (p. 33).

A consequência foi o enfraquecimento dos Estados Nacionais como sistemas econômicos nacionais e instituições político-administrativas territoriais com autonomia relativa, capazes de intervirem nos meios e nos fins socioeconômicos (Furtado, 1987FURTADO, C. Transformação e crise na economia mundial. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra S/A, 1987.). No plano das decisões empresariais, a racionalidade privada e as projeções de cálculo capitalista transcenderam o horizonte de planejamento nacional, uma vez que os custos, preços, métodos organizativos e planos de expansão se vincularam aos parâmetros estabelecidos pela concorrência oligopolista global. No plano das decisões estatais, a financeirização e os fluxos especulativos reduziram a capacidade dos Bancos Centrais de realizar políticas monetárias ativas sem desestabilizar interna e externamente sua moeda - inflação e taxa de câmbio. A mobilidade espacial das corporações e de seus fluxos de capitais colocaram em xeque políticas sociais e tributárias progressivas, assim como políticas fiscais expansionistas caracterizadas, no curto prazo, pela elevação da dívida pública. Por fim, a integração comercial e a consequente redução das barreiras tarifárias elevaram o coeficiente importador e, por conseguinte, as restrições externas ao crescimento, subordinando o mercado interno à ampliação permanente das exportações (Furtado, 1987FURTADO, C. Transformação e crise na economia mundial. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra S/A, 1987., p. 36-37; Fatemi; Williams, 1975FATEMI, N. S.; WILLIAMS, G. W. Multinational corporation: the problems and prospects. South Brunswick: A. S. Barnes, 1975., p. 60).

A transnacionalização econômica e o enfraquecimento dos Estados Nacionais compõem os elementos característicos do fortalecimento do poder estrutural estadunidense no plano das relações interestatais. Em outros termos, se a transnacionalização enfraqueceu até mesmo os Estados Unidos enquanto Estado Nacional - nos termos supracitados -, ela o fortaleceu enquanto Estado capitalista, internacionalizando sua superestrutura econômica, institucional e de segurança. O peso cultural, financeiro e tecnológico de suas corporações, o padrão monetário US Treasury Bill, a integração financeira, produtiva e comercial multilateral apoiada no dólar, o florescimento do “Shopping Center Global”, a superioridade militar e a internacionalização institucional do seu sistema de segurança nacional amarraram o mundo globalizado à política econômica e externa estadunidense.

Dois elementos contraditórios caracterizaram o seu poder estrutural nos marcos da globalização. Por um lado, a transnacionalização econômica, apoiada em seu poder estrutural, e a internacionalização de sua superestrutura institucional - política, jurídica, cultural e diplomática -, criaram um sistema de dominação cuja ação direta - intervenção militar -, foi substituída, segundo Wood (2005)WOOD, E. M. Empire of capital. New York: Ed. Verso, 2005., por mecanismos sutis de coação e de exclusão, com imposição de novas leis e de regras institucionais, reformas estruturais, pressões diplomáticas, fugas de capitais e embargos econômicos. Seu poder repousa não necessariamente na inexistência de questionamentos à ordem estabelecida pelos países subordinados ao “império do capital”, mas à extrema dificuldade de sobrevivência fora dele (Wood, 2005WOOD, E. M. Empire of capital. New York: Ed. Verso, 2005., p. 132; Pereira, 2018PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018., p. 246).

Por outro, a internacionalização da superestrutura estadunidense não anulou o sistema de concorrência interestatal nem apaziguou a natureza contraditória, autoexpansiva, totalizadora e irresistível do capital. Pela inexistência de um Estado supranacional garantidor de um sistema geopolítico e econômico plenamente integrado, o capital transnacional assumiu, nos termos de Meszáros (2002)MESZÁROS, I. Para além do capital. São Paulo: Editora Boitempo, 2002., uma natureza irrestringível e incontornável. A transnacionalização do capital caracterizou-se pela dissonância entre as estruturas políticas e econômicas deste modo de produção20 (19) Para detalhes estatísticos, ver BIS (50th Annual Report, 1967 a 1980) e Board of Governos of The Fed System (1963 a 1983). , gerando a ruptura das unidades sincrônicas existentes entre a produção do capital e seu controle, entre a produção da riqueza e o consumo e entre a produção e a circulação de valor (p. 108-127). Melhor dizendo, a transnacionalização, ainda que tenha fortalecido estruturalmente os Estados Unidos dentro do sistema de concorrência interestatal, germinou o capital global desprovido de uma adequada unidade de comando e regramento, incapaz de regular e sincronizar seu movimento contraditório, irresistível e irrestringível.

