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Efeito analgésico da pregabalina e do sulfato de magnésio no pósoperatório de mastectomia com linfadenectomia axilar

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Mastectomia com linfadenectomia é uma cirurgia que causa dor moderada ou intensa no pós-operatório imediato. Muitos fármacos adjuvantes, seguros, que promovem boa analgesia e com poucos efeitos adversos têm sido pesquisados. A pregabalina e o sulfato de magnésio são fármacos que promovem analgesia com poucos efeitos adversos. O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito analgésico da pregabalina e do sulfato de magnésio no pós-operatório de mastectomia com linfadenectomia axilar.

MÉTODOS:

Estudo randomizado e duplo-cego envolvendo 80 pacientes submetidas à mastectomia com linfadenectomia axilar sob anestesia geral. As pacientes foram divididas em quatro grupos: Controle (GC, não receberam o fármaco adjuvante proposto); Magnésio+Placebo (GM, receberam sulfato de magnésio durante a anestesia); Pregabalina+Magnésio (GP+M, receberam magnésio adicionado a pregabalina 150 mg antes e 12 h após a cirurgia); e Pregabalina+Placebo (GP, receberam a pregabalina). Todas as pacientes responderam o Self-Report Questionnaire 20 (SRQ-20) para rastrear possível transtorno mental e foram seguidas, monitorando o estado físico 1h, 12h e 24h após a cirurgia, através de anamnese, questionário de dor, consumo de opioides e presença de complicações e/ou eventos adversos como náusea, vômito e sonolência. A randomização foi realizada por meio de envelopes opacos e selados sem o conhecimento do anestesiologista (pesquisador) e do paciente.

RESULTADOS:

Foram randomizadas 20 pacientes para cada grupo, as quais foram analisadas ao fim do estudo. O número de pacientes apresentando dor ausente/leve no GP+M foi significantemente maior que nos GC, GM e GP após uma hora. Após 12 horas, GP+M e GP apresentaram maior número de pacientes com dor ausente/leve que GC e GM. Em 24 horas do pós-operatório, todos os pacientes de todos os grupos avaliados não apresentaram dor moderada/severa. Não houve diferença na frequência de pacientes apresentando náusea ou vômito, nem nos escores da avaliação do sono após a cirurgia nos quatro grupos.

CONCLUSÃO:

A associação de sulfato de magnésio e pregabalina causa boa analgesia de mastectomia com linfadenectomia axilar na primeira hora do pós-operatório. No entanto, o uso isolado do sulfato de magnésio não trouxe benefício para analgesia nestas pacientes, assim como a pregabalina sozinha se mostrou pouco efetiva na primeira hora de avaliação.

Descritores:
Dor pós-operatória; Pregabalina; Sulfato de magnésio

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Mastectomy with lymphadenectomy is a surgery associated with moderate to severe pain in the immediate postoperatory. Several safe adjuvant drugs that provide good analgesia with few adverse effects have been researched. Pregabalin and magnesium sulfate are drugs that promote analgesia with few adverse effects. The objective of the present study was to evaluate the analgesic effect of pregabalin and magnesium sulfate in the postoperatory of mastectomy with axillary lymphadenectomy.

METHODS:

Double-blinded, randomized study involving 80 patients submitted to mastectomy with axillary lymphadenectomy under general anesthesia. The patients were distributed into 4 groups: Control (CG, did not receive the proposed adjuvant drug); Magnesium+Placebo (MG, received magnesium sulfate during anesthesia); Pregabalin+Magnesium (P+MG, received magnesium added to pregabalin 150 mg before and 12 h after surgery); and Pregabalin+Placebo (PG, received pregabalin). All patients completed the Self-Report Questionnaire 20 (SRQ-20) to screen for possible mental disorders and had their physical status monitored at 1 h, 12 h, and 24 h after surgery, through anamnesis, pain questionnaire, opioid consumption, and presence of complications and/or adverse events such as nausea, vomiting, and sleepiness. Randomization was performed using sealed opaque envelopes without the knowledge of the anesthesiologist (researcher) and the patient.

