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Análises de revistas

Análises de revistas

Reprodução experimental da vibração das cordas vocais por estimulação elétrica de um nervo recorrente no cão, com observação estroboscópica da resposta laríngea (Reproduction expérimentale de la vibration des cordes vocales en absence de tout courant d'air, par stimulation électrique d'un recurrent du chien, avec observation stroboscopique de la réponse laryngée). L. Laget. Rev. de Laryngol. (suplemento), fevereiro, 1954, págs. 132-142.

Continuando pesquisas anteriores de Husson, o autor propôs-se a reproduzir a vibração das cordas vocais pela estimulação direta do nervo recorrente de cães. Os resultados foram não só interessantes mas bastante significativos para o entendimento de vários fenômenos anteriormeote sem explicação adequada. A excitação constante, com freqüência de 100 c/s, provoca fibrilação da corda psilateral, a qual se aproxima da linha média cerca de 0,5 cm, aproximação máxima na parte posterior da glote; durante a experiência não passa ar pela glote. A estimulação de 100 a 600 c/s é seguida de uma resposta fibrilar das cordas vocais, com freqüência rigorosamente igual à da excitação, mas a amplitude varia de modo complexo, em função da freqüência e da intensidade da estimulação. Com mesma intensidade de excitação, a 100 c/s há fibrilação de amplitude média; a 200 c/s a fibrilação tem amplitude maior; a 300 c/s a fibrilação diminui abaixo da média. Com intensidade maior, a fibrilação aumenta de amplitude também; contudo, com intensidade dupla, a fibrilação volta a uma amplitude média. Estimulando o recorrente com 400 c/s e intensidade igual à inicial, não há resposta visível da corda vocal; com intensidade muito alta a resposta é ainda pequena (menor que a normal para a intensidade inicial). Se a freqüência sobe a 600 c/s também não há resposta visível com a intensidade inicial; entretanto, a essa freqüência mas com intensidade muito baixa, reaparece a fibrilação da corda vocal.

Esses dados permitem conclusões importantes. Assim, para freqüências superiores a 5C0 c/s, o sistema fibra do recorrente-fibra muscular da corda vocal não responde mais a todas as excitações se a intensidade é máxima (isto é, capaz de estimular todas as fibras musculares), mas apenas àquelas que não caiam no período refratário do sistema. Se as excitações são mais fracas, nem todas as fibras são estimuladas (por causa do limiar, densidade de corrente). Digamos que apenas a metade das fibras é excitada; ncsce caso o sistema pode responder a uma freqüência dupla, pois que um estímulo excita o primeiro contingente e o segundo o outro e não o primeiro por se encontrar este em período refratário. Como cada axônio motor comanda um pequeno grupo de fibras musculares (unidade motora), a estimulação rccorrencial em rodízio bifasado desencadeia uma resposta igualmente bifasada das fibras musculares das cordas vocais, de modo que a fibrilação laríngea pode seguir o ritmo da estimulação (desde que o estímulo seja submáximo, evidentemente), com freqüências de 600 c/s ou maiores.

Sabe-se que, para emitir sons de freqüência maior que 450-500 c/s, a mulher ou o homem devem mudar o tom de voz (voz em falsete); isso só é possível se se diminui consideravelmente a intensidade da emissão. Portanto, para passar às freqüências mais altas, o estimulo volitivo para as cordas vocais deve diminuir de intensidade, tornando-se submáximo (não deve excitar todas as fibras simultaneamente), ocorrendo, pois, as condições do rodízio bifasado. Pode admitir-se que, em certos casos, exista um rodízio não bifasado, mas trifasado, da resposta das cordas vocais. Nesse caso apenas um terço das fibras entraria em ação para cada estímulo, sendo-lhes, então, possível responder a freqüências de 1000 a 1500 c/s. Talvez seja essa a explicação do fenômeno de certos sopranos apresentarem uma passagem de voz aos 450-500 c/s e outra aos 1000 ou 1100 c/s, com um timbre um pouco diferente, subindo sem dificuldade aos 1500 ou 1600 c/s.

C. Timo Iaria

Observações sobre o sistema motor após hemisferectomia (Observations on the motor system following cerebral hemispherectomy). L. French e D. R. Johnson. Neurology, 5:11-14 (Janeiro) 1955.

No adulto normal, a exclusão das áreas corticais motoras, por processo mórbido ou por intervenção cirúrgica, causa hemiplegia completa e duradoura. Se a movimentação do membro inferior é recuperada em parte, a do membro superior, e particularmente a movimentação fina da mão, não é recuperada. Lesões semelhantes cm pacientes que sofreram hemiplegia na infância não acarretam déficit motor comparável a este. Os autores apresentam os resultados da hemisferectomia total em S pacientes, operados para o tratamento de crises convulsivas graves, cuja motricidade se recuperou inteiramente até o nível presente na época pré-operatória. Era um caso essa recuperação ultrapassou o estado da motricidade de antes da operação; outro paciente, de nível mental bom, dizia: "Estou muito melhor, pois antes da operação eu necessitava pensar no movimento para poder executá-lo, agora já consigo fazê-lo sem pensar".

É interessante assinalar alguns fatos registrados neste trabalho: a) a hemisferectomia foi total, com conservação apenas do tálamo; b) a hipertonia preexistente deu lugar a uma hipotonia pós-operatória, à qual sucedeu nova hipertonia no decorrer de semanas ou meses; c) na fase hipotônica inicial havia reflexos hiperativos, assim como sinal de Babinski; d) os movimentos foram recuperados em poucos dias; e) em um caso desapareceram intensos movimentos atetóides presentes antes da operação; f) o reflexo cutâneo-abdominal, do qual todos os livros clássicos assinalam arco reflexo passando pela corticalidade motora do hemisfério contralateral, reapareceu após a hemisferectamia, contradizendo, pois, completamente, aquela teoria; g) em nenhum caso a hipertonia pós-operatória foi superior à preexistente. Os autores interpretaram esta recuperação motora admitindo que os pacientes que perderam a capacidade motora de um hemisfério em época precoce de sua vida já tiveram parte desta capacidade retomada pelo hemisfério ipsilateral, previamente à hemisferectomia contralateral. É de se notar que, nos primeiros 4 casos operados, havia hemiplegia acentuada, mas os últimos apresentavam ainda boas possibilidades motoras, inclusive na mão e dedos, possibilidades estas que se restauraram após a hemisferectomia.

P. Pinto Pupo

A síndrome clínica do aneurisma da artéria cerebral média (The clinical syndrome of aneurism of the middle cerebral artery). K. Frankel e B. J. Alpers. Arch. Neurol, a. Psychiat., 74:46 (julho) 1955.

Pouco se conhece sobre a síndrome clínica dependente do aneurisma da artéria cerebral média, pois os registros de casos na literatura consistem, na maior parte, de verificações necroscópicas, sem correlações anátomo-clínicas. Frankel e Alpers analisam os dados de 12 casos de aneurismas de artéria cerebral média verificados no ato operatório ou pela necrópsia, com a finalidade de definir a sua síndrome clínica e quais os elementos que permitem o diagnóstico antes da rotura. Estes casos são estudados conjuntamente com as observações registradas na literatura, sendo úteis as conclusões. Assim, a incidência etária dos aneurismas das artérias cerebrais médias se verifica entre 20 e 50 anos de idade e é mais comum em indivíduos do sexo masculino. Na maioria dos casos, a queixa datava de menos de uma semana, embora houvesse, por vezes, registro de sintomas desde um mês até 15 anos antes da crise atual. Desses sintomas prévios, o mais freqüente é a cefaléia sem localização preferencial; mais raramente foram registradas perda de consciência ou paresias transitórias dos membros. Os sintomas que habitualmente levam o paciente ao médico dependem de sofrimento cerebral; a queixa mais usual é a perda de consciência, por vezes acompanhada de crises convulsivas. A hemiplegia é uma eventualidade freqüente, mas não constante. Na maior parte dos casos, as radiografias simples do crânio não proporcionam informações úteis.

R. Melaragno Filho

Trombose espontânea das artérias carótidas (Spontaneous thrombosis of the carotid arteries). S. K. Shapiro e W. T. Peyton. Neurology, 4:83-100 (fevereiro) 1954.

