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O CUIDADO AO PACIENTE COM CÂNCER SOB A ÓTICA DE ENFERMEIROS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE

RESUMO

Objetivo:

descrever a percepção de enfermeiros sobre o cuidado ao paciente com câncer na Atenção Primária à Saúde.

Método:

estudo qualitativo, desenvolvido em 26 Centros de Saúde da Família de um município do Oeste catarinense - Brasil, entre setembro e outubro de 2022. Participaram 33 enfermeiros, que responderam um questionário on-line. O texto foi interpretado com base nos preceitos conceituais da cultura organizacional da teoria administrativa de Chiavenatto. Questões objetivas foram analisadas pela frequência das respostas; para as dissertativas, utilizou-se o Discurso do Sujeito Coletivo.

Resultados:

os enfermeiros percebem-se despreparados e identificam ausência de protocolos e fluxos organizacionais.

Considerações finais:

na Atenção Primária à Saúde há a crença consolidada no cotidiano laboral e que se torna integrante da cultura organizacional dos serviços de saúde, que o paciente com câncer deve seguir para o cuidado especializado. Nota-se desconhecimento das políticas de saúde, o que implica o profissional na atenção ao paciente com câncer.

DESCRITORES:
Cuidados de Enfermagem; Oncologia; Enfermagem de Atenção Primária; Cuidados Paliativos; Pesquisa Qualitativa

ABSTRACT

Objective:

To describe nurses’ perceptions of cancer patient care in Primary Health Care.

Method:

A qualitative study was conducted in 26 Family Health Centers in a municipality in western Santa Catarina - Brazil, between September and October 2022. A total of 33 nurses took part and completed an online questionnaire. The text was interpreted based on the conceptual precepts of organizational culture from Chiavenatto’s administrative theory. The frequency of responses analyzed objective questions; the Collective Subject Discourse was used for the essay questions.

Results:

Nurses perceive themselves as unprepared and identify a lack of protocols and organizational flows.

Final considerations:

In primary Health Care, there is a belief consolidated in everyday work and becomes part of the organizational culture of health services, that cancer patients should go on to specialist care. There is a lack of knowledge of health policies, which implicates professionals in caring for cancer patients.

KEYWORDS:
Nursing Care; Medical Oncology; Primary Care Nursing; Palliative Care; Qualitative Research

RESUMEN

Objetivo:

describir las percepciones de los enfermeros sobre la atención al paciente oncológico en Atención Primaria.

Método:

estudio cualitativo realizado en 26 Centros de Salud de la Familia de un municipio del oeste de Santa Catarina - Brasil, entre septiembre y octubre de 2022. Participaron 33 enfermeros que cumplimentaron un cuestionario en línea. El texto se interpretó basándose en los preceptos conceptuales de la cultura organizativa de la teoría administrativa de Chiavenatto. Las preguntas objetivas se analizaron por la frecuencia de las respuestas; para las preguntas de ensayo, se utilizó el discurso del sujeto colectivo.

Resultados:

los enfermeros no se sienten preparados e identifican una falta de protocolos y flujos organizativos.

Consideraciones finales:

en Atención Primaria existe la creencia, consolidada en el trabajo diario y que se ha convertido en parte integrante de la cultura organizativa de los servicios sanitarios, de que los pacientes con cáncer deben pasar a la atención especializada. Existe un desconocimiento de las políticas sanitarias, que implica a los profesionales en la atención a los pacientes con cáncer.

DESCRIPTORES:
Cuidados de enfermería; Oncología; Enfermería de atención primaria; Cuidados paliativos; Investigación cualitativa

HIGHLIGHTS

Ao enfermeiro cabe cuidar do paciente com câncer na APS.

Implica aos serviços aperfeiçoar o cuidado ao paciente com câncer.

O enfermeiro deve protagonizar seu aperfeiçoamento ao paciente com câncer.

Estrutura organizacional/protocolos são prioridades para a enfermagem na APS.

INTRODUÇÃO

A atenção em saúde ao paciente oncológico está assegurada pela Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (Portaria N.º 874, de 16 de maio de 2013) e esta delibera que o cuidado deve ser integral, regionalizado e descentralizado11 Ministry of Health (BR). Ordinance No. 874 of May 16, 2013, establishes the National Policy for the Prevention and Control of Cancer in the Health Care Network for People with Chronic Diseases within the Unified Health System (SUS) scope. Official Diary of the Union, [Internet]. 2013 May 17 [cited 2022 Dec 08]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0874_16_05_2013.html
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. Com base na hierarquização do cuidado, é dever do Estado e dos municípios organizar este atendimento, definindo fluxos no sistema público, pontuando-se que o acesso se dá a partir da Rede de Atenção Básica à Saúde22 National Cancer Institute (BR). Patient assessment in palliative care [Internet]. Rio de Janeiro: INCA; 2022 [cited 2022 Dec. 08]. Available from: https://www.inca.gov.br/publicacoes/livros/avaliacao-do-paciente-em-cuidados-paliativos-cuidados-paliativos-na-pratica
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.

