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Sedação paliativa terminal no Brasil: revisão integrativa da literatura

Resumo

A sedação paliativa está inserida no amplo espectro de práticas e condutas dos cuidados paliativos. Seu objetivo principal não é adiantar o fim da vida, mas sim prover conforto e alívio dos sintomas em uma condição de vida terminal. A prática diverge opiniões tanto no ambiente acadêmico e profissional quanto no social e religioso. Como objetivo, esta revisão integrativa da literatura buscou discussões e pesquisas mais pertinentes no cenário brasileiro, a fim de contribuir para a construção de uma noção mais atualizada e adequada ao contexto contemporâneo quanto à sedação paliativa. Questões como surgimento, opinião de médicos e estudantes, fatores bioéticos e desafios quanto à aplicação compõem a discussão da sedação paliativa na terminalidade. Todavia, a literatura disponível sobre a temática ainda é escassa, permeada de aspectos sociais, éticos, religiosos e de profissionais que demandam interpretações individuais e consenso entre as esferas sociais.

Palavras-chave
Cuidados paliativos na terminalidade da vida; Doente terminal; Bioética

Abstract

Palliative sedation integrates the broad spectrum of practices and approaches in palliative care. Its main objective is not to anticipate the end of life, but to provide comfort and symptom relief for terminal conditions; however, opinions in academic, professional, social, and religious contexts differ about its application. This integrative literature review gathers relevant discussions and research in the Brazilian context to contribute to a more updated and appropriate understanding of palliative sedation. Discussions on palliative sedation bring issues regarding its emergence, the opinions of physicians and students, bioethical factors, and challenges. However, the available literature on this topic is scarce, encompassing social, ethical, religious, and professional aspects that require individual interpretations and consensus among social spheres.

Keywords
Hospice care; Terminal ill; Bioethics

Resumen

La sedación paliativa integra el amplio conjunto de prácticas y acciones de los cuidados paliativos. Su objetivo principal no es acelerar el final de la vida, sino proporcionar confort y alivio de los síntomas de los pacientes terminales. Esta práctica genera opiniones divergentes tanto en el ámbito académico y profesional como en el social y religioso. Esta revisión integradora de la literatura busca levantar las discusiones e investigaciones más pertinentes en el escenario brasileño para contribuir a la construcción de una noción más actualizada y adecuada contemporáneamente sobre sedación paliativa. El surgimiento, la opinión de médicos y estudiantes, los factores bioéticos y los desafíos en la aplicación constituyen temas de discusión sobre la sedación paliativa en el final de la vida. Sin embargo, la literatura disponible sobre este tema sigue siendo escasa, permeada de cuestiones sociales, éticas, religiosas y profesionales que requieren interpretaciones individuales y consenso entre las esferas sociales.

Palabras clave
Cuidados paliativos al final de la vida; Enfermo terminal; Bioética

A sedação paliativa está inserida no amplo espectro de práticas e condutas dos cuidados paliativos. Consiste na administração deliberada de fármacos capazes de reduzir o nível de consciência, sob consentimento do paciente ou responsável, a fim de mitigar os sintomas refratários provocados por uma doença terminal avançada. O objetivo principal não é adiantar o fim da vida, mas sim prover conforto e alívio ao indivíduo acometido de sintomas que não respondem mais a nenhum outro tratamento 11. Carvalho RT, Parsons, HA, organizadores. Manual de cuidados paliativos ANCP: ampliado e atualizado [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: Solo; 2012 [acesso 21 fev 2023]. Disponível: https://bitly.ws/39WJA
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Entretanto, a prática diverge opiniões. Frequen- temente, as grandes discussões e controvérsias éticas sobre o tema têm sua origem na desinformação e na equivocada associação com a eutanásia e o suicídio assistido, seja por parte da população leiga ou de profissionais de saúde 11. Carvalho RT, Parsons, HA, organizadores. Manual de cuidados paliativos ANCP: ampliado e atualizado [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: Solo; 2012 [acesso 21 fev 2023]. Disponível: https://bitly.ws/39WJA
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. Por isso, conhecer as diferenças básicas da perspectiva dos cuidados paliativos é o ponto de partida para aprofundar na questão e construir uma discussão baseada em evidências.

