Acessibilidade / Reportar erro

Quando professores que ensinam Matemática elaboram produtos educacionais, coletivamente, no âmbito do Mestrado Profissional

When mathematics teachers create educational products collectively in the context of a Professional Master's program

Resumos

Este artigo tem por objetivo caracterizar os produtos educacionais que estão sendo produzidos na perspectiva da Atividade Orientadora de Ensino (MOURA, 2010), de forma coletiva, por professores da Educação Básica que ensinam Matemática e que estão em atividade de pesquisa, no âmbito do Mestrado Profissional. Aqui, o produto educacional é resultado de um processo reflexivo e contextualizado, que contêm saberes experienciais e teóricos. Contém fluência, movimento, e nunca está pronto e acabado porque representa a dinâmica das aulas de Matemática. Cria situações de ensino e de aprendizagem, define os modos ou procedimentos que colocarão os conteúdos matemáticos em jogo na sala de aula, elege os recursos metodológicos adequados aos objetivos e ações elencados pelos professores, e, por último, indica os processos de análises e sínteses feitas pelos envolvidos no processo de criá-lo. Nesta perspectiva, tal qual a Atividade Orientadora de Ensino, os produtos educacionais, elaborados coletivamente, representam a unidade entre ensino e aprendizagem.

Produtos Educacionais; Atividade Orientadora de Ensino; Situações de Ensino e de Aprendizagem


The aim of this paper is to characterize educational products produced collectively in the perspective of the Guiding Activity of Teaching by basic education mathematics teachers engaged in research activity in the context of a Professional Master's program. The educational product is the result of a reflective and contextualized process containing theoretical and experiential knowledge. It contains fluency and movement and is never finished and complete because it represents the dynamics of mathematics classes. It creates situations of teaching and learning, defines the ways or procedures that will put the mathematical content into play in the classroom, elects the methodological resources that are fitting for the objectives and actions listed by the teachers; finally, it indicates the processes of analysis and summaries made by those involved in the process of creating it. In this perspective, the educational products represent the unity between teaching and learning.

Educational Products; Guiding Activity of Teaching; Situations of Teaching and Learning


Quando professores que ensinam Matemática elaboram produtos educacionais, coletivamente, no âmbito do Mestrado Profissional

When mathematics teachers create educational products collectively in the context of a Professional Master's program

Maria do Carmo de Sousa

Doutora em Educação pela Universidade de Campinas (UNICAMP). Docente do Departamento de Metodologia de Ensino (DME), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos, SP, Brasil. Membro do Núcleo Interativo de Pesquisas em Educação Matemática (NIPEM); Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática (GEM) e do Grupo de Estudos e Pesquisa Formação Compartilhada de Professores - Escola e Universidade (GPEFCom)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria do Carmo de Sousa Rua Prof. Paulo Mont Serrat, 510, casa 44, Jardim Ricetti CEP: 13.570-003, São Carlos, SP, Brasil E-mail: mdcsousa@ufscar.br

RESUMO

Este artigo tem por objetivo caracterizar os produtos educacionais que estão sendo produzidos na perspectiva da Atividade Orientadora de Ensino (MOURA, 2010), de forma coletiva, por professores da Educação Básica que ensinam Matemática e que estão em atividade de pesquisa, no âmbito do Mestrado Profissional. Aqui, o produto educacional é resultado de um processo reflexivo e contextualizado, que contêm saberes experienciais e teóricos. Contém fluência, movimento, e nunca está pronto e acabado porque representa a dinâmica das aulas de Matemática. Cria situações de ensino e de aprendizagem, define os modos ou procedimentos que colocarão os conteúdos matemáticos em jogo na sala de aula, elege os recursos metodológicos adequados aos objetivos e ações elencados pelos professores, e, por último, indica os processos de análises e sínteses feitas pelos envolvidos no processo de criá-lo. Nesta perspectiva, tal qual a Atividade Orientadora de Ensino, os produtos educacionais, elaborados coletivamente, representam a unidade entre ensino e aprendizagem.

Palavras-chave: Produtos Educacionais. Atividade Orientadora de Ensino. Situações de Ensino e de Aprendizagem.

ABSTRACT

The aim of this paper is to characterize educational products produced collectively in the perspective of the Guiding Activity of Teaching by basic education mathematics teachers engaged in research activity in the context of a Professional Master's program. The educational product is the result of a reflective and contextualized process containing theoretical and experiential knowledge. It contains fluency and movement and is never finished and complete because it represents the dynamics of mathematics classes. It creates situations of teaching and learning, defines the ways or procedures that will put the mathematical content into play in the classroom, elects the methodological resources that are fitting for the objectives and actions listed by the teachers; finally, it indicates the processes of analysis and summaries made by those involved in the process of creating it. In this perspective, the educational products represent the unity between teaching and learning.

Keywords: Educational Products. Guiding Activity of Teaching. Situations of Teaching and Learning.

1 Introdução

No final dos anos 90, através da Portaria 80/98, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) passa a reconhecer e a regulamentar os Mestrados Profissionais, no Brasil, os quais foram denominados, naquele momento, Profissionalizantes. A partir de então, para que um curso, em nível de Mestrado, seja considerado Profissional um dos requisitos exigidos pela Portaria está atrelado ao formato do trabalho final, denominado por muitas instituições de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Tal trabalho deve indicar:

domínio do objeto de estudo, (sob a forma de dissertação, projeto, análise de casos, performance, produção artística, desenvolvimento de instrumentos, equipamentos, protótipos, entre outras, de acordo com a natureza da área e os fins do curso) e capacidade de expressar-se lucidamente sobre ele (CAPES, 1998, p. 01).

No que diz respeito aos Mestrados Profissionais, desenvolvidos na área do Ensino a elaboração de um trabalho final de pesquisa profissional deve ser:

aplicada, descrevendo o desenvolvimento de processos ou produtos de natureza educacional, visando à melhoria do ensino na área específica, sugerindo-se fortemente que, em forma e conteúdo, este trabalho se constitua em material que possa ser utilizado por outros profissionais (MOREIRA, 2004, p. 134).

Aqui, percebe-se a tentativa de apontar uma primeira caracterização, no que diz respeito ao tipo de pesquisa aplicada que deve compor o que, atualmente, está sendo denominado de produto educacional, no Mestrado Profissional.