Shapiro e Peyton revêem os problemas atinentes à trombose espontânea da carótida baseados em 17 casos pessoais, comentando os diversos aspectos apresentados por seus pacientes em confronto com as observações registradas na literatura. O sintoma mais comumente verificado consiste em paresia muscular, de intensidade variável e cujo aparecimento pode ser o fenômeno inaugural do quadro ou, então, se instalar mais tardiamente. Associadamente, podem surgir distúrbios da consciência, tonturas, incontinência urinaria ou agitação noturna. Cefaléia, generalizada ou homolateral à trombose, é um sintoma considerado como freqüente; não obstante, em apenas um dos casos dos autores havia referências a cefalalgias. Distúrbios sensitivos, sobretudo subjetivos, são de verificação relativamente freqüente; afasias podem acompanhar os fenômenos motores quando a trombose se verifica na carótida esquerda. Com grande freqüência ocorrem distúrbios mentais de modalidade e intensidade variável. Em nenhum dos casos relatados pelos autores havia manifestações convulsivas, embora estas possam ocorrer e mesmo inaugurar o quadro clínico. Episódios de amaurose transitória, hemianopsias homônimas e atrofias ópticas foram registrados em alguns casos. A palpação das artérias carótidas e temporais deve fazer parte do exame de rotina: em 5 dos pacientes registrados pelos autores havia diminuição ou ausência do pulso carotideo e, em um caso, diminuição homolateral de pulso temporal e facial. Por vezes, os pacientes acusam sensação auditiva de ruídos intracranianos. O decurso da afecção pode ocorrer sob três modalidades diferentes: 1 - episódios transitórios de hemiplegias, hemianestesias ou afasias, com ou sem seqüelas em seus intervalos (assim evoluíram 10 dos 17 casos dos autores); 2 - inicio por icto apoplético (5 casos da série); 3 - decurso lentamente progressivo (2 casos, em que houve necessidade de diagnóstico diferencial com tumores cerebrais).

Diversos aspectos arteriográficos podem caracterizar a trombose da artéria carótida interna: 1 - estreitamento cônico do contraste, antes de sua parada, permitindo a visibilização de pequeno segmento da carótida interna; 2 - falta de enchimento da carótida interna com defeitos da coluna de contraste produzidos pelo trombo; 3 - fluxo retrógrado do contraste na artéria carótida comum, propagando-se pela artéria inominada à artéria vertebral, resultando disso um angiograma vertebral; 4 - irregularidade no diâmetro e estreitamento do vaso; 5 - impossibilidade, em diversas tentativas, de encher a artéria carótida interna; 6 - impossibilidade repetida de preencher a carótida interna além do sifão. Enquanto as primeiras quatro eventualidades comprovam o diagnóstico, as duas últimas apenas permitem um diagnóstico de probabilidade, pois as falhas de enchimento da carótida interna, desde seu segmento inicial ou além do sifão, podem ser devidas a dificuldades técnicas ou a espasmos vasculares.

A trombose carotídea tem sido atribuída à arteriosclerose, à tromboangeite obliterante, às tromboses retrógradas de aneurismas intracranianos, à sífilis, à policitemia, às arterites temporais, às periarterites nodosas, às infecções agudas. Em 14 casos de Shapiro e Peyton, a etiologia não pôde ser esclarecida, mesmo após o estudo anátomo-patológico da artéria ocluída; em um caso, a trombose ocorreu durante a convalescença de uma pneumonia; em outro foi atribuída à policitemia vera; em um último caso se associava à periarterite nodosa. A afecção é nitidamente predominante no sexo masculino (14:17 na série presente) e a carótida esquerda costuma ser mais afetada que a direita (12:17 na mesma casuística).

Diferentes terapêuticas têm sido preconizadas. Em 6 casos, os autores removeram um segmento do vaso trombosado, sem resultados aparentes. Em um caso, foi usado o Dicumarol ao qual se seguiram repetidas infiltrações do gânglio estrelado, também sem nítidos benefícios. Em outro caso foram notadas evidentes melhoras durante o tratamento pelo Dicumarol. A reeducação muscular é sempre indicada. Em geral, o prognóstico é favorável.

R. Melaragno Filho

Circulação colateral pela artéria oftálmica na oclusão trombótica da artéria carótida (Collateral ophtalmic artery circulation in thrombotic carotid occlusion). K. Vaernet. Neurology, 4:605-611 (agosto) 1954.

Normalmente, após a ligadura ou trombose de uma das artérias carótidas internas, a manutenção da irrigação do hemisfério cerebral homolateral é garantida pelas artérias comunicantes anterior e posterior. Entretanto, pelo menos em alguns casos, a artéria oftálmica pode desempenhar esse papel, como se depreende das imagens arteriográficas que mostram o sifão carotídeo e vasos do grupo silviano do lado trombosado repletos de contraste veiculado através da artéria oftálmica. Em um dos casos registrados na literatura, a arteriografia demonstrou a anastomose da artéria oftálmica com a artéria meníngea média.

Vaernet relata 4 casos de trombose da artéria carótida interna no pescoço, nos quais as arteriografias demonstraram repleção do sifão carotídeo e de vasos intracranianos, através dos ramos terminais da artéria oftálmica com o sistema da carótida externa. Os sintomas dependiam da eficiência, em tempo e em volume, da circulação colateral; esta, por sua vez, é função do estado geral anatômico dos vasos.

R. Melaragno Filho

Comparação da resposta hemodinâmica cerebral à Aramina e à noradrenalina em indivíduos normotensos e hipotensos (A comparison of the cerebral hemodynamic response to aramine and norephedrine in the normotensive and the hypotensive subject). J. H. Moyer, G. Morris e H. B. Snyder. Circulation, 10:265-270 (agosto) 1954.

Investigações prévias, realizadas com o método do oxido nitroso, demonstraram que o fluxo sangüíneo cerebral não se modifica pelo emprego da diidroergocornina, apesar das discretas quedas tensionais provocadas pela droga. Entretanto, se a tensão arterial fôr pronunciadamente abaixada por meio da infusão de substâncias ganglioplégicas, registra-se uma queda quantitativa do fluxo sangüíneo cerebral. Por outro lado, foi também verificado que a injeção venosa de noradrenalina provoca, igualmente, uma redução do fluxo sangüíneo cerebral, a despeito da elevação da tensão arterial. Esta redução quantitativa da circulação cerebral parece depender de enérgica vasoconstrição encefálica; assim, o tratamento da hipotensão arterial pela noradrenalina poderia induzir a efeitos cerebrais nocivos.

Moyer e col. investigam, agora, os efeitos de uma amina vasopressora sintética (Aramina) sobre a circulação cerebral de indivíduos normotensos, comparando-os com os resultados proporcionados pela noradrenalina. Em uma segunda parte, estudam as respostas obtidas em pacientes normotensos, nos quais a tensão arterial foi artificialmente elevada por um agente vasopressor, comparando-as com as observadas nos indivíduos em que a tensão arterial, previamente reduzida por ganglioplégicos, era reconduzida ao normal pela noradrenalina. Assim, Moyer e col. estudaram a hemodinâmica cerebral em dois grupos de pacientes: no primeiro, composto de 11 indivíduos normotensos, registraram as medidas da circulação cerebral antes e depois da injeção de Aramina (7 casos) e da noradrenalina (4 casos), verificando que, concomitantemente com a ascensão da tensão arterial determinada pela Aramina ou pela noradrenalina, o fluxo sangüíneo cerebral decrescia. No segundo grupo de pacientes, também composto de 11 indivíduos, idênticas investigações foram realizadas antes e depois do abaixamento da pressão arterial por agentes ganglioplégicos; após a recondução da tensão arterial aos níveis prévios, pela Aramina ou pela noradrenalina, novas determinações da circulação cerebral mostraram que, quando a tensão arterial era diminuída pelos ganglioplégicos, o fluxo sangüíneo cerebral também decrescia. Entretanto, a despeito de queda do fluxo cerebral, o consumo de oxigênio era parcialmente mantido por maior saturação de oxigênio do sangue oferecido ao tecido nervoso. Essa compensação, porém, nem sempre era suficiente e, por vezes, manifestavam-se sinais de anóxia cerebral. Quando injeções de Aramina ou noradrenalina reconduziam a tensão arterial a seus níveis normais, o fluxo sangüíneo cerebral realmente aumentava, ao contrário dos casos em que estes agentes eram usados em indivíduos com sua tensão arterial normal.

Tais resultados parecem indicar que o emprego da Aramina ou da noradrenalina no tratamento de estados hipotensivos arteriais deve acompanhar-se de melhora na irrigação e nas funções cerebrais.

R. Melaragno Filho

Efeito do hexametônio sobre o fluxo sangüíneo e o metabolismo cerebral em pacientes com hipertensão pré-maligna e maligna (The effect of hexamethonium upon cerebral blood flow and metabolism with premalignant and malignant hypertension. C. W. Crumpton, G. C. Rowe, R. C. Capps, J. J. Whitnore e Q. R. Murphy. Circulation, 11:106-109 (fevereiro) 1955.

Crumpton e col. investigaram, pelo método do oxido nitroso, a hemodinâmica e o metabolismo cerebral de 13 pacientes gravemente hipertensos, com retinopatia de grau III ou IV, antes e depois da injeção intramuscular de hexametônio (dose média de 1 mg/kg), verificando que, uma hora após a injeção da droga, a pressão arterial média caiu de 39%, a resistência cerebrovascular diminuiu de 29% e o fluxo sangüíneo cerebral se reduziu de 16%; todavia, o consumo cerebral de oxigênio era mantido à custa de uma redução de saturação venosa cerebral do oxigênio. Assim, comprova-se que a queda da resistência cerebrovascular determinada pelo hexametônio, embora significante, não é suficiente - em casos muito graves de hipertensão - para compensar a redução brusca de tensão arterial.

