Acessibilidade / Reportar erro

Salmonela em ovos comerciais: ocorrência, condições de armazenamento e desinfecção da casca

Salmonella in table eggs: occurrence in retails, storage conditions and eggshell disinfections

Resumos

Este trabalho teve por objetivos verificar a ocorrência de salmonelas na casca e na gema de ovos de galinha distribuídos em pontos de venda da cidade de Campinas-SP, estudar o efeito do tempo e da temperatura de armazenagem sobre a multiplicação de Salmonella enteritidis (SE) na casca e na gema de ovos contaminados artificialmente por contato com maravalhas e na multiplicação de SE em clara e preparações artificialmente contaminadas e verificar o efeito da desinfecção de ovos por imersão em duas soluções desinfetantes sobre a contagem bacteriana e de SE da casca de ovos artificialmente contaminados. Das 124 amostras com 10 ovos cada, obtidas no comércio, 12 (9,6%) e quatro (3,2%) foram positivas para salmonelas na casca e na gema, respectivamente. SE foi o único sorovar identificado. Ovos experimentalmente contaminados apresentaram SE na casca pelo período de estudo de 21 dias tanto nos mantidos em temperatura ambiente, como em refrigeração. Houve migração da contaminação de SE da casca para a gema a partir de 24 horas, com maior intensidade nos ovos mantidos em temperatura ambiente. Clara de ovos, clara batida e glacê não se mostraram substratos apropriados para a multiplicação de SE quando armazenados tanto em temperatura ambiente como em refrigeração. Não houve aumento da contaminação original no período de 24 e 168 horas do estudo. Ao contrário, houve redução de um ciclo logaritmo da contaminação original na preparação de glacês mantidas nas duas condições de armazenagem. A desinfecção da casca de ovos com solução do composto quaternário de amônia na dosagem de 400ppm e aquecida a 45ºC foi mais eficiente do que quando se utilizaram 50,2ppm de cloro, nas mesmas condições de uso, tanto na redução de mesófilos totais como para SE.

Ovo; Salmonella enteritidis; Salmonella spp.; desinfecção


A survey of the presence of Salmonella in chicken eggshell and yolk, obtained on the retail market in Campinas, SP, Brazil, was carried out in order to study the effect of storage time and temperature on the Salmonella enteritidis (SE) multiplication on the eggshell and yolk of eggs artificially contaminated by contact with litter and, also, the multiplication of SE in egg white, whippet egg white and glace, storage under different conditions of temperature. It was also studied the effect of egg dipping disinfections into two solutions, on the bacterial and SE counting on contaminated eggshell. From the 124 samples tested on the survey, 12 (9.6%) and four (3.2%) were positive for Salmonella on the eggshell and in the yolk, respectively. SE was the only detected sorovar. SE remained viable in artificially contaminated eggshells for a period of 21 days in eggs kept at both room temperature (25ºC), and refrigeration (4-8ºC). Migration of SE from the eggshell to the yolk was detected after 24 hours of storage, under both conditions with a greater level on the eggs kept at room temperature. The refrigerated conditions did not affect SE migration, although its replication was reduced. Egg white, whipped egg white and glace were shown not to be good substrates for SE growth, considering there was a reduction of one log10 titer in the original contamination of these foods, kept under both time conditions (24 and 168 hours for glace) and temperatures. In this study, egg dipping in a warm solution (45ºC) of a commercially available quaternary ammonium compound (400ppm) using the same conditions was more effective in eggshell disinfections than the chlorinated compound (50.2ppm) on the total mesophilic bacteria and SE reduction.

Egg; Salmonella enteritidis; Salmonella spp.; egg disinfection


[Salmonella in table eggs: Occurrence in retails, storage conditions and eggshell disinfections]

D.D. Oliveira, E.N. Silva**Autor para correspondência E-mail: edir@fea.unicamp.br

Faculdade de Engenharia de Alimentos – Unicamp

Caixa Postal 6121

13083-970 - Campinas, SP

Recebido para publicação, após modificações, em 30 de junho de 2000.

