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Alterações na cutícula de maçãs 'Fuji' e 'Gala' em função do tratamento térmico e da armazenagem refrigerada

Changes on 'Fuji' and 'Gala' apple cuticle as a result of heat treatment and cold storage

Resumos

As doenças de pós-colheita são fatores limitantes para estocagem de produtos colhidos. É crescente o interesse por métodos alternativos para o controle de podridão em pós-colheita. A termoterapia pré-estocagem parece ser um método promissor podendo ser aliado a outros métodos alternativos. O objetivo deste trabalho foi verificar os efeitos do tratamento térmico por aspersão e imersão na cutícula de maçãs (Malus domestica Borkh.) Fuji e Gala após tratamento e período curto de armazenagem. Foram realizados seis tratamentos, com três repetições de três frutos: testemunha, imersão em água quente a 58ºC-30 s, 1 e 2 min., aspersão em água quente a 58ºC-30 s; imersão em clorofórmio 30 segundos. Foram retiradas amostras para visualização em microscopia eletrônica de varredura na instalação e três semanas de armazenamento a 0ºC. Durante a armazenagem, as rachaduras da cutícula aumentam em largura, sendo esta uma característica importante na pós-colheita, pois estas propiciam maior perda de água e podem tornar-se sítios de penetração de patógenos. O calor derrete os cristaloides de cera da cutícula para formar um padrão de recobrimento mais homogêneo na superfície e a oclusão de fraturas, podendo atuar como barreira física para evitar a entrada de patógenos nas maçãs bem como reduzir a perda de massa fresca.

termoterapia; epicarpo; Malus domestica


Postharvest diseases are limiting factors to the storage of many crops. There is a growing interest in alternative methods to control postharvest diseases. Pre-storage heat treatment seems to be one of the most promising rot control methods, associated with other alternative methods. The objective of this work was to verify the effects of immersion and spraying heat treatment on the cuticle of Fuji and Gala apples (Malus domestica Borkh.) right after treatment and a short storage period. This experiment consisted of six treatments, three replications of three fruits each: no treatment; hot water immersion at 58ºC for 30 s, 1 and 2 min.; hot water spraying at 58º C for 30s; chloroform immersion for 30s. Samples were excised to visualize on scanning electron microscope at onset and after three weeks storage at 0ºC. During the storage period, cracks of the cuticle layer got wider. Heat acts melting the crystalloids on the cuticle layer, and the melting forms a more homogeneous covering pattern on the apple surface. Heat caused occlusion of fractures by melting waxes, showing this is one of the probable effects of heat on the fruit, which could be acting as a physical barrier to avoid the entrance of pathogen in the apple, as well as reducing fresh weight loss.

thermoterapy; epicarp; Malus domestica


PRODUÇÃO VEGETAL

Alterações na cutícula de maçãs 'Fuji' e 'Gala' em função do tratamento térmico e da armazenagem refrigerada

Changes on 'Fuji' and 'Gala' apple cuticle as a result of heat treatment and cold storage

Cândida Raquel Scherrer MonteroI,* * Autor para correspondência. E-mail: candidaraquel@gmail.com License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited. ; Rose Beatriz AntesI; Rinaldo Pires dos SantosII; Liege Cunha dos SantosI; Cristiane Salete AndreazzaI; Renar João BenderI

IDepartamento de Horticultura e Silvicultura, Faculdade de Agronomia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Rua Bento Gonçalves, 7712, 91501-970, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

IIDepartamento de Botânica, Instituto de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil

RESUMO

As doenças de pós-colheita são fatores limitantes para estocagem de produtos colhidos. É crescente o interesse por métodos alternativos para o controle de podridão em pós-colheita. A termoterapia pré-estocagem parece ser um método promissor podendo ser aliado a outros métodos alternativos. O objetivo deste trabalho foi verificar os efeitos do tratamento térmico por aspersão e imersão na cutícula de maçãs (Malus domestica Borkh.) Fuji e Gala após tratamento e período curto de armazenagem. Foram realizados seis tratamentos, com três repetições de três frutos: testemunha, imersão em água quente a 58ºC-30 s, 1 e 2 min., aspersão em água quente a 58ºC-30 s; imersão em clorofórmio 30 segundos. Foram retiradas amostras para visualização em microscopia eletrônica de varredura na instalação e três semanas de armazenamento a 0ºC. Durante a armazenagem, as rachaduras da cutícula aumentam em largura, sendo esta uma característica importante na pós-colheita, pois estas propiciam maior perda de água e podem tornar-se sítios de penetração de patógenos. O calor derrete os cristaloides de cera da cutícula para formar um padrão de recobrimento mais homogêneo na superfície e a oclusão de fraturas, podendo atuar como barreira física para evitar a entrada de patógenos nas maçãs bem como reduzir a perda de massa fresca.