De acordo com a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), a sedação paliativa tem como intenção aliviar sintoma refratário/sofrimento por meio da diminuição do nível de consciência, ocasionada por dosagem de drogas sedativas ajustadas à resposta do paciente, com o objetivo final de aliviar o sofrimento, à princípio, de maneira reversível 11. Carvalho RT, Parsons, HA, organizadores. Manual de cuidados paliativos ANCP: ampliado e atualizado [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: Solo; 2012 [acesso 21 fev 2023]. Disponível: https://bitly.ws/39WJA
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. Dessa maneira, a morte ocorreria de maneira natural e somente no fim da vida. Em contrapartida, a eutanásia compreende a intenção de provocar a morte para cessar o sofrimento, ou seja, findar rapidamente a vida por meio de drogas letais com incremento rápido. Tal procedimento é essencialmente irreversível por adiantar o fim da vida por causa extrínseca.

Este trabalho teve por objetivo coletar, na literatura científica nacional, dados, fatos, relatos e perspectivas sobre a temática da sedação paliativa em pacientes terminais. Feito isso, construiu-se uma revisão dos aspectos mais relevantes que envolvem o conteúdo, sob a ótica do profissional de saúde brasileiro. A discussão contempla aspectos como os equívocos, os dilemas éticos sobre a antecipação da morte, o envolvimento de questões psicológicas e a desinformação, que serão detalhados mais adiante.

Método

O estudo realizado foi do tipo revisão integrativa da literatura e teve como ponto de partida a estratégia PICo. A pergunta de pesquisa estabelecida foi: quais são as principais questões acerca da sedação paliativa em pacientes terminais no sistema de saúde brasileiro? A busca foi realizada nas bases de dados Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Google Acadêmico. Os descritores utilizados foram “sedação profunda”; “cuidados paliativos” e “doente terminal”. O operador booleano utilizado foi “and”. Foram consideradas apenas produções disponíveis na língua portuguesa, publicadas de 2010 em diante, excluindo os trabalhos de revisão da literatura. Com base nesses critérios, a busca resultou em 2.150 resultados na base Google Acadêmico e um na BVS, dos quais cinco foram selecionados para compor esta revisão da literatura.

Resultados e discussão

O trabalho de Girond e Waterkemper 22. Girond JBR, Waterkemper R. Sedação, eutanásia e o processo de morrer do paciente com câncer em cuidados paliativos: compreendendo conceitos e inter-relações. Cogitare Enferm [Internet]. 2006 [acesso 22 fev 2023];11(3):258-63. DOI: 10.5380/ce.v11i3.7313
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apresenta um resumo sobre todos os termos e diretrizes dos cuidados paliativos, fazendo uma grande busca na literatura por meio de manuais, artigos de alto nível de evidência, livros publicados e outros. Portanto, apenas os melhores e mais verídicos dados foram analisados e comparados, constituindo um bom embasamento para os fundamentos dos cuidados paliativos abordados neste artigo. Além disso, o objetivo é fazer uma reflexão sobre o surgimento dessa prática e sua relação com o imaginário humano sobre a morte, assim como relacionar com sua principal filosofia: oferecer qualidade de vida 22. Girond JBR, Waterkemper R. Sedação, eutanásia e o processo de morrer do paciente com câncer em cuidados paliativos: compreendendo conceitos e inter-relações. Cogitare Enferm [Internet]. 2006 [acesso 22 fev 2023];11(3):258-63. DOI: 10.5380/ce.v11i3.7313
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. Outro fator a ser citado é que todos esses aspectos são tratados na área da oncologia, mas aplicáveis a diversas patologias.

Sob a ótica de Costa, sedação paliativa se define como a administração deliberada de fármacos em doses e combinações necessárias para reduzir o nível de consciência, com o consentimento do paciente ou de seu responsável 33. Costa LFJ. Sedação paliativa. PET docs [Internet]. 2015 [acesso 10 nov 2023]. p. 1. Disponível: https://bitly.ws/3dRVr
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. Há uma busca ativa pelo alívio da dor, quando os sintomas não conseguem mais ser sanados pelos tratamentos mais atuais.

Dessa maneira, é explicado que essa prática ocorre com a presença de uma equipe multiprofissional composta por médicos (que farão a escolha da melhor droga e dosagem a serem utilizadas), enfermeiros e técnicos de enfermagem (que realizarão a manutenção e os cuidados com as necessidades vitais e o conforto do doente), psicólogos (que podem contribuir conversando com o paciente na pré-sedação e dando suporte à família), assistente social (que dará novos caminhos para que a família entenda as principais implicações durante e depois dos cuidados paliativos) e espiritual (principalmente se a família seguir alguma religião, pois as crenças têm um amplo olhar sobre a morte e podem oferecer amparo nesse momento delicado). O local geralmente é o próprio hospital, mas, em alguns países, essa prática pode ser feita de maneira ambulatorial e ter cuidado no próprio lar com ajuda profissional.