RESULTS:

For each group, twenty patients were randomized, which were analyzed at the end of the study. The number of patients presenting absent/mild pain in P+MG was significantly higher than in CG, MG and PG after one hour. After 12 hours, P+MG and PG had more patients with absent/mild pain than CG and MG. At 24 hours postoperatively, all patients in all evaluated groups had no moderate/severe pain. There was no diference in the frequency of patients presenting nausea or vomiting, nor in the scores of the sleep evaluation after surgery in the four groups.

CONCLUSION:

The combination of magnesium sulfate and pregabalin provided satisfactory analgesia in the first hour after mastectomy with axillary lymphadenectomy. Nevertheless, magnesium sulfate isolated presented no analgesic beneft for the patients, and pregabalin isolated was only slightly effective at the first hour after surgery.

Keywords:
Postoperative pain; Pregabalin; Magnesium sulfate

INTRODUÇÃO

O carcinoma de mama é o câncer mais comum em mulheres e uma das duas mais frequentes causas de morte por tumor maligno feminino11 da Costa Vieira RA, Biller G, Uemura G, Ruiz CA, Curado M P. Breast cancer screening in developing countries. Clinics. 2017;72(4):244-53..

O tratamento do câncer de mama é complexo e muitas variáveis devem ser consideradas. Dentre elas, a mais importante é o estadiamento da doença, baseando-se na condição clínica do paciente. São três os principais objetivos do tratamento: controlar a doença local, evitar metástase e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Abordagens terapêuticas mais comuns são radioterapia, quimioterapia e cirurgia, como mastectomia com linfadenectomia axilar. Aproximadamente, 50% das pacientes submetidas a mastectomia apresentam dor moderada e cerca de 25% referem dor intensa neste período22 Manzoni M. Dor pós-operatória – preditores de dor pós-operatória crônica. In: SAERJ E, editor. Tópicos de Anestesia e Dor. Rio de Janeiro; 2011.,33 Na HS, Oh AY, Koo BW, Lim DJ, Ryu JH, Han JW. Preventive analgesic efficacy of nefopam in acute and chronic pain after breast cancer surgery: a prospective, double-blind, and randomized trial. Medicine. 2016;95(20):e3705..

A dor pós-operatória (DPO) é um processo multifatorial e, por esse motivo, usa-se a analgesia multimodal, que é um tipo de analgesia que atua em diferentes etapas das vias de condução dos estímulos nociceptivos e utiliza várias substâncias e/ou procedimentos analgésicos com o objetivo de aumentar a resposta com menor dose dos fármacos, efeito sinérgico ou aditivo, poupando o uso de opioides e, com isso, diminuindo os efeitos adversos desagradáveis destas substâncias. São utilizados anti-infamatórios não esteroidais (AINES), opioides, anticonvulsivantes gabapentinóides, antidepressivos, glicocorticoides, acetaminofeno, bloqueador de receptor N-Metil-D-Aspartato (NMDA), agonista α2-adrenérgico, bloqueio analgésico regional, infltração da ferida, entre outros. No entanto, o uso de todas essas substâncias ou procedimentos gera efeitos adversos como náuseas, vômitos, sonolência, tontura, hipotensão e outros44 Wick EC, Grant MC, Wu CL. Postoperative multimodal analgesia pain management with nonopioid analgesics and techniques: a review. JAMA Surg. 2017;152(7):691-7..

A pregabalina é um anticonvulsivante usado para tratamento da epilepsia e ansiedade e como adjuvante no tratamento da dor crônica55 Ben-Menachem E. Pregabalin pharmacology and its relevance to clinical practice. Epilepsia. 2004;45(Suppl 6):13-8..

Estudos indicam que a ação antinociceptiva da pregabalina está relacionada com a sua interação com as vias descendentes noradrenérgica e serotoninérgica de modulação da dor na medula espinhal e reduz a liberação de neurotransmissores excitatórios na medula e em algumas áreas do cérebro em estado neuronal hiperativo, como na dor neuropática66 Stahl SM, Porreca F, Taylor CP, Cheung R, Torpe AJ, Clair A. The diverse therapeutic actions of pregabalin: is a single mechanism responsible for several pharmacological activities? Trends Pharmacol Sci. 2013;34(6):332-9.. A pregabalina seria uma boa opção para redução da DPO em cirurgias ortopédicas quando usada no perioperatório, diminuindo o uso de opioides e a incidência de dor crônica, apesar de aumentar a sedação em alguns pacientes77 Brunton LM, Laporte DM. Use of gabapentin and pregabalin for hand surgery patients. J Hand Surg Am. 2012;37(7):1486-8.. Entretanto, ainda não há consenso sobre a posologia da pregabalina para tratamento da DPO88 Bruhn J, Schefer GJ, van Gefen GJ. Clinical application of perioperative multimodal analgesia. Curr Opin Support Palliat Care. 2017;11(2):106-11.,99 Practice guidelines for acute pain management in the perioperative setting: an updated report by the American Society of Anesthesiologists Task Force on Acute Pain Management. Anesthesiology. 2012;116(2):248-73..