A fim de garantir a qualidade dos serviços no seguimento da assistência, a Portaria SAES/MS n.º 1399, de 17 de dezembro de 201933 Ministry of Health (BR). Ordinance No. 1399 of December 17, 2019: redefines the criteria and reference parameters for the qualification of high-complexity health establishments in oncology within the scope of the SUS. Official Diary of the Union [Internet]. 2019 Dec 17 [cited 2022 Dec. 03]. Available from: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files//media/document//portaria_1399_17dez2019.pdf
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, redefine critérios para a habilitação de estabelecimentos de saúde na alta complexidade em oncologia. Ademais, o câncer por se tratar de uma doença crônica potencialmente fatal, possui uma proteção específica garantida pela Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas no SUS, de 201744 Ministry of Health (BR). Consolidation Ordinance no. 02, of September 28, 2017: consolidation of standards on national health policies of the Unified Health System. Official Gazette of the Union [Internet]. 2017 Sept. 28 [cited 2022 Dec 03]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prc0002_03_10_2017.html#ANEXOIX
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, assim como a garantia de cuidados paliativos descritos na resolução n.º 41 de 2018 do Ministério da Saúde55 Ministry of Health (BR). Resolution no. 41, of October 31, 2018: provides guidelines for the organization of palliative care, in light of integrated continuous care, within the scope of the Unified Health System (SUS). Official Diary of the Union [Internet]. 2018 Oct. 31 [cited 2022 Dec 03]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cit/2018/res0041_23_11_2018.html
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.

Dessa forma, no âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS), a portaria n.º 825 de 2016, que redefiniu a Atenção Domiciliar no Sistema Único de Saúde (SUS), estrutura equipes multiprofissionais para atuarem nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), responsabilizando estas equipes ao primeiro atendimento a todo e qualquer usuário que acesse ao serviço66 Ministry of Health (BR). Ordinance no. 825, of April 25, 2016: redefines home care within the scope of the Unified Health System (SUS) and updates the qualified teams. Official Diary of the Union [Internet]. 2016 Apr. 25 [cited 2022 Dec 03]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/prt0825_25_04_2016.html
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.

Neste cenário, o Enfermeiro é peça-chave, geralmente por exercer papel de gestor, tornando-se o articulador do cuidado, e atua também na assistência direta ao paciente com câncer no acolhimento, na consulta de enfermagem e na continuidade do cuidado em todas as fases do tratamento. Portanto, o enfermeiro tem a chance de fortalecer o vínculo com os pacientes adscritos em seu território, o que o torna referência de apoio ao tratamento77 Bilhalva Y, Abreu F. The role of nurses in oncology: an integrative review. [Monography]. Porto Alegre (RS): Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande Do Sul; 2022..

Face ao exposto, constata-se uma contradição: apesar das legislações em saúde estabelecerem que a APS é uma esfera constituinte do cuidado ao paciente oncológico, o fato é que o cuidado a eles é visto pelos profissionais de saúde como competência da atenção terciária. Estes pacientes, ao acessarem a APS, geram nos profissionais insegurança por acreditarem que ali não é o local ideal de atendimento. Este “modus operandis” dos profissionais que estão na porta de entrada do SUS sustenta-se pelas especificidades da doença e seus tratamentos e pela complexidade do cuidado88 Melo CM, Sangoi KM, Kochhann JK, Hesler LZ, Fontana RT. Challenges and competences of nurses in palliative care in primary health care. Nursing Magazine. [Internet]. 2021 [cited 2023 Jan 10]; 24(277):5833-39. Available from: https://doi.org/10.36489/nursing.2021v24i277p5833-5846
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.

Em estudo realizado com 10 enfermeiros atuantes na APS do nordeste brasileiro revelou-se a existência de lacunas de conhecimento dos profissionais quanto a protocolos e programas que orientam a assistência oncológica, além de outras dificuldades vivenciadas na prática clínica88 Melo CM, Sangoi KM, Kochhann JK, Hesler LZ, Fontana RT. Challenges and competences of nurses in palliative care in primary health care. Nursing Magazine. [Internet]. 2021 [cited 2023 Jan 10]; 24(277):5833-39. Available from: https://doi.org/10.36489/nursing.2021v24i277p5833-5846
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-99 Chaves AFL, Pereira UL, Silva AM, Caldini LN, Lima LC, Vasconcelos HCA. Perceptions of primary health care nurses about the care of cancer patients. Enferm. Foco. [Internet]. 2020 [cited 2023 Jan 10]; 11(2):91-97. Available from: https://doi.org/10.21675/2357-707X.2020.v11.n2.2880
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. Noutra investigação1010 Fonseca DF, Borsatto AZ, Vaz DC, Santos R de C de J, Cypriano V de P, Pinto DC de S, et al. Integration with primary health care: experience of a referral unit in palliative oncology care. Rev. bras. cancerol. [Internet]. 2021 [cited 2023 Jan 10]; 67(4):011327. Available from: https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2021v67n4.1327
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, evidenciou-se que o conhecimento superficial sobre cuidados paliativos, atribuído a fragilidades na formação acadêmica e carência de capacitações, são barreiras a serem superadas na APS.