Outrossim, é possível entender que são necessárias adaptações para cada paciente, visto que o que seria justo para a fase aguda muitas vezes não é aplicável à fase terminal. Isto é, ressuscitação cardiopulmonar, respiração artificial, infusões intravenosas e outras medidas são técnicas de suporte primário utilizadas para a recuperação geral, mas não devem ser realizadas em pacientes sem perspectiva de melhora, pois prolongam o sofrimento.

Girond e Waterkemper 22. Girond JBR, Waterkemper R. Sedação, eutanásia e o processo de morrer do paciente com câncer em cuidados paliativos: compreendendo conceitos e inter-relações. Cogitare Enferm [Internet]. 2006 [acesso 22 fev 2023];11(3):258-63. DOI: 10.5380/ce.v11i3.7313
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descrevem que o Ministério da Saúde (MS) entende sedativos como qualquer droga que acalma ou seda, utilizados principalmente em casos de agitação ou excitação acima do normal. Dessa forma, quando aplicados, é possível diminuir a psicomotricidade do paciente, relaxando tanto o corpo e a parte física – e, consequentemente, retirando as dores – quanto a mente, afastando a ansiedade e outras sensações indesejáveis.

Por outro lado, para o melhor entendimento do artigo, é preciso elucidar a diferença entre sedação paliativa e eutanásia. Esta pode ser descrita como uma metodologia que acelera indiretamente a morte via ações médicas, que são executadas com o intuito de aliviar dor e sofrimento. Existem vários tipos de morte e serão abordados os mais relevantes: eutanásia voluntária (há o consentimento do paciente); eutanásia involuntária (acontece sem o consentimento do paciente); distanásia (ocorre o prolongamento da morte, também chamado de tratamento inútil); ortotanásia ou eutanásia terapêutica (não se utilizam meios para acelerar, apenas para aliviar); e suicídio assistido (realizado quando há ajuda profissional para a realização do ato de autoextermínio).

No âmbito médico, na maioria das vezes, os profissionais de saúde não pensam sobre como sua prática está interligada à morte, apenas à vida e à sua manutenção. Sendo assim, quando começam a pensar na morte de seu paciente e no cuidado com a família, muitos colaboradores podem sofrer. Isso se deve ao fato de se sentirem insuficientes quanto ao seu potencial de trabalho, mas é nesse momento que começam a valorizar ainda mais a vida, inclusive em seus momentos finais.

Por fim, quando os termos são relacionados à bioética, é possível analisar que ambos têm propostas muito diferentes. De acordo com os termos éticos de saúde, a intenção da sedação paliativa é dar qualidade de vida ao paciente (beneficência), e não buscar acelerar sua morte (maledicência). Portanto, os cuidados paliativos se preocupam com o paciente como um todo: vida, morte, modo de morrer, família, dignidade e bem-estar.

Eich e colaboradores 44. Eich M, Verdi MIM, Finkler M, Martins PPS. Princípios e valores implicados na prática da sedação paliativa e a eutanásia. Interface Comun Saúde Educ [Internet]. 2018 [acesso 22 fev 2023];22(66):733-44. DOI: 10.1590/1807-57622016.0853
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promoveram uma pesquisa exploratória e descritiva de abordagem qualitativa com base em diversos profissionais que pensavam sobre a prática da sedação paliativa dos pacientes. Os autores buscaram entender de forma científica e bioética o que esses colaboradores entendiam sobre as implicações desse ato em seu ambiente de trabalho.

Dessa forma, a grande maioria se mostrou favorável à sedação paliativa, visto que tinha o alívio do paciente como seu objetivo principal. Ademais, esses profissionais ressaltaram que eram a favor apenas quando essa era a última opção para o momento, ou seja, quando não era mais possível controlar a dor e o sofrimento sentidos pelo doente ou quando o tratamento standard era mais danoso do que benéfico à sua qualidade de vida, devido aos efeitos colaterais terríveis 44. Eich M, Verdi MIM, Finkler M, Martins PPS. Princípios e valores implicados na prática da sedação paliativa e a eutanásia. Interface Comun Saúde Educ [Internet]. 2018 [acesso 22 fev 2023];22(66):733-44. DOI: 10.1590/1807-57622016.0853
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. Sendo assim, foi especificado que o sofrimento não precisava ser apenas físico, mas que também podia ser psíquico ou social.