Surgem, então, algumas questões: 1) o que é uma pesquisa aplicada, na área do ensino, especialmente, no ensino de Matemática? 2) como deve ser elaborado o produto educacional, de forma que possa orientar o ensino, especialmente o ensino de Matemática, da Educação Básica? 3) até onde esse produto pode ser produzido em larga escala, para que outros profissionais possam utilizá-lo? 4) como os professores da Educação Básica, especialmente aqueles que ensinam Matemática, constroem o produto educacional no âmbito dos Mestrados Profissionais? 5) como caracterizar certos produtos como educacionais?

Entendemos que as respostas às questões apresentadas acima podem estar relacionadas à visão de mundo, de ensino e de aprendizagem que vão sendo construídas, no processo de tornar-se professor, principalmente quando esse profissional tem a oportunidade de desenvolver atividades de pesquisa, como é o caso do Mestrado Profissional.

Dessa forma se, considerarmos os pressupostos da Atividade Orientadora de Ensino (AOE), conforme apontam os estudos de Moura (2010, p. 94), fundamentados na Teoria da Atividade, preconizada por Leontiev, entendemos que, os produtos educacionais da área de Matemática, podem ser caracterizados como "unidades entre ensino e aprendizagem". Devem considerar as necessidades, os motivos, as ações e as operações, presentes no cotidiano de estudantes e de professores da Educação Básica. Logo, tais produtos também podem revelar o entendimento que professores têm sobre o fazer matemático, nas salas de aulas. Aqui, o professor concretiza: "objetivos sociais objetivados no currículo escolar, organiza o ensino: define ações, elege instrumentos e avalia o processo de ensino e aprendizagem" (MOURA, 2010, p. 94), uma vez que:

os elementos característicos da AOE (necessidades, motivos, ações, operações) permitem que ela seja elemento de mediação entre a atividade de ensino e a atividade de aprendizagem. Logo, a atividade de ensino e a atividade de aprendizagem só podem ser separadas para fins de explicação didática; entretanto, o motivo de ambas deve coincidir para que sejam concretizadas. Tal motivo é a apropriação pelos estudantes, da experiência histórica acumulada, pela via do pensamento teórico e dos conceitos científicos, visando ao desenvolvimento do psiquismo, das funções psíquicas superiores. Não há sentido na atividade de ensino se ela não se concretiza na atividade de aprendizagem; por sua vez, não existe a atividade de aprendizagem intencional se ela não se dá de forma consciente e organizada por meio da atividade de ensino (MOURA, 2010, p. 100).

Dessa forma, a AOE promove a mobilização daqueles que ensinam e daqueles que aprendem os conteúdos matemáticos, a partir de "situações desencadeadoras de aprendizagem" que podem ser "materializadas por meio de diferentes recursos metodológicos", dentre eles, "o jogo, as situações emergentes do cotidiano e a história virtual do conceito" (MOURA, 2010, p. 100).

É a partir dessa perspectiva, a de que os produtos educacionais podem ser caracterizados enquanto AOE que, professores da Educação Básica, matriculados no Mestrado Profissional em Ciências Exatas e, concomitantemente, vinculados ao Programa do Observatório da Educação (OBEDUC), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), construíram, coletivamente, os produtos educacionais que compuseram suas dissertações ou, ainda, trabalhos finais. Tais produtos desencadeiam situações de aprendizagem. Estão sendo caracterizados enquanto AOE porque conectam a atividade de ensino com a atividade de aprendizagem, através de situações de aprendizagem que são organizadas e elaboradas pelos professores que ensinam Matemática, e vivenciadas pelos estudantes que frequentam as aulas destes profissionais.

Aqui, os professores são convidados a ser autores e coautores dos produtos que utilizam em suas salas de aula para desenvolver as pesquisas, em nível de Mestrado. Para tanto, participam de grupos de estudos e pesquisas enquanto elaboram e desenvolvem as atividades de ensino que, desencadeiam as situações de aprendizagem.

Vale a pena ressaltar que a atividade será orientadora quando for capaz de definir os elementos essenciais da ação educativa e respeitar as diversas dinâmicas de interações que, muitas vezes, fogem ao controle do professor (MOURA, 2001) e, será considerada atividade de pesquisa quando for capaz de definir os elementos constitutivos que permeiam o pensar sobre as elaborações decorrentes da análise das AOE, feita pelos envolvidos, ou, ainda, quando permitir a análise dos inesperados (CARAÇA, 1998), caso surjam durante o processo de formar-se pelo conhecimento científico.

Neste artigo temos por objetivo caracterizar os produtos educacionais produzidos na perspectiva da AOE (MOURA, 2010), de forma coletiva, no período de 2009 a 2012, por professores da Educação Básica que ensinam Matemática e que estão em atividade de pesquisa, no âmbito do Mestrado Profissional, vinculados ao Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências Exatas (PPGECE) e ao Programa OBEDUC-UFSCar. Para tanto, trazemos uma breve apresentação dos dois programas. Em seguida, apresentamos alguns aspectos teóricos que fundamentam a criação destes produtos. Por último, descrevemos os produtos educacionais elaborados, implementados e avaliados por Mendes (2012), enquanto desenvolveu sua dissertação de mestrado. Tal descrição ilustra como as características da AOE estiveram presentes na sala de aula do professor-pesquisador.

2 Contextualizando o Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências Exatas

Desde 2008, a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) mantém o Mestrado Profissional em Ensino de Ciências Exatas, o qual é parte integrante do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Exatas (PPGECE). Definiu-se que o trabalho final deve ter o formato de uma dissertação, a qual deve ser "baseada em trabalho desenvolvido pelo candidato, de acordo com os objetivos do Curso" (PPGECE, 2008, artigo 20). Fica aqui, a pergunta: quais seriam os produtos educacionais que estariam em acordo com os objetivos do curso?, uma vez que:

O Curso visa a melhoria da qualificação profissional de professores de Ciências Exatas do nível fundamental (5ª. a 8ª séries) e médio, especificamente nas áreas de Física e Matemática, e das Licenciaturas em Física, Matemática e áreas relacionadas, que estejam em comprovada atividade no sistema de ensino. O Curso está sendo planejado para o desenvolvimento de atividades que promovam a integração entre os conteúdos de Ciências Exatas com os aspectos teóricos, metodológicos e epistemológicos do ensino da Física e da Matemática, e do uso de Tecnologias da Informação no ensino destas disciplinas (PPGECE, 2008, s/p).