O magnésio é um antagonista fsiológico natural do cálcio e um antagonista natural dos receptores NMDA1010 Lui F, Ng K F. Adjuvant analgesics in acute pain. Expert Opin Pharmacother. 2011;12(3):363-85.. Em uma metanálise sobre efeito do magnésio como adjuvante analgésico de cirurgias abdominais, histerectomias e ortopédicas, concluiu-se que o magnésio causa diminuição do uso de opioides, diminuição da intensidade de dor quando administrado por via endovenosa em bolus ou bolus e infusão contínua ou apenas infusão contínua, sem provocar alterações importantes em aparelho cardiovascular. A dose de magnésio em bolus varia de 30 a 50 mg.kg-1 e a dose total, quando associada a infusão contínua, varia de 1,03 a 23,5 g1111 Albrecht E, Kirkham KR, Liu SS, Brull R. Peri-operative intravenous administration of magnesium sulphate and postoperative pain: a meta-analysis. Anaesthesia. 2013;68(1):79-90..

Não foram encontrados estudos sobre o efeito analgésico do magnésio e da pregabalina poupando o uso de opioides em mastectomia com linfadenectomia axilar.

Como a dor é uma sensação desagradável e pessoal, há dificuldade em quantificá-la em cada paciente. Existem algumas escalas de dor que servem como ferramentas para mensurá-la. Dentre essas escalas, as mais utilizadas são a Escala Analógica Visual (EAV), a Escala Numérica e a Escala Verbal. A Escala Numérica consiste de 11 pontos de zero a 10, sendo o zero quando paciente refere não ter dor alguma e 10 a pontuação referente a pior dor imaginável. Ela tem vantagem sobre as outras por fornecer, mais facilmente, dados para análise estatística1212 Williamson A, Hoggart B. Pain: a review of three commonly used pain rating scales. J Clin Nurs 2005; 14:798-804..

Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito analgésico isolado ou combinado de pregabalina e sulfato de magnésio no pós-operatório da mastectomia com linfadenectomia axilar. Secundariamente, objetivou-se avaliar a frequência de náusea e/ou vômito com a associação de pregabalina e sulfato de magnésio; avaliar a frequência de sonolência com a associação de pregabalina e sulfato de magnésio; e verificar a associação de possíveis transtornos de humor com a intensidade da dor nos pacientes do estudo.

MÉTODOS

Este é um ensaio clínico randomizado, controlado por placebo, paralelo, duplo-cego e com quatro braços. Foi realizado no Hospital Haroldo Juaçaba – Instituto do Câncer do Ceará. A amostra estudada foi triada dentre os pacientes que iriam se submeter a mastectomia com linfadenectomia axilar. O estudo foi realizado no centro cirúrgico, prosseguindo na sala de recuperação e enfermarias hospitalares, de março de 2015 a novembro de 2017. Este ensaio clínico está registrado no Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (ReBEC) sob o número RBR-59m3sj. Todos as pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O CONSORT Statement foi utilizado para o relato deste ensaio clínico.

Foram incluídas 80 mulheres, com idade igual ou maior de 18 anos; com indicação de mastectomia com linfadenectomia axilar; em estado físico compatível com a classificação da American Society of Anesthesiologist (ASA) I e II (paciente sadio sem alterações orgânicas ou com alteração sistêmica leve ou moderada causada pela doença cirúrgica ou doença sistêmica); que não tinham apresentado intolerância a pregabalina e/ou magnésio previamente; não apresentavam história de alergia a cetoprofeno e/ou dipirona; não apresentavam história prévia de doença hepática ou renal, ou qualquer outra doença que contraindicava o uso de pregabalina ou magnésio; não tinham consumido opioides 48 h antes da cirurgia e não faziam uso de bloqueadores de canal de cálcio. Foram excluídas do estudo as pacientes que relataram reação alérgica a dipirona, e/ou cetoprofeno, e/ou pregabalina e/ou sulfato de magnésio; apresentaram qualquer evento clínico que indicava interromper o procedimento, como hipotensão ou bradicardia grave de difícil controle, exceto por retirada da infusão do sulfato de magnésio.