RESUMO

Este trabalho teve por objetivos verificar a ocorrência de salmonelas na casca e na gema de ovos de galinha distribuídos em pontos de venda da cidade de Campinas-SP, estudar o efeito do tempo e da temperatura de armazenagem sobre a multiplicação de Salmonella enteritidis (SE) na casca e na gema de ovos contaminados artificialmente por contato com maravalhas e na multiplicação de SE em clara e preparações artificialmente contaminadas e verificar o efeito da desinfecção de ovos por imersão em duas soluções desinfetantes sobre a contagem bacteriana e de SE da casca de ovos artificialmente contaminados. Das 124 amostras com 10 ovos cada, obtidas no comércio, 12 (9,6%) e quatro (3,2%) foram positivas para salmonelas na casca e na gema, respectivamente. SE foi o único sorovar identificado. Ovos experimentalmente contaminados apresentaram SE na casca pelo período de estudo de 21 dias tanto nos mantidos em temperatura ambiente, como em refrigeração. Houve migração da contaminação de SE da casca para a gema a partir de 24 horas, com maior intensidade nos ovos mantidos em temperatura ambiente. Clara de ovos, clara batida e glacê não se mostraram substratos apropriados para a multiplicação de SE quando armazenados tanto em temperatura ambiente como em refrigeração. Não houve aumento da contaminação original no período de 24 e 168 horas do estudo. Ao contrário, houve redução de um ciclo logaritmo da contaminação original na preparação de glacês mantidas nas duas condições de armazenagem. A desinfecção da casca de ovos com solução do composto quaternário de amônia na dosagem de 400ppm e aquecida a 45ºC foi mais eficiente do que quando se utilizaram 50,2ppm de cloro, nas mesmas condições de uso, tanto na redução de mesófilos totais como para SE.

Palavras-chave: Ovo, Salmonella enteritidis, Salmonella spp., desinfecção

ABSTRACT

A survey of the presence of Salmonella in chicken eggshell and yolk, obtained on the retail market in Campinas, SP, Brazil, was carried out in order to study the effect of storage time and temperature on the Salmonella enteritidis (SE) multiplication on the eggshell and yolk of eggs artificially contaminated by contact with litter and, also, the multiplication of SE in egg white, whippet egg white and glace, storage under different conditions of temperature. It was also studied the effect of egg dipping disinfections into two solutions, on the bacterial and SE counting on contaminated eggshell. From the 124 samples tested on the survey, 12 (9.6%) and four (3.2%) were positive for Salmonella on the eggshell and in the yolk, respectively. SE was the only detected sorovar. SE remained viable in artificially contaminated eggshells for a period of 21 days in eggs kept at both room temperature (25ºC), and refrigeration (4-8ºC). Migration of SE from the eggshell to the yolk was detected after 24 hours of storage, under both conditions with a greater level on the eggs kept at room temperature. The refrigerated conditions did not affect SE migration, although its replication was reduced. Egg white, whipped egg white and glace were shown not to be good substrates for SE growth, considering there was a reduction of one log10 titer in the original contamination of these foods, kept under both time conditions (24 and 168 hours for glace) and temperatures. In this study, egg dipping in a warm solution (45ºC) of a commercially available quaternary ammonium compound (400ppm) using the same conditions was more effective in eggshell disinfections than the chlorinated compound (50.2ppm) on the total mesophilic bacteria and SE reduction.

Keywords: Egg, Salmonella enteritidis, Salmonella spp., egg disinfection

INTRODUÇÃO

A incidência de surtos de Salmonella enteritidis (SE) em humanos tem aumentado nos últimos anos em muitos países como Estados Unidos, Grã-Bretanha e outros países da Europa (Spakman, 1989; Barrow, 1993; Tauxe, 1997). No Brasil, os surtos por SE no homem tem aumentado a partir de 1993 (Silva, 1995; Irino et al., 1996; Taunay et al., 1996; Lirio et al., 1998). Grande parte deles tem sido relacionada com o consumo de ovos ou pratos preparados com ovos (Spackman, 1989; Barrow, 1993; Noorhvizen & Frankena, 1994; Tauxe, 1997). No Brasil, SE foi detectada pela primeira vez em galinhas, em 1989, quando a cepa foi isolada de matrizes pesadas jovens que apresentavam sintomas clínicos e mortalidade por salmonelose (Ferreira et al., 1990).