Palavras-chave: termoterapia, epicarpo, Malus domestica.

ABSTRACT

Postharvest diseases are limiting factors to the storage of many crops. There is a growing interest in alternative methods to control postharvest diseases. Pre-storage heat treatment seems to be one of the most promising rot control methods, associated with other alternative methods. The objective of this work was to verify the effects of immersion and spraying heat treatment on the cuticle of Fuji and Gala apples (Malus domestica Borkh.) right after treatment and a short storage period. This experiment consisted of six treatments, three replications of three fruits each: no treatment; hot water immersion at 58ºC for 30 s, 1 and 2 min.; hot water spraying at 58º C for 30s; chloroform immersion for 30s. Samples were excised to visualize on scanning electron microscope at onset and after three weeks storage at 0ºC. During the storage period, cracks of the cuticle layer got wider. Heat acts melting the crystalloids on the cuticle layer, and the melting forms a more homogeneous covering pattern on the apple surface. Heat caused occlusion of fractures by melting waxes, showing this is one of the probable effects of heat on the fruit, which could be acting as a physical barrier to avoid the entrance of pathogen in the apple, as well as reducing fresh weight loss.

Key words: thermoterapy, epicarp, Malus domestica.

Introdução

As doenças de pós-colheita são fatores limitantes para estocagem de inúmeros produtos colhidos. Além disso, a susceptibilidade de produtos recém-colhidos às doenças de pós-colheita aumenta durante a estocagem prolongada, como resultado de mudanças fisiológicas que favorecem o desenvolvimento dos patógenos nos frutos (ECKERT; OGAWA, 1988). O mercado de exportação de frutas frescas exige frutos livres de sujeira, patógenos e produtos químicos, uma vez que o consumidor está cada vez mais consciente em relação à necessidade de sua alimentação ser livre de resíduos de qualquer natureza.

Dessa forma, fica cada vez mais difícil justificar o uso de produtos químicos sintéticos em produtos frescos colhidos (HOW, 1991), ao mesmo tempo em que se aumenta o interesse por métodos não convencionais para o controle de podridão.

Neste contexto, o tratamento térmico pré-estocagem parece ser um dos mais promissores métodos de controle de podridão de pós-colheita (COUEY, 1989; SCHIRRA; BEN-YEHOSHUA, 1999). Trata-se de um método físico de desinfecção e pode ser aplicado por imersão, por vapor, por ar seco (LURIE, 1998; SCHIRRA; BEN-YEHOSHUA, 1999) ou por enxágue rápido e escovação (FALLIK et al., 1996). Estes métodos, que utilizam calor para redução de podridão, são fungistáticos e não-fungicidas. O patógeno é inibido tanto pela inibição térmica como pelo aumento da resistência do fruto contra o patógeno. Uma das hipóteses para o aumento de resistência do fruto está relacionada a alterações na camada mais externa do fruto, a cutícula, em que, segundo Schirra et al. (2000), rachaduras são preenchidas por ceras, evitando-se a invasão por vários patógenos (SCHIRRA et al., 2000).

Além dos trabalhos realizados em todo mundo com o uso de tratamento térmico em inúmeros produtos hortícolas recém-colhidos, no Brasil alguns trabalhos já foram realizados para conservação de frutos da cajazeira (BRITO et al., 2008), goiaba (DÓRIA et al., 2004) e maçãs, focando, principalmente, o controle de doenças de pós-colheita (LUNARDI et al., 2003). Para poder se utilizar com eficácia um método de conservação pós-colheita é de suma importância poder se entender como o mesmo atua.

Neste sentido, o presente trabalho tem por objetivo verificar os efeitos do tratamento térmico por aspersão e imersão na superfície cuticular de maçãs cultivar Fuji e Gala.

Material e métodos

Foram utilizadas maçãs (Malus domestica Borkh.) das cultivares Gala e Fuji, provenientes da empresa produtora de maçãs Mercochem, do município de Caxias do Sul, Estado do Rio Grande do Sul. Os frutos foram selecionados quanto à ausência de defeitos e homogeneidade de tamanho e ponto de maturação.