Os autores, estudando os possíveis mecanismos de ação do hexametônio sobre o leito vascular cerebral, são levados a crer que a droga é provida de ação direta sobre os músculos lisos dos vasos cerebrais. Comparando estes resultados com os de Dewar, verifica-se que este último autor, investigando pacientes com hipertensão mais moderada, não registrou queda do fluxo sangüíneo cerebral após o emprego do hexametônio. Quer nos casos de Crumpton e col., quer nos de Dewar, a redução da resistência cerebrovascular foi aproximadamente da mesma ordem (30%). Parece, pois, que o máximo de capacidade da queda da resistência cerebrovascular proporcionado pelo hexametônio é de cerca de 30%; essa queda é suficiente para garantir a normalidade do fluxo sangüíneo cerebral em casos de hipertensão moderada, mas insuficiente quando a hipertensão é grave, eventualidade em que a redução tensional induzida é percentualmente maior.

R. Melaragno Filho

Resposta hemodinâmica cerebral ao composto de xantina, Parefilina (dietilaminoetilteofilina) (The cerebral hemodynamic response to the xanthine compound, Parephyllin). J. H. Moyer e H. B. Snyder. Am. Heart J., 47:912-918 (junho) 1954.

Estudos prévios mediante o método do oxido nitroso haviam demonstrado diminuição do fluxo sangüíneo cerebral em indivíduos normais normotensos, em pacientes com insuficiência cardíaca e em hipertensos sofrendo de graves cefaléias. No presente trabalho, Moyer e Snyder estudaram os efeitos, sobre a circulação encefálica, de um novo composto xantínico, o cloridrato de dietilaminoetilteofilina (Parefilina ou Solufilina ou R-3588); este composto produz menor irritação gástrica que a aminofilina e, portanto, pode ser empregado por via oral em doses mais elevadas; além disto, é desprovido de efeitos irritativos quando usado por via intramuscular.

Moyer e Snyder estudaram, mediante o método do oxido nitroso, a ação desse medicamento em um indivíduo normotenso e 6 pacientes hipertensos, três dos quais com insuficiência cardíaca, injetando, por via venosa, 0,5 g da droga diluída em 100 ml de soluto fisiológico, durante um período de 20 minutos. Verificaram que, diferentemente da aminofilina, o R-3588 não exerce qualquer efeito significativo sobre o fluxo sangüíneo arterial. A despeito da ausência de modificações da hemo-dinâmica cerebral, sensações de tontura e de ansiedade eram comumente observadas. Havia, também, tendência para o aumento do consumo de oxigênio, sugerindo um efeito da droga no sentido de aumentar o metabolismo cerebral. Como o composto em estudo, da mesma forma que a aminofilina, reduz o ritmo de Cheyne-Stokes, os autores sugerem que o modo de ação de ambas as drogas se processe por seu efeito estimulante direto sobre o centro respiratório.

R. Melaragno Filho

Estudos sobre a doença cerebrovascular: o emprego de drogas anticoagulantes no tratamento da insuficiência ou trombose no território do sistema arterial basilar (Studies in cerebrovascular disease: the use of anticoagulant drugs in the treatment of insufficiency or thrombosis within the basilar arterial system). C. H. Millikan, R. G. Siekert e R. M. Shick. Proc. Staff Meet. Mayo Clinic, 30:61 (março, 23) 1955.

Tendo estudado detalhadamente, sob o ponto de vista clínico e anátomo-patológico, numerosos casos de trombose da artéria basilar e tendo verificado que o coágulo obstrutivo, com grande freqüência, é laminado, sugerindo que suas várias porções se tenham formado em épocas diferentes - o que concorda com a observação clínica que mostra a ocorrência de vários episódios premonitórios antes da instalação definitiva da afecção - os autores julgaram ter encontrado, neste conjunto de circunstâncias, a base potencialmente ideal para a administração de anticoagulantes para corrigir ou, melhor ainda, para freiar a evolução do processo obstrutivo.

Atendendo ao fato de que, à medida que aumentam nossos conhecimentos sobre os enfartes encefálicos, se torna patente que lesões em variadas partes do encéfalo podem ter diferente patogenia, assim como podem ser diferentes os aspectos clínicos e anátomo-patológicos, e que disso devem resultar diferenças na escolha da terapêutica, os autores tiveram particular cuidado na seleção dos casos para este estudo. Foram observados 26 pacientes, 5 dos quais apresentavam o sindromo de insuficiência intermitente do sistema arterial basilar; os 21 restantes apresentavam sintomatologia indicadora de trombose definitiva da artéria basilar. A heparina foi empregada apenas quando era desejada uma ação anticoagulante rápida inicialmente; algumas vezes foi usado, também inicialmente, outro preparado (Tromexan); o dicumarol foi o anticoagulante empregado como medicamento a longo prazo, sendo a dose controlada diariamente mediante dosagens de protrombina; a dose de anticoagulantes foi ajustada de maneira a manter o tempo de protrombina entre 30 a 40 segundos (normal de 18 a 20 segundos). A medicação anticoagulante não foi empregada em casos de acidentes vasculares cerebrais de tipo agudo, casos em que a congestão vascular perifocal constitui excelente terreno para hemorragias. Nos 5 casos rotulados como sindromo de insuficiência intermitente da artéria basilar, os episódios cessaram completamente após a administração de coagulantes. Dos 21 pacientes com trombose da artéria basilar, 3 faleceram (14%); nos restantes a sintomatologia, após alguma regressão, permaneceu estacionaria. Para comparação dos resultados obtidos neste último grupo, os autores utilizaram as observações de 23 outros pacientes, todos com trombose da artéria basilar, nos quais não foi empregada a terapêutica pelos anticoagulantes, verificando que 10 faleceram (43%).

Os autores, apresentando seus resultados, sugerem que outros experimentem a terapêutica anticoagulante em casos de episódios de insuficiência intermitente ou de trombose do sistema da artéria basilar. Em sua opinião, seus achados anátomo-patológicos e seus resultados terapêuticos depõem contra a teoria do angioespasmo para explicar os acidentes que ocorrem neste território vascular.

O. Lange

Estudos sobre a doença cerebrovascular: alguns aspectos clínicos da trombose da artéria basilar (Studies in cerebrovascular disease: some clinical aspects of thrombosis of the basilar artery). R. C. Siekert e C. H. Millikan. Proc. Staff Meet. Mayo Clinic, 30:93 (março, 9) 1955.

Os autores estudam os aspectos clínicos da trombose da artéria basilar, baseados em 28 observações, todas com confirmação necroscópica. Em todos os casos os pacientes eram idosos (entre 46 a 84 anos de idade), tendo o exame anátomo-patológico mostrado, em 26 deles, lesões arterioscleróticas; em 2 casos havia arterite luética. Na maioria dos casos (19) havia hipertensão arterial, além de causas outras que podiam influir no estabelecimento do processo trombótico (enfartes do miocárdio, miocardose, fibrilação auricular) por distúrbio na dinâmica hemocirculatória.

A maioria dos pacientes apresentou, antes da instalação da sintomatologia mortal definitiva e precedendo-a de 6 a 12 meses, pródromos constituídos por episódios transitórios de paralisias ou paresias, deficits sensitivos e visuais, distúrbios na articulação da palavra e na deglutição; tais episódios duravam poucos minutos e terminavam com a completa restituição funcional. Nenhum desses sintomas poderia ser considerado como característico ou específico, não fornecendo elementos para o diagnóstico topográfico, o qual só era possível depois de várias repetições, especialmente nos casos em que a sintomatologia não era estereotipada, sugerindo que os ramos de um grande território vascular estavam sendo progressivamente comprometidos.

A sintomatologia definitiva se instala como um dos episódios intermitentes anteriores, diferenciando-se pelo fato de não regredir. Pelo contrário, há rápida agravação dos sintomas, em geral progressivamente crescentes até o óbito. Em todos os casos, o quadro clínico da trombose definitiva se iniciou com enfraquecimento dos quatro membros, acompanhados de distúrbios na motricidade ocular (25), de paresia facial (18), de disartria (18), de disfagia (18). O coma se estabeleceu, na maioria dos pacientes, ao fim de 12 horas. Em 7 pacientes foi observada flutuação entre inconsciência e estado torporoso durante os primeiros dias. Em 23 pacientes foi observada hipertermia, aumentando a temperatura progressivamente até o êxito letal.

O. Lange

Estudos sobre a doença cerebrovascular: o síndromo da insuficiência intermitente do sistema arterial basilar (Studies in cerebrovascular disease: the syndrome of intermittent insufficiency of the basilar arterial system). C. H. Millikan e R. G. Siekert. Proc. Staff Meet. Mayo Clinic, 30:61 (fevereiro, 23) 1955.