Na sala pré-anestésica, aplicou-se o Self-Report Questionnaire 20 (SRQ-20), elaborado pela Organização Mundial de Saúde e validado no Brasil em 1986, que auxilia na detecção de transtornos psicoemocionais, como ansiedade ou depressão, e que podiam causar viés de confusão.

Após randomização simples com envelopes opacos, selados e numerados sequencialmente, uma hora antes do ato cirúrgico, as pacientes foram distribuídas em quatro grupos de estudo, com 20 participantes em cada, da seguinte forma: grupo GP (Pregabalina + Placebo) recebeu pregabalina 150 mg por via oral 90 minutos antes do procedimento anestésico e 12 h após a cirurgia e, durante o ato cirúrgico, recebeu solução fsiológica sem sulfato de magnésio; grupo GM (Magnésio + Placebo) recebeu placebo de pregabalina 90 minutos antes e 12 h após a cirurgia e, na indução anestésica, recebeu sulfato de magnésio na dose de 50 mg/kg, endovenoso, com manutenção de 10 mg/kg/h; grupo GP+M (Pregabalina + Magnésio) recebeu pregabalina 150 mg por via oral 90 minutos antes do procedimento anestésico e 12 h após a cirurgia e, na indução anestésica, recebeu sulfato de magnésio na dose de 50 mg/kg, endovenoso, com manutenção de 10 mg/kg/h; e o grupo GC (Controle) recebeu placebo de pregabalina 90 minutos antes e 12 h após a cirurgia e, durante o ato cirúrgico, recebeu solução fsiológica sem sulfato de magnésio.

Todas as pacientes foram submetidas ao mesmo planejamento anestésico, composto por midazolam na dose de 0,03 mg/kg, por via venosa, 30 min antes da anestesia geral, seguida por propofol, fentanil, remifentanil, cisatracúrio e sevofurano. As pacientes foram submetidas a anestesia geral balanceada. A dose total e o momento da última administração de fentanil foram registrados no final da cirurgia. Todas as pacientes receberam dipirona 20 – 30 mg/kg e cetoprofeno 100 mg por via venosa após início da cirurgia. Foi registrada qualquer alteração de pressão arterial (PA), oximetria de pulso, frequência cardíaca (FC) e capnografia.

Em todas as pacientes, na sala de recuperação pós-anestésica, foram administrados fármacos analgésicos (dipirona e tramadol) em horário preestabelecido. Foi realizado acompanhamento pelo pesquisador durante 24 h após a cirurgia, monitorando o estado do paciente 1, 12 e 24 h, através de anamnese, medida de intensidade de dor (Escala Numérica), sendo este o objetivo principal deste estudo, evolução dos sintomas álgicos, necessidade de utilização de opioides e presença de complicações e/ou eventos adversos como náusea, vômito e sonolência pela escala de Ramsay.

Na escala de Ramsay, o grau 1 é dado para paciente que se encontra agitado; grau 2 ao tranquilo; grau 3 ao sonolento, mas que já atende aos comandos; grau 4 ao paciente que está dormindo, mas responde rapidamente ao estímulo sonoro vigoroso; grau 5 ao paciente dormindo que responde lentamente ao estímulo sonoro vigoroso; e grau 6 ao paciente que se apresenta dormindo e não responde a nenhum estímulo. Além disso, foi correlacionada a ausência ou presença de náusea ou vômito com pontos de zero a 2, sendo zero a ausência desses sintomas, 1 quando paciente sente náusea e 2 se apresenta vômito.

Todas as pacientes receberam dipirona 1 g por via venosa a cada 6 h no período pós-operatório até alta hospitalar e fzeram uso de tramadol 100 mg por via venosa, se solicitado, por motivo de dor, e o horário deste fármaco foi registrado para posterior avaliação.