Ao pensar na pergunta acima, um grupo formado por quatro docentes entendeu que deveria criar condições para que os professores da Educação Básica pudessem elaborar produtos educacionais, de forma coletiva. Os produtos deveriam compor as dissertações de mestrado e conduzir, na sala de aula, as situações de ensino e de aprendizagem. Dessa forma, todo o processo: 1) a elaboração dos produtos educacionais; 2) o desenvolvimento das situações de ensino e de aprendizagem, a partir dos produtos e, 3) a análise e a síntese que os professores fazem deste movimento, deveriam se constituir no conteúdo dos trabalhos de conclusão de curso, ou seja, no conteúdo das dissertações.

No entanto, tal processo pode ocorrer, de forma mais adequada, quando os professores da Educação Básica podem contar com financiamento e tempo hábil para elaborarem seus próprios produtos educacionais, a partir das necessidades dos estudantes.

Movido por essas ideias, o grupo de docentes, citado anteriormente, escreveu o projeto de pesquisa Produtos educacionais no Mestrado Profissional em Ensino de Física e Matemática: itinerários de desenvolvimento, implementação e avaliação, a partir da rede de pesquisa participante Escola-Universidade, para concorrer ao edital do OBEDUC, divulgado também em 2008, pela Capes. O projeto foi aprovado e pôde contar com 10 bolsas, sendo: 03 para licenciandos; 03 para professores da Educação Básica; 03 para mestrandos e 01 para a coordenação.

3 Contextualizando o Programa Observatório da Educação (OBEDUC), da UFSCar

A pesquisa desenvolveu-se a partir de dois subprojetos: Ensino de Física e Ensino de Matemática. Procurou responder questões relacionadas: 1) ao tipo de investigação desenvolvida no Mestrado Profissional; 2) ao conceito de Produto Educacional elaborado no Mestrado Profissional; 3) a construção pelos professores da Educação Básica, das áreas de Física e Matemática de Produtos Educacionais para ser usados em suas próprias aulas e, 4) as diferenças que podem existir entre os produtos educacionais que já estão prontos e acabados, disponíveis no mercado, os quais, muitas vezes, chegam às escolas propostos pelas Secretarias da Educação, de forma impositiva, na forma de livros didáticos, cadernos, materiais manipuláveis e aqueles produzidos coletivamente pelos próprios professores da Educação Básica.

Teve como objetivo caracterizar, desenvolver, implementar e avaliar produtos educacionais do ensino de Física e Matemática, articulando a formação de mestrandos, professores e licenciandos numa rede investigativa participante situada, denominada de rede compartilhada-investigativa (BORGES, 2009), tanto em escolas de São Carlos, quanto na UFSCar, no âmbito da Graduação e da Pós-Graduação. É qualitativa e longitudinal. A metodologia considerou uma sistemática de investigação, segundo dois movimentos do processo da investigação educativa, que pôde contribuir para o desenvolvimento e análise do produto educacional: particularização e generalização. Os atos de particularização e generalização, associando os conhecimentos geral e situado, consideraram a espiral de fases proposta por Lewin (1970).

Tal espiral consistiu em indicar passos sucessidos de pesquisa e ação, constituídos, cada um deles, de um ciclo de planejamento (P), execução (E) e averiguação (A). As etapas de particularização e generalização envolveram reflexões teóricas que ocorreram em reuniões coletivas com mestrandos, professores e licenciandos; observações participantes nas escolas mediante registros escritos e filmagem de situações cotidianas de sala de aula; participação dos professores em grupos de estudos e pesquisa, bem como, em cursos e eventos acadêmicos junto ao PPGECE e outras universidades. As ações relacionadas a cada etapa do ciclo de investigação estão descritas no Quadro 1, abaixo:


Os procedimentos da etapa averiguação corresponderam aos parâmetros de controle da investigação, que foram obtidos à cada ciclo da pesquisa. Assim, ao invés de pressupormos o método como o caminho para, consideramos a investigação como um caminho a partir de. Vale, ainda, ressaltar que, McTaggart (1996, p. 248) considera como característica fundamental desse tipo de pesquisa a "reflexão coletiva pelos participantes sobre a objetivação sistemática e subjetivação disciplinada dos seus esforços para mudar o modo que eles atuam".

4 Produtos Educacionais elaborados coletivamente pelos professores da Educação Básica que ensinam Matemática

O subprojeto da área Matemática criou, no âmbito do OBEDUC-UFSCar, o Núcleo Interativo de Pesquisa em Ensino de Matemática (NIPEM), com o intuito de promover o diálogo que significa a comunicação e redes de convivência, proposto por BOHM (2005). Assim, professores da Educação Básica, ao elaborar e implementar os produtos educacionais, na perspectiva da AOE, dialogaram com licenciandos e docentes da universidade, avaliando, continuamente, cada um dos produtos educacionais que se apresentam nas dissertações do Mestrado Profissional, defendidas no PPGECE.

Os produtos educacionais elaborados pelos envolvidos, a exemplo de atividades e projeto de ensino, materiais didáticos, dentre outros, conduziram as situações de ensino e de aprendizagem na sala de aula. Foram reelaborados a todo o momento, no Grupo de Pesquisa em Educação Matemática (GEM) e/ou no Grupo de Pesquisa Formação Compartilhada de Professores - Escola e Universidade (GPEFCom), uma vez que consideraram as reflexões e vivências feitas pelos participantes. Explicitam os diálogos feitos em diversos momentos da pesquisa. É por este motivo que são caracterizados como AOE, considerando-se que:

Chamamos de Atividade Orientadora de Ensino aquela que se estrutura de modo a permitir que os sujeitos interajam, mediados por um conteúdo negociando significados, com o objetivo de solucionar coletivamente uma situação problema (Moura, 1996). É atividade orientadora porque define os elementos essenciais da ação educativa e respeita a dinâmica das interações que nem sempre chegam a resultados esperados pelo professor. Este estabelece os objetivos, define as ações e elege os instrumentos auxiliares de ensino, porém não detém todo o processo, justamente porque aceita que os sujeitos em interação partilhem significados que se modificam diante do objeto de conhecimento em discussão (...). A atividade orientadora de ensino tem uma necessidade: ensinar; tem ações: define o modo ou procedimentos de como colocar os conhecimentos em jogo no espaço educativo; e elege instrumentos auxiliares de ensino: os recursos metodológicos adequados a cada objetivo e ação (livro, giz, computador, ábaco etc). E, por fim, os processos de análise e síntese, ao longo da atividade, são momentos de avaliação permanente para quem ensina e aprende (MOURA, 2001, p. 155, grifos do autor).