O experimento consistiu de seis tratamentos, com três repetições de três frutos cada: T1 = testemunha; T2 = imersão em água quente a 58ºC, por 30s; T3 = imersão em água quente a 58ºC, por 1 min.; T4= imersão em água quente a 58ºC, por 2 min.; T5 = aspersão em água quente a 58º C, por 30 s, T6 = imersão em clorofórmio por 30 s (NEINHUIS et al., 2001). Foram retiradas amostras para visualização em microscopia eletrônica de varredura no momento da instalação do experimento, logo após a aplicação dos tratamentos e três semanas após este período. Os frutos foram mantidos em ar refrigerado a 0 ± 0,5ºC e UR 98%, durante o período de avaliação.

Segmentos de 5 mm2 da epiderme das maçãs foram retirados da região equatorial de cada fruto e aderidos com fita dupla face em uma lâmina histológica de vidro, de modo a permanecerem estendidos durante o processo de secagem. Em seguida, as lâminas foram colocadas em uma placa de Petri contendo sílica gel para secagem. As placas foram mantidas em um dessecador contendo sílica gel, durante um período mínimo de uma semana. Posteriormente, um segmento de 1 mm2 foi retirado com auxílio de bisturi e microscópio estereoscópico. As amostras foram aderidas em suportes de alumínio com cola prata, recobertas com uma camada de 15 nm de ouro, em metalizador Balzer e visualizadas em microscópio eletrônico de varredura JEOL JSM-6060, sob 10kV.

As imagens foram comparadas para se analisar o derretimento de conteúdo ceroso e dos cristaloides e o padrão de recobrimento das rachaduras bem como a largura destas rachaduras durante o período em estudo. Para se avaliar alterações na largura das rachaduras, imagens de mesma magnificação foram abertas em um programa editor de imagens com réguas para se facilitar medição das larguras.

Por razões da natureza do trabalho realizado, que envolve essencialmente um estudo de análise da estrutura externa da cutícula em função de tratamentos físicos em pós-colheita, análises estatísticas não foram necessárias. Neste estudo, análises por comparação das imagens de microscopia eletrônica de varredura foram suficientes para se identificar as diferenças entre os tratamentos aplicados.

Resultados e discussão

Efeitos do calor na cutícula de maçãs recém-tratadas com calor

O calor aplicado tanto por imersão como aspersão proporcionou dois efeitos distintos visualizados sob o microscópio eletrônico de varredura: o recobrimento parcial ou total das fissuras naturais das camadas epicuticulares dos frutos e o derretimento parcial ou total dos cristaloides de ceras, com alteração do formato original dos mesmos.

As rachaduras naturais (Figura 1a), encontradas na cutícula dos frutos, foram alteradas com a aplicação do calor, variando-se conforme o tratamento aplicado. Na cultivar Fuji, quando se usou imersão, o padrão de derretimento na camada cerosa e a cobertura das rachaduras foram mais homogêneos (Figura 1b e c). Já quando foi utilizada a aspersão, o efeito foi menos homogêneo e o recobrimento das rachaduras foi parcial, parecendo mais esparso e 'salpicado' (Figura 1d).


O efeito de derretimento e cobertura de rachaduras foi mais evidente na cv. Fuji que na Gala, principalmente porque, na cutícula dos frutos desta cultivar, as rachaduras não são tão evidentes quanto na Fuji. Foi possível visualizar as rachaduras na cultivar Gala apenas quando foram retiradas partes das ceras cuticulares que recobriam os frutos com uso de clorofórmio (dados não-apresentados), o que demonstra que as ceras cuticulares da cv. Gala formam uma camada amorfa que recobre mais uniformemente estas rachaduras durante o seu crescimento, diferentemente do que ocorre na Fuji.

A cutícula e as ceras epicuticulares são uma barreira entre organismos vivos como os vegetais e o meio ambiente. Esta camada atua, entre outras coisas, na proteção contra a perda excessiva de água. A presença de microfissuras na camada de ceras epicuticulares já foi demonstrada em outros estudos (FAUST; SHEAR, 1972; LURIE et al., 1996; ROY et al., 1994; MIGUIRE et al., 1999; SCHIRRA et al., 2000) e pode influenciar a permeabilidade ao vapor de água nos frutos. Muitos pesquisadores já estudaram esta camada. Faust e Shear (1972) constataram o aparecimento de rachaduras em maçãs de diferentes cultivares e mencionaram que estas poderiam ocorrer por uma falha das ceras em manter a mesma velocidade de crescimento do tecido interno, ou ainda, que as rachaduras ocorreriam como resultado da expansão do fruto durante o desenvolvimento e o amadurecimento (ROY et al., 1994). Miguire et al. (1999) estudaram as microfissuras em maçãs cv. Braeburn e a sua relação com a permeabilidade ao vapor de água e concluíram que a permeabilidade das rachaduras era aproximadamente 15 vezes maior que a da cutícula intacta e que mudanças na proporção de rachaduras poderiam criar um grande efeito na permeabilidade ao vapor de água do fruto como um todo. Futuros estudos, em termos de perda de massa fresca para frutos tratados com calor (e/ou o uso de ceras comerciais no recobrimento de rachaduras), podem determinar se o recobrimento parcial ou total das fissuras, visualizados neste experimento, têm alguma influência significativa na desidratação dos frutos após a colheita.