A consolidação do poder global estadunidense, a partir do último quarto do século XX, deuse, portanto, graças à ascensão de uma estrutura econômica global que, por sua lógica e dinâmica de funcionamento e por seus limites geopolíticos e institucionais, se desenvolve sem impor limites a si mesma, escalpelando as condições sociais e ambientais de sua reprodução. Se o movimento centrípeto do poder estrutural estadunidense impede que o movimento centrífugo da dinâmica incontrolável do capital transnacional se manifeste como catástrofe imediata, ele não evita a longa marcha social em direção a quadros econômicos e ambientais distópicos.

Considerações finais

Um dos temas mais caros à história econômica é o problema da periodização. As dificuldades se encontram no fato de que nos movimentos históricos repousam tanto elementos de ruptura quanto de continuidade. As narrativas tradicionais sobre a história, desde o pós-guerra, estabeleceram dois períodos muito claros: os Anos Dourados e o neoliberalismo/globalização. No plano da política externa estadunidense e da análise de sua hegemonia, a bibliografia tradicional reforça a existência de três momentos: i) uma hegemonia complacente/condescendente até a década de 1970; ii) a crise de hegemonia nessa década; iii) e a retomada/reafirmação da hegemonia perdida, agora de forma unilateral. A análise da política externa - econômica e geopolítica - estadunidense, desde o pósguerra, e seus impactos mundiais, assim como a facilidade como os Estados Unidos colocaram o mundo de joelhos desde a subida dos juros em 1979, revelam contradições nesta narrativa.

O crescimento econômico e a autonomia dos Estados Nacionais nos Anos Dourados ocorreram sob a construção paulatina de laços econômicos que transcendiam seus espaços geográficos e atrelavam a economia mundial aos tentáculos econômicos e de segurança nacional estadunidenses: difusão do dólar no sistema de pagamentos internacionais, integração comercial multilateral e seletivamente liberal, internacionalização das corporações estadunidenses, universalização do american way of life, superioridade bélica e estratégias militares, diplomáticas e econômicas garantidoras do acesso a recursos econômicos estratégicos para si e seus aliados - período de construção do poder global estadunidense.

A transnacionalização econômica e o consequente enfraquecimento dos Estados Nacionais são processos, portanto, cuja origem se encontra no alicerçamento da ordem econômica internacional observado desde o pós-guerra. Ao amarrar a expansão econômica internacional à sua teia tecnológica, produtiva, monetária, financeira e cultural, os Estados Unidos iam-se fortalecendo no sistema interestatal, em termos estruturais, à medida que a ordem transnacional ganhava força. Mesmo que a forma aparente da crise da década de 1970 tenha-se apresentado pelos questionamentos à hegemonia estadunidense e às especulações contra o dólar, os movimentos mais duradouros e profundos das relações socioeconômicas e interestatais revelavam o seu contrário. Inaugura-se o período do poder global estadunidense plenamente constituído.

Nem toda crise econômica internacional corresponde à crise de hegemonia, assim como nem toda afirmação de hegemonia corresponde à estabilidade e ao crescimento mundial. As transformações nos parâmetros sociais, geográficos, tecnológicos e institucionais do regime do capital também podem gerar movimentos disruptivos na ordem internacional. A consolidação do poder global estadunidense e a transnacionalização do capital são fenômenos correlacionados e contraditórios.

A crise socioeconômica e socioambiental do mundo globalizado repousou, até então, na incapacidade da força centrípeta estadunidense de colocar freios na força centrífuga, totalizadora, irresistível e autoexpansiva do capital global. Dessarte, a ascensão da China como potência global e a retomada das rivalidades imperialistas podem aguçá-la. Estaríamos, hoje, em uma nova fase do capitalismo e das relações interestatais?