Como a elaboração dos produtos para o ensino da Matemática foi feita coletivamente, com idas e vindas às salas de aula, tal qual, aponta Moura (2001), em relação à AOE, os produtos educacionais são resultados de processos reflexivos e contextualizados que contêm os saberes tanto da experiência dos professores da Educação Básica que ensinam Matemática, quanto os saberes dos licenciandos e dos pesquisadores. Contém fluência, movimento e nunca estão prontos e acabados, porque representam a dinâmica das aulas de Matemática vivenciadas tanto pelos estudantes quanto pelos professores da Educação Básica. Têm como objetivo: criar situações de ensino e de aprendizagem; definir os modos ou procedimentos que colocarão os conteúdos matemáticos em jogo nas salas de aula; eleger os recursos metodológicos adequados aos objetivos e ações. Por fim, indicar os processos de análises e sínteses feitas pelos participantes. Contêm atividades de ensino que se apresentam na sala de aula, metodologicamente, a partir de jogos, situações emergentes do cotidiano e histórias virtuais.

No entanto, deve-se considerar que, em 2008, quando os professores da Educação Básica que lecionam Matemática começaram a pensar, coletivamente, sobre os produtos educacionais que norteariam os processos de ensino e de aprendizagem de suas turmas, os quais seriam descritos em suas dissertações, apresentaram a problemática que estão vivenciando desde então: a implementação da Proposta Curricular pela Secretaria do Estado de São Paulo. Do ponto de vista daqueles que pensam e fazem o ensino de Matemática acontecer na Educação Básica, nem professores, nem estudantes conseguem compreender as reais intenções da maioria das situações de aprendizagem sugeridas e descritas nos cadernos que chegam às escolas anualmente.

Dessa forma, durante todos esses anos, enquanto criavam produtos educacionais, os professores da Educação Básica, juntamente com os demais integrantes do NIPEM, pensavam sobre: 1) as ações presentes no ato de ensinar os conteúdos matemáticos propostos, os quais, muitas vezes estão distantes do cotidiano dos estudantes; 2) os instrumentos que podem auxiliar o ensino de Matemática; 3) os recursos metodológicos adequados a cada objetivo e ação e, 4) os processos de análise e síntese que representam os conteúdos das dissertações do Mestrado profissional.

Diante da problemática apontada pelos professores da Educação Básica, no ato da criação dos produtos educacionais, surgiram novas perguntas: como delinear os produtos educacionais? Quais conteúdos matemáticos deveriam compô-los? Quais elementos teóricos e metodológicos seriam necessários considerar?

O estudo coletivo permitiu que o grupo definisse quais elementos teóricos (história dos conteúdos matemáticos e metodologias de ensino de Matemática) deveriam fundamentar a elaboração dos produtos educacionais, dentre eles, atividades e projetos de ensino, sem, contudo, desconsiderar as Propostas Curriculares - documentos oficiais que norteiam os projetos políticos pedagógicos das escolas.

Dessa forma, os elementos citados fazem parte dos produtos educacionais produzidos pelos professores da Educação Básica que concluíram suas dissertações. Assim, na medida em que os professores da Educação Básica que ensinam Matemática aceitaram o desafio de elaborar e implementar produtos educacionais, em diferentes formatos, passaram a avaliá-los, continuamente. Passaram, então, a compreender melhor os elementos característicos da AOE. Ingressaram em atividades de pesquisa.

É por este motivo que, quando tratamos dos produtos educacionais elaborados coletivamente, na perspectiva da AOE, temos tomado o cuidado de não apresentá-los, isoladamente, como objetos manipuláveis prontos e acabados, correndo o risco de passar a impressão de que podem ser elaborados, sem que se considerem as particularidades e singularidades das salas de aula.

Tais produtos foram e estão sendo divulgados, pelos próprios autores, em eventos acadêmicos diversos, dentre eles, o ENREDE1 1 http://www.enrede.ufscar.br/ : Encontro da rede de professores, pesquisadores e licenciandos de Física e de Matemática, promovido pela equipe do OBEDUC-UFSCar, no período de 2009 a 2012. Estão disponíveis nos sites do Núcleo Interativo de Pesquisa em Educação Matemática (NIPEM)2 2 http://www.ufscar/nipem ; Programa de Pós-Graduação em Ciências Exatas (PPGECE)3 3 http://www.ppgece.ufscar.br/ e Biblioteca Comunitária da UFSCar (BCO)4 4 http://www.bco.ufscar.br/ e em Anais de congressos.

São apresentados da seguinte forma: 1) atividades de ensino sobre Geometria Fractal; 2) situações problemas, de cunho interdisciplinar sobre o ensino de Função; 3) atividades de ensino sobre Análise Combinatória e 4) quebra cabeças geométricos e atividades de ensino sobre o conceito de Área, conforme mostra o Quadro 2, abaixo.


Os elementos teóricos que fundamentam os produtos indicados no quadro acima foram definidos na medida em que os professores: 1) detectavam as necessidades dos estudantes; 2) elaboravam as atividades e projetos de ensino; 3) selecionavam os conteúdos matemáticos que iriam ser ensinados; 4) definiam o tipo de pesquisa a ser desenvolvido e 5) definiam os recursos metodológicos que conduziriam as situações de ensino e aprendizagem. Há de se ressaltar, ainda, que as atividades e projetos de ensino levaram em consideração os estudos de Moura, uma vez que:

[...] A atividade, na interpretação que fazemos desse conceito desenvolvido por Leontiev (1986), é fruto de uma necessidade que, para ser realizada, estabelecem objetivos, desencadeia ações, elege instrumentos e, por fim, avalia se chegou a resultados adequados ao que era desejado (MOURA, 2001, p. 155, grifos do autor).