Raros são os trabalhos dedicados aos síndromos determinados por alterações no débito sangüíneo através da artéria basilar e, assim mesmo, nos poucos casos relatados o diagnóstico de trombose foi feito após o exame necroscópico. Millikan e Siekert procuram mostrar que os distúrbios impedientes da circulação através da artéria basilar são relativamente freqüentes e que comumente se manifestam, em sua fase inicial, por um síndromo intermitente, indicador do comprometimento gradualmente progressivo do tronco basilar. O diagnóstico clínico na fase premonitória - síndromo de insuficiência intermitente do sistema arterial basilar - tem particular importância, pois os sintomas parecem se atenuar pelo emprego de drogas anticoagulantes.

O trabalho é documentado com 10 observações, todas relativas a pacientes idosos (entre 50 e 70 anos de idade), sendo 3 de caráter anátomo-clínico e 7 exclusivamente clínico. Em todos os casos ocorreram episódios bruscos e intermitentes indicadores da supressão da circulação sangüínea em determinado setor do tronco do encéfalo (hemiparesias ou monoparesias motoras ou sensitivas, disartria, disfagia, vertigens, distúrbios na motricidade ocular) e, eventualmente, nos lobos occipitals (distúrbios visuais). A ocorrência, em alguns episódios, de sintomas em ambos os lados do corpo (isto é, hemiparesia no hemicorpo esquerdo e às vezes no direito), sugere o diagnóstico de comprometimento da artéria basilar. Tais episódios, inicialmente curtos e alongando-se à medida que se repetem, geralmente deixam reliquats, normalizando-se integralmente a função alterada em prazo relativamente curto. Em geral, somente depois da ocorrência de vários episódios intermitentes, nos quais a sintomatologia varia topogràficamente indicando pequenas variações no território vascular comprometido, é que ocorrem sintomas permanentes caracterizando a insuficiência vascular total e definitiva determinada por oclusão completa. Nos três casos em que ocorreu o óbito, o exame necroscópico confirmou o diagnóstico clínico de oclusão total da artéria basilar.

Os episódios intermitentes apresentados pelos primeiros pacientes observados não foram influenciados pela medicação vasodilatadora (inalações de dióxido de carbono), o que levou os autores ã conclusão de que não se tratava de espasmos vasculares. Pelo contrário, a medicação anticoagulante (Dicumarol), controlada pela verificação diária do tempo de protrombina (normal 18 seg) e administrada até que este tempo atingisse 30 a 40 seg, pareceu dar excelentes resultados quanto à regressão dos sintomas intermitentes, sugerindo tratar-se de oclusões arteriais temporárias. A medicação anticoagulante se mostrou pouco eficiente quando a sintomatologia indicava o estabelecimento de lesão definitivamente oclusiva.

Poder-se-á discutir a opinião dos autores quanto à patogenia e especialmente quanto à ação terapêutica dos anticoagulantes, argüindo que nos casos que esta medicação aparentemente foi favorável tratar-se-ia, na realidade, de espasmos vasculares com sintomatologia reversível, ocorridos em vasos com paredes alteradas seja pela arterioselerose seja por hialinose. Entretanto, é mister salientar a importância dos fatos clínicos assinalados, permitindo o diagnóstico precoce de uma afecção geralmente grave pela própria localização das lesões.

O. Lange

Hemorragias subaracnòideas conseqüentes a tumores intracranianos (Subarachnoid hemorrhage consequent to intracranial tumors). B. Glass e K. H. Abbott. Arch. Neurol, a. Psychiat., 73:369-379 (abril) 1955.

A hemorragia subaracnóidea não traumática é ocasionada, na maior parte das vezes, por rotura ou drenagem de aneurismas intracranianos; a eventualidade desse sangramento ser a manifestação inicial de um tumor intracraniano tem sido pouco considerada. Todavia, Glass e Abbott, em 162 casos pessoais de tumores intracranianos, encontraram 8 casos em que a sintomatologia inicial foi dada por hemorragia subaracnóidea. Esta alta percentagem contrasta com as verificações anátomo-patológicas de Courville, nas quais a hemorragia surgiu em apenas dois casos (ambos de glioblastomas), em uma série de 50.000 necrópsias. Oldberg reviu os 832 gliomas de Cushing, encontrando 52 casos de hemorragias e, destes, ao que parece, apenas 7 (0,84%) teriam se iniciado com hemorragia subaracnóidea. Glass e Abbott recolheram na literatura 33 casos dessa natureza, aos quais acrescentaram suas 8 observações pessoais, baseando-se nessa casuística para o presente estudo.

No conjunto dos casos registrados, o liquor variava entre levemente xantocrômico e francamente sangüinolento. Por vezes, a hemorragia intratumoral determinou sintomatologia relativamente benigna, enquanto que, em outras, era mortal. Sangramento mínimo ocorreu em 6 casos; moderado em 11 casos. Sangramento fatal no surto inicial foi verificado em 3 pacientes, enquanto que hemorragias múltiplas com evolução para a morte foram observadas na maioria dos casos. Dos 41 casos analisados, 20 (48,7%) correspondiam a gliomas primários do cérebro; a seguir, e surpreendentemente, catalogavam-se os adenomas pituitários (11 casos); sucediam-se 6 casos de tumores vasculares, benignos ou malignos e um tumor do ângulo ponto-cerebelar não esclarecido sob o ponto de vista histopatológico. Na maioria dos casos (34) a sede do tumor era supratentorial; dos restantes (fossa posterior), um situava-se no ângulo pontocerebelar, 2 no 4º ventrículo e 5 nos hemisférios cerebelares. A idade dos pacientes - nos casos em que havia menção desse dado - variou entre 10 dias e 70 anos; 24 casos correspondiam ao sexo masculino, 12 ao feminino; em 3 não havia referência ao sexo.

A seguir, os autores resumem as observações de seus 8 casos, incluindo um paciente de 7 meses, no qual o exame anátomo-patológico revelou tratar-se de astrocitoma (grau IV). O mecanismo das hemorragias parece ser idêntico na maioria dos gliomas malignos: proliferação vascular endotelial com obliteração subseqüente da luz vascular, causando necrose seguida de hemorragia intratumoral; por outro lado, as paredes delgadas dos vasos neoformados podem ser torcidas com o crescimento do neoplasma, o que facilita sua rotura; a necrose com a conseqüente perda da suporte mecânico dos vasos ou a erosão tumoral dos vasos podem ser outras eventualidades que explicam sangramentos intraparenquimatosos na vigência de tumores cerebrais. O prognóstico é habitualmente mau: ao lado da hemorragia em si, deve ser considerado o caráter altamente maligno das neoplasias que determinam tais sangramentos; entretanto, é preciso ter presente a possibilidade de se tratar de um adenoma pituitário associado a lesões vasculares circunscritas, de prognóstico mais favorável.

R. Melaragno Filho

Epilepsia temporal (Temporal lobe epilepsy). O. Magnus, L. Ponsen e A. J. van Rijn. Folia Psychiat., Neurol, et Neurochir. Neerlandica, 57:264-297, 1954.

A epilepsia temporal, pelo caráter heterogêneo de suas crises, pelo diagnóstico diferencial muitas vezes difícil que impõe, pela extrema freqüência e pela resistência aos tratamentos habituais, chama particular atenção dos estudiosos do assunto. Este trabalho, calcado em 50 casos pessoais e em revisão extensa da literatura, constitui uma apreciação crítica do assunto. Depois de conceituar a epilepsia temporal, os autores discorrem sobre a sintomatologia clínica das crises, assinalando três ordens de manifestações: a) psíquicas, caracterizadas por distúrbios da consciência, mais ou menos completos e mais ou menos duradouros, permitindo que o paciente atenda a certas ordens elementares ou que esteja inteiramente inconsciente, com amnésia lacunar completa; além disso, perturbações da percepção (macropsia, ilusão do "déjà vu", ilusão de irrealidade das coisas ou de mudança erri «eu próprio eu - despersonalização - ou sensação de que os acontecimentos se passam muito mais depressa do que no real), perturbações do pensamento (até estado confusional) e da memória; b) fenômenos motores elementares (torção tônica de cabeça e olhos e mesmo elevação do membro superior contralateral) ou complexos (automatismos de mastigação, deglutição ou de manuseio de objetos, geralmente correlacionados à profissão do paciente, ou gestos da vida de todo o dia), até automatismos mais complexos e duradouros; c) manifestações vegetativas (gástricas, intestinais, vesicals, sintomatologia vasomotora, sudorese e mesmo parada respiratória); d) fenômenos sensorials. O fato é que, dentro desta sintomatologia aparentemente heterogênea, a crise temporal guarda um todo uniforme, uma seqüência tal que todo aquele que já a apreciou a reconhecerá com facilidade.