Por conseguinte, autores relatam a experiência positiva do ambulatório à distância, o qual objetiva a integração entre o Ambulatório do Hospital do Câncer IV do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) e a APS da cidade do Rio de Janeiro, demonstrando que é possível praticar assistência na APS. Esta iniciativa foi avaliada pelos profissionais como uma estratégia que assegura a qualidade dos cuidados1010 Fonseca DF, Borsatto AZ, Vaz DC, Santos R de C de J, Cypriano V de P, Pinto DC de S, et al. Integration with primary health care: experience of a referral unit in palliative oncology care. Rev. bras. cancerol. [Internet]. 2021 [cited 2023 Jan 10]; 67(4):011327. Available from: https://doi.org/10.32635/2176-9745.RBC.2021v67n4.1327
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. Diante do exposto, o presente estudo tem como objetivo descrever a percepção de enfermeiros sobre o cuidado ao paciente com câncer na Atenção Primária à Saúde.

MÉTODO

O texto foi interpretado com base nos preceitos conceituais da cultura organizacional, presentes na teoria da administração de Chiavenatto1111 Chiavenatto I. Administration in New Times. 2th ed. Rio de Janeiro; 2000., para o qual profissionais de determinada instituição compartilham valores e expectativas que exibem seus hábitos e suas crenças e caracterizam suas atitudes no ambiente interno e externo da instituição.

Os locais de pesquisa foram os Centros de Saúde da Família (CSF) de um município do Oeste catarinense que possui uma rede básica com 62 enfermeiros, distribuídos em 26 CSF. Participaram desta investigação 33 enfermeiros assistenciais atuantes nos CSF, com exceção daqueles em licença ou atestado no período da coleta dos dados.

A coleta de dados ocorreu entre setembro e outubro de 2022, de modo on-line, sendo que por e-mail enviou-se um convite individual, contendo um link do Google Forms com Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e um formulário com questões semiestruturadas relacionadas à assistência ao paciente oncológico no âmbito da APS.

Com a abordagem descrita, obteve-se a participação de 12 dos 62 profissionais. Logo, optou-se por reestruturar a proposta de coleta de dados, de forma a facilitar o acesso e ampliar a participação. Assim, o mesmo convite foi reencaminhado via 1 DOC (Canal oficial de comunicação interna da prefeitura desse município) individualmente, respeitando todos os aspectos éticos, o que permitiu a participação de mais 21 enfermeiros, totalizando 33 participantes.

No envio do questionário estipulou-se o prazo de 15 dias para devolutiva. Este foi estruturado a partir de questionamentos que permitisse aos pesquisadores obterem respostas visando atender ao objetivo do estudo. Dessa forma, perguntou-se sobre aspectos mais gerais, isto é, como o enfermeiro desenvolve a assistência ao paciente com câncer na APS e como ele se sente diante deste atendimento. Ademais, questionou-se sobre aspectos mais específicos: se o enfermeiro realiza consulta a pacientes com câncer na APS e se considera relevante ter instrumentos para orientar a consulta do enfermeiro a estes pacientes. O tempo estimado de resposta era de 30 minutos.

As questões objetivas foram analisadas a partir da frequência das respostas, o que permitiu que a equipe de pesquisa as agrupasse pela recorrência de seu conteúdo. Para as respostas dissertativas, utilizou-se a técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), que na primeira pessoa do singular expressa um conjunto de falas individuais semelhantes ou complementares1212 Lefevre F, Lefevre AMC. The collective subject that speaks. Interface - Comunic. Saúde, Educ. [Internet]. 2006 [cited 2023 Mar 20]; 10(20):517-524. Available from: https://doi.org/10.1590/S1414-32832006000200017
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. Os autores desta metodologia propõem quatro figuras metodológicas para a confecção do DSC: as expressões-chave (ECHs), as ideias centrais (IC), a ancoragem (AC) e o DSC.

As ECHs são fragmentos da fala que se revelam como conteúdo essencial ao que se propõe discutir. As IC são expressões linguísticas que correspondem a uma síntese, homogênea e o mais precisa possível das ECHs, vindo a dar origem ao DSC. Na AC, o pesquisador captura a expressão de uma teoria, ideologia ou uma crença adotada pelo participante e que está embutida no discurso como se fosse uma afirmação qualquer. Portanto, O DSC é uma agregação ou soma, não matemática, de trechos isolados de depoimentos, de modo a formar um todo discursivo coerente, em que cada uma das partes se reconheça como constituinte desse todo. É um discurso síntese, redigido na primeira pessoa do singular, e composto pela colagem das ECHs que têm a mesma IC ou AC1212 Lefevre F, Lefevre AMC. The collective subject that speaks. Interface - Comunic. Saúde, Educ. [Internet]. 2006 [cited 2023 Mar 20]; 10(20):517-524. Available from: https://doi.org/10.1590/S1414-32832006000200017
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.