A partir do exposto, vamos ilustrar como tais ideias se apresentam no trabalho de Mendes (2012), licenciado em Matemática, em 2005, e professor de Matemática da rede pública de ensino, desde 2006. Estamos denominando-o de professor-pesquisador. Defendeu sua dissertação de mestrado, no PPGECE, em 30/03/2012.

5 Produtos educacionais para o ensino de conteúdos geométricos na perspectiva da AOE

Mendes (2012) elaborou, implementou e avaliou produtos educacionais, enquanto desenvolvia sua dissertação, intitulada: Da resolução de quebra- cabeças em sala de aula à aplicabilidade no cotidiano de uma Marmoraria: o que os estudantes do 9º ano do ensino fundamental falam e escrevem sobre o conceito de área. Analisou:

As falas e as escritas de estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental sobre o conceito de área, a partir de atividades orientadoras de ensino (MOURA, 1996) que envolvem os conteúdos de áreas dos polígonos notáveis: Retângulo, Triângulo, Paralelogramo, Trapézio e Losango, incluindo-se aí, a composição e a decomposição de figuras planas. As atividades se constituem por quebra- cabeças. Foram elaboradas pelo pesquisador , desenvolvidas na sala de aula e no contexto de uma Marmoraria. A investigação é qualitativa e pode ser caracterizada como estudo de caso. Foi conduzida pelo pesquisador em todos os momentos, uma vez que este é o professor da sala. Ou seja, o professor não se limitou apenas a observar e a anotar o movimento ocorrido na sala de aula. A questão que norteia o estudo é: "o que estudantes do 9ºano do Ensino Fundamental falam e escrevem sobre o conceito de área enquanto vivenciam atividades orientadoras de ensino, tanto na sala de aula, quanto no contexto de uma marmoraria"? A análise das falas e das escritas foi feita mediante categorias de análise relacionadas aos conteúdos envolvidos. [...] Produziram-se ainda, atividades orientadoras de ensino sobre os conceitos de área de polígonos. Ressalta-se que esta investigação sintetiza teórica e metodologicamente os movimentos ocorridos tanto na sala de aula, quanto na marmoraria (MENDES, 2012, p. 9).

Ao escolher a temática de estudo, ensino de geometria, buscou "subsídios teóricos para entender quando, como e porque o ensino de Geometria começou a ser tratado de uma forma menos importante que a Álgebra e a Aritmética" (MENDES, 2012, p. 21). Ao selecionar o conteúdo, considerou a sua experiência em sala de aula que:

Mostra que o conteúdo de áreas de polígonos, tema deste estudo, de acordo com a Proposta Curricular do Estado de São Paulo (SEE/SP, 2008), faz parte do currículo do 4º bimestre do 8º ano, mas os estudantes do último ano do Ensino Fundamental das salas onde leciono não estudaram esse conteúdo (MENDES, 2012, p. 22).

Em relação aos produtos educacionais, afirma que:

As atividades orientadoras de ensino (MOURA, 1996, 2000, 2001), elaboradas por mim, a partir das demandas das classes onde leciono que exploram, por exemplo, conceitos relacionados à composição e decomposição de figuras planas e à aplicabilidade do conceito de área no comércio, em particular em uma Marmoraria (p. 26). [...] se constituem por quebra-cabeças que foram desenvolvidos na sala de aula e a aplicação dos conceitos estudados no contexto de uma Marmoraria (MENDES, 2012, p. 28).

Tais produtos consideram:

As ideias contidas nos documentos oficiais: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e Proposta Curricular para o ensino de Matemática, elaborado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) sobre o ensino do conceito de área, uma vez que [...]. Vale à pena ressaltar que também considerei, durante a elaboração das atividades, a síntese histórica do conceito de área que envolve a composição e decomposição de figuras geométricas presentes nos estudos de Boyer (1974) (MENDES, 2012, p. 30).

O professor-pesquisador procura mostrar as semelhanças e diferença que há entre os produtos educacionais que elaborou e as situações de aprendizagem sobre o conteúdo Áreas, propostas pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo:

As atividades orientadoras de ensino estão atreladas às necessidades e aos motivos dos estudantes, enquanto as situações de aprendizagens propostas nos cadernos da SEE/SP são genéricas, são propostas para todas as salas da Educação Básica como se todos os alunos fossem iguais. As atividades orientadoras consideram os contextos dos estudantes, suas aprendizagens e não aprendizagens, enquanto que, as situações de aprendizagem propostas nos "cadernos", em determinados momentos, estão descontextualizadas e não consideram os conhecimentos que os estudantes já possuem, ou os conhecimentos que eles não possuem [...]. Em síntese, as situações de aprendizagem propostas pela SEE/SP e as atividades orientadoras de ensino propostas por Moura se assemelham no sentido de desenvolver competências e habilidades nos estudantes e se diferenciam pela intencionalidade. Nas situações de aprendizagem, os estudantes são passivos e o professor é o protagonista da aprendizagem, enquanto que, nas atividades orientadoras de ensino, o aluno é protagonista de sua aprendizagem, é o sujeito e o professor é um mediador, que conduz o estudante para construir o seu próprio conhecimento. Concordo com Moura (2001) que é preciso muito mais do que informar, repetir e aplicar os conceitos em exercícios para dar vida e subjetividade à aprendizagem de matemática. É preciso destituir-se do formalismo, do rigor da linguagem, da rigidez das regras e deixar que as crianças se sintam desafiadas a terem as suas elaborações. (MENDES, 2012, p. 41-42).