Analisando a sintomatologia entre as crises, os autores mostram serem os distúrbios do humor, da conduta e da afetividade bastante freqüentes, apresentando-se mesmo acessos de grande agressividade ou surtos de impulsividade difíceis de serem separados dos de natureza compulsiva, neurótica. Analisando os elementos eletrencefalográficos, os autores assinalam a topografia temporal de projeção do foco, que se apresenta como espícula isolada, espícula e onda lenta ou ondas sharp ritmadas. Quanto à hereditariedade, assinalam que, em seu material, havia 4 pacientes com parentes epilépticos. A respeito da etiologia, apresentam interessante quadro comparando seus 50 casos com os 55 de Penfield e col. e os 100 de Gastaut e col.; em seu material, 2 casos tinham etiologia desconhecida, 18 foram devidos a traumas (trauma do parto 4, trauma fechado do crânio 12 e trauma aberto 2), 26 tiveram como etiologia processos inflamatórios pregressos e, em 4, a etiologia era variada.

Quanto ao tratamento, os autores revêem as drogas mais modernamente usadas, citando o Dilantin e a Mesantoína como boas, sendo a Tridione sem ação; a Fenurona é a que melhores resultados dá, sendo de recear, entretanto, seus efeitos tóxicos. Se as crises são resistentes ao tratamento medicamentoso, se o ECG mostrar alteração focai constante e com focalização correspondente ao tipo clínico da crise, e se o paciente está seriamente prejudicado por essas crises, então deve ser considerada a terapêutica cirúrgica, para remoção do foco. Os autores analisam, a este respeito, os resultados de Penfield e col., de Bailey e Gibbs e de Green, para citar seus 18 casos operados até então. Destes últimos, fazem análise detalhada, concluindo - entre os que já tinham mais de ano de seguimento - que 50% dos casos são totalmente curados ou muito beneficiados pela cirurgia; a análise crítica da cirurgia e suas indicações, assim como o problema dos focos primários e dos focos secundários, são expostos com grande critério.

Por fim, em extensa discussão, os autores analisam o ponto de vista dos que mais estudaram o problema, terminando por comparar a epilepsia do lobo temporal com as demais lesões focais do encéfalo, mostrando que sua sintomatologia, aparentemente complexa, se deve às conexões íntimas do lobo temporal com as estruturas rinencefálicas e daí com as diencefálicas e mesencefálicas, decorrendo disso a grande tendência que têm as crises aí nascidas a apresentarem sintomas de superior integração, assinalando-se sindromes de automatismo complexo que envolvem o cérebro como um todo.

P. Pinto Pupo

Localização da descarga nos casos de automatismo por lesão temporal (Localization of discharge in temporal lobe automatism). W. Feindel e W. Penfield. Arch. Neurol, a. Psychiat., 72:605, 1954.

O propósito deste trabalho é o estudo, com finalidade localizatória, da zona de origem das descargas que produzem o automatismo, em pacientes de epilepsia temporal que foram levados à mesa operatória. O automatismo havia sido descrito com precisão por H. Jackson (1888), no quadro dos "uncinate fits"; o que mais chamou a atenção do genial neurologista foram os "dreamy states", se bem que a eles se associassem freqüentemente manifestações mastigatórias, olfativas, gustativas ou vegetativas. Entretanto, fundamentais no quadro clínico eram o estado confusional e o automatismo. Em 1898 Jackson apresentou o caso ímpar de um médico observado durante 23 anos, com anotações detalhadas de crises de automatismo e dos fenômenos de memória que as precediam, cujo cérebro mostrou somente um foco de amolecimento na zona do uncus; assim, Jackson pôde assinalar "que as descargas responsáveis por este tipo particular de epilepsia tinham origem nas células do uncus e das regiões adjacentes". Ulteriormente foi demonstrado que as descargas eletrográficas nestes casos têm como ponto de partida áreas do lobo temporal; Penfield e Jasper mostraram que essas descargas partiam não só da região do uncus, mas também das áreas corticais adjacentes da face superior e lateral do lobo temporal. Penfield e Kristiansen (1951), em 26 casos operados, todos com nítido automatismo, encontraram o foco em áreas temporais em 23, frontais em 2 e têmporo-parietal em um. Penfiel (1952) assinalou que as descargas originadas em outras áreas do córtex que não as temporais, se propagam logo aos sistemas subcorticais, determinando crises generalizadas e nunca automatismo. Por outro lado, quando o automatismo aparece como resultado de foco cortical, a descarga começa sempre na região frontal anterior ou na temporal. Ambos os tipos de descargas - frontais e temporais - se propagam imediatamente às formações centrencefálicas, resultando daí perturbação de consciência e automatismo, sem que sobrevenham obrigatoriamente convulsões. O automatismo frontal, seguido de descargas eletrográficas 3 c/s com ondas e espículas, se assemelha ao automatismo do Pm, enquanto que o automatismo temporal se acompanha de descargas eletrográficas do tipo descrito como Pm, as quais têm características clinicas bem diferentes.

No presente estudo os autores se basearam em 155 casos operados para tratamento de epilepsia temporal, sob anestesia local; 121 pacientes (78%) apresentavam automatismo psicomotor. Para esta análise foram escolhidos 50 casos com traçados eletrográficos bem demonstrativos e documentados e com crises de automatismo provocadas pela excitação de áreas temporais durante o ato cirúrgico. Os autores estudaram documentadamente 12 observações, analisando as manifestações clínicas que precedem ou coexistem com o automatismo e correlacionando-as com áreas anatômicas cuja excitação determina seu aparecimento. Dessas pesquisas clínicas e experimentais chegam a várias conclusões, entre as quais se destacam: a) o automatismo pode não ser precedido por aura alguma ou podem ocorrer manifestações de "sensação abdominal", "confusão consciente", "manifestações motoras tônicas e adversivas", "sensação somática", "sensações cefálicas" ou "sensação de irrealidade", entre as mais comuns; b) a estimulação elétrica do lobo temporal em paciente consciente pode levar a automatismo e amnésia, com supressão extensa da atividade elétrica no córtex; c) as áreas responsáveis pelo início do "comportamento automático" são as da região pariamigdalóide (incluindo uncus, núcleo amigdalóide ventral, claustrum) e córtex têmporo-insular. Revendo a anatomia e a fisiopatologia desta complicada região e analisando os fatos que observaram, os autores tecem considerações sobre o papel desempenhado por estes sistemas (incluindo sua projeção difusa aos sistemas do tálamo e do tronco cerebral) nos processos da memória e na manutenção do estado normal de consciência e de atividade consciente do indivíduo.

P. Pinto Pupo

Esclerose provocada pela incisura do tentório e crises de tipo temporal produzidas pela hérnia do hipocampo durante o parto (Incisural sclerosis and temporal lobe seizures produced by hipocampal herniation at birth). K. M. Earle, M. Baldwin e W. Penfield. Arch. Neurol, a. Psychiat., 69:27, 1953.

Nestes últimos anos se tornou patente que os pacientes portadores de epilepsia temporal constituem o maior grupo entre os convulsivos. As crises temporais podem iniciar-se em tenra idade, continuando até a idade adulta, ou só se iniciar depois da idade adulta; na maioria das vezes, a causa vai ser encontrada em lesão do lobo temporal adquirida por trauma de nascimento. A esse respeito, revendo material do Neurological Montreal Institute, os autores estudaram 157 casos de epilepsia temporal que foram levados à intervenção cirúrgica. Todos eles foram operados depois que clínica e eletrencefalogràficamente havia certeza de que a epilepsia era temporal, sendo o foco unilateral. Em grande número desses casos, o craniograma, mostrando menor desenvolvimento da fossa temporal, ou o pneumencefalograma, mostrando atrofia do lobo temporal, depunham a favor de lesão adquirida nos primeiros dois anos de vida do paciente.

As lesões encontradas em 100 (63%) desses pacientes sugerem a compressão ou anóxia durante o nascimento ou na infância; somente em 57 havia lesões de outra natureza (traumatismo pós-natal, processo infeccioso ou neoplasma). As anormalidades congênitas do lobo temporal foram completamente afastadas. A esse respeito é de interesse assinalar que, nesse material, havia 5 pares de gêmeos, dos quais, em 4, o irmão era sadio e, em um, o irmão falecera no nascimento. As lesões sediavam-se na parte inferior do lobo temporal (uncus, região do hipocampo e primeira circunvolução temporal), sendo verificada desde a atrofia isolada de um girus até a atrofia de todo o lobo temporal. Essa atrofia era de tipo esclerose, com ausência lacunar de neurônios e fibras nervosas, proliferação da glia astrocitária, espessamento da íntima e da adventícia dos pequenos vasos e fibrose acentuada da pia-mater. Tais alterações, pelo seu tipo e topografia e, principalmente, pelo seu aparecimento tão freqüente e sempre com as mesmas características, podem ser agrupadas como entidade - esclerose da incisura - produzida pela hérnia do lobo temporal através do tentório durante o mecanismo de parto. As lesões encontradas são de tipo vascular e causadas por anóxia aguda.

