Acessibilidade / Reportar erro

Degeneração walleriana de origem vascular em ressonância magnética de paciente com paralisia supranuclear progressiva provável: fator etiológico ou associação fortuita?

Vascular wallerian degeneration on magnetic resonance in a patient with probable progressive supranuclear palsy: aetiology or casual link?

Resumos

Paralisia supranuclear progressiva (PSP) é uma das principais causas de parkinsonismo-plus não responsivo a terapia. A ocorrência de doença cerebrovascular associada a parkinsonismo não é infreqüente, no entanto é difícil estabelecer a relação causa-efeito entre ambas. Relatamos o caso de um paciente de 65 anos com PSP provável iniciada após infarto cerebral, em que a imagem por ressonância magnética evidenciou sinais de degeneração walleriana do trato córtico-espinhal. Não há relato na literatura pesquisada sobre esta possível correlação.

paralisia supranuclear progressiva; doença cerebrovascular; degeneração Walleriana; ressonância magnética


Progressive supranuclear palsy (PSP) is one of the most important causes of parkinsonism non responsive to therapy. Vascular parkinsonism is not uncommon. However, the cause-effect relationship between them is uncertain. We report on a 65 years old man with probable PSP who developed the clinical features of the disease after a ischaemic stroke. Magnetic resonance imaging disclosed a corticospinal tract Wallerian degeneration. There is not such an observation in the literature about this possible correlation.

progressive supranuclear palsy; cerebrovascular disease; Wallerian degeneration; magnetic resonance imaging


Degeneração walleriana de origem vascular em ressonância magnética de paciente com paralisia supranuclear progressiva provável: fator etiológico ou associação fortuita?

Vascular wallerian degeneration on magnetic resonance in a patient with probable progressive supranuclear palsy: aetiology or casual link?

Paulo Roberto Alves RosaI; Cesar Ribeiro FerreiraII

Examina Diagnósticos Avançados, Nova Friburgo RJ, Brasil

IMestre em Neurologia; Professor de Neurofisiologia Clínica da Universidade Estácio de Sá, Campus Nova Friburgo

IIMestrando em Radiologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Chefe do Setor de Ressonância Magnética da EXAMINA Diagnósticos Avançados

RESUMO

Paralisia supranuclear progressiva (PSP) é uma das principais causas de parkinsonismo-plus não responsivo a terapia. A ocorrência de doença cerebrovascular associada a parkinsonismo não é infreqüente, no entanto é difícil estabelecer a relação causa-efeito entre ambas. Relatamos o caso de um paciente de 65 anos com PSP provável iniciada após infarto cerebral, em que a imagem por ressonância magnética evidenciou sinais de degeneração walleriana do trato córtico-espinhal. Não há relato na literatura pesquisada sobre esta possível correlação.

Palavras-chave: paralisia supranuclear progressiva, doença cerebrovascular, degeneração Walleriana, ressonância magnética.

ABSTRACT

Progressive supranuclear palsy (PSP) is one of the most important causes of parkinsonism non responsive to therapy. Vascular parkinsonism is not uncommon. However, the cause-effect relationship between them is uncertain. We report on a 65 years old man with probable PSP who developed the clinical features of the disease after a ischaemic stroke. Magnetic resonance imaging disclosed a corticospinal tract Wallerian degeneration. There is not such an observation in the literature about this possible correlation.

Key words: progressive supranuclear palsy, cerebrovascular disease, Wallerian degeneration, magnetic resonance imaging.

Paralisa supranuclear progressiva (PSP) é uma causa de parkinsonismo com duas formas de apresentação: idiopática e vascular. A forma idiopática apresenta-se como parkinsonismo simétrico, não responsivo a L-dopa, instabilidade na marcha, quedas freqüentes e paralisia do olhar vertical, sem evidências de outras etiologias. A forma vascular desenvolve-se de modo semelhante; contudo, os sinais parkinsonianos são, em geral, assimétricos, incontinência esfincteriana e sinais de acometimento vascular nos exames de neuroimagem1,2. Há, no entanto, controvérsia sobre tal doença. A degeneração walleriana (DW) ocorre quando o axônio é submetido a injúria, seja ela traumática ou isquêmica, com degeneração do tipo centrífugo3. Atualmente, a observação de DW pela ressonância magnética (RM) é muito freqüente, principalmente em processo isquêmicos com acometimento do trato cortico espinhal4,1.