Destaque-se, ainda, que ao elaborar os produtos educacionais Mendes (2012) considerou: os aspectos históricos da Geometria, pois defende que se:

Faz necessário construir um processo dedutivo para a demonstração das fórmulas para o cálculo das áreas de retângulos, paralelogramos, triângulos, trapézios e losangos, sem necessariamente desconsiderar o trabalho dos matemáticos. [...] As atividades propostas nesta pesquisa assumem como verdade que a área de um quadrado de lado a é e, a partir disso, com auxílio dos quebra- cabeças conduzem os estudantes a deduzir uma maneira de calcular a área de retângulos, triângulos, paralelogramos, losangos e trapézios. [...] As atividades orientadoras de ensino propostas leva em consideração [...] desde os egípcios que, segundo Boyer (1996) tinham uma necessidade (política, econômica e social) e motivo para medir a terra. Hoje, temos o cálculo de áreas de figuras como sendo uma necessidade econômica e social, para colocar preços "justos" em certas mercadorias, por isso o convite aos estudantes para ir até uma marmoraria. O objetivo está no fato de fazer com que compreendam a importância política, social e econômica do cálculo com áreas, além de uma necessidade social de encontrar emprego e econômica para poder compreender melhor os cálculos que são feitos no orçamento de revestimento, tendo como ponto de partida a matemática axiomática de hoje, que prima pelo desenvolvimento do raciocínio lógico indutivo e dedutivo, necessários para o desenvolvimento integral do ser humano, bem como o uso de materiais manipulativos, ou seja, dos quebra-cabeças (MENDES, 2012, p. 52-54).

Os produtos educacionais foram analisados e, consequentemente, avaliados em diversos momentos:

É importante ressaltar que, antes do desenvolvimento das atividades em sala de aula, refletimos sobre elas durante o Mini Curso intitulado: 'Da resolução de quebra- cabeças à constituição das fórmulas para calcular áreas de polígonos', apresentado no X-ENEM, Encontro Nacional de Educação Matemática, ocorrido em julho de 2010, em Salvador - BA [...] (MENDES, 2012, p. 62).

Ao justificar a escolha do uso de um jogo específico, para o ensino de conteúdos geométricos, o professor-pesquisador afirma que:

Os estudantes, de modo geral, sentem fascínio por quebra- cabeças. São atraídos pela beleza das cores, pela variedade das peças, pelo desafio de conseguir montar o que os quebra cabeças propõem e pela dinâmica inerente à manipulação das peças (MENDES, 2012, p. 43).

Assim:

Os estudantes foram organizados em duplas e foi entregue a cada um, 1 tesoura, 1 caixa lápis de cor, 1 cola e as folhas de atividade, tudo fornecido pela escola. A pesquisa não trouxe nenhum custo ao professor. Para cada atividade de ensino, utilizou-se 3 aulas de matemática, sendo 2 seguidas, o que chamamos de aula dupla, com duração de 50 minutos cada para a realização das atividades pelos estudantes e 1 aula de 50 minutos para fazer um debate das respostas e estratégias que cada dupla seguiu para resolver os problemas propostos (MENDES, 2012, p. 63).

Foram elaborados e implementados, na sala de aula, produtos educacionais que se materializaram em folhas de atividades e quebra-cabeças, orientando as situações de ensino e de aprendizagem: 1) Descobrindo a área do Retângulo; 2) Descobrindo a área do Triângulo; 3) Descobrindo a área do Paralelogramo; 4) Descobrindo a área do Trapézio; 5) Descobrindo a área do Losango. Para Mendes (2012, p. 43):

A finalidade dos quebra-cabeças que elaborei é construir um desenho, a partir de uma coleção de peças menores. Assim, enquanto tenta montar a figura procurada, o estudante vai descobrindo relações entre suas partes e o todo, entre as medidas dos lados das partes. Percebe, por exemplo, que as características de uma figura permanecem inalteradas por mais que se mude sua posição e aprende que, para resolver o problema de montar a figura toda, precisa muitas vezes tentar vários caminhos até encontrar um que sirva. Dessa forma, pode desenvolver a perseverança, a capacidade de análise, de buscar processos cada vez mais reflexivos a partir da atividade orientadora de ensino proposta. Além disso, lado, vértice, meio, centro, bem como o nome das diversas formas que muitas vezes compõem as peças, podem ser entendidas como noções que naturalmente surgem na montagem de quebra-cabeças geométricos, conforme apontam os estudos de Smole, K. S; Diniz, M. I. e Cândido P. (2000).

O Quadro 3 traz uma folha de atividade que convida os estudantes a elaborarem um quebra-cabeça e uma foto que mostra o envolvimento dos estudantes durante o desenvolvimento da atividade.


A figura 1 mostra os estudantes construindo o quebra-cabeça proposto pelo professor-pesquisador.


Ao analisar e, consequentemente, avaliar as situações de ensino e aprendizagem que contaram com uso dos produtos educacionais, o professor-pesquisador destaca:

A importância dos quebra- cabeças para que os estudantes se sintam motivados em aprender geometria. Concordo com Kalef (2003) que o processo de construir um material manipulativo, pintando, recortando e colando traz certo fascínio aos estudantes, despertando a curiosidade e incentivando-os a realizar as atividades propostas. [...] Os diálogos [...] mostram que os estudantes compreenderam a intenção dedutiva das atividades. Este fato ficou claro quando um estudante diz que, para descobrir a área do triângulo, temos que transformá-lo em um retângulo ou quadrado, já que sabemos calcular a área somente destas figuras. O problema motivador desta atividade gerou um debate de ideias fundamental, desenvolvendo nos estudantes um raciocínio fundamental na matemática, que é a descoberta de uma coisa nova usando um conhecimento que já se tem. Nesse sentido, concordo com Moura (2005), uma vez que a atividade orientadora de ensino colocou os estudantes em conflito na tentativa de solucionar o problema, mesmo não conseguindo fazer a decomposição do triângulo em um retângulo, os estudantes sabiam que tinham que fazer isso, para cumprir um formalismo característico da matemática, descobrir algo novo partindo de algo que se conhece, para validar o resultado. Há de se considerar ainda o papel da dobradura no ensino de geometria, no sentido de promover que os estudantes compreendam e descubram coletivamente propriedades como base média, altura e área de um triângulo sem muita dificuldade. A dobradura foi fundamental na construção do quebra-cabeça pela sua simplicidade e facilitou o processo de aprendizagem dos estudantes. Concordo com Senzaki (2009) que o uso de dobradura no ensino de geometria proporciona a interação entre os alunos, permitindo não só que eles se movimentem na sala de aula, mas que possam trocar informações constantemente, tanto com o professor quanto com os colegas, o que torna a aula bem mais dinâmica (MENDES, 2012, p. 98-110).