Para provar essa asserção, os autores revêem dados da embriologia, da circulação cerebral e dos possíveis mecanismos pelos quais durante o parto haveria a herniação do lobo temporal, através do tentório. Embriològicamente, é sabido que o lobo temporal é ainda pouco desenvolvido no momento do nascimento, sendo, portanto, mais suscetível à lesão pela anóxia. As artérias corióidea anterior, cerebral média e cerebral posterior, pela sua situação na base do crânio, são suscetíveis a compressão por uma hérnia temporal; particularmente a artéria corióidea anterior que, na época do parto, tem calibre tão grande ou maior que as duas outras, é a mais vulnerável (ela irriga a região do uncus e parte do hipocampo). Também há a possibilidade de compressão venosa, ou mesmo de laceração venosa, com a hérnia temporal, comprometendo em particular a região do uncus, do hipocampo e do corno de Ammon, cuja drenagem venosa se faz pelas veias cerebrais internas. Quanto à mecânica da hérnia temporal durante o parto, os autores fizeram interessante experimentação com natimortos. Em alguns deles estabeleceram pressão igual sobre toda a abóbada craniana, envolvendo-a com borracha; depois de congelar o todo, serraram, obtendo cortes seriados em que encontraram sempre o uncus e a parte mediai do hipocampo herniada sob o tentório. Em outros casos fizeram a mesma compressão e, retirando-a antes de congelamento, não encontraram a hérnia temporal; provavelmente esta não permanece depois de cessada a compressão; por esse motivo, geralmente não é encontrada nas autópsias, se bem que possa ocorrer freqüentemente durante o parto e causar compressão e mesmo lesão dos vasos que irrigam as faces inferior e medial do lobo temporal. Em outros casos, cuja abertura craniana foi feita pela fossa posterior, com a retirada do cerebelo e do tronco cerebral, os autores puderam documentar perfeitamente a hérnia temporal. Com esses argumentos puderam os autores concluir que a esclerose das porções medial e inferior do lobo temporal, achado anátomo-patológico tão freqüente na epilepsia temporal, é causada pela hérnia temporária desse lobo, através da incisura do tentório, durante o parto.

P. Pinto Pupo

Tratamento da epilepsia temporal pela lobectomia (Treatment of temporal-lobe epilepsy by temporal lobectomy). M. A. Falcone, D. Hill, A. Meyer, W. Mitchell e D. Pond. Lancet, 248:827-835 (abril, 23) 1955.

A epilepsia temporal é muito comum e rebelde à terapêutica. Algumas vezes pode ser causada por um tumor, mas, na maioria dos casos, é devida a lesões microscópicas não evidenciáveis pelo exame clínico-radiológico ou mesmo quando o cérebro é exposto durante a operação. Contudo seus quadros clínicos e eletrencefalográficos são bastante característicos. Os autores trataram 31 pacientes com epilepsia desse tipo e obtiveram resultados muito satisfatórios em 26, quer em relação às crises, quer em relação aos distúrbios mentais, motivo pelo qual são de opinião que o método cirúrgico merece estudo cuidadoso e observação em mais larga escala. O presente estudo é baseado em 30 casos seguidos de 1 a 4 anos, sendo que um faleceu logo após operação. São pacientes provenientes de um hospital geral (7) e de um hospital psiquiátrico (23). Quanto à idade: um na primeira década da vida, 5 na segunda, 9 na terceira, 4 na quarta, 9 na quinta e 2 na sexta. Todos apresentavam crises clínicas de tipo temporal, perturbações mentais com comportamento agressivo e labilidade de humor (10), manifestações paranoides (9), ansiedade e estados depressivos (7), comportamento psicopático necessitando internação (7). Em sua maioria estes pacientes estiveram sob intenso tratamento com vários medicamentos, sob controle médico por vários anos, e seus distúrbios persistiam. O exame neurológico foi normal, exceto em 3 (um com hemiplegia infantil e dois com paralisias de nervos cranianos conseqüência de traumatismo grave). O liqüido céfalo-raquidiano resultou normal em todos. O EEG foi repetidamente feito, em particular com eletrodos especiais (faríngeos) e com estudo durante o sono; em 19 casos havia foco ativo restrito a um lobo temporal e em 9 havia sinais em ambos os lobos temporais; dos dois pacientes restantes, em um a alteração do EEG se traduzia por disritmias 5 a 6 c/s, localizadas e, em outro, não havia distúrbio eletrencefalográfico; como, porém, o pneumencefalograma mostrasse, neste último caso, ligeira distorção do polo temporal do ventrículo lateral e a craniotomia permitisse ver aspecto ligeiramente róseo-amarelado do tecido nervoso, o polo temporal foi extirpado com bom resultado (o exame histopatológico mostrou pequeno enfarte antigo).

O exame radiológico mostrou ser a hemifossa média ligeiramente menor do lado do foco (processo atrófico) em um quarto dos casos; em 2 havia formação calcificada nessa fossa. A arteriografia feita em alguns pacientes foi negativa, mesmo em dois casos com angiomas. A pneumencefalografia foi feita em todos os pacientes, com o cuidado de obter perfeito enchimento dos cornos temporais dos ventriculos; em geral foi assinalada assimetria de imagens com aspecto atrófico do hemisfério cerebral e dilatação do corno temporal, em concordância com os dados fornecidos pelo EEG; entretanto, em 4 casos houve discordância e a operação foi feita do lado indicado pelo EEG. Tal proceder se mostrou acertado, sendo encontrados dois casos com oligodendroglioma, um com hemangioma e um com cicatriz cortical. A pneumencefalografia deve, pois, ser interpretada de acordo com o EEG, pois a existência de um ventrículo menor no lado patológico (alterações do EEG) pode indicar existência de um tumor.

Em relação ao procedimento cirúrgico, os autores descrevem os pontos de reparo e a técnica de retirada de todo segmento anterior do lobo temporal, incluindo o hipocampo e o núcleo amigdaliano, tanto quanto possível em um só bloco, preservando assim a peça para estudo histológico. Analisam os cuidados necessários com as formações anatômicas da vizinhança. Como efeitos pós-cirúrgicos imediatos assinalam um caso de morte, raras crises convulsivas nos primeiros dias (as quais não dão importância prognostica, admitindo serem devidas a edema pós-cirúrgico), assim como diplopia e afasia transitórias. Como seqüelas neurológicas permanentes assinalam hemianopsia em quadrante ou mesmo completa; isso aconteceu independentemente do limite pouco ou muito avançado da intervenção sobre o lobo temporal. Distúrbios da fala ocorreram em um terço dos pacientes que sofreram intervenção no hemisfério dominante (afasia nominal). Em caso algum houve distúrbio de memória de modo permanente.

Os resultados cirúrgicos são analisados em quadros muito objetivos. Em relação aos ataques, dos 30 pacientes 26 tiveram melhora acentuada (12 ficaram livres de crises e em 14 permaneceram crises raras e frustras); dois casos tiveram melhora parcial (continuaram a ter crises, com menor freqüência). Em relação aos distúrbios de personalidade, de 29 pacientes 20 tiveram melhora acentuada. Correlacionando os resultados com os dados clínico-eletrencefalográficos pré-operatórios puderam os autores afirmar que os casos em que havia concomitantemente crises tipo GM assim como aqueles em que o foco eletrencefalográfico não era limitado a um lobo temporal apresentaram os piores resultados.

Quanto ao exame anátomo-patológico, em 9 casos havia lesões macroscópicas (3 tumores, 2 hemangiomas calcifiçados, 2 angiomas, um enfarte e uma cicatriz). Nos 21 casos restantes as lesões eram microscópicas e menos circunscritas, mas em todos eles havia certo grau de fibrose meníngea, atrofia cortical, gliose marginal e gliose da substância branca, assim como alterações degenerativas das arteríolas. Desses 21 casos, em 12 havia esclerose do corno de Ammon (4 com história de parto anormal, 7 com crises tipo GM, 4 em que tinha ocorrido coma e cianose no decurso da moléstia febril na infância), o que não confirma a teoria de Spielmeyer, que atribui esta alteração aos distúrbios circulatórios durante as crises, nem a de Penfield que explica sua origem pela hérnia temporal durante o parto patológico. Os autores chamam a atenção para a alta freqüência com que foram encontrados elementos patológicos no tecido temporal retirado pelo ato cirúrgico e a elevada percentagem de resultados terapêuticos úteis com esse procedimento, julgando-os como elementos concordantes no sentido de que deve realmente existir uma correlação de causa e efeito entre essas lesões adquiridas do lobo temporal e a epilepsia temporal. A seu ver a cirurgia da epilepsia temporal está no limiar de um novo e grande campo de conhecimentos sobre esse terrível e tão extenso mal. A experimentação nas mãos dos neurofisiologistas já mostrou que a excitação do hipocampo e do núcleo amigdalino no animal pode reproduzir distúrbios de comportamento e estados confusionais idênticos aos da epilepsia temporal. Do conjunto de tais estudos pode esperar-se que os casos de epilepsia psicomotora possam vir a ser resolvidos pela cirurgia.