Para estruturar o DSC, segue-se uma esquematização clássica com começo, meio e fim, e do geral para o particular. As partes do discurso, os parágrafos, são ligados por meio de conectivos que proporcionem a sua coesão, eliminando-se dados particulares, tais como sexo, idade, eventos particulares, doenças específicas e as repetições de ideias. Posterior a cada DSC, foi discutida a ideia central por meio de bibliografias que sustentarão o tema tratado1212 Lefevre F, Lefevre AMC. The collective subject that speaks. Interface - Comunic. Saúde, Educ. [Internet]. 2006 [cited 2023 Mar 20]; 10(20):517-524. Available from: https://doi.org/10.1590/S1414-32832006000200017
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.

O estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEPSH) da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), sob o parecer n.º 5.633.551. Os direitos dos participantes foram preservados ao longo do estudo, e todas essas etapas respeitaram as normas estabelecidas pela Resolução n.º 466/2012 e Resolução n.º 550/2016 do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS

Serão apresentados o perfil sociodemográfico, as análises frequências e os DSC. Na Figura 1, há o perfil dos participantes caracterizados a partir da idade, do sexo, da formação continuada e da experiência profissional.

Figura 1
Caracterização dos participantes. Chapecó, SC, Brasil, 2023

Em relação a como se desenvolve o cuidado de enfermagem a pacientes com câncer no âmbito da APS, 16 dos participantes ao serem questionados responderam que não há organização definida na unidade em que trabalha e afirmam que o cuidado é conduzido ao serviço especializado de oncologia, seis citam a utilização de um fluxo de atendimento estruturado na unidade, e cinco utilizam algum protocolo.

O DSC 1 e 2 conferem a ICs relativas ao questionamento anterior:

É realizada a assistência/acolhimento de demandas dos pacientes durante seu tratamento, sem um fluxo de atendimento específico. O diagnóstico inicial geralmente acontece na Atenção Básica [AB] e após é encaminhado para alta complexidade [oncologia] via regulação. (DSC1)

Ausência de fluxo de trabalho e protocolos que normatizam o cuidado de enfermagem. Após o resultado de mamografia [MMG] ou citopatológico [CP], ou qualquer outro exame sugestivo, avalia-se o resultado do exame e conduz o fluxo para especialista conforme protocolo municipal. (DSC2)

Quanto à continuidade do cuidado ao paciente com câncer pela APS, 28 afirmam que ocorre simultaneamente em APS e serviço especializado, quatro citam o atendimento exclusivo no serviço especializado, e um sinaliza atendimento exclusivo na APS.

A seguir, as ICs:

Os pacientes geralmente são acompanhados no setor de oncologia do hospital. A Unidade Básica de Saúde [UBS] geralmente presta assistência auxiliando nas orientações, agendamentos de exames e consultas, solicitação de transporte, realização de curativos, atendimento domiciliar e acompanhamento das outras demandas de saúde, ou seja, se enquadra no fluxo de atendimento dos demais pacientes da AB, são assistidos conforme a necessidade do seu quadro de saúde, tendo as suas demandas priorizadas. (DSC4)

Recebemos o paciente por procura espontânea, com diversas queixas e necessidades de cuidados, no seguimento, cura ou em fase terminal, com cuidado paliativo. Ele é acolhido pela equipe e encaminhado para avaliação do enfermeiro. O profissional realiza a consulta de enfermagem e prescreve as orientações e/ou tratamentos pertinentes à demanda do paciente. (DSC5)

Os participantes respondem como avaliam o cuidado em saúde a pacientes com câncer no âmbito da APS. Destes, 15 acreditam que o cuidado é parcialmente resolutivo; sete sinalizam um cuidado não resolutivo por não ser estruturado; cinco percebem um cuidado resolutivo; e outros seis percebem um cuidado não resolutivo, ainda que seja estruturado parcialmente.

E quanto à preparação para o atendimento, 21 se sentem parcialmente preparados; seis não se sentem preparados de maneira geral, isto é, independentemente de um atendimento especializado ou não; quatro não se sentem preparados por ser uma especialidade; e dois afirmam estar preparados para prestar cuidados a pacientes com câncer na APS.

A IC abaixo descreve a preparação profissional:

Despreparo profissional, e unilateralidade por estar atualmente mais voltado para um modelo biomédico, limitação de conhecimento sobre a doença, tratamento e cuidado, ou seja, pouca vivência/experiência, não saber lidar com siglas e ciclos de tratamento e complexidade de alguns casos. Precisa de mais preparo, mais capacitações das equipes de CSF. (DSC6)

A sequência de ICs revelam dificuldades encontradas no serviço para cuidar os pacientes com câncer na APS:

Referência e Contrarreferência, ou seja, dificuldade de acesso às informações do tratamento oncológico no Serviço de Oncologia, falta de capacitações e atualizações em oncologia, dificuldade na transversalidade do cuidado. Seria importante todo paciente com câncer ter consigo um sumário por escrito de como está sendo feito o tratamento, suas necessidades, medicações, próximas consultas e exames. Isso pode contribuir para o seguimento dos cuidados na UBS. (DSC7)

Paciente idoso com pouca instrução desacompanhado; dificuldade de compreensão durante o processo de cuidar, contrarreferência do serviço especializado com ausência de informações clínicas ou insuficientes, demora na resposta aos agendamentos de retorno. (DSC8)