Há de se considerar, ainda, as respostas escritas que os estudantes explicitaram, tanto individualmente, quanto coletivamente. Algumas delas indicam que, embora os trinta estudantes estejam prestes a concluir o Ensino Fundamental, vinte e oito deles não conseguem transpor a representação escrita para a representação algébrica, a partir de fórmulas, como se observa nas Figuras 2 e 3.



No que diz respeito à elaboração, implementação e avaliação dos produtos educacionais no contexto da Marmoraria.

Os produtos educacionais se materializam na forma de folhas de atividades e de visitas feitas in loco. Diferente do recurso metodológico jogo, utilizado na sala de aula, no caso da Marmoraria se utiliza do recurso metodológico situações emergentes do cotidiano:

Após as atividades propostas na sala de aula sobre o cálculo das áreas dos retângulos, triângulos, paralelogramos, trapézios e losangos, o objetivo da visita à Marmoraria foi vivenciar na prática, como estes conceitos se apresentam no comércio. A atividade proposta, ainda que situada, simulou a compra de um produto oferecido pela empresa, ou seja, reproduziu uma cena aonde as pessoas chegam à Marmoraria com um desenho, um formato de pedra que gostariam de comprar. Assim, o cliente entrega o desenho ao Marmorista e este calcula o valor da pedra a ser adquirida. Para esta atividade, os estudantes foram divididos em dois grupos de 15 estudantes. Devido ao espaço físico da Marmoraria e a pedido do marmorista, programamos duas visitas, em dois dias diferentes, com cinco subgrupos em cada dia. Sendo assim, como tínhamos 15 estudantes para cada dia, os quinze foram divididos em trios, totalizando cinco subgrupos. Cada subgrupo recebeu um desenho, contendo o formato de pedra, para que simulassem a compra. Os estudantes entregariam ao empresário a folha e este calcularia o preço da pedra desejada, explicando como fazia para obter o valor da mesma (MENDES, 2012, p. 125).

A escolha dos desenhos considerou uma investigação feita pelo marmorista sobre quais formatos (retangular, triangular, etc.) e quais tipos de produtos (mesas, pias, balcões, soleiras, etc.) são os mais vendidos pelo seu estabelecimento: 1) mesa retangular de medidas 1,1m x 1,9m; 2) aparador em formato de trapézio, com bases 2,20m e 1,60 m e altura de 45 cm; 3) cantoneira em formato de triângulo retângulo de catetos 56 cm e 45 cm; 4) balcão em formato de paralelogramo de base 1,1 m e altura 45 cm e 5) mesa de centro, em formato de um losango de lado 1 m, conforme mostra a Figura 4.


Durante o desenvolvimento das situações de ensino e aprendizagem, ocorridas na Marmoraria, há de se destacar pelo menos um diálogo ocorrido entre estudantes e marmorista. Tal diálogo envolve a análise do desperdício de sobras de materiais e, consequentemente, de dinheiro que as pessoas fazem, na maioria das vezes sem saber, quando encomendam objetos que devem ser construídos com pedras (Figura 5).


Ao analisar alguns episódios que ocorreram durante as situações de ensino e de aprendizagem, nos dois contextos - sala de aula e Marmoraria - o professor-pesquisador afirma que:

Ao lê-los, me preocupei em compreender, teoricamente, os diversos aspectos que se evidenciam no movimento da sala de aula e da Marmoraria, como por exemplo: as apropriações e dificuldades que podem estar relacionadas aos cálculos das áreas, especialmente no que diz respeito: 1) ao papel da visualização dos quebra-cabeças, no sentido de propiciar aos estudantes a compreensão das fórmulas, bem como do uso destas no cotidiano da Marmoraria; 2) ao papel da generalização; 3) às possíveis relações existentes ou não entre o que ocorre na escola com o cotidiano (MENDES, 2012, p. 86).

A partir das sínteses e análises teóricas feitas pelo professor-pesquisador, em sua dissertação de mestrado, das situações de ensino e aprendizagem e, da elaboração, implementação e avaliação dos produtos educacionais, podemos inferir que professor-pesquisador e estudantes se colocaram em atividade. Ao mesmo tempo, os episódios selecionados por ele dão-nos indícios do que os estudantes sabem e do que não sabem.

Segundo Mendes (2012, p. 63):

[...] da criação das atividades orientadoras de ensino à aplicação na sala de aula, há um longo caminho a ser percorrido, caminho de modificações e adaptações das atividades, de construção e reconstrução, sempre visando à aprendizagem dos estudantes, tornando-as mais significativa, prazerosa e interessante.

Assim, podemos afirmar que, a elaboração, implementação e avaliação de produtos educacionais em sala de aula são movimentos que convidam o professor da Educação Básica a estar constantemente envolvido na atividade de pesquisa, uma vez que, produtos educacionais elaborados a partir da dinâmica da sala de aula, pelas suas próprias características, não permitem que as aulas sejam monótonas e repetitivas. Há necessidade de se planejar as aulas, de forma que priorizem o trabalho em grupo.

Os produtos educacionais precisam ser readequados às necessidades das turmas, e tais adequações são de responsabilidade tanto do professor, quanto do grupo ao qual ele pertence, uma vez que:

[...] as elaborações de atividades orientadoras de ensino estão em constantes adaptações e mudanças, ou seja, é preciso refletir sobre uma atividade, considerar o contexto e os conhecimentos dos estudantes, para assim melhorar cada vez mais a atividade, tornando a aprendizagem mais significativa para os estudantes e para o professor [...]. Não posso deixar de mencionar sobre a dificuldade que tive em pensar, elaborar e desenvolver atividades orientadoras de ensino e cursar as disciplinas do mestrado e paralelamente a isso, ministrando 33 aulas semanais na rede Estadual de Ensino. Para amenizar esta dificuldade, uma proposta de solução seria oferecer bolsas de estudos para professores em exercício nas escolas publicas ou privadas, durante o tempo que estão cursando o mestrado. Com isso, diminuiriam sua quantidade de aula e, consequentemente, a qualidade de seu aprendizado aumentaria (MENDES, 2012, p. 142-143).