P. Pinto Pupo

Tratamento de crises noturnas pelo Desoxin (Desoxyn therapy for nocturnal seizures). J. Logothetis. Neurology, 5 (abril) 1955.

O Desoxyn (sulfato de metanfetamina) foi empregado num grupo de 46 pacientes convulsivos, com vários tipos de crises e sem seleção de idade ou sexo. Estes pacientes não haviam apresentado melhoras durante 2 anos de tratamento com os medicamentos usuais (Dilantin, Mebaral, Mesantoína, Tridione, etc). Neste grupo, 20 pacientes apresentavam 90% ou mais de crises convulsivas noturnas, ao passo que os demais as apresentavam durante o dia. O Desoxyn foi empregado na dose de 10 a 15 mg divididos em 2 a 3 tomadas, de preferência antes de dormir nos casos com crises noturnas e pela manhã nos casos com crises diurnas.

De modo geral foi assinalado efeito favorável nos pacientes portadores de crises noturnas, pois, dentre 20 pacientes, 13 tiveram uma redução no número de crises de 50% em média. Nos casos com crises diurnas foi observado efeito oposto, pois, na maioria houve piora, com aumento do número de crises.

Deve ser ressaltada a correlação destes resultados com o quadro eletrencefalográfico, pois os pacientes portadores de disritmias bilaterais por ondas e espículas, por espículas positivas 14 c/s e distúrbios profundos diencefálicos foram os que responderam favoravelmente à terapêutica, ao passo que, nos casos de focos corticais, a terapêutica falhou ou aumentou o número de crises.

E. Zukerman

Mielografia total (Total myelography). J. T. Brierre e J. A. Couclough. Radiology, 64:81-84 (janeiro) 1955.

Os autores propõem nova técnica de exame mielográfico para o diagnóstico de hérnias do núcleo pulposo, variante dos métodos de Bell (exame mielográfico em posição erecta) e de Malis, Newman e Wolf (repleção total do espaço subaracnóideo lombar): introdução de 21 ml de Pantopaque no espaço subaracnóideo lombar, após a medida da pressão liquórica e a retirada de quantidade de liquor suficiente para exame; terminada a introdução do contraste, que é feita com o paciente em decúbito, são realizadas diversas manobras, de modo a permitir completa repleção do canal raquidiano lombar, sendo, em seguida, praticados os exames mieloscópico e mielográfico. Após a realização do exame, o contraste é retirado por aspiração na região lombar.

Os autores assinalam as seguintes vantagens do método: 1) facilidade de exame do espaço subaracnóideo em posição erecta, pois a quantidade de contraste injetada permite a repleção do canal desde C5 até Tn; 2) as manobras efetuadas favorecem a visibilização das hérnias discais; 3) possibilidade de exame dos segmentos cervical e torácico do canal raquidiano sem manipulação exaustiva dos pacientes; 4) menor gotlculização do contraste; 5) possibilidade de retirada de maiores quantidades de contraste, após o exame; 6) menor manipulação dos pacientes do que nos outros métodos; 7) redução do tempo de exposição do examinando e do examinador aos raios X; 8) maior rapidez de exame. Os autores examinaram 18 doentes, não tendo encontrado imagens mielográficas falsamente negativas ou positivas, tão comuns nas mielografias com menor quantidade de contraste.

C. Pereira da Silva

Pneumencefalografia em Pediatria; revisão de 214 casos (Pneumoencephalography in Pediatric Department; review of 214 cases). J. Westerdal, K. E. Foght-Nielsen e G. Thomsen. Acta Pediat., 43:120-135 (março) 1954.

Os autores reviram 214 pneumencefalogramas de crianças com paralisia cerebral, epilepsia, oligofrenia e combinações várias dessas aíecções. Em todos os casos a pneumencefalografia foi feita por via lombar. Registraram apenas um caso de acidente: morte dois dias após o exame, por pneumonia, em uma criança de 5 meses, portadora de grave infecção intestinal e na qual a pneumencefalografia havia evidenciado grave atrofia cerebral.

Com a finalidade de apreciar os resultados de seus estudos, os autores relacionaram 166 casos, dividindo nos seguintes grupos as crianças examinadas: epilepsia (30 casos); oligofrenia (30); oligofrenia e epilepsia (25); paraplegia e tetraplegia espástica (58); sintomas unilaterais (23). Os demais pneumencefalogramas foram excluídos por serem casos neurocirúrgicos. Classificaram os quadros pneumencefalográficos em: normais, atrofia cerebral, hidrocefalia comunicante, agenesia do corpo caloso e ausência de repleção gasosa dos ventrículos laterais. O EEG foi feito em 119 dessas crianças. Como fatores etiológicos possíveis os autores consideram: fatores hereditários, infecções pré-natais, asfixia neonatal, parto difícil, prematuridade, encefalite, meningite e traumatismos cranianos. Em nenhum dos casos encontraram processos que requeressem intervenção neurocirúrgica. A ausência de repleção ventricular, observada em 6 casos, foi considerada como conseqüente a técnica defeituosa, o mesmo ocorrendo com a repleção unilateral dos ventrículos cerebrais. Pneumencefalogramas normais foram encontrados em 62 casos e atrofias cerebrais de localizações várias em 139 casos. Os autores consideraram como atrofia cerebral os aspectos pneumencefalográficos conseqüentes não só à atrofia de partes do cérebro normalmente desenvolvidas, como também aqueles devidos a defeitos de desenvolvimento, por ser impossível distinguir estas duas condições no pneumencefalograma; a dilatação ventricular discreta observada por vezes nos pneumencefalogramas de crianças não foi considerada como devida à atrofia cerebral, sendo atribuída à fraca resistência do tecido cerebral nas crianças. Relativamente às dimensões das cisternas basais, os autores demonstraram muita cautela no seu julgamento, em virtude das numerosas causas de erro de interpretação que ocorrem na apreciação. Verificaram que, mesmo nos casos de grande dilatação ventricular, a circunferência do crânio era normal ou apenas ligeiramente aumentada; em alguns casos havia mesmo redução dos diâmetros cranianos (casos denominados de hidromicrocefalia, nos quais a dilatação ventricular é causada por atrofia da substância cerebral e não por aumento da pressão intracraniana, como ocorre na hidrocefalia). Observaram ainda desvios ventriculares para o lado em que havia atrofia cerebral; em dois casos verificaram agenesia do corpo caloso.

Na classificação dos pneumencefalogramas, os autores consideraram o aspecto dos ventrículos laterais, os sinais de atrofia cortical, a dilatação do 3? e do 4? ventrículo e as dimensões das cisternas da base. Os autores verificaram que, salvo nos casos com sintomas unilaterais, nenhuma correlação evidente existia entre a natureza dos sintomas, o EEG e o caráter da atrofia cerebral. Observaram mesmo, muitas vezes, desproporção entre a gravidade dos sintomas clínicos e o grau de atrofia cerebral verificado no pneumencefalograma. Em 60% dos pacientes com sintomas unilaterais observaram atrofia cerebral assimétrica, fato que foi verificado em apenas 10% dos casos dos demais grupos; no grupo epilepsia a percentagem de achados normais foi particularmente elevada em comparação com os outros grupos (23 pneumencefalogramas normais em 30 casos de epilepsia); nos casos de oligofrenia verificaram, com freqüência, desproporção entre o grau de oligofrenia e o de atrofia cerebral. Puderam verificar que sintomas clínicos discretos raramente eram observados em casos com acentuadas atrofias cerebrais, ao contrário do que sucedeu com freqüência, isto é, oligofrenias ou paralisias cerebrais graves com pneumencefalogramas normais. A coexistência de sintomas clínicos graves com pneumencefalogramas normais ou com acentuadas atrofias cerebrais pode ser explicada pelo fato de que as células nervosas degeneradas são substituídas em alguns casos por tecido glial, o que não ocorre em outros; assim sendo, só nos casos recentes a atrofia cerebral pode ser visibilizada no pneumencefalograma. Em grande número de casos de atrofia cerebral, o EEG mostrava anormalidades difusas ou focais e, em outros casos, não havia correlação entre o EEG e o pneumencefalograma.

Finalizando, os autores acham que a maior indicação da pneumencefalografia em crianças é nos casos de oligofrenia e de paralisia cerebral, onde infelizmente o processo não tem ação terapêutica. Aconselham, porém, o emprego do exame pneumencefalográfico em todos os casos de epilepsia, seqüelas de lesões cranianas, hemorragias intracranianas e nos casos neurológicos duvidosos.

C. Pereira da Silva

Causa potencial de erro no diagnóstico radiológico de costelus cervicais (A source of potential error in the roentgen diagnosis of cervical ribs). D. R. Keating e J. R. Amberg. Radiology, 62:688-695 (maio) 1954.