Pouca oferta de suporte psicológico à família e paciente, já que são pacientes e familiares que podem psicologicamente afetados, familiares muitas vezes pouco orientados e com poucas condições para oferecer suporte emocional aos pacientes. Os acolhimentos de escuta são interrompidos devido outras demandas, o tempo nosso é diferente do tempo do paciente. (DSC9)

Dificuldade dos profissionais para cuidar a dor dos pacientes, ausência de medicações mais específicas para tratamento. É difícil conhecer todos os pacientes com câncer em atendimento no CSF para planejar o cuidado, dificuldades relacionadas com transporte, para poder acompanhar de forma contínua associado a dificuldades de locomoção até CSF. (DSC10)

Por fim, foi questionado sobre a existência de potencialidades no cuidado a pacientes com câncer, sendo que a multiprofissionalidade e o comprometimento profissional são fatores identificados como potenciais e as ICs expõe estas questões:

Equipe multiprofissional integrada e atuante. A proximidade e o vínculo entre paciente e equipe de CSF constitui uma excelente ferramenta no cuidado, que pode potencializar o cuidado adaptando às condições reais do paciente, conforme as tecnologias oferecidas. Desenvolvimento de ações direcionadas que produza a melhoria da qualidade de vida. Uso de práticas alternativas e complementares. (DSC11)

Comprometimento profissional e capacidade técnica, rapidez nos encaminhamentos, fluxo bem estabelecido no setor do Sistema de Regulação [SISREG], redes de apoio, acolhimento humanizado, acompanhamento holístico coletivo, para um cuidado integral e humanizado. Creio que todas as unidades possuem potências. (DSC12)

DISCUSSÃO

O cuidado ao paciente com câncer na APS foi descrito sob a ótica do processo de trabalho vivenciado pelos enfermeiros. Quanto à estruturação de um modelo assistencial, o presente estudo permite conjecturar sobre a carência de uma padronização, o que induz aos participantes, majoritariamente, eleger como tomada de decisão o encaminhamento destes pacientes aos setores especializados em oncologia.

Na atualidade, a necessidade de padronizar a prática assistencial ao paciente oncológico1313 Pasquetti PN, Gaulke M, Köfender L, Schindler ES, Herr GEG, Kolankiewicz ACB. Low resolution of care for cancer patients assisted in primary health care. In: 6 Proceedings of the 6th International Health Congress - CISAÚDE; 2019, May 27; Ijuí, Rio Grande do Sul, Brazil. [cited 2023 Mar 20]; p. 1-9. Available from: https://www.publicacoeseventos.unijui.edu.br/index.php/conintsau/article/view/11234/9830
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requer busca de alternativas na ausência de protocolos específicos. Um caminho resoluto pode ser a adesão ao Projeto Terapêutico Singular, no qual o cuidado é planejado pela equipe interdisciplinar e o próprio paciente, considerando suas reais necessidades1414 Oliveira JS, Constâncio TOS, Silva RS, Boery RNSO, Vilela ABA. Palliative care in primary health care: assignments of the nursing team. Rev. APS. [Internet]. 2021 [cited 2023 Mar 23]; 24(2):410-28. Available from: https://doi.org/10.34019/1809-8363.2021.v24.16848
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.

As evidências descritas nos discursos coletivos destacaram desconhecimento dos profissionais no que concerne ao teor da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) e da Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na Rede de Atenção à Saúde das pessoas com doenças crônicas11 Ministry of Health (BR). Ordinance No. 874 of May 16, 2013, establishes the National Policy for the Prevention and Control of Cancer in the Health Care Network for People with Chronic Diseases within the Unified Health System (SUS) scope. Official Diary of the Union, [Internet]. 2013 May 17 [cited 2022 Dec 08]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0874_16_05_2013.html
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,44 Ministry of Health (BR). Consolidation Ordinance no. 02, of September 28, 2017: consolidation of standards on national health policies of the Unified Health System. Official Gazette of the Union [Internet]. 2017 Sept. 28 [cited 2022 Dec 03]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prc0002_03_10_2017.html#ANEXOIX
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. Este desconhecimento, enquanto objeto de preocupação, tem sido foco de pesquisa, como em estudo realizado no nordeste brasileiro, em 2019, em que se identificou que os enfermeiros consideram importante a realização de ações voltadas para o cuidado ao paciente com câncer na APS; porém, não o fazem e admitem ainda a incipiência quanto aos programas e protocolos do Ministério da Saúde para orientar assistência a esse público99 Chaves AFL, Pereira UL, Silva AM, Caldini LN, Lima LC, Vasconcelos HCA. Perceptions of primary health care nurses about the care of cancer patients. Enferm. Foco. [Internet]. 2020 [cited 2023 Jan 10]; 11(2):91-97. Available from: https://doi.org/10.21675/2357-707X.2020.v11.n2.2880
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.