Os profissionais também citaram a literatura para embasar ainda mais seus argumentos sobre a sedação paliativa. Isso ocorre porque existem várias modalidades e cada uma é aplicada em casos diferentes, por exemplo: primária ou secundária; contínua ou intermitente; profunda ou superficial. Esses termos são aplicados com base na história do paciente e de sua doença e na classificação dos sintomas: difíceis ou intoleráveis. Dessa maneira, os colaboradores conseguem aplicar a técnica correta que o paciente necessita, de forma segura e bioética. Pacientes que têm possibilidade de melhora recebem sedações paliativas mais leves, enquanto aqueles que realmente estão em situações mais vulneráveis recebem sedações mais fortes e permanentes.

Desse modo, também esclareceram que é de suma importância conversar com os familiares e obter sua aprovação, pois é preciso entender que a sedação paliativa não é uma forma de apressar a morte, mas apenas mais um cuidado a ser oferecido em uma morte que está próxima. Sendo assim, é possível diferenciar essa técnica da eutanásia, que busca ocasionar a morte imediata, e compreender a preocupação que esses profissionais têm em relação a explicar o assunto para a família, que muitas vezes pode estar confusa sobre o tema. Também foi citado que pacientes e familiares que recusam a sedação paliativa geralmente têm motivos religiosos. Eles acreditam que aquele momento de sofrimento ao fim da vida é uma “purificação” da alma que está prestes a partir. Os profissionais ainda relataram sofrer por isso, pois não podem fazer nada perante a dor de seu paciente. Para Eich e colaboradores 44. Eich M, Verdi MIM, Finkler M, Martins PPS. Princípios e valores implicados na prática da sedação paliativa e a eutanásia. Interface Comun Saúde Educ [Internet]. 2018 [acesso 22 fev 2023];22(66):733-44. DOI: 10.1590/1807-57622016.0853
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, fica evidente a importância do esclarecimento e do diálogo com a família sobre a sedação paliativa. É necessário tomar atitudes prudentes em relação ao caso para que o paciente não sofra e para que a família esteja confortável com sua partida.

Ainda com relação às perspectivas médicas, no trabalho de Piedade, Cardoso e Priolli 55. Piedade MAO, Cardoso CA, Priolli DG. Prevalence of palliative sedation in the State of São Paulo: an emerging medical demand. Einstein (São Paulo) [Internet]. 2020 [acesso 22 fev 2023];18:1-9. DOI: 10.31744/einstein_journal/2020ao5395
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foi aplicado um questionário de 23 itens para médicos da cidade de São Paulo sobre seus conhecimentos acerca da temática. A partir dessa análise, 99% dos médicos afirmaram ser favoráveis à sedação paliativa, além de não acreditarem que esta poderia ser comparada com a eutanásia. Além disso, 68% relataram já ter utilizado a técnica em algum momento de sua vida, mas apenas 26% afirmaram ter formação na área de cuidados paliativos. Desse modo, ficou evidente que a maioria dos profissionais se sente confortável com o uso da técnica, além de ser muito frequente durante sua atuação. Contudo, há uma preocupação quanto ao relativo baixo preparo (visto que grande maioria não tem formação específica na área), pois é necessário fazer escolhas corretas acerca da droga a ser aplicada, dialogar com a família, ter conhecimento sobre as implicações legais, além de preparo psicológico para lidar com o caso.

Ainda sob a perspectiva da ética médica, porém voltada para a academia e para a formação profissional, Lima e colaboradores 66. Lima FCO, Costa Filho JO, Davanço BZ, Uyema GYS, Kitamura NA. Aspectos bioéticos sobre eutanásia e sedação paliativa: perspectiva do acadêmico/bioethical aspects about euthanasia and palliative sedation. Rev Brasil Epidemiol [Internet]. 2020 [acesso 25 fev. 2023];3(6):19651-64. DOI: 10.34119/bjhrv3n6-341
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realizaram uma pesquisa com 146 estudantes de medicina da Universidade de Medicina de Presidente Prudente, que estão entre o 11º e 12º período do curso, acerca do conhecimento teórico e ético sobre eutanásia e sedação paliativa. Foram aplicadas oito questões sobre as diferenças e implicações dessa prática médica, visto que estes serão futuros profissionais e terão de lidar com a morte de seus pacientes eventualmente.