Os autores chamam a atenção para a possibilidade de erro no diagnóstico radiológico das costelas cervicais durante os primeiros 10 anos de vida, erro este ocasionado pelas variações normais de desenvolvimento das apófises costais da 7ª vertebra cervical. Recordam que, embora rara a ocorrência de costelas cervicais sintomáticas em crianças, essa eventualidade pode apresentar-se, de modo que o radiologista deve estar prevenido sobre as variações normais de forma e tamanho das apófises costais durante o período de desenvolvimento, a fim de que não descreva como costela cervical uma apófise costal que se desenvolveu de modo diverso do comum. Lembram que as massas laterais da 7ª vertebra cervical constam de uma porção anterior (o chamado processo costal) e outra posterior (o processo transverso). Em seus ápices, esses dois processos se fundem, formando o buraco transverso, o qual, situando-se no plano horizontal, raramente é visibilizado nas radiografias de rotina do adulto. Em crianças, pelo contrário, o buraco transverso e as duas apófises são visibilizados com grande freqüência, não só devido às dimensões relativamente reduzidas da apófise transversa, como também porque as duas apófises não se acham ainda fundidas. As duas apófises desenvolvem-se por pontos de ossificação independentes, que se fundem dos 4 aos 10 anos de idade. O tamanho dessas apófises em crianças é variável; nos casos em que a apófise costal é mais longa que a transversa é que ocorre a possibilidade de erro de interpretação, sendo a apófise costal alongada considerada como uma costela supranumerária. No adulto, quando não ocorre a fusão das duas apófises, o diagnóstico de costela cervical rudimentar pode ser feito com facilidade.

Afirmam os autores que, para o diagnóstico correto de existência de costela cervical em crianças abaixo de 10 anos de idade é necessário: a) verificar se elas apresentam as curvaturas anterior e inferior, tal como ocorre nas costelas verdadeiras; b) verificar se a costela considerada como cervical não é uma costela torácica de desenvolvimento anômalo; c) observar se não há presença ocasional de vertebra cervical supranumerária; d) cientificar-se se não se trata de anomalia numérica de costelas.

C. Pereira da Silva

Calcificação dos discos intervertebrals na infância (Calcification of the intervertebral disks in childhood). F. N. Silverman. Radiology, 62:801-816 (junho) 1954.

O autor teve oportunidade de observar 7 casos de calcificação dos discos intervertebrals em crianças de idades variáveis de 5 meses a 11 anos. Revendo este problema, encontrou na literatura o registro de mais 8 casos. O estudo de conjunto desses 15 casos permitiu concluir que a calcificação dos discos intervertebrals em crianças não tem significação clínica, constituindo apenas um achado radiográfico.

Em nenhum dos casos relatados havia correlação entre a calcificação dos discos e os sintomas clínicos apresentados. Relativamente à etiologia da calcificação lembra o autor que, no adulto, ela é considerada como conseqüente à degeneração senil do disco, enquanto que, na criança, o seu aparecimento é atribuído a distúrbios metabólicos e a fatores infecciosos. O tratamento deve ser conservador, sendo instituído apenas nos casos em que haja sintomas atribuíveis à calcificação.

C. Pereira da Silva

Osteartropatia idiopática crônica (Chronic idiopathic osteoarthropathy). T. E. Keats e W. S. Bagnals. Radiology, 62:841-844 (junho) 1954.

Os autores relatam um caso de osteartropatia hipertrófica crônica idiopática, que acreditam ser o 9º descrito na literatura médica americana. Tratava-se de paciente de côr preta, com 29 anos de idade, que se queixava de dores intermitentes nos membros inferiores e edema dos joelhos. As dores haviam surgido aos 16 anos de idade e se agravavam no inverno e nos dias úmidos. O paciente apresentava dedos e artelhos em forma de clava e edema dos joelhos. O exame clínico nada de anormal revelou para o lado dos diferentes aparelhos, sendo negativos os exames de laboratório e normais as dosagens químicas no sangue. O exame radiográfico mostrou espessamento difuso da cortical das duas tíbias, conservando-se normal a medular; havia também proliferação periostal irregular nos maléolos e hipertrofia das últimas falanges dos dedos e artelhos.

A osteartropatia hipertrófica crônica idiopática é relativamente rara, mais comum no sexo masculino, não tendo preferência por raças, mas apresentando caráter familial. Os sintomas, que surgem geralmente na adolescência, consistem em dores intermitentes, rigidez e edema das articulações atingidas, sendo mais freqüente nas articulações dos joelhos, punhos e tornozelos. Os dedos e artelhos apresentam conformação em bagueta de tambor ou em clava, podendo haver hipertrofia ou atrofia das últimas falanges dos dedos e artelhos. Podem associar-se distúrbios endócrinos vários. O diagnóstico é feito principalmente pela radiografia. O diagnóstico diferencial deve ser feito com a osteartropatia hipertrófica crônica secundária, que apresenta o mesmo quadro radiológico, sendo a distinção feita pela ausência de moléstia primária, pelo início da puberdade, pela influência familial e a longa duração, elementos que falam a favor da osteartropatia idiopática; diferença-se da acromegalia pela falta de alterações selares e ausência de engrossamento dos pequenos ossos das mãos e dos pés; distingue-se da moléstia de Paget porque esta se inicia tardiamente e acarreta distúrbios na trabeculação dos ossos; a distinção com a artrite reumatóide se faz porque esta não determina periostite nem espessamento cortical, assim como não traz deformação em clava dos dedos; a distinção com a periostite luética é feita pelas reações sorológicas e porque a lues geralmente não afeta as extremidades superiores. A etiologia é ainda desconhecida. Os autores recomendam muito cuidado no diagnóstico da osteartrose hipertrófica crônica idiopática, aconselhando só afirmá-lo quando não se encontrar uma etiologia responsável pela condição, pois lembram que se deve ter em mente ser particularmente elevada a incidência desta osteartropatia em casos de câncer dos pulmões.

C. Pereira da Silva

Glicemia e sistema nervoso autônomo (Blood sugar and autonomic nervous system). E. Gelhorn. Acta Neurovegetativa, 9:74, 1954.

A anóxia, a hipercapnia, o frio, a febre, etc., determinam aumento da taxa de glicose sangüínea, mas essa resposta não ocorre ou é diminuída quando são extirpadas as medulares das supra-renais; em alguns casos, mesmo, ocorre hipoglicemia. Tais fenômenos, segundo Gelhorn, refletem um equilíbrio dinâmico entre os sistemas simpátieo-adrenal e vago-insulinieo, equilíbrio que é rompido ora para um lado, ora para outro, de acordo com os estímulos. A estimulação do hipotálamo posterior, por exemplo, desencadeia o quadro clássico da "sham rage" (raiva fictícia) com hiperglicemia; seccionando-se a medula cervical, persiste a raiva, mas não há hiperglicemia; pelo contrário, a taxa da glicose sangüínea baixa. Ora, a "sham rage" é manifestação nitidamente simpática, mas a interrupção das vias hipotalamospinais que controlam os núcleos simpáticos medulares, abole a resposta hiperglicêmica; e não só abole mas também permite que o tono vago-insulínico se manifeste.

Desde que distúrbios hipotalâmicos induzidos por emoções são predominantes nas psiconeuroses e psicoses funcionais, é de importância considerar o balanço neurovegetative central nessas condições. Sangue de pacientes psicóticos injetado em ratos hipofisectomizados e nos quais fora feita a extirpação das medulares das suprarenale (o que os torna mais sensíveis à insulina), provoca intensa hipoglicemia (denotando aumento da insulina), ao passo que o sangue de pessoas normais, mesmo sob stress emocional, não produz tais efeitos. O balanço dos centros vegetativos desses psicóticos, portanto, pende para o lado parassimpático, enquanto que, nos normais, pende para o lado simpático-adrenal. A falta de reação hiperglicêmica da maioria dos pacientes mentais nos momentos de excitação contrasta vivamente com a hiperglicemia que surge nas pessoas normais diante de fraco stress. Além disso, a hipoglicemia, em certos pacientes, pode ser controlada com atropina ou psicoterapia; até mesmo o achatamento da curva de tolerância à glicose pode, em alguns casos, ser eliminado pela atropinização.

O autor cita pesquisas feitas recentemente, demonstrando que, dependendo da forma de excitação emocional e do tipo de indivíduo, os sintomas durante stress sugerem descargas simpáticas ou parassimpáticas predominantes; entretanto, tais descargas não afetam necessariamente todo o sistema simpático ou todo o parassimpático, podendo ser restritas a certas partes (distúrbios gastrintestinais, cardíacos ou vasculares, hiperglicemia ou combinações de vários desses fatores). Portanto, tais perturbações emocionais têm um fator em comum: originam-se ou são associadas a perturbações vegetativas. Se de intensidade suficiente, tais distúrbios alteram as funções corticais, disso resultando mudanças fundamentais da personalidade.

C. Timo Iaria

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Abr 2014
  • Data do Fascículo
    Mar 1956
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