Outro estudo ratifica a existência do conhecimento deficiente e acrescenta que os profissionais reconhecem a falta de capacidade técnica em lidar com paciente oncológico, o que resulta em lacunas na assistência, prejudicando a continuidade do cuidado1515 Ramalho MNA, Beltrão TA, Barros MBSC, Silva FMC, Oliveira SHS. Follow-up of people with cancer by primary health care nurses. Rev Cubana Enfermer. [Internet]. 2019 [cited 2023 Mar 23]; 35(4):e3011. Available from: https://revenfermeria.sld.cu/index.php/enf/article/view/3011/512
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. E, no que tange à continuidade da assistência, os participantes do estudo valorizam esta prerrogativa, pois acreditam que no fluxo de atendimento suas necessidades devam ser priorizadas.

Portanto, o impacto do desconhecimento das políticas recai sobre a continuidade da assistência ao paciente com câncer tanto quanto compromete a qualidade dessa assistência. Esta constatação reflete uma problemática que abrange bem mais que a assistência ao paciente com câncer. O fato é que existe um descolamento entre a produção de políticas públicas e a sua execução; e, em geral, decorre do distanciamento entre os técnicos que elaboram o texto da política e o profissional a que se incumbe o cuidado estruturado na política. Este fato foi constatado em um estudo no qual foi possível detectar o desconhecimento de profissionais da rede de atenção, relativo à política que envolve a assistência à população ribeirinha, situação que dificulta aos profissionais organizarem o cuidado, tanto quanto identificarem os recursos disponíveis1616 Silva LB, Rodrigues ILA, Nogueira LMV, Silva IFS, Santos FV. Knowledge of primary health care professionals on health policies for the riverside population. Rev. Bras. Enferm. [Internet]. 2020 [cited 2023 Oct 23]; 73(5):e20190080. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2019-0080
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.

O compartilhamento de informações no itinerário do tratamento oncológico resulta em atendimento integral e resolutivo, bem como confere ao paciente tranquilidade e segurança em transitar pelos níveis de atenção à saúde. Dessa forma, a articulação é prevista pela Rede de Atenção à Saúde (RAS) e tem o potencial de evitar a sobrecarga da atenção especializada1717 Winter VDB, Rodrigues CD, Lorenzini E, Pluta P, Berghetti L, Kolankiewicz ACB. Discharge planning and referral of cancer patients to primary health care contribute to a better transition of care. In: 7 Proceedings of the UNIJUÍ Knowledge Hall; 2021, October 18; Ijuí, Rio Grande do Sul, Brazil. [cited 2023 Mar. 20]. p. 1-5. Available from: https://www.publicacoeseventos.unijui.edu.br/index.php/salaoconhecimento/article/view/20843
https://www.publicacoeseventos.unijui.ed...
. Nesse caso, é necessário garantir esta articulação para responder efetivamente às políticas criadas.

No que tange à enfermagem, o mais cruento envolvendo o papel do enfermeiro da APS acerca do cuidado ao paciente com câncer focaliza-se na delimitação e compreensão deste papel. Nota-se dúvidas dos profissionais quanto ao alcance de suas ações; portanto, muito além de protocolos que explicitem como cuidar do paciente com câncer na APS, é preciso definir com clareza o papel do enfermeiro, tanto quanto ocupar-se com a formação profissional.

A literatura sinaliza que há diferentes percepções quanto à assistência a esta especialidade na APS, mas compreender o fluxo de atendimento do paciente com câncer e rede de atenção do SUS é crucial para todos os profissionais e para a qualidade da assistência1818 Rosa LM, Souza AIJ, Anders JC, Silva RN, Silva GS, Fontão MC. Oncology nursing care and qualification demands in primary health care. Cogitare enferm. [Internet]. 2017 [cited 2023 Apr 15]; 22(4):1-9. Available from: http://dx.doi.org/10.5380/ce.v22i4.51607
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Na raiz deste problema, exibe-se o que já se apontou, isto é, o conhecimento e entendimento das políticas de cuidado ao paciente com câncer. Nesse sentido, salienta-se a importância das políticas públicas de saúde no combate ao câncer, bem como dos direitos sociais e das garantias fundamentais como alicerce da dignidade humana e do Estado Democrático de Direito1919 Dantas IR. Analysis of social rights and fundamental guarantees of patients with malignant neoplasm. [Monography]. Sousa (PB): Universidade Federal de Campina Grande; 2022..

O conhecimento acerca das políticas de saúde, que delimitam direitos e asseguram assistência aos pacientes com câncer, deve ser construído desde a formação profissional, bem como o senso crítico deve ser estimulado, a fim de qualificar a práxis do enfermeiro. Para tal, o assunto deve fazer parte das matrizes curriculares da graduação e pós-graduação, visto que se reconhece a carência na formação dos profissionais, reforçando a importância de incluir na matriz curricular o conhecimento no campo da oncologia99 Chaves AFL, Pereira UL, Silva AM, Caldini LN, Lima LC, Vasconcelos HCA. Perceptions of primary health care nurses about the care of cancer patients. Enferm. Foco. [Internet]. 2020 [cited 2023 Jan 10]; 11(2):91-97. Available from: https://doi.org/10.21675/2357-707X.2020.v11.n2.2880
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Neste quesito da formação, é pertinente introduzir concepções relativas às Práticas Avançadas, isto é, formação de Enfermeiros de Práticas Avançadas (EPA). E ainda que no Brasil seja incipiente o debate, tem sido vastamente discutido mundialmente com potencialidades já evidenciadas quanto à melhoria no processo assistencial na prática clínica2020 Lima BFC, Costa FS, Rabelo EM, Torres LM, Almeida SP. The dimensions of care in the nurses work process in Primary Health Care. BEPA. [Internet]. 2020 [cited 2023 Apr 15]; 17(202):1-20. Available from: https://doi.org/10.57148/bepa.2020.v.17.34259
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Um estudo, que objetivou investigar evidências quanto à formação de EPA no cuidado a pacientes com câncer, discute a relevância da estratégia na área oncológica, argumentando-se que os ajustes na formação potencializaram os resultados e as repercussões relevantes na ascendência de mortes ocasionadas por câncer, cujas estatísticas e previsões são alarmantes e, em última análise, a redução de custos2121 Schneider F. Advanced practice nursing in oncology: professional training proposal [Thesis]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2021..

