Fundamentando-se na perspectiva teórica fornecida pela psicanálise de orientação lacaniana, busca-se investigar a representação familiar em narrativas orais de ficção, produzidas por uma criança e um adolescente de rua. Parte-se do princípio de que o discurso narrativo configura-se como locus privilegiado para a instalação da subjetividade. No discurso narrativo de ficção, em especial, a verdade do sujeito irrompe à sua revelia; ele acaba falando de si, pois não logra escapar de seu assujeitamento à linguagem. O que parece caracterizar as narrativas é a emergência de um jogo entre o empírico e o idealizado, que se organiza da seguinte maneira: lado a lado com a representação de uma família desestruturada (figuras parentais ausentes, rearranjos familiares, pais negligentes), aparece a representação de uma família unida e feliz. A conclusão é que, através da ficção, eles organizaram sua simbolização particular sobre o que é uma família, guiados fundamentalmente pelo desejo.
This study aims at investigating the family representation in oral fiction narratives produced by one child and one adolescent, both homeless. Lacan-oriented psychoanalysis served as a theoretical perspective for the analysis. Moreover, the fiction narrative discourse is considered to be configured as a privileged locus for the emergence of subjectivity. Particularly in this modality of discourse, the subject truth breaks out in absence; one talks about himself because he cannot escape his dependence upon the language. What seems to distinguish these narratives is the emergence of a relationship between what is empirical and what is idealized. Along with the representation of a disarranged family (absent parent figures, reassembles, neglectful parents), comes the representation of a happy united family. It can be concluded that through fiction these subjects organized their private simbolization of what a family is, guided essentially by desire.
En se basant sur la perspective théorique fournie par la psychanalyse d'orientation lacanienne, on cherche à étudier la représentation de la famille à partir de narrations orales fictives produites par un enfant et un adolescent de la rue. On part du principe que le discours narratif se configure comme locus privilégié dans l'installation de la subjectivité. Dans le discours narratif fictif, spécialement, la vérité du sujet jaillit à son insu : il finit par parler de lui, car il ne peut échapper à son assujettissement au langage. Ce qui paraît caractériser les narrations, c'est l'émergence d'un jeu entre l'empirique et l'idéalisé, qui s'organise ainsi : côte à côte avec la représentation d'une famille déstructurée (figures parentales absentes, familles recomposées, parents négligents), apparaît la représentation d'une famille unie et heureuse. On conclut que, au moyen de la fiction, ils organisent leur symbolisation particulière sur ce qu’est une famille, guidés fondamentalement par le désir.