  • (1)
    Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2009).
  • (2)
    Ver, à guisa de exemplo, Hobsbawm (1995HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914 - 1989). Tradução de Marcos Santarrita; Revisão técnica de Marica Cecília Paoli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995., cap. 14); Armstrong (1991, cap. 12 e 13); Van Der Wee (1986VAN DER WEE, H. Prosperity and upheaval: the world economy: 1945-1980. New York: Penguin Books, 1986., cap. IX e X) e Mazzucchelli (2011MAZZUCCHIELLI, F. Os dias de sol: a formação da idade de ouro do capitalismo. Mimeo, 2011., cap. 6 e 7).
  • (3)
    Apoiados em Panitch e Gindin (2012)PANITCH, L.; GINDIN, S. The making of global capitalism. London; New York: Verso, 2012., entendemos poder global como a capacidade de um país de dar a direção e o sentido das transformações socioeconômicas mundiais, assim como de ditar o ritmo e a intensidade da dinâmica econômica internacional, nos marcos de uma economia transnacionalizada.
  • (4)
    Escorados em Strange (1987)STRANGE, S. The persistent myth of lost hegemony. International Organization, v. 41, n. 4, 1987. compreendemos poder estrutural como a capacidade de um país de exercer este poder global mediante os parâmetros militares, tecnológicos, produtivos, culturais, monetários e financeiros.
  • (5)
    Uma definição plausível do conceito de estabilizador hegemônico é encontrada em Keohane (1980)KEOHANE, R. O. The theory of hegemonic stability and changes in international economic regimes, 1967-77. In: HOLSTI, O. R.; SIVERSON, R. M.; GEORGE, A. L. (Org.). Change in the international system. Boulder Co: Westview, 1980.. Segundo o autor, “it holds that hegemonic structures of power, dominated by a single country, are most conductive to the development of strong international regimes whose rules are relatively precise and well obeyed. (...) The decline of hegemonic structures of power can be expected to presage a decline in the strength of corresponding international regimes” (p. 132).
  • (6)
    Não há um consenso sobre a definição de hegemonia entre as diferentes abordagens de Economia Política Internacional. O conceito varia desde a faculdade de coerção/cooptação de Estados soberanos pelo país dominante em termos militares e econômicos - vertente neorealista - até a capacidade de liderança/coordenação, pelo país economicamente mais avançado, das relações institucionais internacionais - variante “neoliberal”. Para uma análise detalhada das diferentes variantes do conceito de hegemonia e de estabilidade hegemônica, ver Fiori (2005)FIORI, J. L. Sobre o poder global. Novos Estudos Cebrap, São Paulo, v. 73, 2005.; Ribas (2001)RIBAS, V. T. Hegemonia e império: trajetória dos Estados Unidos na segunda metade do século XX. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2001. e Scandiucci Filho (2000)SCANDIUCCI FILHO, J. G. Hegemonia, estados e mercado nos arranjos de Bretton Woods. Tese (Doutorado)- Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 2000..
  • (7)
    Críticas ao conceito de estabilizador hegemônico podem ser identificadas em Fiori (2005)FIORI, J. L. Sobre o poder global. Novos Estudos Cebrap, São Paulo, v. 73, 2005.; Scandiucci Filho (2000)SCANDIUCCI FILHO, J. G. Hegemonia, estados e mercado nos arranjos de Bretton Woods. Tese (Doutorado)- Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 2000. e Pereira (2018)PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018.. Segundo Fiori (2005)FIORI, J. L. Sobre o poder global. Novos Estudos Cebrap, São Paulo, v. 73, 2005., a teoria do estabilizador hegemônico e dos ciclos sistêmicos “parecem excessivamente associados a uma visão funcionalista do ‘sistema mundial’”. (p. 64). Para Sandiucci Filho (2000) as abordagens neorealistas e neoliberais da teoria da hegemonia e do estabilizador hegemônico desconsideram o papel das relações entre autoridade política e mercado e a luta entre diferentes frações de classe como elementos pertinentes à constituição da ordem internacional (p. 7-8). Nos termos de Pereira (2018)PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018., as abordagens tradicionais da teoria do estabilizador hegemônico e dos ciclos sistêmicos ignoram a possibilidade de crises e desajustes econômicos internacionais decorrentes, não necessariamente de uma suposta crise de hegemonia, mas de mudanças históricas observadas no grau de desenvolvimento das forças produtivas do capital, em suas transformações tecnológicas e organizacionais e no padrão de acumulação e valorização daí decorrentes (p. 248).
  • (8)
    “A hegemonia dos Estados Unidos declinou e, enquanto caía, o sistema monetário com base no dólar-ouro desabou” (Hobsbawm, 1995HOBSBAWM, E. Era dos extremos: o breve século XX (1914 - 1989). Tradução de Marcos Santarrita; Revisão técnica de Marica Cecília Paoli. São Paulo: Companhia das Letras, 1995., p. 279). “A década de 1970 foi o momento histórico de transição da hegemonia ‘partilhada e contestada’ dos EUA para a hegemonia ‘absoluta’ que se reinaugurou com Reagan. Foi o período em que se estilhaçaram as normas e consensos estabelecidos em Bretton Woods” (Mazzucchelli, 2011MAZZUCCHIELLI, F. Os dias de sol: a formação da idade de ouro do capitalismo. Mimeo, 2011., p. 83).
  • (9)
    Parece-nos claro que Tavares (1985)TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985. relaciona a crise internacional, não apenas ao aparente desmoronamento do polo hegemônico - tal como os autores neorealistas e neoliberais de Economia Política Internacional -, mas à iminência da constituição de uma ordem policêntrica e assíncrona de poder. A crise de hegemonia é interpretada, portanto, como a possibilidade, não apenas aparente, de retração do poder e liderança do hegemon - os Estados Unidos.
  • (10)