O objetivo deste trabalho é relatar um caso de PSP provável surgida após um ictus isquêmico, com a observação de sinais de DW na RM .

CASO

Homem de, 65 anos, caucasiano, representante comercial, natural de São Sebastião do Alto, residente em N. Friburgo, com antecedentes de tabagismo, hipertrigliceridemia e histórico familiar para doença cerebrovascular e insuficiência coronariana. Há nove anos foi internado com hemiparesia esquerda, sendo diagnosticado como isquemia cerebral, com remissão total do déficit neurológico. Há cerca de quatro anos o paciente passou a queixar-se de desequilíbrio e esquecimentos. Evoluiu nas consultas subseqüentes com lentidão, engasgos, visão dupla, episódios de incontinência urinária, sialorréia e cair com facilidade. Foi iniciado tratamento com L-dopa, biperideno, amantadina, porém, não houve reposta terapêutica.

Exame neurológico: Vigil, lúcido, orientado no tempo e espaço, com mini-exame do estado mental apresentando score de 25/30 (dois pontos perdidos em cálculo, um ponto em memória evocada, um ponto em praxia e um ponto na figura com dois pentágonos), marcha em pequenos passos, anteroflexão do tronco, hipomimia facial, disartria, paresia do olhar vertical (predominantemente na mirada para cima) (Fig 1), reflexo óculo-cefálico encontrava-se preservado, hipertonia tipo roda denteada mais acentuada a esquerda, reflexo cutâneo plantar em flexão a direita e indiferente a esquerda e reflexos profundos exaltados difusamente. Não apresentava choro ou riso espasmódico.

Pressão arterial: 120/80 mmHg deitado e em pé.

O paciente foi sumetido a exame de RM em aparelho Toshiba® 0,5 Tesla e software Contour®. A imagem por RM revelou lesão alongada com hipossinal na seqüência FLAIR e T1, e hiperssinal na seqüência T2, comprometendo cápsula externa e centro semi-oval direitos, além de alargamento do ventrículo lateral e cissuras homolaterais. Observou-se ainda, lesão linear oblíqua com hiperssinal na seqüência T2, no trajeto do trato cortico espinhal sugerindo degeneração Walleriana e na seqüência FLAIR, redução volumétrica do pedúnculo cerebral e da ponte a direita.(Fig 2, 3 e 4)




DISCUSSÃO

PSP é afecção neurodegenerativa, de causa obscura, caracterizada por sinais parkinsonianos e comprometimento do olhar vertical de caráter essencialmente supranuclear. Ao estudo anatomopatológico observamos perda neuronal, degeneração granulovacuolar, gliose e emaranhados neurofibrilares nos núcleos da base, mesencéfalo e núcleos cerebelares1,2,5. Os critérios diagnósticos foram propostos pelo National Institute of Neurological Disorders and Stroke (NINDS), sendo divididos em: PSP possível, PSP provável e PSP definida. Na PSP possível temos: doença progressiva iniciada aos 40 anos ou mais, com comprometimento do olhar vertical e/ou lentificação do movimentos sacádicos, instabilidade postural importante, quedas freqüentes ao logo do ano em que iniciou o quadro, sem evidências de outra doença que possa explicar melhor tais achados. Na PSP provável observamos: instabilidade postural grave com quedas freqüentes ao logo do ano em que iniciou o quadro com comprometimento do olhar vertical, bem como outros achados de PSP possível. Na PSP definida, encontramos além dos achados da PSP possível e provável, alterações anatomopatológicas típicas de PSP6.

O presente relato evidencia evolução de uma síndrome extrapiramidal que ocorreu após injúria isquêmica cerebral, sugerindo a possibilidade de etiologia vascular. A ocorrência de sinais neurológicos assimétricos, incontinência urinária, além dos fatores de risco acenam para isto. Contudo, reconhecemos que é dificil estabelecer uma relação precisa de causa e efeito, considerando o tempo de instalação do ictus e o início da síndrome extrapiramidal. Um estudo realizado na Mayo Clinic sugere que a pesquisa do Haplótipo H2 da proteína tau pode auxiliar na diferenciação entre PSP idiopática e vascular2.