Mendes (2012) nos permite caracterizar seus produtos como educacionais, uma vez que, com a mediação do professor, se apresentam como coletivos e dinâmicos, possibilitando que os estudantes integrem conhecimentos vivenciados tanto nas práticas sociais, quanto nos currículos escolares. Dessa forma, os produtos educacionais sistematizam: 1) os conteúdos matemáticos que fazem parte das práticas sociais dos estudantes, mas que, muitas vezes, são excluídos das salas de aula; 2) a História do conteúdo, com especial atenção para as práticas sociais deste, no contexto de algumas civilizações, incluindo-se a atual; 3) as necessidades sociais dos estudantes e 4) os documentos oficiais e pesquisas que tratam da temática, revelando-nos seu entendimento sobre o fazer matemático na sala de aula.

6 A guisa de conclusão

Os produtos educacionais que compõem as dissertações elaboradas pelos professores da Educação Básica, no âmbito do Mestrado Profissional e OBEDUC-UFSCar, nos fazem afirmar que quando os professores da Educação Básica desenvolvem, implementam e avaliam tais produtos, de forma coletiva, se colocam em atividade de pesquisa porque podem analisar e sintetizar os conhecimentos que se explicitam nas salas de aula. Ou seja, podem teorizar sobre os conhecimentos matemáticos que são elaborados com e sobre a sala de aula.

Nesse sentido, caso os produtos sejam desenvolvidos sem o atrelamento às problemáticas das salas de aula, talvez tenhamos que pensar se podem ser considerados educacionais. E questionarmos a necessidade de produzi-los em larga escala, de forma que sejam generalizáveis, para todas as escolas e salas de aula, ainda que resultem de um processo reflexivo e contextualizado, que contêm saberes experienciais e teóricos.

Entendemos que, se os produtos educacionais forem pensados a partir da perspectiva da AOE, devem ser elaborados coletivamente e transitar em vários espaços, dentre eles, as escolas e as universidades que acolhem os professores da Educação Básica que lecionam Matemática. Nessa perspectiva, os produtos educacionais representam unidade entre ensino e aprendizagem. Ao mesmo tempo, as dissertações produzidas no âmbito do Mestrado Profissional, tal qual indica a AOE, representam o conhecimento teórico da experiência feita pelos próprios professores da Educação Básica.

Submetido em Julho de 2012

Aprovado em Dezembro de 2012

  • BOHM, D. Diálogo: comunicação e redes de convivência. São Paulo: Palas Athena, 2005.
  • BORGES, A. A. A. G. Ideias algébricas explicitadas por estudantes da EJA em espaços não-formais: o caso do cursinho de Ribeirão Preto. 2010. 108 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências Exatas) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2010.
  • BORGES, A. A. A et al. Constituindo rede de investigação colaborativa sobre o ensino de Matemática com licenciandos, professores da Educação Básica e pesquisadores In: CONGRESSO ESTADUAL PAULISTA SOBRE FORMAÇÃO DE EDUCADORES, 10., 2009, Águas de Lindóia. Anais... Águas de Lindóia: UNESP, 2009. p. 6613-6625, CD-ROM.
  • CAPES, Portaria 80/98 Disponível em: <http://www.ufrgs.br/propg/regulam/anexos/port80_98.htm>. Acesso em: 05 jun. 2012.
  • CARAÇA, B. J. Conceitos fundamentais da matemática Portugal: Gradiva, 1998.
  • GOMES, A. N. Uma proposta de ensino envolvendo Geometria Fractal para o estudo de Semelhança de Figuras Planas. 2010. 230f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências Exatas) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2010.
  • LEWIN, K. Problemas de Dinâmica de Grupo São Paulo: Cultrix, 1970.
  • McTAGGART, R. Issues for participatory action researchers. In: ZUBER-SKERRITT, O. (Ed.). New directions in action research London: Routledge Falmer, 1996. p. 243-255.
  • MENDES, A. F. Da resolução de quebra-cabeças em sala de aula à aplicabilidade no cotidiano de uma Marmoraria: o que os estudantes do 9º ano do ensino fundamental falam e escrevem sobre o conceito de área. 2012. 158f. Dissertação (Mestrado Profissional em Ciências Exatas) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2012.
  • MOREIRA, M. A. O mestrado (profissional) em ensino. Revista Brasileira de Pós-Graduação, Brasília, ano 1, v. 1, n. 1, p. 131-142, jul. 2004. Disponível em: <http://www2.capes.gov.br/rbpg/images/stories/downloads/RBPG/Vol.1_1_jul2004_/131_142_o_ mestrado_profissional_em_ensino.pdf>. Acesso em: 15 nov. 2013.
  • MOURA, M. O. A atividade de ensino como ação formadora. In: CASTRO, A. D.; CARVALHO, A. M. P. (Org.). Ensinar a ensinar - Didática para a escola Fundamental e Média São Paulo/SP: Editora Pioneira, 2001. p. 143-162.
  • MOURA, M .O. (Org.). A atividade pedagógica na teoria histórico-cultural São Paulo: Liber Livro Editora Ltda, 2010.
  • PPGECE. Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências Exatas 2008. Disponível em: <http://www.ppgece.ufscar.br/index.php/por/content/view/full/180>. Acesso em: 06 jun. 2012.
  • SILVA, M.A. Elaborações de estudantes do 7° ano do ensino fundamental sobre números inteiros e suas operações 2012. 122f. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Exatas (PPGECE), Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2012.
  • VAZQUEZ, C. M. R. O ensino de Análise Combinatória no ensino médio por meio de atividades orientadoras em uma Escola Estadual do interior paulista. 2011. 90f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências Exatas) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2011.
  • Endereço para correspondência:
    Maria do Carmo de Sousa
    Rua Prof. Paulo Mont Serrat, 510, casa 44, Jardim Ricetti
    CEP: 13.570-003, São Carlos, SP, Brasil
    E-mail:
  • 1
  • 2
  • 3
  • 4
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Maio 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      Jul 2012
    • Aceito
      Dez 2012
    UNESP - Universidade Estadual Paulista, Pró-Reitoria de Pesquisa, Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática Avenida 24-A, 1515, Caixa Postal 178, 13506-900 Rio Claro - SP Brasil - Rio Claro - SP - Brazil
    E-mail: bolema.contato@gmail.com