O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa (CEP – CAAE: 30802414.0.0000.5528).

Análise estatística

Os dados numéricos foram expressos em forma de média e desvio padrão, analisados pelo teste de Kolmogorov-Smirnov e comparados por meio dos testes ANOVA/Bonferroni (dados paramétricos) ou Kruskal-Wallis/Dunn (dados não paramétricos). Os dados categóricos foram expressos em forma de frequência absoluta e percentual e comparados por meio do teste do Qui-quadrado. O software utilizado foi o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 20,0 para Windows, adotando uma confança de 95%.

RESULTADOS

Características demográficas dos pacientes deste estudo, tais como idade, peso, altura e índice de massa corporal, estão apresentado na tabela 1.

Tabela 1.
Características demográficas dos pacientes

O tempo médio de anestesia (momento da extubação) e o consumo de fentanil e sevofurano estão apresentados na tabela 2, não apresentando diferença estatisticamente significante entre grupos.

Tabela 2.
Característica da anestesia realizada nos grupos

No GC e G P, não houve administração de sulfato de magnésio. Nos demais grupos não houve diferença significante quanto a quantidade de magnésio administrado. Em todas as pacientes, foi usada apenas a dose inicial de relaxante muscular, cisatracúrio, sem dose adicional durante o procedimento anestésico e todas atingiram TOF>0,9 antes do tempo de extubação (Tabela 2).

A pontuação média do SRQ-20 também não apresentou diferença estatisticamente significante entre os grupos estudados (p=0,233), a saber: GC (5,45±3,73), GM (4,25±2,27), GP+M (3,90±2,65) e GP (3,85±2,11).

Com relação ao tempo para solicitação do primeiro analgésico, tramadol, a maioria dos pacientes fez uso do opioide nos primeiros 60 minutos após a cirurgia. No entanto, os grupos tratados com pregabalina apresentaram maior frequência de pacientes fazendo uso de tramadol com mais de 60 minutos (n=6, 30,0%) que os grupos magnésio + placebo (n=3, 15,0%) e placebo (n=0, 0,0%) (p=0,044) (Tabela 3).

Tabela 3.
Tempo para primeira solicitação de analgésico

O número de pacientes apresentando dor leve, isto é, intensidade de dor de zero a três, no GP+M, foi significativamente maior que nos outros grupos após 1 h. Após 12 h, os grupos GP+M e GP apresentaram maior número de pacientes com dor ausente/leve que o GC e GM. Em 24 h do pós-operatório, todos os pacientes de todos os grupos avaliados não apresentaram dor moderada/intensa (Tabela 4).

Tabela 4.
Frequência de dor nos grupos de acordo com classificação da intensidade

Não houve diferença na frequência de pacientes apresentando náusea ou vômito após 1, 12 ou 24 h entre os grupos. Também não houve diferença nos escores de sono entre os quatro grupos nos tempos de 1, 12 e 24 h (Tabelas 5 e 6).

Tabela 5.
Frequência de náusea/vômito nos grupos estudados
Tabela 6.
Frequência de sonolência nos grupos estudados

Sabendo que pacientes que obtiveram pontuação acima de 7 no questionário SRQ-20 eram suspeitos de apresentar transtorno psicoemocional e poderiam apresentar maior intensidade de dor por meio da aplicação da escala analógica visual, comparou-se estes pacientes suspeitos e não suspeitos com o nível de dor referido em cada momento avaliado.

A presença ou ausência de suspeição de transtorno psicoemocional não interferiu na frequência e nível de DPO nos quatro grupos experimentais em nenhum dos momentos avaliados (Tabela 7).

Tabela 7.
Suspeição de transtorno psicoemocional nos diferentes grupos de acordo com a intensidade de dor

DISCUSSÃO

A associação de sulfato de magnésio e pregabalina promoveu analgesia mais eficaz na primeira hora e até 12 horas após a cirurgia de mastectomia com linfadenectomia axilar. Porém, o uso isolado de pregabalina ou sulfato de magnésio não melhorou a analgesia dessas pacientes na primeira hora do pós-operatório. Em 12 h do pós-operatório, o uso isolado de pregabalina promoveu analgesia satisfatória, no entanto o sulfato de magnésio isolado não causou adequada analgesia. Em 24 h do pós-operatório, o uso isolado de pregabalina e de sulfato de magnésio foi semelhantemente eficaz para analgesia. Não foi observado aumento da frequência de náusea, vômito nem sonolência com o uso desta associação. A suspeição de transtorno psicoemocional também não mostrou interferência na intensidade de dor.