A contaminação dos ovos por salmonela se dá, inicialmente e na maioria das vezes, através da casca. Tempo e temperatura de armazenagem são fatores fundamentais para que as salmonelas passem da superfície da casca para as estruturas internas do ovo (Staldeman, 1986; Silva, 1995). A desinfecção e o resfriamento do ovo logo após a postura são procedimentos adotados em vários países como medidas para reduzir a contaminação e a multiplicação bacteriana (Hammack et al., 1993). Ovos podem também se contaminar via transovariana. Nesse caso, a contaminação está localizada na gema e os processos convencionais de desinfecção dos ovos não são eficientes. A clara, em geral, apresenta-se com baixa contaminação por salmonelas pois ela contém elementos naturais que dificultam o desenvolvimento bacteriano, como a presença de enzimas antibacterianas (lisozima) e a deficiência em ferro, elemento essencial para a multiplicação bacteriana, p.ex. Contudo, a manipulação da clara no preparo de determinados pratos pode romper esse equilíbrio e favorecer a multiplicação de salmonelas.

No Brasil, poucos são os levantamentos sobre a presença de salmonelas em ovos comerciais (Langoni et al., 1995). A maioria dos ovos comerciais é produzida por galinhas mantidas em gaiolas. Uma pequena parte é constituída por ovos de descarte de incubação que são produzidos por matrizes em ninhos com cama de maravalhas. Parte desses ovos, oriundos de reprodutoras, apresenta defeitos na casca que facilitam a passagem das salmonelas da superfície para suas estruturas internas aumentando o risco de contaminação.

Recentemente, a vigilância sanitária estabeleceu condutas higiênico-sanitárias que incluem cuidados de armazenamento e preparações de pratos a base de ovos (Centro..., 1998, 1999). Entretanto, a legislação brasileira ainda não prevê a armazenagem, o transporte e a comercialização de ovos de consumo sob refrigeração.

Este trabalho teve por objetivos verificar a ocorrência de salmonelas na casca e na gema de ovos distribuídos em pontos de venda da cidade de Campinas-SP, estudar o efeito do tempo e da temperatura de armazenagem sobre a multiplicação de SE na casca e na gema de ovos contaminados através do contato com maravalhas e na multiplicação de SE na clara e em preparações artificialmente contaminadas e verificar o efeito da desinfecção de ovos por imersão em duas soluções desinfetantes sobre a contagem bacteriana e de SE da casca de ovos artificialmente contaminados.

MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa de Salmonella sp. foi realizada num total de 1.240 ovos comerciais de galinhas coletados no comércio varejista de Campinas-SP, no período de janeiro a março de 1995, nas suas embalagens originais. Foram analisadas 124 amostras constituídas por 10 ovos cada. Os ovos de cada amostra eram quebrados assepticamente e as cascas, colocadas em um saco plástico, eram trituradas manualmente. Vinte e cinco gramas de cada amostra de casca eram colocados em copos homogeneizadores de aço inox e triturados por um minuto na presença de 225ml de água peptonada tamponada (APT). As gemas eram separadas das claras usando-se um separador doméstico, homogeneizadas em um Becker e pesadas 25g para suspensão em 225ml de APT. Todo o material utilizado era previamente esterilizado em autoclave. As claras eram desprezadas.

Para os experimentos com contaminação e inoculação experimentais, foram utilizados ovos comerciais brancos obtidos de granja comercial, não lavados e sem nenhum processo de limpeza prévia. Eles eram transportados ao laboratório e mantidos em temperatura ambiente até o momento de uso. Foi utilizada a cepa de SE, fagotipo 28, isolada de galinhas doentes (Ferreira et al., 1990), resistente a 100mg de ácido nalidíxico (Nal) por ml do meio de cultura. Para a contaminação, a cepa era cultivada em caldo triptona de soja por 18-24 horas a 37ºC, com aproximadamente 108 unidades formadoras de colônia (UFC) por ml.