    Tavares (1985)TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985. usa de forma aparentemente semelhante, e sem definição prévia, os termos retomada e reafirmação, criando certa ambiguidade conceitual.
  • (11)

    Cabe reconhecer que o tom dramático adotado por Tavares (1985)TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985., sobre a crise da hegemonia estadunidense, foi substituído, em Tavares e Melin (2017)TAVARES, M. C.; MELIN, L. E. Pós-escrito 1997: a reafirmação da hegemonia norte-americana. In: TAVARES, M. C.; FIORI, J. L. (Org.). Poder e dinheiro: uma economia política da globalização. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017., por uma abordagem mais plácida sobre os acontecimentos do período. Entretanto, o artigo traz, novamente, ambiguidade no uso dos termos retomada e reafirmação. Senão vejamos: as “crises que instabilizaram a economia mundial na década de 70 foram seguidas de dois movimentos de reafirmação da hegemonia americana no plano geoeconômico (diplomacia do dólar) e no plano geopolítico (diplomacia das armas) que modificaram, profundamente, o funcionamento e a hierarquia das relações internacionais a partir do começo da década de 1980” (p. 55). E em seguida, “conquanto ambos os movimentos hajam sido imprescindíveis ao esforço de retomada de sua hegemonia, o presente texto tomará por objeto, primordialmente, o plano geoeconômico, procurando explicitar a natureza das políticas de globalização, implementadas de forma sistemática mediante o apoio e pressão da potência hegemônica em prol da crescente liberalização dos movimentos de capital” (p. 57, grifos nossos).
  • (12)

    “Há algum tempo atrás, tudo levava a crer que os EUA tinham perdido a capacidade de liderar o mundo de uma maneira benéfica. Isso continua a ser verdade. Mas por outro lado os americanos, indiscutivelmente, deram, de 1979 a 1983, uma demonstração de sua capacidade maléfica de exercer sua hegemonia e de ajustar todos os países, através da recessão, ao seu desideratum. E o fizeram, está, claro, com uma arrogância e com uma violência sem precedentes” (Tavares, 1985TAVARES, M. C. A retomada da hegemonia americana. Brazilian Journal of Political Economy, v. 5, n. 2, abr./-jun. 1985., p. 8). Ver também, Armstrong (1991); Glyn et al. (1990)GLYN, A.; HUGUES, A.; LIPIETZ, A.; SINGH, A. The rise and fall of the golden age. In: MARGLIN, S. A.; SCHOR, J. B. The golden age of capitalism: reinterpreting the postwar experience. Oxford: Claredon Press, 1990. e Mazzucchelli (2011)MAZZUCCHIELLI, F. Os dias de sol: a formação da idade de ouro do capitalismo. Mimeo, 2011..
  • (13)