O tratamento térmico é utilizado para se reduzir podridões de pós-colheita. Alguns autores mencionam que um dos efeitos do calor seria o efeito físico de oclusão das fraturas e microferimentos pelo derretimento das ceras existentes na camada epicuticular, protegendo, desta forma, o fruto da entrada de patógenos (SCHIRRA et al., 2000). O calor utilizado neste experimento alterou a camada de ceras epicuticulares dos frutos, e estas se apresentaram derretidas e recobriram total ou parcialmente as rachaduras naturalmente existentes nestes. No entanto, o tipo de tratamento térmico tem efeitos diferentes nesta camada, derretendo mais ou menos as estruturas que a formam e aumentando ou diminuindo o efeito do recobrimento de fissuras, deixando esta camada mais ou menos homogênea. A eficácia deste recobrimento em termos de proteção do fruto é algo que deve ser determinado para cada cultivar e/ou espécie frutífera, uma vez que a cutícula apresenta características distintas mesmo entre cultivares de uma mesma espécie. A oclusão de fraturas, pelo derretimento das ceras epicuticulares em função do calor, que se observa neste trabalho, mostra que este é um dos prováveis efeitos do calor sobre os frutos e que pode estar atuando como uma barreira física para evitar a entrada de patógenos nas maçãs. Cabe salientar que o calor tem outros efeitos não-discutidos neste trabalho e que atuam em conjunto com o efeito físico mencionado na possível proteção do fruto contra patógenos em pós-colheita.

O efeito do calor sobre os cristaloides epicuticulares presentes na superfície foi bastante evidente na cv. Fuji, pela abundância destes cristaloides nesta cultivar. Ocorreram derretimento parcial ou total (Figura 2b e c) e alteração de formato dos cristaloides. O derretimento foi visualizado em todos os tratamentos térmicos aplicados tanto por imersão como em aspersão. O material ceroso, proveniente do derretimento dos cristaloides, e a formação de uma camada mais amorfa e homogênea de ceras (Figura 2c) provavelmente ajudaram na cobertura das rachaduras na superfície epicuticular quando os frutos foram submetidos ao calor. Outro efeito, visualizado apenas nos frutos da cultivar Fuji, tratados pelo calor, foi um aglomeramento de cristaloides (Figura 2d), geralmente associado ao tratamento de calor aplicado por aspersão.


A cultivar Gala também apresentou derretimento de cristaloides (Figura 3c), fenômeno que foi menos evidente nesta cultivar pelas características de sua camada de ceras epicuticulares.



O aglomeramento de cristaloides, visualizado na Fuji, não ocorreu para esta cultivar, mas o tratamento com aspersão produziu efeito salpicado na sua cutícula (Figura 3d). A formação de placas na cutícula de muitas amostras tratadas com calor, principalmente por imersão (Figura 3b), foi evidente nesta cultivar.

Efeitos do tratamento com calor na cutícula de maçãs armazenadas a frio

Três semanas após a aplicação dos tratamentos térmicos, os frutos armazenados a 0ºC foram submetidos a uma segunda avaliação, realizada para se examinar a possível ocorrência de alguma alteração no padrão visualizado inicial.

Efeitos similares aos observados logo após a aplicação dos tratamentos foram registrados após o período de armazenagem, tais como recobrimento de rachaduras na superfície da cultivar Fuji, principalmente nos tratamentos onde o calor foi aplicado por imersão (Figura 4a, b e c). Já quando o calor foi aplicado por aspersão, ocorreu um efeito 'salpicado' na cutícula similar ao visualizado antes do armazenamento (Figura 4d).


Estudos em mais de um tipo de frutos mostraram que ocorrem modificações nas rachaduras da cutícula em função da armazenagem: Roy et al. (1994), estudando maçãs, verificaram que, em frutos colhidos antes do climatério, as rachaduras se tornavam mais largas e profundas durante uma estocagem prolongada; outro estudo (D´HALLEWIN; SCHIRRA, 2000) revelou resultados similares para pomelo. Neste trabalho, foi possível medir a largura das rachaduras, antes e após a estocagem, por um curto período e verificaram-se efeitos similares aos citados na literatura em relação ao aumento da largura das rachaduras após este período, tanto para frutos tratados com calor como para aqueles com o tratamento-testemunha. Os valores médios de largura das rachaduras cuticulares em maçãs da cultivar Fuji são: testemunha 15,47 µm, testemunha após armazenagem 17,46 µm, tratado com calor 22,82 µm, tratado com calor e armazenado 26,82 µm.