A contaminação artificial por SE foi feita mediante contato dos ovos com maravalhas contaminadas. Utilizou-se esse método por se assemelhar mais com a contaminação natural da casca dos ovos de reprodutoras do que outros métodos descritos na literatura. Maravalhas ligeiramente umedecidas, previamente esterilizadas em autoclave, eram colocadas em sacos plásticos e aspergidas com a cultura de SE. Para a contaminação, os ovos eram depositados sobre elas, fazendo-se leves movimentos por 10 minutos.

Aproximadamente 80 ovos contaminados pelo método das maravalhas foram divididos em dois grupos. Um era mantido em temperatura ambiente, entre 25 e 28ºC, e o outro em geladeira, entre 4 e 8ºC. Os ovos mantidos em temperatura ambiente foram examinados nos tempos de zero, 24, 48, 72, 168 e 336 horas pós-contaminação. Os refrigerados foram examinados nos mesmos tempos e também no tempo de 504 horas. Cinco ovos de cada grupo eram usados nas análises de casca e gema, como anteriormente descrito, em cada período.

Em outro experimento foram utilizados nove ovos contaminados em maravalhas e cinco ovos não contaminados como controle. Os contaminados foram divididos em três grupos de três ovos cada e dois grupos foram imediatamente desinfetados. A desinfecção foi realizada por imersão dos ovos por 30 segundos na solução desinfetante aquecida a 45ºC. Um dos grupos foi desinfetado em solução contendo 400ppm de compostos quaternários de amônio (obtido do produto comercial Cleanshellâ) e o outro desinfetado em solução contendo 50,2ppm de cloro residual livre.

Também foi examinada a sobrevivência de SE em clara in natura, em clara batida e em glacê de clara. Aproximadamente 700 gramas de clara foram obtidos de ovos comerciais com a separação realizada conforme descrito anteriormente. Um ml da cultura de SE foi lentamente homogeneizado à mistura de claras. A clara in natura não foi submetida a nenhuma preparação. A preparação da clara batida foi feita com o uso de um misturador elétrico até se obter uma consistência firme. O glacê foi preparado com clara e açúcar na proporção de 1:1 utilizando-se um misturador elétrico. Cada uma das preparações foi dividida em duas porções e armazenadas em temperatura ambiente e em geladeira. As amostras mantidas a 25ºC foram examinadas nos tempos de zero, cinco e 24 horas após preparo. As mantidas refrigeradas entre 4 e 8ºC, foram examinadas adicionalmente nos tempos de 48, 96 e 168 horas após preparo.

Para o isolamento de Salmonella sp. de ovos comerciais foi empregada a metodologia convencional com APT como pré-enriquecimento, caldo tetrationato como enriquecimento seletivo, agar verde brilhante (AVB) e xilose lisina descarboxilase (XLD), agar tríplice açúcar e ferro (TSI) e agar lisina e ferro (LIA) como meios de triagem e as provas bioquímicas convencionas. Todos os meios foram incubados por 24 horas a 37ºC. As colônias bioquimicamente típicas para Salmonella sp. foram sorotipadas pela Seção de Enterobactérias do Instituto Adolfo Lutz de São Paulo.