No cenário da formação, inclui-se também a necessidade constante de aperfeiçoamento profissional, fato que reforça a demanda de capacitações específicas sobre assistência ao paciente oncológico na APS, bem como as suas famílias1818 Rosa LM, Souza AIJ, Anders JC, Silva RN, Silva GS, Fontão MC. Oncology nursing care and qualification demands in primary health care. Cogitare enferm. [Internet]. 2017 [cited 2023 Apr 15]; 22(4):1-9. Available from: http://dx.doi.org/10.5380/ce.v22i4.51607
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. A educação permanente em saúde é considerada uma estratégia que possui um caráter resolutivo e participativo, podendo ser desenvolvida por meio de metodologias ativas, como as simulações realísticas, e resultar em uma comunicação mais eficaz e eficiente2222 Jesus T. Continuing health education, a strategy for training and development for the SUS: Report on the ESP/SE innovation laboratory. Magazine Sergipana of Public Health. [Internet]. 2022 [cited 2023 May 10]; 1(1):84-93. Available from: https://www.revistasergipanadesaudepublica.org/index.php/rssp/article/view/15
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É válido destacar que a formação permanente é responsabilidade do serviço; contudo, quanto à educação continuada é de responsabilidade do profissional, e ainda que a educação providenciada pelo serviço seja organizada na instituição, ela deve suprir necessidades reportadas pelos profissionais. Assim, insere-se neste debate o envolvimento do profissional relativo ao seu aperfeiçoamento: ele protagoniza sua formação. Esta análise repercute na percepção do profissional sobre a sua capacidade em cuidar de pacientes com câncer, retratando como ele enxerga a resolutividade desse cuidado2323 Souza GRM, Cazola LHO, Pícoli RP. The work of primary health care nurses in oncology care: an integrative review. Cogitare Enferm. [Internet]. 2018 [cited 2023 May 14]; 23(4):e58152. Available from: https://doi.org/10.5380/ce.v23i4.58152
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Frente a isso, reforça-se na literatura sobre a importância de a gestão dos serviços fomentar a qualificação dos profissionais, seja organizando os processos indispensáveis à produção da EPS, seja no estímulo ao profissional para a produção de sua educação continuada, a exemplo de cursos de especialização, participação em eventos, para aprimorar o cuidado ao paciente com câncer e evitar insatisfação e ineficiência bilateralmente, em relação ao processo de trabalho imbricado a esta especialidade1515 Ramalho MNA, Beltrão TA, Barros MBSC, Silva FMC, Oliveira SHS. Follow-up of people with cancer by primary health care nurses. Rev Cubana Enfermer. [Internet]. 2019 [cited 2023 Mar 23]; 35(4):e3011. Available from: https://revenfermeria.sld.cu/index.php/enf/article/view/3011/512
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Na sequência, os participantes problematizam as dificuldades percebidas por eles, diante do processo de trabalho envolvendo o paciente com câncer. Nesse sentido, identificam-se divergências que podem resultar em consequências e/ou prejuízos na tramitação do tratamento destes pacientes, como, por exemplo, um tempo de espera para diagnóstico e início do tratamento não condizente com o que a política preconiza, implicando na sobrevida, visto que diminui as chances de cura e aumenta o risco de sequelas desses pacientes1515 Ramalho MNA, Beltrão TA, Barros MBSC, Silva FMC, Oliveira SHS. Follow-up of people with cancer by primary health care nurses. Rev Cubana Enfermer. [Internet]. 2019 [cited 2023 Mar 23]; 35(4):e3011. Available from: https://revenfermeria.sld.cu/index.php/enf/article/view/3011/512
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,2424 Neves FB. Health surveillance strategies for people with cancer from the perspective of health advocacy [Thesis]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 2022..