As modificações que ocorreram na superfície cuticular da cultivar Gala incluem a formação de 'placas de cera' (Figura 5a) similar às visualizadas antes da armazenagem ou somente a formação de uma superfície amorfa de cobertura relativamente homogênea (Figura 5b). Este resultado já era esperado já que esta cultivar apresenta a característica de rachaduras menos evidente que a Fuji.


Os frutos da cultivar Fuji não-tratados com calor, avaliados após o armazenamento, apresentaram hifas de fungos penetrando as rachaduras. Este fenômeno pode ser visualizado na Figura 6 (a) e demonstra como as rachaduras podem ser uma porta de entrada para um patógeno ou um apoio para o desenvolvimento e/ou fixação do mesmo na superfície externa dos frutos de maçã.


Já na cultivar Gala, não se observou nenhum microrganismo na superfície dos frutos, avaliados após armazenagem e que não sofreram tratamento térmico. Entretanto, pôde-se visualizar microrganismos desenvolvendo-se na superfície em algumas amostras de frutos que foram tratadas com calor (Figura 6b).

Neste caso, o tratamento com calor pode não ter sido suficiente para eliminar toda fonte de inóculo da superfície dos frutos.

O efeito de derretimento de cristaloides da maçã cv. Gala foi novamente visualizado (Figura 7a) após a armazenagem. Em algumas amostras, havia cristaloides intactos (Figura 7b), os quais podem tanto não ter sofrido derretimento por uma falha de aplicação do tratamento como podem ter sido originados após o tratamento térmico, provenientes de uma nova síntese destes compostos cerosos ou de recristalização dos mesmos. Para Roy et al. (1994), o tratamento com calor pode estimular aumento na síntese de ceras para preencher rachaduras, lenticelas, ou ambos. Baker (1974) também sugeriu que aumentos de temperatura estimulam a produção de ceras.


Na cultivar Fuji, mesmo após o tempo de armazenamento, o efeito do derretimento parcial ou total e a alteração de formato dos cristaloides ainda foram visualizados com clareza em todos os tratamentos de calor aplicados (Figura 8a).


Além dos efeitos de derretimento e alteração no formato, também ocorreu aglomeramento de cristaloides, semelhante ao que ocorreu nesta mesma cultivar antes do período de armazenagem (Figura 8b). Outro fato a salientar é a grande quantidade de cristaloides intactos presentes na superfície cuticular dos frutos após o período de armazenamento, provavelmente por uma síntese de compostos de cera durante este período (Figura 8b e c). Comparando-se os frutos tratados com calor, antes e após o armazenamento, os primeiros apresentaram superfície mais homogênea e com menor quantidade de cristaloides (Figuras 1 e 4).

Neste sentido, o estresse pelo tratamento de calor pode ter estimulado a produção de ceras pelos frutos durante a armazenagem como sugerem alguns autores (ROY et al., 1994) ou o próprio armazenamento pode ter algum efeito neste sentido. Ou seja, os frutos, durante o armazenamento, podem ter sintetizado mais ceras para preencher fissuras em sua superfície no sentido de evitar excessiva desidratação dos tecidos.

De acordo com a literatura, a modificação que vem sendo visualizada no epicarpo de frutos em função do armazenamento se refere às rachaduras na cutícula, que se tornam mais largas e profundas durante a estocagem (D´HALLEWIN; SCHIRRA, 2000; ROY et al., 1999). Tais trabalhos não mencionam a modificação nos cristaloides de ceras na superfície dos frutos visualizada neste trabalho.

Conclusão

O calor atua derretendo parcial ou totalmente cristaloides da camada cerosa da cutícula, alterando seu formato e causando aglomeramento dos mesmos.

O derretimento forma um padrão de recobrimento mais homogêneo na superfície das maçãs, gerando a oclusão de rachaduras da cutícula. Desta forma, este recobrimento pode estar atuando como uma barreira física para evitar a entrada de patógenos nas maçãs.

Agradecimentos

Agradecemos ao CNPq pelo apoio financeiro no projeto e ao CME-UFRGS, pelo uso do microscópio eletrônico de varredura.

Received on August 7, 2008.

Accepted on October 30, 2008.

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  • *
    Autor para correspondência. E-mail:
    License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Mar 2011
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      07 Ago 2008
    • Aceito
      30 Out 2008
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