A contagem de SE na casca, gema, clara, clara batida e glacê nos experimentos com contaminação artificial foi feita pela suspensão decimal das amostras e suas respectivas diluições em APT. A contagem de SE na casca dos ovos foi feita por análise individual de cada ovo. Fazia-se o enxágüe da casca em sacos plásticos estéreis adicionando 5ml de APT, homogeneizando-se por 30 segundos. Em seguida, foram feitas diluições decimais em APT. Alíquotas de 0,1ml das diferentes diluições foram plaqueadas em duplicata na superfície de placas de ágar MacConkey contendo 100mg de Nal por ml do meio de cultura para impedir a presença de outros contaminantes. Todas as suspensões originais em APT foram também incubadas a 37ºC por 24 horas e plaqueadas em ágar MacConkey (Nal) para permitir revelar a presença de SE quando a quantidade não podia ser contada na diluição 10-1. Mesófilos totais foram determinados na casca de ovos submetidos à desinfecção química, através de metodologia padrão (Silva et al., 1997).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No isolamento de Salmonella sp. de ovos comerciais observa-se que das 124 amostras tomadas ao acaso no mercado no período de janeiro a março de 1995, cada amostra representada por 10 ovos, foram isoladas salmonelas de 12 (9,6%) e quatro (3,2%) amostras de casca e gema, respectivamente (Tab. 1). O único sorovar identificado foi SE. A presença da salmonela na gema pode ser resultante da migração a partir da casca contaminada. Sabe-se que os poros da casca dos ovos permitem a penetração de salmonelas e o nível de penetração está relacionado com as condições de tempo e temperatura de armazenagem (Bradshaw et al., 1990; Shah et al., 1991; Silva, 1995). Esses percentuais encontrados são muito elevados se comparados com os dados da literatura nacional (Langoni et al., 1995). O fato de se isolar somente SE em índices tão elevados talvez possa ser explicado pelo dados levantados pelo Instituto Adolfo Lutz de São Paulo (Irino et al., 1996). Nesse artigo, o sorovar SE começa a ser detectado a partir de 1993 e, rapidamente, passa a ser predominante em surtos humanos e em alimentos que contenham ovos e/ou seus derivados. O mesmo fato é indicado em levantamento recente realizado com alimentos comprados pela Secretaria de Abastecimento do Município de São Paulo (Lirio et al., 1998). Aqui, também, aves constituem o alimento mais contaminado e SE o sorovar mais prevalente. Esses dados sugerem que, pelos menos em São Paulo, há um período de surtos de infecção alimentar por SE, com os produtos avícolas como principal fonte de contaminação, à semelhança do que se passou em outros países (Spakman, 1989; Barrow, 1993; Tauxe, 1997).

Os resultados do efeito do tempo e da temperatura de armazenagem sobre a multiplicação de SE na casca e na gema de ovos experimentalmente contaminados por contato com maravalhas e mantidos em temperaturas ambiente e de refrigeração são apresentados na Tab. 2. Testes-piloto mostraram que a fixação de salmonelas na casca de ovos frescos é extremamente dependente da umidade do material utilizado como veículo (dados não publicados), por isso umedeceram-se as maravalhas antes da contaminação com SE. Esse procedimento de não aplicação direta da cultura ou de suas diluições diretamente sobre a casca foi para simular contaminação natural. Sabe-se que ovos de descarte de incubação, produzidos por reprodutoras botados em ninhos ou cama de maravalhas úmidas, são comercializados sem refrigeração para consumo humano. Nestes experimentos, a contaminação original (tempo zero) da casca por SE era relativamente elevada (105 UFC/casca). SE manteve-se presente, porém decrescente, na casca dos ovos mantidos em ambas as condições de armazenagem, em todo o período experimental de 336 horas e em até 504 horas, na armazenagem refrigerada. O decréscimo maior ocorreu no primeiro período de 24 horas após a contaminação, quando houve perda de dois ciclos logaritmos. A translocação da SE da casca para a gema foi detectada 24 horas após a contaminação dos ovos refrigerados e em 48 horas nos ovos mantidos em temperatura ambiente. Contudo, a armazenagem em temperatura ambiente permitiu que SE chegasse à gema em maior número de vezes e com maior taxa de multiplicação. Estes dados ratificam o efeito benéfico da refrigeração de ovos no controle da migração de salmonelas da casca para a gema (Hammack et al., 1993).