Vários estudos indicam que a DPO da mastectomia é moderada ou intensa, e várias formas de analgesia têm sido utilizadas. Em estudo de coorte de 2013, analisando a intensidade da DPO de várias cirurgias, verificou-se que mastectomia com ou sem linfadenectomia axilar causa dor de moderada intensidade no primeiro dia após a cirurgia1313 Ferreira Laso L, Lopez-Picado A, Lamata L, Ceballos Garcia M, Ibanez Lopez C, Pipaon Ruilope L, et al. Postoperative analgesia by infusion of local anesthetic into the surgical wound after modifed radical mastectomy: a randomized clinical trial. Plast Reconstr Surg. 2014;134(6):862e-70e.,1414 Gerbershagen HJ, Aduckathil S, van Wijck AJ, Peelen LM, Kalkman CJ, Meissner W. Pain intensity on the first day after surgery: a prospective cohort study comparing 179 surgical procedures. Anesthesiology. 2013;118(4):934-44..

Neste ensaio, o GC, que não recebeu pregabalina nem sulfato de magnésio, apresentou dor de intensidade moderada ou intensa na primeira hora de pós-operatório de mastectomia com linfadenectomia, tornando-se leve após 24h, apesar da utilização de dipirona, cetoprofeno e tramadol quando solicitado.

Neste estudo, a avaliação da analgesia foi realizada considerando a Escala Numérica e o tempo em que foi solicitada a primeira dose de analgésico. Foi observada, então, adequada analgesia promovida pela pregabalina com intensidade de dor abaixo de 4 somente a partir da avaliação realizada 12 h após a cirurgia, pois na primeira hora de avaliação apenas 4 pacientes atingiram pontuação na Escala Numérica abaixo de 4. Contudo, quando se associa a pregabalina ao sulfato de magnésio, a analgesia na primeira hora foi adequada, não atingindo escore acima de 3 na escala da dor.

O consumo de opioide nos pós-operatório foi similar entre os grupos, pois a maioria dos pacientes solicitou o tramadol em 1 h após a cirurgia. Apenas um paciente do GC solicitou este fármaco apenas uma vez no pós-operatório tardio antes de 24 h. Deve ser considerado que a comparação do consumo de opioide entre os grupos no pós-operatório é de grande valor para dar mais robustez a estudos, mas seria necessário o uso de analgesia controlada pelo paciente (ACP), porém, o material utilizado para esta finalidade nem sempre é disponível em todos os hospitais.

Uma metanálise1515 Guo BL, Lin Y, Hu W, Zhen CX, Bao-Cheng Z, Wu HH, et al. Efects of systemic magnesium on post-operative analgesia: is the current evidence strong enough? Pain Physician. 2015;18(5):405-18. concluiu que a analgesia do sulfato de magnésio ocorre após cirurgias ortopédicas, cardiovasculares e urogenitais, diminuindo a dor, principalmente após 6 h do término da cirurgia.

A área anatômica da cirurgia deste estudo, mama, é diferente do local cirúrgico avaliado e este fator pode ser um motivo de não se ter encontrado o mesmo resultado da metanálise.

Efeitos adversos, como náusea e vômito e sonolência, não diferiram entre os grupos em nenhum momento da avaliação, diferente do que foi encontrado na metanálise, em que a pregabalina diminui a incidência de náusea e vômito e nas doses única ou múltiplas de 300 mg pode causar sedação1616 Mishriky BM, Waldron NH, Habib AS. Impact of pregabalin on acute and persistent postoperative pain: a systematic review and meta-analysis. Br J Anaesth. 2015;114(1):10-31.. Esse fato pode ser relacionado a dose utilizada no presente estudo.

CONCLUSÃO

Este ensaio mostrou eficácia da terapia multimodal baseada na associação de sulfato de magnésio e pregabalina para controle da DPO de mastectomia com linfadenectomia.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2021
  • Aceito
    06 Jan 2022
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