O achado principal na RM em PSP é a atrofia global. No entanto, podem ser observados redução volumétrica do mesencéfalo e aumento no coeficiente aparente de difusão no putamen, globo pálido e núcleo caudado7. Em nosso paciente, podemos observar, além das alterações típicas de injúria isquêmica antiga, achados que sugerem DW ao longo do trato cortico espinhal, como alterações involutivas do pedúnculo cerebral, da ponte e pirâmide a direita em relação a esquerda. Com o desenvolvimento das técnicas de RM, evidenciamos achados neste método compatíveis com DW, principalmente em lesões vasculares comprometendo núcleos da base e o trato piramidal. A DW pode ser observada a partir de quatro semanas após o ictus vascular e parece influenciar no prognóstico motor de pacientes com doença cerebrovascular8.

Como a resposta medicamentosa na PSP é nula, a fisio e a fonoterapia impõem-se como medidas de manutenção para os pacientes. Baixos escores do índice de Barthel foram observados em pacientes acometidos de hemorragia supratentorial que apresentavam DW pontina9 e parece haver pior prognóstico ou lentidão no processo de reabilitação em pacientes com lesão vascular na cápsula interna e coroa radiada onde foi notada DW no trato cortico-espinhal10.

A PSP pode ser uma apresentação clínica de doença vascular encefálica incomum, e é inusitada a observação de DW no caso relatado. Apesar de não podermos desconsiderar a possibilidade de duas situações ocorridas de forma independente, não encontramos registro de tal correlação na bibliografia pesquisada.

Recebido 31 Janeiro 2005, recebido na forma final 26 Maio 2005. Aceito 11 Junho 2005.

Dr. Paulo Roberto Alves Rosa - Avenida Alberto Braune 167/505 - 28613-001 Nova Friburgo RJ - Brasil. E-mail: prarosa@terra.com.br

  • 1. Winikates J, Jankovic J. Vascular progressive supranuclear palsy. J Neural Transm 1994;42(Suppl):S189-S201.
  • 2. Josephs KA, Ishizawa T, Tsuboi Y, Cookson N, Dickson DW. A clinicopathological study of vascular progressive supranuclear palsy: a multi-infarct disorder presenting as progressive supranuclear palsy. Arch Neurol 2002;59:1597-1601.
  • 3. Brasileiro G Filho. Bogliolo Patologia, 6Ş edição Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000:834-835.
  • 4. Fukui K, Iguchi I, Kito A, Watanabe Y, Sugita K. Extent of pontine pyramidal tract Wallerian degeneration and outcome after supratentorial hemorrhagic stroke. Stroke 1994;25:1207-1210.
  • 5. Carrilho PE, Barbosa ER. Progressive supranuclear palsy in a sample of Brazilian population: clinical features of 16 patients. Arq Neuropsiquiatr 2002;60:917-922.
  • 6. Litvan I, Agid Y, Calne D, et al.Clinical research criteria for the diagnosis of progressive supranuclear palsy (Steele-Richardson-Olszewski syndrome): report of the NINDS-SPSP international workshop. Neurology 1996;47:1-9.
  • 7. Seppi K, Schocke MFH, Esterhammer R, et al. Diffusion-weighted imaging discriminates progressive supranuclear palsy from PD,but not from the parkinson variant of multiple system atrophy. Neurology 2003;60:922-927.
  • 8. Castillo M, Mukherji SK. Early abnormalities related to postinfarction Wallerian degeneration: evaluation with MR diffusion-weighted imaging. J Comput Assist Tomogr 1999;23:1004-1007.
  • 9. Fukui K, Iguchi I, Kito A, Watanabe Y, Sugita K. Extent of pontine pyramidal tract Wallerian degeneration and outcome after supratentorial hemorrhagic stroke. Stroke 1994;25:1207-1210.
  • 10. Miyai I, Suzuki T, Kii K, Kang J, Kubota K. Wallerian degeneration of the pyramidal tract does not affect stroke rehabilitation outcome. Neurology 1998;51:1613-1616.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Mar 2006
  • Data do Fascículo
    Set 2005

Histórico

  • Aceito
    11 Jun 2005
  • Recebido
    31 Jan 2005
Academia Brasileira de Neurologia - ABNEURO R. Vergueiro, 1353 sl.1404 - Ed. Top Towers Offices Torre Norte, 04101-000 São Paulo SP Brazil, Tel.: +55 11 5084-9463 | +55 11 5083-3876 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista.arquivos@abneuro.org