    Para mais detalhes sobre as discussões relacionadas à construção de narrativas no campo da descrição e do conhecimento científico, ver Le Goff (2011)LE GOFF, J. A história nova. In: NOVAIS, F.; SILVA, R. F. da (Org.). Nova história em perspectiva. São Paulo: Cosac & Naify, 2011.; Dobb (1978)DOBB, M. Teorias do valor e distribuição desde Adam Smith. Buenos Aires: Editora S.A., 1978.; Fernandes (1987)FERNANDES, F. Introdução. In: FERNANDES, F. (Org). Marx & Engels: história. São Paulo: Ed. Ática, 1987.; Vieira (2001)VIEIRA, A. G. Conceito de estrutura narrativa à sua crítica. Psicologia: Reflexão e Crítica, v. 14, n. 3, 2001. e Cardoso (2001).
  • (14)

    Para uma avaliação mais detalhada destas políticas externas, ver Pereira (2018)PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018..
  • (15)

    Ver também, Gray (1950).
  • (16)

    Até o final da década de 1960, havia 8 grandes acordos de defesa mútua entre os Estados Unidos e 48 países, além da assinatura de garantias de investimento privada com mais de 70 países subdesenvolvidos (Schiller; Phillips, 1972SCHILLER, I. H.; PHILLIPS, J. D. Super state: readings in the military-industrial complex. Illinois: University of Illinois Press, 1972., p. 22; Shoup, 1972SHOUP, D. M. The New American Militarism. In: SCHILLER, I. H.; PHILLIPS, J. (Org.). Super state: readings in the military-industrial complex. University of Illinois Press, 1972., p. 94; Magdoff, 1969MAGDOFF, H. The age of imperialism: the economics of U.S. Foreign Policy. New York; London: Modern Reader Paperbacks, 1969., p. 126-127). “Dentre os tratados militares, ressaltamos a OTAN (entre os Estados Unidos, Canadá e a maioria da Europa Ocidental), o Tratado Internacional de Assistência Recíproca (Entre os Estados Unidos e a maioria dos países do continente americano), o Pacto de Bagdá (entre os Estados Unidos, Iraque, Turquia, Grã Bretanha, Paquistão e Irã), o acordo de cooperação militar com a Libéria, o Tratado de Cooperação e Segurança Mútua entre os Estados Unidos e o Japão, o Tratado de Defesa Mútua entre os Estados Unidos e a Coreia do Sul e entre os Estados Unidos e a China, o SEATO (entre os Estados Unidos, Austrália, França, Nova Zelândia, Paquistão, Filipinas, Tailândia e Grã-Bretanha) e o ANZUS (entre os Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia)” (Pereira, 2018PEREIRA, L. R. Supremacia norte-americana e a gênese da ordem global: o mito dos anos dourados à luz dos imperativos imperialistas estadunidenses. Tese (Doutorado)-Instituto de Economia, Unicamp, Campinas, 2018., p. 211).
  • (17)

    “Shopping Center Global” foi a metáfora usada por Barnet e Muller (1974)BARNET, R.; MULLER, R. Global reach: the power of the multinational corporation. New York: Simon and Schuster, 1974. para descrever a formação do mercado mundial contemporâneo, apoiado no poder econômico e cultural das grandes corporações transnacionais, na integração comercial e na uniformização dos padrões de consumo em escala planetária.
  • (18)

    Sobre o conceito de capital internacional, ver Prado Jr. (1957PRADO JR., C. Esboços dos fundamentos da teoria econômica. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1957, cap. 7., cap. 7) e Sampaio Jr. (2012)SAMPAIO JR., P. A. Capitalismo dependente e reversão neocolonial. Tese (Livre Docência)- Memorial Acadêmico - Volume 2. Campinas-SP: Universidade Estadual de Campinas/Instituto de Economia, 2012..
  • (19)

    Para detalhes estatísticos, ver BIS (50th Annual Report, 1967 a 1980) e Board of Governos of The Fed System (1963BOARD OF GOVERNORS OF THE FED SYSTEM. Federal Reserve Bulletin, Washington, DC, v. 48, n. 8, Aug. 1963. a 1983).
  • (20)

    Sobre o conceito de modo de produção, ver Marx e Engels (2008)MARX, K.; ENGELS, F. Contribuição à crítica da economia política. São Paulo: Expressão Popular, 2008.. Para uma interpretação refinada deste conceito, compreendido como modo de vida centrado no trabalho enquanto posição teleológica, ver Lukács (2012)LUKÁCS, G. Para uma ontologia do ser social. São Paulo: Boitempo, 2012..

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2024

Histórico

  • Recebido
    29 Set 2021
  • Aceito
    06 Out 2023
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