Os resultados do efeito do tempo e da temperatura de armazenagem sobre a multiplicação de SE em clara e preparações artificialmente contaminadas e mantidas em temperatura ambiente e de refrigeração são apresentados na Tab. 3. Os resultados indicam que clara de ovos e suas preparações não constituem substrato ideal para a multiplicação de SE. O número de salmonelas viáveis em clara, clara batida e glacê, mantidos em ambas as condições de armazenagem, praticamente manteve-se dentro dos níveis iniciais de contaminação (104 UFC/g da amostra) nos diferentes tempos de armazenagem. Não houve multiplicação nem redução da cepa contaminante. Os únicos dados consistentes, que mostram a redução de um ciclo logaritmo, são os resultados da armazenagem do glacê em refrigeração nos tempos de 96 a 168 horas. É provável que esta estabilidade na multiplicação bacteriana na clara e em suas preparações seja devida aos fatores antibacterianos nelas presentes (Garibaldi, 1959; Board, 1966).

Os resultados do efeito da desinfecção em duas soluções desinfetantes sobre a contagem bacteriana e de SE da casca de ovos são apresentados na Tab. 4. O composto contendo quaternários de amônia (400ppm do princípio ativo) foi mais eficiente que o composto clorado (50,2ppm) na redução da contaminação por SE e por mesófilos totais da casca dos ovos. Ambos os desinfetantes foram eficazes na redução, mas não na eliminação total dos contaminantes da casca. Esses resultados são semelhantes aos de outros autores (Worley et al., 1992; Kuo et al., 1997). A legislação brasileira permite somente o uso de produtos clorados até a concentração de 50ppm e solução aquecida. Ovos destinados à fabricação de massa ou à desidratação devem ser previamente lavados em água corrente (Brasil, 1997). Outras normas gerais de higiene vêm sendo sugeridas pela vigilância sanitária brasileira (Centro..., 1998, 1999). Na maioria das vezes, as granjas não realizam desinfecção da casca dos ovos e, alguma vezes, quando limpam a casca, o fazem com água fria sem desinfetantes.

CONCLUSÕES

A ocorrência de Salmonella enteritidis em 12 e 4 (9,6 e 3,2%) amostras de casca e gema, respectivamente, como único sorovar, em ovos comerciais tomados ao acaso no mercado no período de janeiro a março de 1995, é considerada como muito alta e deve ser motivo de preocupação pela vigilância sanitária. Ovos experimentalmente contaminados por contato com maravalhas mantiveram a SE na casca mesmo quando mantidos em boas condições de armazenagem, em todo o período experimental de 504 horas. Nesse período houve translocação da SE da casca para a gema. Clara de ovos e suas preparações não constituem substrato ideal para a multiplicação de SE. Ovos artificialmente contaminados com SE via casca em contato com maravalhas e imediatamente desinfetados por imersão por 30 segundos em solução desinfetante mantida a 45ºC mostraram que o composto contendo quaternários de amônia (400ppm do princípio ativo) foi mais eficiente que o composto clorado (50,2ppm) na redução da contaminação por SE e mesófilos totais da casca dos ovos.