A partir do resultado, é possível inferir que a quantidade de acertos totais foi satisfatória de modo geral, pois a maioria dos alunos teve bom desempenho. Entretanto, a principal preocupação começa quando os erros são analisados, já que apenas 38% dos alunos conseguiram diferenciar corretamente sedação paliativa, eutanásia, distanásia e ortotanásia e pouco mais de 55% dos alunos diferenciaram eutanásia de sedação paliativa 66. Lima FCO, Costa Filho JO, Davanço BZ, Uyema GYS, Kitamura NA. Aspectos bioéticos sobre eutanásia e sedação paliativa: perspectiva do acadêmico/bioethical aspects about euthanasia and palliative sedation. Rev Brasil Epidemiol [Internet]. 2020 [acesso 25 fev. 2023];3(6):19651-64. DOI: 10.34119/bjhrv3n6-341
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.

Dessa forma, percebem-se falhas no modelo de ensino médico brasileiro, visto que esses alunos, prestes a se formar, ainda não tinham amplo conhecimento sobre os termos e, portanto, não saberiam a conduta correta diante de casos mais delicados. Isso revela muito sobre a atual situação da medicina, na qual muitos profissionais se mostram favoráveis à sedação paliativa, mas não são capazes de conduzi-la de maneira eficiente, ainda mais quando levada em consideração a exaustão emocional sofrida pela família e pelos colaboradores do caso.

Por fim, Santos e colaboradores 77. Santos RB, Gomes CM, Bonadio CB, Ferreira PS, Bertequini RB, Rodrigues LF. Estudo observacional retrospectivo sobre o perfil de pacientes que receberam terapia de sedação paliativa em unidade de cuidados paliativos de hospital de câncer no Brasil. Rev Bras Cancerol [Internet]. 2019 [acesso 2 mar 2023];65(1):1-7. DOI: 10.32635/2176-9745.rbc.2019v65n1.324
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realizaram um estudo observacional retrospectivo sobre 919 prontuários de pacientes que foram a óbito nos cuidados paliativos no Hospital de Câncer Brasileiro. Do total, 21,5% receberam a sedação paliativa e, destes, os dados mais relevantes foram: a maioria era mulher (55%); a principal causa oncológica foi tumor no sistema digestório; e o sintoma mais recorrente foi dispneia, seguida pela dor. Ademais, a técnica mais aplicada (75% dos pacientes) foi a sedação contínua. Outro fator relevante foi o estágio em que a patologia estava. É possível dizer que no estágio I apenas 3,5% receberam a sedação, enquanto no estágio IV (mais avançado) foram 56%. A técnica foi utilizada em casos de dores insuportáveis, além de danos psiquiátricos (como casos de delirium) e psicológicos (quando o paciente não consegue ter um estado de bem-estar, pois nenhuma medicação resolve a dor satisfatoriamente), visto que a qualidade de vida vai além do bom funcionamento do corpo, é também uma questão de manutenção da integridade social.

Considerações finais

A sedação paliativa permanece na penumbra entre a desinformação e os limites da bioética. Mesmo após diversos debates, opiniões e discussões, o maior desafio consiste em uma definição mais clara e específica, pautada nos valores da sociedade contemporânea, ainda bastante permeada por crenças religiosas, que, frequentemente, assumem o sofrimento como parte do processo do viver. Entretanto, o sofrimento presente na morte vai além das múltiplas interpretações filosóficas e religiosas, sendo capaz de compor a vontade e o direito de experimentar a própria passagem à maneira do indivíduo.

Desse modo, uma vez que a compreensão sobre a questão é escassa – principalmente do ponto de vista profissional e acadêmico –, é razoável considerar uma discussão aprofundada da temática. Faculdades, hospitais e unidades de saúde têm condições suficientes de capacitação, sejam elas durante aulas, reuniões ou mesas de debate. Para a população em geral, a construção de uma noção básica sobre o conceito ainda é um desafio, tendo em vista a heterogeneidade do povo brasileiro, diverso em costumes e crenças. Todavia, esse fato não exime dos profissionais de saúde o dever de conscientizar a sociedade e, para tal, a produção de material e bibliografia atualizados se faz necessária para uma melhor interpretação sobre a sedação paliativa no contexto brasileiro.

Referências

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    Carvalho RT, Parsons, HA, organizadores. Manual de cuidados paliativos ANCP: ampliado e atualizado [Internet]. 2ª ed. Rio de Janeiro: Solo; 2012 [acesso 21 fev 2023]. Disponível: https://bitly.ws/39WJA
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    » https://doi.org/10.32635/2176-9745.rbc.2019v65n1.324

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    20 Jun 2023
  • Revisado
    08 Nov 2023
  • Aceito
    13 Nov 2023
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