Estudo realizado em um município do sul do Brasil identificou falhas na coordenação do cuidado associadas à referência e contrarreferência e à comunicação dos diferentes pontos da rede. Falhas que poderiam ser corrigidas se houvessem tecnologias telecomunicativas2525 Pluta P, Schmidt CR, Loro MM, Alievi MF, Petenon MK, Kolankiewicz ACB. Coordination of care in primary health care from the perspective of the multidisciplinary team. In: 4 Proceedings of the UNIJUÍ Knowledge Hall; 2018, September 17; Ijuí, Rio Grande do Sul, Brazil. [cited 2023 May 20; p. 1-5. Available from: https://publicacoeseventos.unijui.edu.br/index.php/salaoconhecimento/article/view/9433
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. Recomenda-se, com o intuito de minimizar estas dificuldades, a organização de relatório de contrarreferência, a fim de garantir uma comunicação intersetorial efetiva; e a organização de relatório de contrarreferência, desenvolvido pela APS, para a qual incumbe-se a ordenação do cuidado, conforme previsto na Lei n.º 8.142 de regulamentação do SUS1515 Ramalho MNA, Beltrão TA, Barros MBSC, Silva FMC, Oliveira SHS. Follow-up of people with cancer by primary health care nurses. Rev Cubana Enfermer. [Internet]. 2019 [cited 2023 Mar 23]; 35(4):e3011. Available from: https://revenfermeria.sld.cu/index.php/enf/article/view/3011/512
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Além disso, os participantes valorizam o suporte emocional, ou melhor dizendo a ausência dele: percebem que paciente e família carecem de um olhar a esta necessidade de saúde, que acompanha esta condição de saúde desde seu diagnóstico até o seu desfecho. Acrescentam, também, que na estrutura do serviço se deva analisar as reais condições dos pacientes na assimilação do cuidado, especialmente quando são idosos2626 Silva AE, Guimarães MAM, Carvalho RC, Carvalho TV, Ribeiro SA, Martins MR. Palliative care: definition and strategies used in medical practive. RSD. [Internet]. 2021 [cited 2023 June 17]; 10(1):e18810111585. Available from: https://doi.org/10.33448/rsd-v10i1.11585
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Por outro lado, os participantes perceberam potencialidades no cuidado ao paciente com câncer; assim, o trabalho em equipe, a criação de vínculo fortalecido e um modelo de assistência humanizada se destacam. Estes achados são similares aos encontrados noutro estudo que evidenciou que os atributos, como vínculo da equipe com o paciente/familiar e acolhimento, acrescido de confiança e empatia, são aspectos importantes para o cuidado humanizado2727 Sartori KP. Perceptions of health professionals regarding palliative care in the context of primary health care [Dissertation]. São Carlos (SP): Federal University of São Carlos; 2022..

Como limitação do estudo em foco, pode-se destacar a utilização exclusivamente de um instrumento para coleta de dados, para os enfermeiros expressarem suas percepções. Do ponto de vista científico, quanto mais instrumentos adotarem para a coleta dados de uma pesquisa, mais exuberante e abrangente será o resultado oriundo dela. Dito isto, é importante sinalizar que nesta área de atuação da enfermagem, envolvendo o papel do enfermeiro ao paciente com câncer na APS, mais estudos devem ser desenvolvidos, de modo a mostrar os resultados futuros de práticas resolutivas neste nível de atenção.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apreende-se nos discursos dos enfermeiros do Centro de Saúde da Família analisado que na cultura organizacional da Atenção Primária em Saúde há uma crença que pacientes com câncer é percebido como um cuidado especializado, para o qual não se sentem preparados; assim, em meio a esta sensação, não conseguem capturar de forma assertiva qual o papel do enfermeiro no contexto da atenção ao paciente com câncer neste lócus assistencial. O desconhecimento das políticas de saúde envolvendo esta população reforça a concepção de que pacientes com câncer devem ser encaminhados ao serviço especializado, o que implica na não obrigatoriedade para este profissional em preparar-se para desenvolver este cuidado.

Desta forma, uma ação a ser traçada no âmbito da gestão dos serviços do Sistema Único de Saúde, visando resgatar este papel profissional da enfermagem na APS, é justamente promover estratégias que impliquem este profissional a assumir este papel, com conhecimento técnico e científico, tanto quanto das legislações que oferecem suporte na atenção ao paciente com câncer; assim como construir junto à APS um espaço de confiança e apoio, no qual o enfermeiro sinta-se fortalecido e consciente ao exercício do cuidado ao paciente com câncer. Neste caso, em última análise, promover uma cultura organizacional institucional, na qual sustenta-se a crença de que enfermeiros estão aptos a esta prática.

Nesse sentido, toma-se por eixo norteador a solução da problemática revelada neste estudo, que é acionar os processos formativos, sejam eles de natureza coletiva ao envolver as instituições neste compromisso social, sejam eles de natureza individual ao comprometer o próprio profissional à busca de aperfeiçoamento para atender a estes pacientes cuja especialidade é factual, mas não exime o enfermeiro da APS a prestar assistência. Portanto, ao destrinchar-se esta problemática basal, protocolos e estruturas organizacionais serão desenvolvidos, e o modelo de atenção sistematizado, enfim, incluirá esta população de pacientes.

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Editado por

Editora associada:

Dra. Luciana Kalinke

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    25 Ago 2023
  • Aceito
    27 Out 2023
Universidade Federal do Paraná Av. Prefeito Lothário Meissner, 632, Cep: 80210-170, Brasil - Paraná / Curitiba, Tel: +55 (41) 3361-3755 - Curitiba - PR - Brazil
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