  • BARROW, P.A. Salmonella control - past, present and future. Avian Pathol., v.22, p.651-669, 1993.
  • BOARD, R.G. The course of microbial infection of the hens egg. J. Appl. Bacteriol., v.29, p.319-341, 1966.
  • BRADSHAW, J.G., SHAH, D.B., FORNEY, E. et al. Growth of Salmonella enteritidis in yolk of shell eggs from normal and seropositive hens. J. Food Protec., v.53, p.1033-1036, 1990.
  • BRASIL. Regulamento da inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal. Brasília: Ministério da Agricultura e do Abastecimento. 1997. p.160-167.
  • CENTRO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Portaria CVS-13/98 de 30/7/98. Manual de procedimentos e condutas para controle higiênico e sanitário em estabelecimentos de alimentos. São Paulo, 1998. p.26-30.
  • CENTRO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Portaria CVS-6/99 de 10/3/99. Regulamento técnico sobre os parâmetros e critérios para o controle higiênico sanitário em estabelecimentos de alimentos. São Paulo, p.26-27, 1999.
  • FERREIRA, A.J.P., ITO, N.M.K., BENEZ, S.M. et al. Infecçăo natural e experimental por Salmonella enteritidis em pintos. In: CONFERĘNCIA APINCO DE CIĘNCIA E TECNOLOGIA AVÍCOLAS. Anais Campinas: FACTA, 1990. p.171.
  • GARIBALDI, J.A. Factors in egg white with control growth of bacteria. Albany: Western Regional Research Laboratory, 1959. p.337-344.
  • HAMMACK, T.S., SHERROD, P.S., BRUCE, V.R. et al. Research note: Growth of Salmonella enteritidis in grade A eggs during prolonged storage. Poult. Sci., v.72, p.373-377, 1993.
  • IRINO, K, FERNANDES, S.A., TAVECHIO, A.T. et al. Progression of Salmonella enteritidis phage type 4 strains in Săo Paulo State, Brazil. Rev. Inst. Med. Trop. S. Paulo, v.38, p.193-196, 1996.
  • KUO, F.L., KWON, Y.M., CAREY, J.B. et al. Reduction of Salmonella contamination on chicken egg shells by a peroxidase-catalyzed sanitizer. J. Food Sci., v.62, p.873-884, 1997.
  • LANGONI, H., PRADO, R.A.T., PINTO, J.P.A.N. et al. Isolamento de salmonelas em ovos de galinha oferecidos no comércio de Botucatu - S.P. Hig. Alimentar, v. 9, p.45-47, 1995.
  • LIRIO, V.S., SILVA, E.A., STEFONI, S. et al. Freqüęncia de 17 sorotipos de Salmonella isolados em alimentos. Hig. Alimentar, v.12, p.36-42, 1998.
  • NOORDHVIZEN, J.P., FRANKENA, K. Salmonella enteritidis: clinical epidemiological approaches for prevention and control of Salmonella enteritidis in poultry production. Int. J. Food Microbiol., v.21, p.131-143, 1994.
  • SPACKMAN, D. Salmonella in poultry in the U.K. Observations and actions. WESTERN POULTRY DISEASE CONFERENCE, 1989, Sacramento. Proceedings... s.n., 1989. p.207-210.
  • SHAH, D.B., BRADSHAW, J.G., PEELER, J.T. Thermal resistance of egg-associated epidemic strains of Salmonella enteritidis J. Food Sci., v.56, p.391-393, 1991.
  • SILVA, E.N. Salmonella enteritidis em aves e saúde pública. Hig. Alimentar, v.9, p.7-13, 1995.
  • SILVA, N., JUNQUEIRA, V.C.A., SILVEIRA, N.F.A. Manual de métodos de análise microbiológica de alimentos Săo Paulo: Varela, 1997. 295p.
  • STADELMAN, W.J. The preservation of quality in shell eggs In: STADELMAN, W.J. Egg science and technology 3.ed. Westport: AVI, 1986. p.63-96.
  • TAUNAY, A.E., FERNADES, S.A. TAVECHIO, A.T. et al. The role of Public Laboratory in the problem of Salmonellosis in Săo Paulo, Brazil. Rev. Inst. Med. Trop. Săo Paulo, v.38, p.119-127, 1996.
  • TAUXE, R.V. Emerging foodborne diseases: An evolving public health challenge. Centers Dis. Control Prevention, Atlanta, Special Issue, v.3, 12p., 1997.
  • WORLEY, B.S., WHEATLEY, W.B., LUTEN, S.D. et al. Inactivation of Salmonellaa enteritidis on shell eggs by novel N-halamine biocidal compounds. J. Ind. Microbiol., v.11, p.37-42, 1992.
  • *
    Autor para correspondência
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Fev 2001
    • Data do Fascículo
      Dez 2000

    Histórico

    • Recebido
      30 Jun 2000
    Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Veterinária Caixa Postal 567, 30123-970 Belo Horizonte MG - Brazil, Tel.: (55 31) 3409-2041, Tel.: (55 31) 3409-2042 - Belo Horizonte - MG - Brazil
    E-mail: abmvz.artigo@gmail.com